A Constituição não prevê o afastamento de um parlamentar; a medida está no Artigo 319 do Código de Processo Penal, mas não pode ser aplicada a um parlamentar
O Senado Já havia adotado um conjunto de
medidas para deixar claro que Aécio Neves (PSDB-MG) está afastado de
suas funções. Nesta quarta, aplicou algumas outras. Volto ao ponto daqui
a pouco. Antes, algumas considerações.
É mesmo do balacobaco!
Saibam todos os navegantes: o
afastamento de um parlamentar de sua função é um dos frutos do direito
criativo do Supremo. Não existe na Constituição. O Artigo 54 da Carta
lista as ações vedadas aos parlamentares. O 55 define que perderá o
mandato aquele que incidir num dos atos listados no anterior e
estabelece ainda outras circunstâncias para a cassação, como quebra do
decoro, perda dos direitos políticos, condenação criminal em sentença
transitada em julgado etc.
Sim, é verdade, o Inciso VI do Artigo 319 do Código de Processo Penal prevê:
“VI – suspensão do exercício de função pública ou de
atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio
de sua utilização para a prática de infrações penais.
Ai, ai… Vamos lá tentar destrinchar o
baguncismo que toma conta do país. Note-se, de saída, que, se o
constituinte tivesse achado razoável o afastamento, ele o teria inserido
na Carta. Como não está lá, não cabe ao Supremo emendar a Constituição
com remendos do Código de Processo Penal. Mas isso ainda Não diz tudo.
O primeiro a evocar tal artigo (o 319)
para afastar um parlamentar foi Teori Zavascki, em maio do ano passado,
ao impedir Eduardo Cunha de exercer seu mandato de deputado. Submeteu a
decisão ao pleno e obteve unanimidade. Pois é… Cunha pode merecer, e eu
acho que merece, todas as punições do mundo, mas aquilo foi uma
exorbitância. Por que digo isso?
O Parágrafo 1º do Artigo 283 do mesmo Código de Processo Penal estabelece:
“§ 1º: As medidas cautelares previstas neste Título não se
aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente
cominada pena privativa de liberdade.”
Sim, eu sei, essa variante da língua
portuguesa é quase incompreensível, mas isso quer dizer o seguinte: só
se podem aplicar medidas cautelares em razão de delitos que sejam
passíveis de prisão. Ocorre que um parlamentar só pode ser preso, antes
da condenação com trânsito em julgado, por flagrante de crime
inafiançável, conforme estabelece o Parágrafo 2º do Artigo 53 da
Constituição. De que Aécio é acusado mesmo para ser afastado de seu
mandato? De obstruir a investigação.
Ora, ainda que tivesse existido (e não
existiu!), obstrução de investigação (ou da Justiça), como chamam por
aí, não integra o rol dos crimes inafiançáveis. E não houve flagrante.
Logo, o pedido de prisão era descabido. E descabida, portanto, é a
medida cautelar aplicada em seu lugar: o afastamento. E, antes que
alguém objete, eu mesmo lembro: igualmente desmotivada foi a prisão do
então senador Delcídio do Amaral.
Medidas do Senado
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), fez ver ao ministro Marco Aurélio, relator do Supremo do caso que trata do afastamento de Aécio e do seu pedido de prisão (já trato do assunto), que as medidas determinadas por Edson Fachin, antigo relator, estão em curso. A Casa fez o necessário para caracterizar o afastamento — ainda que arbitrário; e isso digo eu.
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), fez ver ao ministro Marco Aurélio, relator do Supremo do caso que trata do afastamento de Aécio e do seu pedido de prisão (já trato do assunto), que as medidas determinadas por Edson Fachin, antigo relator, estão em curso. A Casa fez o necessário para caracterizar o afastamento — ainda que arbitrário; e isso digo eu.
Conforme informa o Estadão, “o
presidente do Senado pediu uma reunião com Marco Aurélio e enviou um
ofício mostrando diversas medidas que a Casa havia adotado desde que o
afastamento foi determinado, em 18 de maio, como a suspensão do salário,
da verba indenizatória e do uso do carro oficial.” Mais: “O Senado
também apagou, nesta quarta-feira, o nome do tucano do painel de
votações do plenário e passou a identificar o senador como ‘afastado por
decisão judicial’ no site oficial do órgão.” Mais tarde, a Mesa
esclareceu que a parte fixa do salário — R$ 33.763,00 — continuará a ser
paga, descontando-se as ausências das sessões deliberativas.
E que se note: Aécio cumpriu a
determinação de Fachin. Não compareceu ao Senado depois do afastamento.
Não participou de sessões nem circulou pela Casa. De resto, Fachin não
havia determinado o fechamento do gabinete do senador. O fato de que seu
nome estivesse no painel eletrônico não evidenciava descumprimento da
decisão, é evidente.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo
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