Agronegócio precisa de nova agenda e não de defensores do atraso.
Políticos desfilaram pela Agrishow em Ribeirão Preto na esperança de
serem vistos como candidatos do agronegócio. Nenhum alcançou o posto
pelo que se pôde ver das reações comedidas dos organizadores do evento. O
ideal seria que o setor se fixasse não em pessoas, mas em propostas, e
que os projetos fossem voltados para o futuro e não para a defesa do
atraso.
O agronegócio brasileiro vive um meio do caminho que o faz ser de
ponta em alguns momentos e lugares, e atrasado na pauta que os seus
representantes defendem. Quem vê a lista dos projetos da bancada
ruralista no Congresso não vê o coração das mudanças que ocorrem dentro
do setor. As empresas deveriam mirar o futuro do campo, que terá que ser com
mais tecnologia, mais rastreabilidade, mais pacificação com o meio
ambiente. Quem se dispõe a ser o defensor do agronegócio, pode achar que
o bom é propor limitações ao processo de licenciamentos ambientais,
restrições à divulgação da lista suja do trabalho escravo, anistia a
quem ocupou terra pública e, agora, a ideia de armar os produtores
rurais.
A encruzilhada em que o campo brasileiro está tem muitos dilemas. O
que parece ser o interesse do agronegócio, o prenderá no passado. O
Brasil sempre será um grande produtor de alimentos, tem um forte mercado
interno, é e continuará sendo um importante fornecedor de carnes e
grãos para o mundo. O campo brasileiro tem que olhar as tendências dos
tempos de hoje, ser mais rigoroso com a qualidade, prestar contas de
como cada item é produzido e sobre o que acontece na cadeia produtiva. A
atitude do consumidor interno e externo hoje é a de ser mais exigente
com a qualidade e o processo de produção. A tecnologia põe cada vez mais
ferramentas nas mãos de quem quer o consumo consciente. Não adianta
reclamar de protecionismo, é preciso agir para cumprir as exigências do
consumidor.
A entrevista de Pedro de Camargo Neto no “Valor” de sexta-feira tocou
num ponto essencial. O governo brasileiro quer discutir na OMC a
imposição de barreiras sanitárias às exportações de frango. Isso será um
desastre, diz o expresidente da Sociedade Rural Brasileira. O
empresário criticou a operação da Polícia Federal na época, mas hoje,
apesar de manter a ideia de que houve exageros, admite os erros do
setor. “Existia um jeitinho brasileiro de operar o sistema de inspeção
sanitária e a Carne Fraca acabou com ele”. O que precisa se combater é o
mau comportamento de grandes frigoríficos que aceitaram esse sistema
flagrado na operação. Fiscais que recebiam favores de fiscalizados,
Ministério da Agricultura que não via o que estava acontecendo, grandes
empresas exportadoras achando que era normal pagar a fiscalização, ou
mascarar problemas na qualidade do produto. Em vez de brigar com a União Europeia, dar ao consumidor da carne
brasileira a garantia de que o sistema de fiscalização está sendo
aperfeiçoado, corrigir os defeitos encontrados, aumentar a qualidade da
certificação. Enfrentar o problema e não brigar com os seus efeitos.
Há pressões protecionistas contra o Brasil e sempre vai haver, mas o
que o país não pode é dar motivo. Se a pauta da agricultura brasileira
no terceiro milênio for a redução do combate ao trabalho escravo, a
flexibilidade na fiscalização ambiental e o agravamento do conflito
armado no campo, esquece. Estaremos fora da competição internacional. De 1975 a 2017, a área plantada brasileira aumentou 82%, e a produção
subiu 512%. O crescimento da produtividade fala por si. O Brasil é bom
porque é competitivo, porque usou novas tecnologias de uso de solo e de
produção, porque tem as condições naturais e somou-as às condições
adquiridas pela busca da agropecuária de precisão. É esta facção que é a
vencedora. Não é a que grila, mata, desmata e corrompe.
Que futuro quer o campo brasileiro? Esta é a pergunta que deve ser
feita. Talvez nenhum dos candidatos preencha as expectativas, por isso o
mais importante é o compromisso com uma agenda modernizadora.
Coloque-se uma arma de fogo na mão de cada capataz, em cada fazenda, e
vamos direto para o passado do campo bandoleiro. Invista-se em novas
tecnologias de produção e teremos espaço garantido no futuro. Esta é a
encruzilhada.
Miriam Leitão - O Globo
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