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sábado, 17 de novembro de 2018

Sem trégua para Bolsonaro

A doutrinação política de Jair Messias Bolsonaro como presidente eleito está sendo feita a duras penas e sob forte resistência. O mandatário mergulhou em discussões acessórias, como fusão de ministérios, ideologia nas escolas, limitação do papel do BNDES, e recebeu algumas invertidas, seja de corporações fortemente organizadas, seja de líderes congressuais – esses, de alguma maneira, movidos por uma ponta de vingança, indo à forra por se sentirem tratados como personagens figurativos. É o caso, por exemplo, do ainda, temporariamente, presidente do Senado, Eunício Oliveira, que viu naufragar fragorosamente seu projeto de reeleição e botou pra quebrar na base da gastança pública.[curiosidade: que respeito, que consideração, que autoridade tem um político que é demitido nas eleições;
quando é escorraçado na tentativa de reeleição, o fracasso e a desmoralização são ainda maiores,  visto que a rejeição, o repúdio, estão acompanhados por um atestado de incompetência?]   Foi dele a ideia de antecipar de forma vergonhosa a agenda de votação dos aumentos do Judiciário, impactando toda a folha da máquina que “Messias” vai herdar. 

Não pegou nada bem nessa queda de braço do futuro Executivo com o superado Legislativo o intento de realizar uma “prensa” na patota parlamentar, como sugeriu o superministro da economia Paulo Guedes, tentando com tal expediente fazer passar a reforma da Previdência ainda neste ano. Ao “prensar” a turma, colocá-la contra a parede, veio, de quem se sentiu encurralado, o esperneio. Eunício, de novo, pontificou entre risos de deboche: “ele não sabe como a coisa funciona”. Decerto os congressistas não estão dispostos a aceitar o “tratoramento” puro e simples da Casa. Exigem negociações, rapapés, o diálogo em última análise. Se não vai ser na base do toma lá dá cá, que pelo menos os conquistadores cheguem com jeito – pedem eventuais aliados. Eis aí um aprendizado que Bolsonaro & Cia. estão tendo de fazer de maneira acelerada, sem trégua. Há um longo, acidentado e perigoso percurso a atravessar para que pautas vitais à retomada do País sejam digeridas no plano de quem possui a caneta para ajudar a aprová-las ou não. 

É preciso bem mais que habilidade para mobilizar apoios nas redes sociais. São necessárias tarimba de liderança e interlocução calejada. Na prévia do seu governo, a “prensa” exigida pelo intendente de “Messias” soou como prepotência e, em tempos de animosidade latente, a resposta veio do mesmo tamanho. Resultado: a votação da Previdência vai mesmo ficar para o ano que vem. Perdem os brasileiros e castiga-se ainda mais a cambaleante economia nacional. Essa temporada de testes de governança para a esquadra bolsonarista já foi equivalente a um curso intensivo. Teve de tudo um pouco. A cada choque com a fauna política de Brasília, recuos tiveram de ser bolados. O Ministério do Trabalho voltou a ter o mesmo status. Havia entrado na navalha de cortes. Não mais. 

No horizonte dos caciques palacianos cada um deles pediu a sua cerimônia de convescotes para, digamos, o reconhecimento de forças. Bolsonaro foi aos juízes e também tratou de agradar líderes parlamentares. Após cancelar duas audiências justamente com os presidentes do Senado e da Câmara, aquiesceu e enviou acenos para que Rodrigo Maia tivesse com ele um encontro a portas fechadas, exclusivo e sem tempo predeterminado. [Rodrigo Maia vá lá, não é um campeão de votos, mas, foi reeleito para o seu sexto mandato, sonha com a reeleição na Câmara e pede o apoio do capitão reformado e eleito presidente da República;
quanto a dar alguma atenção a  Eunício é desperdiçar velas com defunto ruim.]
Maia sonha com a reeleição na Câmara e pede o apoio do capitão-reformado. Deve levar. Bolsonaro precisa dele para aprovar o orçamento de 2019, para fazer valer mudanças na Lei do Desarmamento, para reforçar a legislação do combate ao crime organizado e à corrupção. A agenda é extensa. Sem contar que ele não possui outra alternativa fora da conversa com líderes da cúpula para evitar molecagens como a da aprovação sem lastro do reajuste de salários que impactam brutalmente o caixa da União, estados e municípios. Entre o novo presidente e o velho Congresso existem conhecidas diferenças. Elas precisam ser aparadas. A arte de “engolir sapos” diz muito de um governante consciente e provando competência para avançar fazendo pequenos recuos. Assim são curtidos os verdadeiros estadistas. Com o seu temperamento irascível – e um tanto quanto ingênuo – Bolsonaro ainda está longe desse estágio. Nada melhor que o tempo e a vivência para lhe darem traquejo.

 Carlos José Marques,  diretor editorial da Editora Três

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