A doutrinação política de Jair Messias Bolsonaro como presidente eleito
está sendo feita a duras penas e sob forte resistência. O mandatário
mergulhou em discussões acessórias, como fusão de ministérios, ideologia
nas escolas, limitação do papel do BNDES, e recebeu algumas invertidas,
seja de corporações fortemente organizadas, seja de líderes
congressuais – esses, de alguma maneira, movidos por uma ponta de
vingança, indo à forra por se sentirem tratados como personagens
figurativos. É o caso, por exemplo, do ainda, temporariamente,
presidente do Senado, Eunício Oliveira, que viu naufragar fragorosamente
seu projeto de reeleição e botou pra quebrar na base da gastança
pública.[curiosidade: que respeito, que consideração, que autoridade tem um político que é demitido nas eleições;
quando é escorraçado na tentativa de reeleição, o fracasso e a desmoralização são ainda maiores, visto que a rejeição, o repúdio, estão acompanhados por um atestado de incompetência?] Foi dele a ideia de antecipar de forma vergonhosa a agenda de
votação dos aumentos do Judiciário, impactando toda a folha da máquina
que “Messias” vai herdar.
Não pegou nada bem nessa queda de braço do
futuro Executivo com o superado Legislativo o intento de realizar uma
“prensa” na patota parlamentar, como sugeriu o superministro da economia
Paulo Guedes, tentando com tal expediente fazer passar a reforma da
Previdência ainda neste ano. Ao “prensar” a turma, colocá-la contra a
parede, veio, de quem se sentiu encurralado, o esperneio. Eunício, de
novo, pontificou entre risos de deboche: “ele não sabe como a coisa
funciona”. Decerto os congressistas não estão dispostos a aceitar o
“tratoramento” puro e simples da Casa. Exigem negociações, rapapés, o
diálogo em última análise. Se não vai ser na base do toma lá dá cá, que
pelo menos os conquistadores cheguem com jeito – pedem eventuais
aliados. Eis aí um aprendizado que Bolsonaro & Cia. estão tendo de
fazer de maneira acelerada, sem trégua. Há um longo, acidentado e
perigoso percurso a atravessar para que pautas vitais à retomada do País
sejam digeridas no plano de quem possui a caneta para ajudar a
aprová-las ou não.
É preciso bem mais que habilidade para mobilizar
apoios nas redes sociais. São necessárias tarimba de liderança e
interlocução calejada. Na prévia do seu governo, a “prensa” exigida pelo
intendente de “Messias” soou como prepotência e, em tempos de
animosidade latente, a resposta veio do mesmo tamanho. Resultado: a
votação da Previdência vai mesmo ficar para o ano que vem. Perdem os
brasileiros e castiga-se ainda mais a cambaleante economia nacional.
Essa temporada de testes de governança para a esquadra bolsonarista já
foi equivalente a um curso intensivo. Teve de tudo um pouco. A cada
choque com a fauna política de Brasília, recuos tiveram de ser bolados. O
Ministério do Trabalho voltou a ter o mesmo status. Havia entrado na
navalha de cortes. Não mais.
No horizonte dos caciques palacianos cada
um deles pediu a sua cerimônia de convescotes para, digamos, o
reconhecimento de forças. Bolsonaro foi aos juízes e também tratou de
agradar líderes parlamentares. Após cancelar duas audiências justamente
com os presidentes do Senado e da Câmara, aquiesceu e enviou acenos para
que Rodrigo Maia tivesse com ele um encontro a portas fechadas,
exclusivo e sem tempo predeterminado. [Rodrigo Maia vá lá, não é um campeão de votos, mas, foi reeleito para o seu sexto mandato, sonha com a reeleição na
Câmara e pede o apoio do capitão reformado e eleito presidente da República;
quanto a dar alguma atenção a Eunício é desperdiçar velas com defunto ruim.]
Maia sonha com a reeleição na
Câmara e pede o apoio do capitão-reformado. Deve levar. Bolsonaro
precisa dele para aprovar o orçamento de 2019, para fazer valer mudanças
na Lei do Desarmamento, para reforçar a legislação do combate ao crime
organizado e à corrupção. A agenda é extensa. Sem contar que ele não
possui outra alternativa fora da conversa com líderes da cúpula para
evitar molecagens como a da aprovação sem lastro do reajuste de salários
que impactam brutalmente o caixa da União, estados e municípios. Entre o
novo presidente e o velho Congresso existem conhecidas diferenças. Elas
precisam ser aparadas. A arte de “engolir sapos” diz muito de um
governante consciente e provando competência para avançar fazendo
pequenos recuos. Assim são curtidos os verdadeiros estadistas. Com o seu
temperamento irascível – e um tanto quanto ingênuo – Bolsonaro ainda
está longe desse estágio. Nada melhor que o tempo e a vivência para lhe
darem traquejo.
Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três
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