Será que Bolsonaro confundiu o centro de Alcântara (MA) com base militar? Tomara!
Os
primeiros quatro dias foram suficientes para apontar a principal fonte de problemas
na “nova era”:
Jair Messias Bolsonaro, que não só surpreendeu como chocou
militares, diplomatas e políticos ao lançar a ideia de uma base militar
americana em território brasileiro no futuro. Um prato feito para a oposição.
Bolsonaro
podia falar o que quisesse na campanha, mas precisa aprender que não pode mais
como presidente. Qualquer palavra e vírgula fora do lugar podem dar confusão.
Aliás, já deram, quando ele jogou ao vento não só uma, mas três ideias que ou
estão só na sua cachola ou não foram adequadamente discutidas com quem de
direito nem estão prontas para virar decisão de governo. Acabou desautorizado
em público por auxiliares e criticado intramuros até pelos sempre disciplinados
militares.
Dentre as
três ideias, a mais explosiva foi a de oferecer de mão beijada para o governo
Donald Trump a instalação de uma base militar dos EUA em solo brasileiro. Como
assim?
Essa
questão, delicadíssima, envolve soberania, defesa, segurança e amor próprio
nacional, além de relações internacionais, particularmente regionais. Até por
isso, militares ficaram de cabelo em pé, diplomatas demoraram a acreditar no
que ouviam e não falta quem lembre que é expor o Brasil e, por extensão, toda a
América do Sul, como alvo de confrontos entre os EUA e China ou Rússia, por
exemplo.
Na
hipótese (remotíssima, claro) de uma guerra entre eles, chineses e russos
estariam tentados a jogar uma bomba na base? Ou seja, no Brasil e na América do
Sul? Em tese, poderia ser. De tão esdrrúxula, a proposta foi recebida por diplomatas e militares como um
“equívoco” do presidente, que teria confundido o Centro de Lançamento de
Alcântara (MA) com uma base militar. O que está em estudo é um Acordo de
Salvaguardas Tecnológicas (TSA em inglês) para permitir o uso comercial de
Alcântara em lançamento de satélites, aliás, não apenas pelos EUA, mas também
por outros parceiros. Base militar é outra coisa, totalmente diferente. É abrir
mão do controle de uma parte do território para um outro país, no caso os EUA.
Quando a Venezuela
ameaçou sediar uma base russa, em 2009, gerou uma gritaria estridente não só do
Brasil, mas de toda a região. Se condena uma base russa na Venezuela, ou uma
americana no Equador, por que permitir que o Brasil hospede uma dos EUA? O único registro de base militar estrangeira no Brasil foi na Segunda Guerra, quando
Getúlio Vargas autorizou, em 1942, que os americanos usassem o geograficamente
estratégico Rio Grande do Norte para reabastecimento de aeronaves e decolagem
rumo à África. Outros tempos…
Hoje,
ceder território para uma base militar estrangeira é de uma subserviência
constrangedora, que os militares e os diplomatas não podem aceitar em nenhuma
hipótese. Aliás, nem eles nem o Congresso Nacional a quem, pelo artigo 49,
inciso II da Constituição, cabe aprovar qualquer tipo de base temporária em
solo nacional. Nessa, Jair Bolsonaro não apenas deu palanque para o
ex-chanceler Celso Amorim – inimigo número 1 da “nova diplomacia” –, como pode
unir oposição, situação, esquerda e direita. Contra o governo.
Eliane Cantanhêde - O Estado
de S. Paulo
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