Bolsonaro desiste de Vélez no MEC e Maia desiste de Bolsonaro na reforma
Com tantas prioridades, Brasília anda em círculos, num chove e não molha
que não leva a nada e atrapalha tudo: a troca de desaforos entre os
presidentes da República e da Câmara e a queda do ministro da Educação,
que já foi decidida pelo chefe Jair Bolsonaro e é questão de tempo –
horas, ou dias.É inacreditável que Bolsonaro tenha riscado um novo fósforo no incêndio
com o deputado Rodrigo Maia, quando a sensação no governo e no Congresso
era de que o pior da crise havia passado. Alguém consegue entender por
que o presidente foi falar novamente que Maia está nervoso “por
problemas familiares”?
Já imaginaram se o deputado devolvesse na mesma moeda e desafiasse
Bolsonaro a duelar com insinuações contra a família? Ele não faz isso
porque seria um golpe abaixo da linha da cintura e também porque tem
boas relações com o senador Flávio Bolsonaro, que também é do Rio. O que parece claro é que Bolsonaro vai sempre governar atacando num dia,
recuando no outro, mais preocupado com três ou quatro milhões de
bolsonaristas da internet do que com os 200 milhões de brasileiros. Como
isso só atrapalha a reforma da Previdência, Rodrigo Maia decidiu deixar
o presidente pra lá e articular com quem realmente interessa. Ontem,
fez as pazes com Sérgio Moro, da Justiça, e acertou os próximos passos
com Paulo Guedes, da Economia, seu principal parceiro no governo. De
quebra, recebeu Onyx Lorenzoni (Casa Civil).
Funciona mais ou menos assim: todo mundo deixa Bolsonaro brincando com
os filhos nas redes sociais e vai tocar a reforma da Previdência, o
pacote anticrime o que mais for importante para o próprio governo e para
o País sair do buraco e recuperar um lugar ao sol. Moro repõe seus projetos na lista de prioridades, tanto na Câmara quanto
no Senado, mas com um cuidado: falar mais no combate ao crime
organizado e deixar o endurecimento das regras contra corrupção (que
atinge partidos e políticos) a reboque. Um pequeno ajuste, ou uma
pequena inversão, para reduzir resistências.
Guedes, que já deu seu recado – “Não tenho apego a cargo” –, vai fazer o
que Bolsonaro se recusa a fazer e o vice Hamilton Mourão já faz
naturalmente: abrir as portas do seu gabinete para grupos de
parlamentares, de prefeitos, de governadores. Ou seja: ele vai articular
apoio político. Quanto ao ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez: esse é caso
perdido. Bolsonaro ora diz que é fake news, ora confirma, ora é dúbio,
mas a verdade é uma só e óbvia: ele já decidiu demitir Vélez, a pessoa
errada, no lugar errado, na hora errada.
Aliás, o próprio Bolsonaro disse em entrevista à Rede Bandeirantes o que
todo mundo sabe: “O MEC não está dando certo”. E explicou por quê:
“Você tem que ter poder de comando, exercer autoridade, indicar pessoas
corretas”. Vélez não comanda nada, nem sabia do adiamento da avaliação
da alfabetização; não tem autoridade, já que os técnicos, os militares e
os “olavetes” da pasta se engalfinham à luz do dia; e há controvérsias
se ele realmente escolheu as pessoas corretas para cada órgão, depois de
seis recuos e 15 exonerações. Em três meses, nada andou no MEC.
Vélez não tem apoio do setor, nem dos generais, e acabou de perder o do
padrinho Olavo de Carvalho. Logo, só falta uma coisa: arranjar alguém
disposto a descascar “esse abacaxi do tamanho de um bonde”, segundo o
ministro. Um abacaxi com bilhões de reais de orçamento e bilhões de
problemas a resolver.
Moro. A foto de Maia com Bolsonaro, dias atrás, teve 3.700
curtidas no Instagram. A dele com Moro, ontem, bateu em 6.500 até as 16
horas e continuava crescendo. Brigar com Moro é pior do que com
Bolsonaro.
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo
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