Pegaram Sergio Moro. Ele foi flagrado sentenciando o ladrão
mais querido do país – e isso não se faz. O pessoal da mídia transformista – a
militância fantasiada de jornalismo – não gostou do que o principal juiz da
Lava Jato falava em privado durante o processo que condenou o bom ladrão. j.w. (por acaso amigo dos arapongas em questão) já tinha reclamado que a voz
de Moro é fina. Agora veio a queixa sobre os modos para se referir ao ladrão
amigo. Ok, cada um na sua – e se a sua é a militância delinquente
com maquiagem de jornalismo investigativo, você tem mesmo que caçar quem
defende a lei. Ainda assim, se coloque no lugar de Sergio Moro por um instante.
Ele estava liderando a força tarefa que capturou a quadrilha
mais simpática e voraz da história. Já tem gente até dizendo que ele não
poderia ter liderado Lava Jato nenhuma, que tinha que ficar lá no gabinete dele
canetando os processos e ponto. Normal: no mundo encantado dos legalistas de
almanaque, a justiça se faz praticamente com uma varinha de condão. O juiz é um
burocrata que não precisa nem lavar as mãos no fim do expediente, tal o seu
isolamento virtuoso.
Voltando ao mundo real e sua desobediência aos almanaques,
Moro tinha entendido que o filho do Brasil – uma figura a caminho da
canonização em vida – aproveitara sua santificação na Terra para se associar a
santidades menos conhecidas que ele, mas igualmente puras – que viviam no altar
das empreiteiras. Tudo em nome da amizade e da camaradagem, num clima tão
fraterno e altruísta que ali a gula nem era pecado. Sendo assim, saíram
devorando tudo (sem culpa).
Sergio Moro foi o estraga prazeres que apareceu para
atrapalhar essa história bonita. O final terrível de tudo isso – se é que se
pode falar em final – foi a condenação e prisão inédita no país de empreiteiros
bilionários que só queriam fazer o bem, junto com ídolos do PT que tomaram o
dinheiro do povo só para impedir que ele gastasse tudo com cachaça. Agora imagine a cena: Moro decreta a prisão de Lula e ele
simplesmente não obedece. Se tranca num sindicato cercado de fiéis
transtornados esbofeteando jornalistas e dizendo que o grande líder só sairia
dali sobre seus cadáveres. A companheira Gleisi já tinha avisado que ia morrer
gente se ousassem tentar prender Lula. Vários desses intelectuais de almanaque – os que dizem que
juiz bom é juiz de gabinete – ali já diziam que Moro tinha dado vexame: sua
sentença precipitada e inócua iria para a lata de lixo da história.
Os legalistas sabem admirar um bom drible marginal nas
instituições. Além deles, na torcida – e na fé – pelo baile de Lula na
Justiça e na lei, estavam celebridades, famosas entidades de classe, parte da
imprensa internacional, instituições multilaterais de direitos humanos (sic),
etc. E Moro jogando xadrez com essa tsunami “progressista” em sentido
contrário, fora os insultos de quem estava a favor dele mas já o chamava de
arregão nas redes sociais. “Manda a polícia logo!” “Morreu na praia!” etc.
Ao contrário do que fingem querer os legalistas de
almanaque, nesse momento Sergio Moro não estava sozinho em seu gabinete
esperando a justiça se fazer pela providência divina. Certamente estava
conversando não só com procuradores, mas com delegados, agentes,
desembargadores e outros. Estava fazendo o que não estava em nenhum script e
contrariava todos os convites das circunstâncias: evitar um banho de sangue e
desmontar um teatro que salvaria um criminoso.
Se os arapongas fantasiados de jornalistas capturarem alguma
mensagem telefônica desse famoso 7 de abril de 2018, informarão, depois daquela
edição caprichada, que Moro estava combinando com seus comparsas como capturar
um inocente perseguido por ele. Como diria Cazuza: transformam um país inteiro num puteiro
pra ganhar mais dinheiro – e (complementamos) querem que o xerife seja a
virgem.
Ricardo Fiuza - Gazeta do Povo
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