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sábado, 8 de janeiro de 2022

O triunfo da mentira - J. R. Guzzo

Máquina agrícola fazendo a colheita em campo de soja, no Estado do Mato Grosso | Foto: Sergio Sallovitz/Shutterstock
Máquina agrícola fazendo a colheita em campo de soja, no Estado do Mato Grosso | Foto: Sergio Sallovitz/Shutterstock

A dúvida é saber onde se mente mais, se no Brasil ou lá fora. Deve ser no Brasil: aqui, além da produção própria, importamos com paixão as mentiras manufaturadas na Universidade Harvard, ou no governo da Alemanha, ou no Le Monde. Qual a novidade? País subdesenvolvido é assim mesmo: copia tudo o que ouve ou que lhe mostram, e considera como verdade matemática tudo o que vem embalado em inglês, francês ou outra língua civilizada. Isso complica consideravelmente a questão. 

Qualquer alucinação originada nos centros mundiais da sabedoria, da democracia e do politicamente correto entra no Brasil com a facilidade e a rapidez com que entra por aqui a cocaína da Bolívia. 
Entra e cai direto no ouvido dos que mandam, influem e controlam — eis aí todo o problema. A partir daí, as mais espetaculares criações da estupidez mundial viram lei neste país, ou algo tão parecido que não se percebe a diferença.

O agronegócio brasileiro, de acordo com os militantes ambientais [em sua maioria, comprados por interesses estrangeiros] causa terremotos, erosão do solo e incêndios

De todas as mentiras de primeira grandeza que estão hoje em circulação no Brasil e no mundo, provavelmente nenhuma se compara ao complexo de falsificações montado para sustentar que o agronegócio brasileiro, e em especial a pecuária, está ameaçando a sobrevivência “do planeta”. Segundo o rei da Noruega, o diretor de marketing da multinacional high tech (e mesmo low tech) ou o cientista ambiental de Oxford, nossa soja e o nosso boi, que têm um papel cada vez mais fundamental na alimentação de talvez 1 bilhão de pessoas, ou mais gente ainda, são um terror. Juntos, destroem florestas, envenenam o mundo com “carbono” e provocam todo tipo de desastre natural — das enchentes às secas, dos incêndios à erupção dos vulcões. Não se deve discutir mais nada do ponto de vista científico, técnico ou da mera observação dos fatos — todos os que estão “conscientes” da necessidade de “salvar o planeta” concordam que a “humanidade” tem de “agir já” se quiser “sobreviver” à “crise climática”.

Imagens de bois brasileiros no pasto, ou colheitadeiras trabalhando na safra de grãos, são diretamente associadas, nos comerciais de grandes empresas, órgãos internacionais e ONGs milionárias, a tsunamis na Ásia, a inundações na Austrália ou a seca no sul do Sudão. O agronegócio brasileiro, de acordo com os militantes ambientais, causa terremotos, erosão do solo e incêndios — mesmo os incêndios da Califórnia ou do Canadá. É responsável pela fome na África. (Não tente entender: o Brasil está produzindo neste ano quase 300 milhões de toneladas de alimentos, mas o cientista político da Sorbonne garante que agricultura e pecuária modernas são geradoras de miséria.)

Nem é preciso falar, é claro, da Amazônia. Os cientistas, especialistas, ambientalistas etc. do mundo inteiro dão como indiscutível, há anos, que o trabalho rural está destruindo, ou já destruiu, a Floresta Amazônica
A Amazônia está lá, visível para todos — continua sendo, disparado, a maior reserva florestal do mundo. Praticamente a totalidade dos grãos brasileiros é produzida em Mato Grosso, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul e áreas desenvolvidas do Nordeste — que diabo esses lugares teriam a ver com a Amazônia? 
 
O produtor rural no Brasil é o único no mundo obrigado a reservar 20% de suas propriedades, nem 1 metro quadrado a menos, para áreas de mata; não recebe um tostão furado por isso. (O que aconteceria se os agricultores americanos ou europeus tivessem de fazer a mesma coisa?) Mas nada disso importa; ninguém levanta essas questões, ou se permite alguma dúvida. A agropecuária está destruindo a Amazônia, o Brasil e o mundo, dizem eles. É proibido apresentar fatos desmentindo isso, ou simplesmente discutir o assunto.
Toda essa mentira poderia fazer parte, apenas, de um mundo que não está aqui, ou de realidades que não são as nossas — como o ski nos Alpes suíços ou o Carnaval de Veneza.  
Querem achar que o zebu está causando poluição em Berlim, ou que a soja destrói “a floresta”? 
Pois que achem. O que se vai fazer? Mas as contrafações produzidas no exterior não ficam no exterior. São metabolizadas imediatamente pela mídia, o mundo político e as classes intelectuais do Brasil, e passam a fazer parte da nossa realidade formal e imediata. São mentiras ativas. Determinam quais as decisões que devem ser tomadas, a começar pelas sentenças da Justiça. Estabelecem quem está com a razão. Definem como o país tem de ser governado. São as mentiras mais potentes em circulação hoje em dia. Mentira brasileira pega ou não pega; muitas não pegam. Mentira construída na Europa ou nos Estados Unidos pega sempre.

As exportações não sofrem absolutamente nada com a “imagem” do Brasil no exterior; ao contrário, acabam de bater um recorde histórico

Os meios de comunicação são uma peça-chave nesse embuste todo. Uma mentira não deixa de ser mentira por ter sido dita, por exemplo, pelo presidente Macron — por sinal ele já mentiu pesado, tempos atrás, exibindo fotos falsas de um incêndio “na Amazônia”. Mas quem liga para isso? Se é Macron quem diz, a imprensa brasileira passa a ter certeza instantânea de que é verdade. É por isso que você poderá ler, a qualquer momento, uma manchete assim: “Bois brasileiros estão comendo as árvores da Amazônia, denuncia Macron”
Ou: “Macron revela que bois brasileiros estão soltando carbono demais na atmosfera, incentivados por Bolsonaro”. 
Tire Macron e ponha algum outro, uma Merkel ou um Leonardo DiCaprio da vida, ou um El País qualquer. Vai dar exatamente na mesma — seja lá o que digam, a mídia brasileira vai transformar em verdade indiscutível.
As áreas de vegetação preservadas pelos agricultores brasileiros
equivalem à superfície de 14 países europeus
Foto: Divulgação Embrapa
 
O problema não está nas pretensas “implicações econômicas” que as mentiras estrangeiras podem causar, porque não há implicação nenhuma: o Brasil exporta mais para a Tailândia do que para a França, ou mais para a Malásia do que para a Inglaterra, ou mais para a Índia do que para a Itália. As exportações brasileiras não sofrem absolutamente nada com a “imagem” do Brasil no exterior; ao contrário, acabam de bater um recorde histórico, com US$ 280 bilhões (e um superávit superior a US$ 60 bi) em 2021. Que raio de “impacto negativo” é esse?  
 
Como seria possível estar em crise comercial externa com números assim?
Mais: o Brasil é o país ocidental que tem o maior saldo comercial com a China; exporta para lá mais do que para os Estados Unidos, a União Europeia e o Mercosul juntos. 
Como a China dá importância zero para o que dizem sobre o meio ambiente os professores de Princeton ou os comunicadores da Suécia e menos ainda para os jornalistas e militantes ambientais brasileiros —, toda essa mentirada não dói no bolso do agronegócio brasileiro, nem afeta o seu crescimento cada vez maior. 
Mas constrói-se assim uma história de falsificação. Desmoralizam a ciência. Proíbem a verificação dos fatos mais simples. Enganam os jovens. Intoxicam os currículos das escolas. A soma disso tudo é muito ruim.

A pecuária, neste momento, é onde se concentra o grosso das calúnias contra o agronegócio brasileiro. Até o Bradesco entrou nesse linchamento; a exemplo de tantas outras grandes empresas brasileiras fanatizadas pelas causas “identitárias”, “progressistas” e socialisteiras, colocou no ar uma campanha publicitária pelo “carbono neutro” na qual denunciava a pecuária brasileira pela “crise” ambiental e convocava a população a comer menos carne
É um despropósito completo, do ponto de vista dos fatos. 
A pecuária, segundo a comprovação científica mais séria, neutra e fundamentada na experiência, gera efeitos exatamente contrários ao que a militância ecológica espalha pelo mundo afora. 
A criação de bois, em qualquer escala, faz o solo absorver carbono, e não espalhar veneno na atmosfera, como acreditam nove entre dez “influenciadores” de opinião. É fundamental para preservar a boa qualidade do solo — e para combater a expansão de desertos
É o que mais se recomenda para salvar as terras secas da África, melhorar o ambiente natural e prover o sustento de populações inteiras sem agredir a natureza nem a vegetação nativa.  
Não há miséria, nem solo devastado, onde há pecuária. 
Da mesma forma, é evidente que não há criação de gado na Floresta Amazônica. 
Como poderia haver? Não faz sentido nenhum: quem iria criar boi no meio do mato?

O Brasil tem o maior rebanho comercial do mundo, com cerca de 220 milhões de cabeças. É o maior exportador mundial de carne, com US$ 8 bilhões em 2021. A maior empresa brasileira do setor, a JBS, fatura perto de R$ 350 bilhões mais do que todas as montadoras de automóveis, caminhões e demais veículos somadas
Como seria possível um país sair praticamente do zero e tornar-se o número 1 do mundo na exportação de carne com métodos primitivos de criação, tal como dizem os militantes do antiagronegócio? 
O Brasil só tem os números apresentados acima por força do avanço tecnológico e da competência dos pecuaristas, pelo investimento e pela excelência da terra ocupada pelas pastagens, ou das técnicas de confinamento — não porque está cortando árvores para ocupar o terreno com gado, ou por estar destruindo a natureza. 
Não é possível, simplesmente, um país ter o maior rebanho de bois do mundo e, ao mesmo tempo, comportar-se de maneira selvagem na sua pecuária.
 
Mas qual a honestidade do atual debate ambientalista? A verdade é o que menos interessa; só vale a fé nos próprios desejos, ideias e interesses. 
A ciência, no mundo de hoje, passou a ser uma questão de crença e, como crença, transformou-se em religião. 
Não se trata mais de questionar, investigar nem observar fatos; trata-se de decretar que a realidade é como querem os proprietários da virtude. Estamos em plena Era da Mentira Universal.

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J.  R. Guzzo, colunista - Revista Oeste - MATÉRIA COMPLETA e  vídeo do Bradesco

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