A notícia do jornal britânico The Times cita o Centro Nacional de Ciência Abrangente de Hefei como criador de um sistema capaz de “ler expressões faciais e ondas cerebrais, analisando quão atento um membro está para a educação política e do pensamento”.
O objetivo, segundo o Centro Hefei, é “solidificar ainda mais a confiança e a determinação de ser grato ao partido, de ouvir o partido e de seguir o partido”. Atingir 100% de foco nos ensinamentos políticos e na doutrinação ideológica. A tecnologia de leitura de ondas cerebrais já é capaz de detectar se alguém, numa sala de estudos, está acessando um site de pornografia ou se está cansado.
Na sua busca pelo controle absoluto da população, o regime comunista chinês já espalhou 170 milhões de câmeras de vigilância por lugares públicos e é capaz de monitorar de uma maneira ou outra os atos de seu 1,4 bilhão de habitantes. A tecnologia de inteligência artificial é capaz de apontar um punhado de “suspeitos” em aglomerações com milhares de pessoas. O processo de identificação dura menos de um segundo.
Mas controlar a liberdade dos cidadãos é pouco. O PCC quer controlar sua mente. Ainda segundo o Times, o Partido espalhou um aplicativo chamado “Estude Xi para tornar a China Mais Forte” aos seus quase 97 milhões de membros. Xi, claro, é o todo-poderoso Xi Jinping, o presidente da China, o autoproclamado novo Mao Tsé-tung.
A imprensa oficial (e qual não é oficial na China?) conta histórias edificantes sobre cidadãos que abrem o aplicativo assim que acordam, antes de tomar água ou fazer xixi. Solteiros são incentivados a se casar com quem também usa o “Estude a Grande Nação”. “Você não pode se distrair”, declarou o professor Haiqing Yu, da universidade australiana RMIT. “É um tipo de vigilância digital. Leva a ditadura digital a um novo nível.” A China de Xi Jinping está cada vez mais parecida com uma versão high-tech da Coreia do Norte.
Os humanos não são iguaisCada membro do partido é obrigado todos os dias a ler no aplicativo quatro artigos aprovados pelo grande líder, a assistir a três vídeos de nove minutos e responder a três perguntas. Se acertar as respostas, ganha 40 pontos. Acumulando esses pontos, como num programa de milhagem, vai ter mais chance de subir na burocracia do partido.
O professor James Leibold, da Universidade La Trobe, em Melbourne, Austrália, escreveu um artigo, em 2018, para o New York Times sobre essa obsessão chinesa de controle sobre o indivíduo. Revelou que não é uma novidade imposta pelo Partido Comunista quando tomou o poder, em 1949.
A China de Xi Jinping está cada vez mais parecida com uma versão high-tech da Coreia do Norte
Segundo o professor Leibold, já no século 3 a.C., o filósofo Xunzi definia a humanidade como “madeira torta” que precisava ser retificada em nome da “harmonia social”. O confucionismo (que exerce grande influência no regime comunista chinês) determinava que o mais importante não eram os direitos individuais, mas a aceitação da hierarquia social. Segundo essa linha de pensamento, os humanos não são iguais, mas variam em “suzhi”, ou qualidade. Confúcio falava em “pessoas superiores”. Os comunistas falam em “quadros de liderança”.
Pessoas “inferiores” podem se aperfeiçoar? Sim, desde que sigam as regras do partido. Se um chinês é condenado à prisão, por exemplo, é imediatamente isolado e incentivado a obedecer às regras. Recebe, conforme seu comportamento, mais comida e horas de sono ou mais tortura e isolamento. Faz parte do processo a “autocrítica”, o reconhecimento de que estava errado. Segundo o filósofo contemporâneo Tu Weiming, é a jornada de “dor e sofrimento” na busca de aperfeiçoamento e aceitação.
“Paralisar e controlar o oponente”O Partido Comunista chinês sempre deu atenção ao processo que ficou conhecido como “lavagem cerebral”. A expressão vem da união de duas palavras em mandarim, “xi” (lavagem) e “nao” (cérebro). O sistema tornou-se tristemente conhecido durante a Guerra da Coreia (1950-1953), quando militares norte-americanos aprisionados pelos chineses confessavam crimes inexistentes e decidiam abandonar o próprio país e viver com seus carrascos.
O doutor Robert Jay Lifton, que trabalhou com veteranos da Guerra da Coreia, identificou alguns métodos para quebrar a vontade dos prisioneiros norte-americanos — o controle absoluto de seu ambiente, a confissão de crimes não cometidos, a obrigação de permanecer em posições dolorosas, a privação de comida e sono, o confinamento solitário e a exposição permanente à propaganda comunista. A individualidade é quebrada, e o prisioneiro se torna uma “nova pessoa”, dócil aos seus captores, renegando seus próprios princípios.
A China não esconde uma outra possibilidade: a de inventar armas destinadas a desorientar tropas inimigas, criando confusão mental em massa. Segundo o jornal Washington Times, os chineses estão investindo em biotecnologia destinada a “paralisar e controlar o oponente” e “atacar o desejo do inimigo de resistir”.
Escravos voluntáriosToda essa tecnologia de dominação mental, que parece sair de uma história em quadrinho barata, é real e presente. Por enquanto, está sendo testada na China, mas amanhã poderá estar no Irã ou em Cuba. A obsessão controladora de Xi Jinping está dando um impulso definitivo para esses métodos e tecnologias. Mas a questão não diz respeito só à China. E muito menos à tecnologia em si.
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