Editorial
IMUNIDADE PARLAMENTAR
A caixa de Pandora do desprezo por liberdades e garantias constitucionais, uma vez aberta, mostra-se cada vez mais difícil de fechar. O exemplo mais recente é o da condenação judicial, em primeira instância, da deputada federal Chris Tonietto (PL-RJ) devido a uma publicação em mídias sociais, feita dois anos atrás, que foi considerada discriminatória em relação à comunidade LGBT.
Trata-se de uma situação emblemática, pois consegue combinar, em um único caso, os efeitos de uma decisão equivocada do Supremo, o ativismo ideológico de setores do Ministério Público Federal e do Judiciário, a relativização excessiva da liberdade de expressão e a negação de uma garantia importantíssima concedida pela Constituição aos parlamentares.
A deputada federal Chris Tonietto durante sessão da Câmara em maio de 2022. - Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados
Em junho de 2020 – um ano depois da decisão do Supremo que equiparou a homofobia ao racismo –, comentando casos recentes de pedofilia, a deputada havia escrito em seu perfil no Facebook: “Defendida explicitamente por alguns expoentes do movimento LGBT, a pedofilia está sendo visivelmente introduzida no país como fator de dissolução da confiança nas relações familiares e corrupção moral de toda uma geração de crianças expostas a uma erotização abominável desde a mais tenra infância. Combateremos sem cessar a disseminação da pedofilia no Brasil e as ideologias nefastas que as sustentam”. No mês seguinte, a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão recomendou que ela se retratasse da “informação falsa” publicada e pediu que a deputada citasse fontes que comprovassem sua alegação.
Veja Também:
Homofobia e liberdade de expressão (editorial de 18 de outubro de 2020)
Só por isso o caso de Tonietto já seria extremamente grave, mas a ele se acrescenta a violação da imunidade parlamentar, garantida no artigo 53 da Constituição, cujo caput afirma que “os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. Em sua decisão, a juíza Italia Bertozzi afirmou que “não se pode, pois, elastecer a imunidade [parlamentar] a ponto de fazê-la escudar toda e qualquer manifestação emitida pelo cidadão, que, exercendo mandato eletivo, profira opiniões ofensivas a pessoas e/ou coletividades, sem nexo etiológico com o cargo desempenhado”, em uma tentativa de recusar a Tonietto a proteção constitucional a suas palavras.
No entanto, o tipo de alerta feito pela parlamentar tem, sim,
“nexo etiológico com o cargo desempenhado”, pois diz respeito também à
sua atividade como representante eleita do povo. Avança-se, assim, sobre
a imunidade parlamentar de forma ainda mais ostensiva que no caso do
deputado Daniel Silveira, pois das afirmações de Tonietto nem se pode
dizer que foram deploráveis como haviam sido as do seu colega, embora
ambas estejam igualmente protegidas constitucionalmente.
A
perseguição falaciosa contra a deputada retrata a inversão de
prioridades das instituições do poder público, que estão deixando de
lado o verdadeiro problema, a defesa da normatização da pedofilia, para
investir contra quem alerta a sociedade a respeito dessa militância.
Abafar a difusão de verdades inconvenientes que dizem respeito apenas a
algumas pessoas, e não a toda uma coletividade, em nada ajuda no
objetivo meritório de combater o preconceito contra a população LGBT.
Editorial - Gazeta do Povo
Chris Tonietto é condenada por post sobre LGBT e pedofilia; especialistas apontam ativismo judicial
A
deputada federal Chris Tonietto (PL-RJ) foi condenada pela 24ª Vara
Federal do Rio de Janeiro, após ação movida pelo Ministério Público
Federal (MPF) no ano passado, por postagem apontada como discriminatória
em relação à comunidade LGBT no Facebook. Para especialistas ouvidos
pela Gazeta do Povo, a decisão não levou em conta a
imunidade parlamentar e também representa cerceamento à liberdade de
expressão. A deputada informou que vai recorrer da decisão e apresentar
provas de que falou a verdade.
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De
acordo com a sentença publicada no dia 12 de julho, a parlamentar
deverá excluir a publicação, considerada como discriminatória por
relacionar a prática de crime e de pedofilia a alguns homossexuais. Além
disso, a juíza federal Italia Poppe Bertozzi indicou que deputada deve
fazer uma retratação em suas redes sociais, que deverá ser mantida no ar
por, pelo menos, um ano, além de pagar R$ 50 mil para a estruturação de
centros de cidadania LGBTs.
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