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quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Com Bolsonaro, país pode ganhar um partido de ultradireita - Folha de S. Paulo

Bruno Boghossian

Sigla em criação pelo presidente tende a se tornar veículo para posições radicais

Com Jair Bolsonaro, o país pode ganhar um partido de ultradireita. A legenda que o presidente quer criar surge ancorada em valores reacionários, no populismo e no personalismo puro. A aparente espinha dorsal da Aliança pelo Brasil coube numa sequência de publicações de Eduardo Bolsonaro. Na primeira frase, o deputado anuncia a criação da sigla com o objetivo de libertar a população "da destruição de valores cristãos e morais". Em poucas linhas, ele repete essa fórmula e encerra com um resumo dos princípios do novo partido: "fé, honestidade e família".
[presidente Bolsonaro! - óbvio que sendo um partido idealizado pelo senhor e por grande parte dos seus eleitores - vamos esquecer seus filhos no tocante ao partido, lá estarão na condição de cidadãos e não de filhos -  já nasce sendo espancado.
Mas, ser espancado é um bom fermento para um crescimento sadio e exitoso.
E, já passa da hora das ideias que o senhor e seus milhões de eleitores,  apoiam e defendem, serem representadas de forma autêntica e clara por  um Partido que por elas pugne.

Apresentamos uma sugestão de nome para o novo partido: Ação Integralista Brasileira - AIB ou Aliança Integralista Brasileira - AIB, a primeira-denominação  proposta repete ipsis litteris, denominação de organização anterior extinta no  governo Vargas e a segunda praticamente nada altera.
Por estarmos no Brasil, onde se proíbe o que é correto e se libera - até mesmo se  impõe a aceitação do que é errado, imoral - talvez seja proibido usar o nome proposto.

O ensaio de manifesto é carregado de tons messiânicos. Fala no "novo rumo brasileiro" e no que chama de "a verdadeira união com o povo", como se Jair fosse o único capaz de representá-lo. Sem modéstia, cita ainda um "momento histórico" e o "grito solitário" do pai, que passaria a ecoar com a criação da legenda. Isso, é claro, sem falar na defesa aberta de ditaduras e de torturadores, que os grandes próceres da sigla fazem questão de defender publicamente e a todo momento.

O partido parece se inspirar na Arena (Aliança Renovadora Nacional), que serviu de sustentação para o regime militar. Seu manifesto de 1975 mencionava a união dos brasileiros e uma aliança com o povo, mas não apelava tanto aos valores cristãos quanto Eduardo Bolsonaro. O partido pode se tornar veículo para a difusão de ideias radicais, a exemplo do espanhol Vox e do alemão AfD. Essas duas legendas ainda brigam pelo poder em seus países, enquanto a Aliança já nasce no topo. [uma vantagem a favor do Brasil e que não pode ser deixada de lado.]

A migração de integrantes do PSL para a nova legenda deve acelerar uma depuração do bolsonarismo e definir em que ponto do espectro político o grupo mais afinado com o presidente passará a operar.  Se apenas os mais fiéis seguirem Bolsonaro, como parece claro até aqui, haverá espaço para posições mais extremadas. Elas tendem a sobressair em ambientes de forte apelo religioso e de fidelidade a um líder que sustenta posições desse tipo.

Bruno Boghossian, jornalista - Folha de S.Paulo



quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Militares em serviço precisam ter respeitado o DIREITO de seus atos serem julgados pela JUSTIÇA MILITAR - que não é corporativista e sim especializada

Senado aprova PL que transfere à Justiça Militar crimes cometidos por militares em operações de GLO. 

O Senado aprovou nesta terça-feira (10) o projeto que transfere à Justiça Militar o julgamento de crimes cometidos por militares em missões de garantia da lei e da ordem (GLO), como a que ocorre atualmente na cidade do Rio de Janeiro. O projeto (PLC 44/2016) impede o julgamento comum de militares das Forças Armadas pela Justiça em crimes dolosos (intencionais) contra civis quando envolverem ações de Estado. O texto vai à sanção.

Atualmente, o Código Penal Militar lista alguns crimes, principalmente relacionados a atividades militares, nos quais o julgamento é feito pela Justiça Militar, exceto se forem dolosos contra civis.  Exclui-se dessa regra o abate de aviões que não respondem ao comando de aterrissagem dado por aeronave militar de patrulhamento.  Pelo texto aprovado, se um militar matar um civil durante uma operação, ele será julgado pela Justiça Militar, e não mais pelo Tribunal do Júri. Se ele cometer um homicídio intencional em uma situação fora do trabalho, será julgado como outro cidadão, pela Justiça comum.
O tribunal do júri visa permitir que cidadãos julguem seus pares, ou seja, outros cidadãos. Militares das Forças Armadas no exercício de sua missão não estão agindo como cidadãos, mas sim como o próprio Estado. [correto este entendimento; o militar em serviço em área militar, em missões GLO e mesmo missões de patrulhamento aéreo, não pode ser submetido a um Tribunal do Júri.
O militar está agindo no cumprimento do DEVER e tem o direito de ter toda a proteção do Estado, inclusive se ocorrer mortes ainda que de civis.
É um absurdo um marginal é abatido em uma missão de natureza militar e os militares são julgados por paisanos.]

A força máxima deste deve ser julgada por Justiça Militar especializada, que entende e conhece as nuances da sua atuação – disse o relator do texto, senador Pedro Chaves (PSC-MS), ao lembrar que a atuação da Justiça Militar não é corporativista, e sim especializada.

Polêmica
A aprovação do texto gerou polêmica. Lindbergh Farias (PT-RJ) alegou que o projeto deveria ser considerado prejudicado, já que, no próprio texto, feito para as Olimpíadas, havia a previsão de vigência somente até 2016. [esse senador é uma coisa que só existe para atrapalhar; tem que ser julgado pelos crimes de corrupção dos quais é acusado e se condenado ser encarcerado na forma d a lei.
Aliás, nos tempos recentes a Câmara dos Deputados tem dois ou três deputados que não produzem nada de útil para a sociedade, exceto criticar o Governo, tentar atrapalhar a recuperação econômica do Brasil; no Senado Federal, tem além desse senador um outro, que até hoje não apresentou um único projeto de lei. 
Para evitar a ação nefasta de tais deputados e senadores é conveniente que se aprove uma lei estabelecendo um limite mínimo de produção para esses senhores.
Produção que será medida em número de projetos COERENTES que apresentarem, não sendo necessário sequer que sejam aprovados, basta que não sejam absurdos.]
Para que o texto não tivesse que voltar para a Câmara, caso fosse modificado, os senadores aceitaram o compromisso do governo de vetar esse artigo do prazo de vigência, assim o texto poderá valer indefinidamente.  Para Lindbergh, as ações militares e o emprego das Forças Armadas como polícia não resolverão o problema da violência nas cidades. O senador destacou o risco de que, com essa mudança, se tornem cada vez mais frequentes os pedidos desse tipo de operação, para o qual os soldados do Exército Brasileiro não são devidamente preparados.

Roberto Requião classificou o projeto como irresponsável por banalizar o uso das Forças Armadas como polícia. Ele informou que apresentará projeto para prever que os pedidos de utilização do Exército nesse tipo de operação sejam examinados pelo Senado.  — O projeto é uma monstruosidade, um absurdo. Exército não é polícia. Eu fico perguntando a vocês: amanhã ou depois, vocês querem o filho alistado no Exército para defender a Pátria sendo destacado, pela irresponsabilidade de um presidente, a confrontar traficantes na favela da Rocinha e vir a falecer com um balaço na cabeça? Não tem cabimento. O Exército não está adaptado para esses confrontos urbanos — argumentou. [o ilustre senador, outro criador de caso, esquece que uma das máximas do glorioso Exército Brasileiro é: "Não nos pergunte se somos capazes, dê-nos a missão".]

Já Cristovam Buarque (PPS-DF) classificou o texto como "uma solução esparadrapo" para um problema estrutural que é a crise na segurança pública.

Defesa
Para Jorge Viana (PT-AC), o processo Legislativo é complexo e não termina no Congresso.Ele defendeu o procedimento do compromisso sobre o veto e a aprovação do projeto.

Apesar de concordar com a imposição de limites para a atuação de militares nesse tipo de operação, ele disse ser a favor do projeto para resguardar os homens que estão tendo que cumprir essa obrigação e ajudar as polícias. A senadora Ana Amélia (PP-RS) também cobrou segurança jurídica para os militares.  — Querem criar uma condição de total insegurança para esses militares que estão cumprindo rigorosamente dispositivo constitucional. É preciso que se entenda em que país estamos vivendo. Não dar essa proteção aos militares seria um desastre total, do ponto de vista institucional e da própria segurança pública do nosso País — cobrou a senadora.

Situações
Com o projeto, além das missões de garantia da lei e da ordem outras situações de crime doloso contra a vida cometido por militares das Forças Armadas contra civil serão julgados pela Justiça Militar: ações no cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo presidente da República ou pelo ministro da Defesa; 
em ações que envolvam a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não sejam de guerra; 
em atividades de natureza militar, operação de paz ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com a Constituição, o Código Brasileiro de Aeronáutica ou o Código Eleitoral.

Com informações da Agência Senado


domingo, 20 de agosto de 2017

Exército quer que Justiça Militar passe a julgar crime doloso contra civil

O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, quer que o Código Penal Militar seja alterado para que crimes dolosos contra a vida cometidos por integrantes das Forças Armadas contra civis em "operações de garantia da lei e da ordem" voltem a ser julgados pela Justiça Militar, e não pela Justiça Comum, como ocorre desde 1996.
Segundo ele, a medida traria mais celeridade e segurança jurídica a esses casos. Especialistas ouvidos pela ConJur avaliam que essa alteração poderia dar margem a julgamentos corporativistas.

Villas Bôas afirmou recentemente, em redes sociais, que a operação das Forças Armadas no Rio de Janeiro “exige segurança jurídica aos militares envolvidos”. Por ser comandante do Exército, o general disse ter “o dever de protegê-los”, opinando que a legislação precisa ser revista. Questionado pela ConJur sobre quais são as alterações necessárias na visão do general, o Exército respondeu que é preciso transferir para a Justiça Militar a competência dos crimes dolosos contra a vida praticados por oficiais contra civis.

Quando o Código Penal Militar foi outorgado, em 1969, na ditadura militar, estabeleceu que esses delitos seriam julgados pela Justiça Militar. Isso mudou com a Lei 9.299/1996, que determinou que os crimes dolosos contra a vida e cometidos contra civil são da competência da Justiça Comum.  De acordo com o Exército, por meio de sua assessoria de imprensa, o fato de o oficial em operação ser julgado pela Justiça Comum “pode trazer prejuízos para a carreira profissional do militar, caso venha a se envolver em um confronto, e para a operação em si, já que uma pronta reação pode ficar comprometida”.

Por isso, a corporação é favorável a devolver a competência para o julgamento de tais delitos, quando cometidos em operação de garantia da lei e da ordem, para a Justiça Militar. Na visão da instituição, a mudança aumentaria a segurança jurídica e a celeridade processual. “Ao submeter os casos de crime a um togado de Justiça Militar, ganha-se em celeridade e, principalmente, no grau de conhecimento das atividades militares deste magistrado ao qual se submeterá o processo”, diz o comunicado do Exército à ConJur.

Ideia antiga
Dessa maneira, o Exército apóia a aprovação do Projeto de Lei 2014/2003. A proposta fixa que apenas militares dos estados e do Distrito Federal, como policiais militares e bombeiros, sejam julgados pela Justiça Comum em caso de crime doloso contra a vida praticado contra civil. Assim, membros do Exército, da Marinha e da Aeronáutica teriam suas condutas avaliadas pela Justiça Militar.

Outro projeto semelhante é o PL 44/2016, aprovado no ano passado pela Câmara dos Deputados. O texto dá poderes à Justiça Militar da União para cuidar de processos de crimes dolosos contra a vida contra civis cometidos sob ordens do presidente da República ou do ministro da Defesa; em ação que envolva a segurança de instituição ou missão militar ou em atividade de natureza militar, de operação de paz ou de garantia da lei e da ordem.

A proposta foi encaminhada pelo governo Michel Temer (PMDB) ao Legislativo em regime de urgência. O objetivo do governo era aprovar a medida antes das Olimpíadas, quando 22 mil militares ocuparam as ruas do Rio de Janeiro. No entanto, o então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) entendeu que o texto deveria ser aprovado pelas comissões da casa.

Na ocasião, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) afirmou que o projeto poderia levar à impressão de que se estaria concedendo "uma licença para matar e ser julgado pela Justiça Militar e não pela Justiça comum".  Ele também lembrou que o Brasil promoveu grandes eventos (como Copa do Mundo, em 2014, e Jogos Panamericanos, em 2007) sem a necessidade de uma lei dessa natureza. Entre outros senadores que se manifestaram contra a urgência, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que a proposta é uma “total temeridade”, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) afirmou que a ideia é “pra lá de inconveniente” e José Aníbal (PSDB-SP) alertou para “impacto negativo” internacionalmente.

Precedente do STM
Em 2016, o Superior Tribunal Militar entendeu, por unanimidade, que a Justiça Militar da União é competente para processar e julgar casos de homicídio doloso cometidos por militares das Forças Armadas contra civis.  O entendimento foi consolidado durante apreciação de um caso de homicídio supostamente cometido por um militar do Corpo de Fuzileiros Navais. Ele foi acusado de matar um civil durante uma ação militar executada em abril de 2014 no Complexo da Maré, no Rio.

Segundo o relator do caso, ministro José Coêlho Ferreira, a Lei 9.299/1996, levaria à conclusão de que a Justiça Militar da União seria incompetente para julgar o caso, por se tratar de suposto homicídio doloso praticado contra civil. Contudo, disse ele, uma análise mais aprofundada e cautelosa do dispositivo demonstra o contrário.  O magistrado opinou que essa lei se originou a partir do clamor popular em razão das constantes notícias veiculadas de lesões corporais e homicídios praticados por policiais militares contra civis na década de 1990, tais como nos casos da Favela Naval (SP), Eldorado dos Carajás (PA), Candelária e Vigário Geral (ambos no Rio).
“É cediço que a intenção inicial da reforma do Código Penal Militar era retirar a competência da Justiça Militar Estadual para julgar os crimes dolosos contra a vida cometidos contra civis tão apenas por militares dos estados, excluindo os militares das Forças Armadas”, afirmou o relator.

Porém, a seu ver, o texto final da lei acabou englobando também os militares das Forças Armadas, por um “claro erro de abrangência”, tendo em vista que eles também estão submetidos ao Código Penal Militar.  O relator acrescentou que a Emenda Constitucional 45/2004 tirou as dúvidas sobre o tema, pois alterou significativamente a competência das justiças militares estaduais. O texto da emenda diz que compete à Justiça Militar Estadual processar e julgar os militares dos estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do tribunal do júri quando a vítima for civil. [nos parece um absurdo que em um confronto entre um militar das FORÇAS AUXILIARES, o militar agindo a serviço e no estrito cumprimento do DEVER, ocorrendo a morte de um civil, seja a ocorrência submetida ao tribunal do júri, haja vista restar claro que o crime é de natureza MILITAR, haja vista que foi cometido por militar em serviço, durante operação militar, tendo como vítima civil que colocou em risco a operação militar e os próprios militares.]
“A partir daí, bastaria uma correta interpretação do texto constitucional, à luz da Emenda Constitucional 45/2004, para se concluir sobre competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida cometidos por militares da União [Forças Armadas]. Ora, a despeito de ter alterado substancialmente a competência das justiças militares dos estados, tal emenda em nada modificou a competência da Justiça Militar da União.”  Portanto, observou Ferreira, o legislador destacou visivelmente no seu texto que deverá ser “ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil”, somente no artigo que faz referência às justiças militares dos estados, não tratando do assunto nos artigos referentes à Justiça Militar da União. Ele foi seguido por todos seus colegas no STM.

Sinal dúbio
Contudo, especialistas ouvidos pela ConJur não acreditam que a transferência de competência dos crimes dolosos cometidos contra civis para a Justiça Militar atingiria os benefícios alardeados pelo Exército.Tanto Geraldo Prado, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, quanto Breno Melaragno Costa, presidente da Comissão de Segurança Pública da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil, destacam que a competência desses delitos passou para a Justiça Comum para evitar proteções corporativas.

O retorno ao sistema pré-1996 poderia sinalizar ao militar que ele teria um julgamento mais brando nesses casos, analisa Costa, ressaltando que a Justiça Militar é séria, eficiente e não costuma agir de forma corporativista.  Já Prado afirma que essa mudança não aumentaria a segurança jurídica. A seu ver, a segurança é dada pela clareza de quem vai julgar a questão, algo que já está consolidado. E a Justiça Comum, segundo ele, tem “plenas condições” de analisar acusações de crimes dolosos contra a vida de civis praticados por integrantes das Forças Armadas.

Legalidade questionada
Profissionais do Direito divergem quanto à constitucionalidade e legalidade do uso das Forças Armadas para patrulhar as ruas do Rio e quanto à sua eficácia em reduzir a criminalidade a longo prazo.  O uso das Forças Armadas para exercer atividades de policiamento ostensivo, atividades próprias da Polícia Militar, contraria a Constituição e a LC 97/1999, segundo o jurista Lenio Streck.

Por outro lado, a professora de Direito Constitucional da Uerj Ana Paula de Barcellos não enxerga irregularidade se a ação tiver prazo e alcance delimitados.

Texto transcrito do site do STM


segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Brasil gasta R$ 16,4 milhões por ano com aposentadoria de juízes condenados pelo CNJ

Aposentadoria por salário integral é a pena máxima para a punição de juízes que cometam crimes no exercício do cargo

Uso do cargo para beneficiar loja maçônica, vendas de sentenças, relações pessoais com traficantes e assédio sexual a servidoras de tribunais. É grande a lista de crimes cometidos por juízes e desembargadores em todo o país que levou o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) a determinar a aposentadoria compulsória de 48 magistrados desde 2008. A punição por aposentadoria compulsória custa aos cofres públicos anualmente R$ 16,4 milhões em pensões vitalícias e valores brutos, conforme levantamento inédito feito pelo UOL.


O montante gasto com os 48 magistrados condenados pelo CNJ daria para pagar com folga durante três anos os salários dos 11 ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Eles custam, juntos, cerca de R$ 5 milhões por ano entre vencimentos e impostos.  Em valores líquidos, após o desconto de impostos, a folha salarial dos ministros cai para R$ 3,2 milhões por ano. A remuneração dos magistrados punidos pelo CNJ fica em R$ 11,85 milhões anuais.


O valor médio recebido anualmente por juiz ou desembargador condenado com a aposentadoria compulsória varia de R$ 237 mil a R$ 329 mil, conforme a diferença entre vencimentos líquido e bruto. Os valores mensais foram multiplicados por 13 meses para chegar ao total anual, considerando o 13º salário. Os dados foram coletados pelo UOL nos sites de transparência dos tribunais brasileiros e, em alguns casos, em valores informados pelas assessorias de imprensa dos órgãos judiciários.


Duas resoluções do CNJ determinam total transparência na folha de pagamentos dos tribunais. Mas nem todos cumprem a determinação. Os Tribunais de Justiça da Paraíba e do Rio de Janeiro não disponibilizam os dados. A reportagem procurou as assessorias para acessar os números, mas não obteve resposta. Uma servidora que pediu para não ser identificada disse que foi “repreendida” por solicitar os dados internamente.


Para o ex-corregedor do CNJ Gilson Dipp, a dificuldade em ter acesso a informações que deveriam ser públicas ocorre porque “a Justiça não tem muita transparência”. O período de Dipp à frente da corregedoria nacional, entre os meses de setembro de 2008 e 2010, foi o de maior punição de magistrados. Ele participou de 18 afastamentos compulsórios, incluindo o do ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Paulo Medina por venda de sentenças para beneficiar empresários de bingos ilegais.


Dipp, que foi também ministro do STJ, considera o montante pago a magistrados afastados por atos ilícitos um “disparate” que contribui para reforçar na sociedade o sentimento de que a aposentadoria compulsória é um “prêmio” a corruptos.  Já o presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), João Ricardo Costa, defende a manutenção das aposentadorias. “Essa regra traz muito mais ganhos para a sociedade do que fatos isolados que nós temos no país”, diz.

A aposentadoria compulsória é a pena máxima prevista na Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), criada em 1979 e incorporada pela Constituição de 1988. É uma medida administrativa, sem efeito penal imediato, e o pagamento só pode ser suspenso caso o magistrado seja condenado pela Justiça comum.  Embora desde 2012 o STF tenha decidido que magistrados aposentados não têm direito a foro privilegiado, a condenação no CNJ não gera uma ação penal automaticamente. É preciso que o Ministério Público, um tribunal ou mesmo um cidadão acione a Justiça para investigar o magistrado fora do âmbito administrativo. No geral, os casos envolvendo juízes e desembargadores caem no esquecimento após sair do CNJ.


Costa avalia que a punição administrativa é importante para evitar que os magistrados fiquem à mercê de pressões políticas e econômicas locais, uma vez que as investigações começam nos tribunais espalhados pelo país antes de chegar ao CNJ. O dirigente da AMB cita um caso no Acre, onde um juiz endureceu nas decisões contra nepotismo e sofreu retaliações. “A punição administrativa é feita pela administração do tribunal, que pode ser pressionada pelo poder político local, pelo governo do Estado etc. Por isso tem toda uma justificativa para que o juiz não seja demitido pelo processo administrativo”, diz.


Dipp sugere uma revisão na legislação para suspender os pagamentos em casos mais graves, como a venda de sentença. O desejável é que não houvesse nenhum benefício [como a aposentadoria compulsória após comprovação de ilicitudes]. Isso é terrível, mas está previsto na lei. O Judiciário tem vantagens [financeiras] decorrentes de leis ou de decisões judiciais que não deveriam existir”, afirma.  O dirigente da AMB defende uma reforma no sistema recursal, que permite um número elevado ações para protelar decisões definitivas. “O problema todo é que temos um sistema processual em que os processos não terminam nunca, principalmente em situações que envolvem agentes políticos, grandes empresários e também a magistratura”, diz.


‘Bandidos de toga’

A venda de sentença é a principal causa de afastamento de magistrados pelo CNJ, que inclusive já condenou três vezes o mesmo desembargador pelo crime.

Autora da expressão “bandidos de toga” para se referir aos magistrados corruptos, a ex-corregedora do CNJ e ex-ministra do STJ Eliana Calmon diz que pouca coisa mudou desde quando fez a afirmação, quando comandava a apuração de infrações cometidas por magistrados entre 2010 e 2012. “A sociedade não perdoa juiz corrupto. É repugnante até para quem corrompe”, afirma.


Para Eliana Calmon, é preciso mudar a Lei Orgânica da Magistratura Nacional para haver mais rigor na punição de ilegalidades praticadas por juízes e desembargadores. “É necessário separar as maçãs podres para fortalecer o Judiciário com ainda mais credibilidade popular, como vem acontecendo depois da Lava Jato. Isso não exclui os juízes corruptos que se escondem, se protegem por detrás das garantias da magistratura. Este foi o sentido da frase que cunhei ao me referir aos bandidos de toga”, recomenda.


A revisão da Loman, contudo, ganhou os holofotes recentemente depois que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pediu ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para “agilizar” a votação da proposta de emenda constitucional (PEC 53/2011).  A emenda foi aprovada no Senado em 2013, prevendo a cassação dos vencimentos de magistrados condenados pelo CNJ ao criar a possibilidade de “demissão” no âmbito da magistratura.


O texto dormitava nos escaninhos da Câmara, mas ressurgiu com a eclosão da Operação Lava Jato. Renan defendeu a PEC como “uma medida fundamental de combate à corrupção e à impunidade” dos magistrados e para acabar com o “prêmio” representado pela “aposentadoria por juiz e membro do Ministério Público” que cometeram crimes. Dipp avalia que a iniciativa do Congresso fere a Constituição, uma vez que esta define o STF como órgão que deva sugerir um projeto de lei regulamentando uma nova Loman. Na madrugada do dia 30, deputados federais aprovaram o texto-base do pacote de medidas anticorrupção proposto pelo Ministério Público. Com os novos tópicos apresentados e a derrubada de outros tantos, o projeto ficou desfigurado e foi criticado por várias instâncias do Judiciário, como a Procuradoria-Geral da República e a presidente do STF. Ele prevê punição a magistrados por abuso de autoridade.


O Poder Judiciário não está nem além nem aquém de qualquer outro sacrifício que o povo brasileiro e as instituições venham a passar.  Mas o ex-corregedor do CNJ critica a demora do STF em propor a lei. Nas contas de Dipp, o Supremo discute o tema internamente há mais de 15 anos. “Acho que o Judiciário já deveria ter ditado a adequação da nova Loman, consentânea com os tempos atuais. A Loman atual é antiquada e de certa maneira é corporativista”, avalia.


Eliana Calmon também defende mudanças, ressaltando que há casos em que a aposentadoria compulsória é uma boa medida para servidores públicos em geral, inclusive no Judiciário. “É imprescindível que se façam correções na Loman”, diz. A ex-ministra do STJ sugere uma nova legislação que crie multas para infrações menores, exija o ressarcimento de dinheiro público desviado e suspenda o direito de magistrados voltarem por novo concurso. “Conheço juiz aposentado compulsoriamente por corrupção e que prestou novo concurso. Era juiz estadual e, após a punição administrativa, fez concurso para juiz federal. Se houvesse impedimento legal, ele não mais poderia fazer concurso, pelo menos para a magistratura”, conta.


Penduricalhos

A folha de pagamento com os compulsórios pode ser ainda maior se considerar gratificações e indenizações pagas pelos tribunais regionais. São os chamados “penduricalhos”. O Tribunal de Justiça do Amazonas pagou neste ano, por exemplo, de R$ 10 mil a R$ 18 mil a cada um de quatro juízes aposentados por decisão do CNJ. Os valores aparecem na folha de pagamento apenas como “vantagens pessoais”.

A situação permite a um ex-desembargador do TJ-AM ampliar substancialmente os seus vencimentos. O salário fixo dele é de R$ 30.471,11 por mês, mas, com o recebimento nos últimos meses de R$ 10 mil como “gratificação”, o ganho mensal sobe para R$ 38.261,05. Em maio deste ano, ele recebeu R$ 15,8 mil em gratificação, que, somados à parcela do 13º, fizeram sua renda líquida atingir R$ 46.404,63.

Em resposta, o TJ-AM disse “que o valor de R$ 15.788,49 corresponde à Parcela Autônoma de Equivalência, no montante de R$ 10 mil, paga em cumprimento à decisão judicial, assim como acontece em todos os tribunais do país, devida aos magistrados ativos e inativos; e o valor de R$ 5.788,49, concedido por decisão administrativa que corresponde a uma diferença de subsídio do ano de 2005 autorizada pela Lei 3.506/2010, de 17/05/2010, cujo término do pagamento se deu em junho de 2016″.

São esses penduricalhos nos salários que fazem o Judiciário pagar, em muitos casos, mais que o teto permitido pela Constituição, que é o vencimento bruto de ministro do STF: R$ 33.763. Dipp afirma que “tem certos benefícios que não podem ser recebidos pelos aposentados, mas vários tribunais estão pagando”. O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ-SC) reforçou, em agosto, por exemplo, o contracheque de um ex-desembargador com bonificação de R$ 11.516,34. Foi o repasse da Parcela Autônoma de Equivalência (PAE), concedido pelo órgão catarinense a seus magistrados para corrigir perda salarial com a URV (Unidade Real de Valor), adotada em 1994 para fazer a transição do cruzeiro para o real.

Ele foi afastado pelo CNJ em junho de 2014. Ele perdeu o cargo por não denunciar a exploração sexual de uma adolescente. A Polícia Federal identificou que ele sabia de relações de um amigo com uma garota de programa de 16 anos. O ex-magistrado catarinense recebe mais de R$ 22,5 mil líquidos como aposentadoria, mas custa mais de R$ 30,3 mil ao TJ-SC, entre vencimento e impostos. Ele recebe mensalmente outros R$ 300 como auxílio-saúde.

Em nota, o TJ-SC confirmou o benefício da “restituição de contribuição do Instituto de Previdência de Santa Catarina, cobrado de forma equivocada em relação aos magistrados, e naquele instante [agosto] recomposto ao patrimônio dos anteriormente prejudicados, em conformidade com a legislação vigente”. Para o ex-corregedor do CNJ, a crise econômica impõe mais rigor ao Judiciário com esse tipo de “penduricalho” e deveria partir do STF a revisão dos benefícios. “O ajuste fiscal [conduzido pelo governo federal], não importa quem seja o causador, deve corresponder a todo o serviço público.”

O presidente da AMB defende um enxugamento nos benefícios dos magistrados. Ele avalia que o ideal é uma combinação de salário mais o adicional por tempo de serviço, que englobaria o auxílio moradia pago hoje a magistrados da ativa. “O que queremos é uma política mais estável para a magistratura. O Congresso entende isso, mas não se direciona para criar essa estrutura legal”, diz João Ricardo Costa.