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sábado, 17 de setembro de 2022

Violações patrocinadas pelo Pretório Excelso - Revista Oeste

Cristyan Costa

Da ação de busca e apreensão na casa de empresários à desmonetização de canais conservadores, confira as leis e os artigos da Constituição que foram ignorados por ministros do STF 


Dispositivos violados:

  1. Artigo 102 da Constituição: Compete ao STF julgar infrações penais comuns, o presidente da República, o vice-presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República”;
  2. Artigo 129 da Constituição: “Compete ao MPF promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; e requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais”;
  3. Artigo 5° da Constituição: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”;
  4. Parágrafo II do artigo 282 do Código de Processo Penal: “As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público”.

O jurista Dircêo Torrecillas Ramos, membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas, lembra que compete ao Ministério Público Federal “apresentar denúncias, dar diligências e exercer o controle externo da atividade policial”, segundo determina o artigo 129 da Constituição. Isso não ocorreu.

“Avalio que houve excessos”, constatou o jurista Ives Gandra da Silva Martins, professor universitário e doutor em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Segundo ele, o conteúdo das mensagens avaliado por Moraes representa mera opinião política. “Empresários não dão golpe de Estado. Quem teria de fazer isso são as Forças Armadas. E as chances de os militares executarem um plano dessa magnitude é igual a três vezes zero.”

O jurista Adilson Dallari afirma que Moraes violou o artigo 5° da Carta Magna. “Ameaça tem de ser real, concreta, viável e suscetível de ser realizada”, observou. “Não se confunde com bravata, que não é crime. Além disso, não compete ao STF abrir inquérito dessa natureza.”

Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirma que o TSE tem de ser transparente. “Um ‘serviço secreto’ não se coaduna com o sistema democrático, sobretudo diante da postura de Moraes”, observou. “Há a violação do artigo 37 da Constituição, que trata da publicidade, da moralidade, da transparência e da legalidade. Existe um viés autoritário. A Justiça Eleitoral é ser transparente.”

Dispositivos violados:

  1. Inciso IV do artigo 5° da Constituição: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”;
  2. Inciso VIII do artigo 5° da Constituição: “Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”;
  3. Inciso IX do artigo 5° da Constituição: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

Na terça-feira 13, o TSE proibiu, por unanimidade, o presidente Jair Bolsonaro de usar imagens do 7 de Setembro em peças de propaganda eleitoral. O TSE determinou:

  • Que a Empresa Brasil de Comunicação retire vídeos do canal da TV Brasil no YouTube com trechos dos atos do presidente, sob pena de multa de R$ 10 mil, mas preservasse o material em arquivo até o fim do processo;
  • Que o presidente e o candidato a vice, Braga Netto, fossem intimados a, em 24 horas, parar de veicular qualquer material de propaganda eleitoral que tenha como base as imagens de Bolsonaro nos atos de 7 de Setembro em Brasília e no Rio, sob pena de multa de R$ 10 mil;
  • Que a campanha não produzisse novos conteúdos para a propaganda eleitoral com as ações realizadas no Bicentenário da Independência.

“A medida do TSE violou a liberdade de manifestação do presidente”, constatou Torrecillas. “Todos podem reunir-se pacificamente em locais abertos ao público. Bolsonaro soube dividir os atos em dois: o desfile do Dia da Independência e, depois, sem a faixa presidencial, discursou para apoiadores. Não precisaria proibir o presidente.”

Dallari lembrou que, como justificativa, se alegou que as festividades foram custeadas com recursos públicos. “Na verdade, recursos públicos custearam as despesas da cerimônia oficial de Brasília, onde o presidente compareceu usando a faixa presidencial”. observou. “Nas outras manifestações, custeadas por particulares e por fundos de campanha, o candidato compareceu nessa qualidade. No fundo, o ministro Benedito Gonçalves atendeu a um pedido de Lula, a quem deve sua designação para o STJ.”

Há Há duas semanas, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, determinou que o eleitor deve entregar o celular ou qualquer outro aparelho eletrônico antes de entrar na cabine de votação no dia da eleição para “garantir o sigilo do voto”. Além disso, detectores de metais poderão ser utilizados em situações excepcionais, avaliadas caso a caso pelo juiz eleitoral. Se o eleitor se recusar a entregar o aparelho, cometerá “crime eleitoral”. O juiz eleitoral será avisado e deverá chamar a Polícia Militar.

O inquérito infame já consumiu milhares de páginas, cujo conteúdo permanece em sigilo. Assim, os alvos do carrasco não sabem sequer do que são acusados

“Proibir portar o celular é uma decisão correta e que está prevista em lei, pois preserva o sigilo do voto”, disse Adilson Dallari. “Contudo, ameaçar alguém de prisão por isso é algo ridículo.” Torrecillas completa: “Não vejo motivos para se prender alguém por isso. No máximo, uma advertência.”

Por unanimidade, o TSE determinou a retirada da propaganda eleitoral em que a primeira-dama Michelle Bolsonaro aparece. O material é um vídeo que integra a campanha do presidente Jair Bolsonaro. De acordo com o TSE, a Lei Eleitoral prevê a participação de apoiadores nas peças publicitárias somente em 25% do tempo, o que estaria além no vídeo.

“Normas do TSE limitam o tempo de manifestação de apoiadores”, disse Dallari. “No caso, a alegação é a de que o tempo máximo teria sido ultrapassado. Obviamente, o correto seria cortar o excesso, e não proibir a propaganda inteira. O facciosismo é escandaloso.”

Dispositivos violados:

  1. Inciso VII do artigo 84 da Constituição: “O presidente da República tem de manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos”.

Em 30 de agosto, o TSE mandou a TV Brasil, o Google, o Facebook e o Instagram tirarem do ar vídeos da reunião do presidente Jair Bolsonaro com embaixadores, realizada em 18 de julho. Na ocasião, Bolsonaro criticou as urnas eletrônicas.

“Não há inconstitucionalidade por parte do presidente”, disse Dallari. “Nos termos do artigo 84, inciso VII, compete ao presidente da República manter relações com Estados estrangeiros e seus representantes. Inconstitucional foi a reunião do Fachin com os embaixadores.”

Dispositivos violados:

  1. Artigo 53 da Constituição: “Deputados e senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos, no exercício do mandato;
  2. Inciso XII do artigo 84 da Constituição: “Cabe privativamente ao presidente da República conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei”;
  3. Súmula IX do TSE: “A suspensão de direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos”.

Com base em julgamento do STF, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro cassou a candidatura do deputado federal Daniel Silveira ao Senado. O STF condenou o deputado a quase dez anos de cadeia por críticas contra os ministros da Corte. Silveira, contudo, recebeu um indulto presidencial, que extingue supostos crimes cometidos por ele.

Torrecillas afirma que o parlamentar pode ser candidato nas eleições deste ano por causa do indulto. “Se há um perdão, há a extinção da pena. Se há a extinção da pena, o deputado recupera os direitos políticos”, constatou o jurista. Mais: o artigo 55 da Constituição, parágrafo 2, estabelece que, mesmo que haja uma condenação com uma sentença que transitou em julgado (não cabendo recursos), quem decide sobre a perda do mandato é o Congresso Nacional.”

A deputada estadual Janaína Paschoal, jurista e uma das autoras do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, argumenta que a graça (indulto individual) tem impacto na condenação criminal, e não diretamente nas questões eleitorais. “No entanto, na medida em que a inelegibilidade decorreu da condenação, a meu ver, caindo a condenação, cai a restrição.”

Ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Ivan Sartori afirma que, quando há clemência do presidente da República, todos os efeitos da condenação, e a própria condenação, são perdoados. “Silveira se torna elegível”, observou. O desembargador Marcelo Buhatem, presidente da Associação Nacional dos Desembargadores, vai na mesma linha. O magistrado lembrou ainda que o ministro Moraes, relator do processo que condenou Silveira, reafirmou em outra ocasião que o indulto é um ato privativo do presidente da República e tem de ser respeitado, “goste-se ou não”.

Buhatem também lembrou o que estabelece a súmula número 9 do Tribunal Superior Eleitoral: “A suspensão de direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado cessa com o cumprimento ou a extinção da pena, independendo de reabilitação ou de prova de reparação dos danos.”

Dispositivos violados:

  1. Súmula vinculante 14 do STF: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”;
  2. Inciso LV do artigo 5° da Constituição: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Desde a abertura dos inquéritos inconstitucionais do STF, além de operações da Polícia Federal contra alvos dessas investigações, os advogados das partes não têm acesso aos autos do processo.

“A súmula 14 garante aos advogados dos investigados o acesso aos autos”, constatou Dallari. “Ninguém pode se defender sem saber do que está sendo acusado. A proibição de acesso aos autos viola o inciso LV do artigo 5 da Carta Magna, que garante o direito ao devido processo legal.”

Dispositivos violados:

  1. Artigo 5° da Constituição: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”;
  2. Artigo 53 da Constituição (no caso do deputado Daniel Silveira): “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. § 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal”.

O deputado Daniel Silveira, o jornalista Oswaldo Eustáquio e o ex-presidente do PTB Roberto Jefferson foram presos por críticas ao STF.

“Silveira não cometeu crime”, disse Dircêo. “Ele manifestou uma opinião. O deputado tem imunidade em razão do cargo que ocupa. Por isso, compete à Câmara dos Deputados decidir o que fazer.” Ainda segundo o jurista, caso o deputado tivesse sido enquadrado no artigo 286 do Código Penal, que prevê punição de três a seis meses por incitação à violência, Silveira poderia cumprir a pena em liberdade.

“Por que vai ser preso agora se, caso fosse condenado por causa disso, cumpriria a pena em liberdade?”, indagou o jurista. “O ministro Alexandre de Moraes tinha de ter comunicado à Casa para que ela decidisse sobre a prisão, se fosse o caso de prisão, porque não é”, acrescentou Torrecillas. “No artigo 53 da Constituição está escrito: deputados e senadores são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.”

Sobre Oswaldo Eustáquio, o jurista explicou que, “por ser jornalista e sem foro privilegiado, o processo precisava ser encaminhado à primeira instância”, afirmou. “Só no fim é que o STF seria provocado. Trata-se de um jornalista, um civil, que tem o direito à liberdade de expressão.” Torrecillas lembra que fake news, um dos argumentos usados contra Eustáquio, é um termo subjetivo e difícil de caracterizar. Portanto, frágil no proferimento de uma sentença.

No que diz respeito à prisão de Roberto Jefferson, Ives Gandra Martins classificou de “censura prévia”, que viola o artigo 5° da Constituição.

Dispositivos violados:

  1. Inciso IV do artigo 5° da Constituição: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”;
  2. Inciso XVI do artigo 5° da Constituição: “Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”;
  3. Artigo 220 da Constituição: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Sugerir a modernização da urna eletrônica e discorrer sobre possíveis efeitos colaterais das vacinas contra a covid-19, entre outros assuntos, se tornaram tabus. Agências de checagem e o consórcio de imprensa tacham reportagens de fake news. Em paralelo, o STF intimida pessoas e até manda prender quem se atreve a abordar esses temas.

“A atuação visando impedir ou dificultar a manifestação do pensamento viola o artigo 5°, inciso IV, e também o inciso XVI, que garante a liberdade de reunião, que pode ser física ou virtual”, disse Dallari. “Além disso, viola o Art. 220, que assegura a liberdade de informação e comunicação social.”

Dispositivos violados:

  1. Inciso IV do artigo 5° da Constituição: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”.

Em setembro do ano passado, o corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Luis Felipe Salomão, determinou que a rede social GETTR suspendesse repasses de recursos via monetização e de outros serviços a páginas alinhadas ao presidente Jair Bolsonaro.

Entre os alvos estavam os jornalistas Allan dos Santos e Oswaldo Eustáquio. De acordo com o TSE, eles publicaram ameaças à democracia brasileira e são investigados em inquérito que tramita no tribunal. Os valores já repassados aos perfis devem ser direcionados para uma conta judicial.

Alguns dias depois, foi a vez de Bárbara Destefani, do canal Te Atualizei, ser desmonetizada no YouTube. Até hoje, os alvos não tiveram acesso aos autos.

“A decisão do TSE restringiu o alcance da liberdade de expressão”, avaliou Torrecillas. “Há profissionais de imprensa que dependem da monetização para exercer o seu ofício. Os recursos recebidos por meio de vídeos sustentam a atividade dessas pessoas. O que houve, claramente, foi censura.”

Leia também “As pesquisas naufragam nas ruas”

Cristyan Costa, colunista - Revista Oeste


quarta-feira, 3 de junho de 2020

O que está por trás do debate do artigo 142 da Constituição - Míriam Leitão


O Globo

Uma parte da Constituição promulgada há 32 anos, de repente, se tornou polêmica.artigo 142 estabelece as funções das Forças Armadas (FFAA)Elas estão sob autoridade do presidente, e podem ser chamadas por qualquer um dos três poderes, para garantir a Lei e a Ordem. Mas o procurador-geral da República disse, no programa do Pedro Bial, que um poder que invade a competência de outro Poder, em tese, não há de merecer a proteção desse garante da Constituição. A repercussão foi negativa, e Augusto Aras voltou atrás para explicar que a Constituição não permite a intervenção militar.  

[Sugerimos que o artigo 142 da Consituição Federal, seja lido em conjunto com o artigo 15, da Lei Complementar 97. Com a leitura vão concluir que os Poderes Judiciário e Legislativo caso entendam necessário o uso das Forças Armadas em ações de GLO, devem requisitar ao comandante supremo das FF AA, o Presidente da República.]

A Constituição diz que as FFAA estão "sob a autoridade suprema do Presidente da República, destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem." A linha que Aras havia defendido é a mesma do presidente da República. O tema entrou em debate quando Jair Bolsonaro disse que estava com “as armas da democracia na mão”. Em seguida, ele chamou para uma transmissão com o jurista Ives Gandra, que tem uma interpretação minoritaríssima sobre o tema. Ele entende que o artigo 142 dá direito às FFAA de intervirem em alguma divergência entre dois poderes. Elas seriam o poder moderador. 

A maioria dos juristas brasileiros interpreta que é o STF que tira as dúvidas nos conflitos constitucionais. Há passagens da Constituição que indicam isso claramente.  O presidente e os ministros militares que o cercam acham que o STF está invadindo as prerrogativas e as competências do ExecutivoEles passaram a interpretar o artigo 142 como uma porta aberta na Constituição para que haja uma intervenção das FFAA, constitucional e decretada pelo presidente.  

Aras, nesse caso, voltou atrás. Mas ele tem tido um comportamento muito subordinado ao presidente da República. O procurador-geral chegou a defender que Bolsonaro fique sem máscaras porque não estaria infectado, como se fosse possível garantir isso. Aras também defendeu a reunião indefensável que teve com o presidente, um encontro que não foi gravado porque não teria pauta, disse o procurador-geral.  

As FFAA não são um poder supremíssimo, acima do Judiciário, do Executivo e do Legislativo. Essa discussão extemporânea sobre o artigo 142 reforça o que estava implícito nos movimentos do presidente. Bolsonaro tenta encontrar na Constituição uma justificativa para o que ele e seus filhos tentam fazer. Eles querem uma ruptura com a ordem democrática.  

Míriam Leitão, colunista - O Globo


domingo, 11 de março de 2018

LULA NA CADEIA 1: Petista pode separar a escova de dente: será preso em breve, ainda que, depois, venha a ser libertado

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já pode preparar a escova de dente. Será preso em breve. Cármen Lúcia, presidente do Supremo, cedeu à pressão do que pretendem ver o petista no xilindró e não pautou nem para o mês de abril as duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade que pedem que o tribunal reconheça a presunção de inocência até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória — COMO, DIGA-SE, ESTÁ NA CONSTITUIÇÃO — nem o habeas corpus preventivo impetrado pela defesa de Lula. O TRF-4 já emitiu sinais de que terá celeridade recorde também na resposta aos embargos de declaração, o que pode acontecer ainda neste mês de março. Aí virá a cadeia. Condenado pelo tribunal a 12 anos e um mês, começará a cumprir a pena em regime fechado. [também está na CF, artigo 86, parágrafo 4º, que o Presidente da República não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções;
mesmo assim a ilustre procuradora-geral da República e o ministro Edson Fachin autorizaram a reaberto da investigação - fingindo desconhecerem que quem investiga quer responsabilizar; 
O 'esquecimento' da chefe do 'parquet' e do ministro do STF, deu ensejo a que Temer, com a sutileza habitual, enviasse a doutora Raquel, parecer do jurista Ives Gandra, lembrando o mandamento constitucional obliterado no lapso de memória havido.
Consta também na CF que é da competência privativa do presidente da República nomear seus ministros.
Consta também, etc, etc, mandamentos constitucionais que são esquecidos ora pela PGR, outras vezes por ministros do STF.]
Ministros podem levar ao pleno, sem autorização prévia de Cármen, habeas corpus de outros condenados, o que forçaria uma rediscussão sobre a jurisprudência, mas, ainda assim, a eficácia seria duvidosa, uma vez que não se trata de ação de efeito vinculante. [uma, ou algumas, cabeças coroadas do Supremo estão tentadas a fazer o acima destacado em vermelho; só que também estão cientes que o povo não é tão estúpido que desvincule o ato ao interesse de livrar a cara do Lula e não ficará bem para a excelência - afinal vaias, apupos, xingamentos e outros constrangimentos em aviões de carreira atual como fatores dissuasórios desta suprema conduta.
Vale ter presente que Lula - apesar de alguns não concordarem com a sua condenação - foi condenado, só no processo do triplex, por NOVE juízes.]  A única chance de Lula não ser preso daqui a pouco estava mesmo na votação, antes da execução provisória da pena, do HC preventivo ou nas ADCs. E isso não vai acontecer.

Todos sabem que a divulgação com tanta antecedência da pauta do mês vindouro não é a regra no Supremo. Ao fazê-lo, Cármen Lúcia evidencia que não cede a pressões dos petistas. No momento, ela só cede a pressões do antipetistas. A coisa toda tem lá a sua ironia patética. Ela só está no tribunal porque, em 2006, quando presidente, Lula perguntou a Sepúlveda Pertence, então ministro do STF e hoje seu advogado, se ele tinha em mente o nome de alguma mulher para a função. E Sepúlveda se lembrou, então, de uma prima sua que havia sido procuradora-geral do Estado de Minas no governo Itamar Franco. O parentesco e a forma de indicação renderam à atual presidente do Supremo o apelido de “Prima Carminha”. O Brasil ficou sabendo, então, de sua existência a partir daquele ano.

Pressão para o STF votar e para não votar? Bem, não lido com esses critérios. Nem Prima Carminha deveria fazê-lo. O ministro Marco Aurélio, relator das ADCs, liberou-as para votação em dezembro. Em decisão recente, o ministro Edson Fachin, relator do habeas corpus preventivo de Lula, negou a liminar, mas remeteu o pedido para o pleno. Logo, se as matérias fossem pautadas, Cármen estaria apenas cumprindo a sua obrigação. Evitar a votação sob o pretexto de que não se deixa pressionar por um dos lados da contenda corresponde, aí sim, a ceder à pressão do outro lado. E, é claro, isso não depõe a favor da ministra.

Há uma outra óbvia má consciência embutida nessa resistência: houvesse a certeza de que o resultado seria contrário à pretensão de Lula, quem de vocês duvida de que a questão já teria sido pautada para este março? Até porque, nesse caso, não haveria polêmica nenhuma. E Cármen não precisaria temer por sua reputação. Ela só está evitando a votação porque há a suspeita  — certeza, ninguém tem — de que o tribunal possa, na apreciação das ADCs, reafirmar o que vai no Inciso LVII do Artigo 5º da Constituição: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

E por que Lula já pode preparar a escova de dente e o pijama (é permitido na cadeia? Não sei…)?  Ora, ainda que o TRF-4 não libere neste março os embargos de declaração, é certo que, de abril, não passará. Como a prima já deixou claro que não pautou a matéria, parece não haver saída para o petista.  Que se regozijem os que acharem que é bom para o Brasil e para o processo político que um ex-presidente que hoje seria eleito para um terceiro mandato vá para a cadeia quando há na corte suprema do país três ações que poderiam, ao menos, retardar essa prisão para depois do pleito. Porque também não tenho dúvida sobre uma outra questão: ainda que Lula venha a ser beneficiado pela, como vou chamar?, “revalidação” do princípio constitucional da presunção de inocência ou pelo habeas corpus, a minha dúvida é zero sobre a recusa do STJ em rever, em qualquer medida, a pena que lhe foi aplicada. Na verdade, as ações que estão no STF podem, quando muito, retardar a prisão. Isso não quer dizer, reitere-se, que foi condenado com provas —e me refiro apenas ao caso do tríplex de Guarujá. Todo advogado que já leu denúncia e sentença sabe que as provas não estão nos autos. Mas assim decidiu a Justiça. essa é a decisão da Justiça.

Blog do Reinaldo Azevedo

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sábado, 27 de janeiro de 2018

A candidatura de Lula ficou inviável - Ives Gandra da Silva Martins

O jurista Ives Gandra da Silva Martins, 82 anos, costuma surpreender por suas posições legalistas e políticas. No dia do julgamento do recurso de Lula no TRF-4, ele falou à ISTOÉ não apenas da importância da Lava Jato para o combate à corrupção no País, como também dos recentes atropelos constitucionais promovidos pelo Judiciário e pelo Ministério Público. Amigo dos principais ministros e procuradores, Gandra não receia em criticar – sempre polidamente – o espaço que o STF ocupa ao se intrometer em áreas que deveriam ser exclusivas do Executivo e do Legislativo. Ele acredita que o impedimento de Lula para a eleição irá provocar um efeito moderador, acalmando ânimos e esvaziando também a candidatura de Jair Bolsonaro, criando espaço para o surgimento de líderes regionais em busca de expressão nacional. Ives Gandra afirma ter lido a sentença do juiz Sérgio Moro que condenou Lula e afirma que seu advogado “vai ter um bocado de trabalho nos embargos de declaração”.

A candidatura de Lula está enterrada?
Se a condenação for mantida, não vejo como ele possa concorrer. O TSE é um tribunal jurídico político. Sua linha é não representar nada que violente o Direito e respeitar a vontade dos eleitores. Lembremos que a Lei da Ficha Limpa foi criada para evitar que as candidaturas cheguem ao TSE. Tenho a impressão que o TSE dificilmente concordaria em homologar sua candidatura. Os embargos irão se atear sobre a pena, mas não modificam a essência da pena. Outra parte, a condenação, fica como definitiva. A meu ver isso inviabilizaria o registro da candidatura.

A Lei da Ficha Limpa vai funcionar por inteiro?
Essa lei, na minha opinião de mero doutrinador do direito, não está de acordo com o Artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que diz: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. E se o réu ainda não é culpado, como é que não pode concorrer em uma eleição? Essa posição eu expus na ocasião [da criação da lei], mas fui superado. Há quatro anos isso não prevalece. Tanto que diversos políticos não puderam concorrer. Houve uma consolidação jurisprudencial que superou uma interpretação acadêmica que eu e Celso Bastos [jurista falecido em 2003] fizemos da Constituição. Hoje, a Lei da Ficha Limpa deve ser aplicada por inteiro tão logo sejam encerrados os embargos de declaração. Essa posição veio a ser confirmada pelo Supremo quando determinaram que a prisão em segunda instância é possível, desde que feita em colegiado, independente do trânsito em julgado. Mantenho minha posição acadêmica e pessoal, pois se trata de questão penal e não eleitoral. Mas não é a que vale no Brasil.

(...) 

Hoje há ativismo jurídico em excesso por parte do STF?
Esse é um grande problema. Na semana passada comentei que a ministra Cármen Lúcia impediu a posse de uma ministra [Cristiane Brasil] por ela ter perdido uma ação trabalhista. Não foi por uma ação penal. Esse ativismo é perigosíssimo, pois cria insegurança. Imagine qualquer diretor de empresa que tenha perdido uma ação para um funcionário não poder assumir um cargo no governo. A Constituição é clara nesses casos. A competência privativa [da nomeação] é do presidente e o Supremo não tem que intervir. O Supremo fez isso quando deu um rito para o Legislativo, contra o regimento interno, no processo do impeachment do Collor. Seria um rito rapidíssimo do Senado. O Supremo interveio e fez durar aquela enormidade, criando uma agonia imensa no País. Apesar de eu considerar os 11 ministros excepcionais – escrevi livros com nove deles –, sou de um tempo que ninguém do Supremo falava fora dos autos. Me sinto fora de moda, aos quase 83 anos, pois tenho visto os poderes invadirem a competência de outros. O Supremo faz isso em relação ao Executivo, com relação à nomeação de ministro, e ao Legislativo, quando decide sobre aborto ou sobre uma pena que deveria ser cumprida na segunda instância e não no trânsito em julgado. Lembro que todos os ministros que fizeram a história do Supremo até 2003, como Moreira Alves, Galloti, Cordeiro Guerra, Sydney Sanches, não invadiram competência de outros poderes. Depois veio essa nova geração. Mas essa é apenas a posição de um velho advogado e professor de Direito.


O que você achou da condenação baseada em “atos de ofício indeterminados”, conforme fez o juiz Sergio Moro?
Li a sentença do Sérgio Moro. Ele vincula elemento por elemento. No triplex, foi evidente que tudo que foi feito de mudança no imóvel era para o presidente Lula. Nenhuma construtora faz modificações em um apartamento, que fica diferente de todos os outros, sem cobrar absolutamente nada. Gosto do advogado do Lula. É competente, mas vai ter um bocado de trabalho nos embargos de declaração.

Íntegra da entrevista

 Ives Gandra da Silva Martins