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terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Em vez de atacar BC, Lula precisa começar a governar - Editorial - O Globo [a direção do Blogo mudou?]

A opinião do GLOBO

Na posse do economista Aloizio Mercadante no comando do BNDES, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a repetir suas diatribes contra o Banco Central (BC) e a taxa de juros. “Não existe justificativa nenhuma para que a taxa de juros esteja em 13,5% ao ano [na verdade, está em 13,75%]”, afirmou. “É uma vergonha esse aumento de juro.”  
Lula pode não saber, mas declarações como essa só contribuem para o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC precisar manter o juro nas alturas. E o desprezo que ele tem demonstrado por conceitos básicos da economia não ajuda. Os próprios ministros da área econômica estão incomodados. 
 
A incerteza diante da falta de regras fiscais confiáveis e os riscos de volta de um modelo econômico fracassado elevaram as expectativas inflacionárias pela oitava semana consecutiva (para 5,78%, segundo a pesquisa Focus, do BC)
Como o BC não controla o juro real, apenas estabelece a taxa nominal necessária para conter a inflação, não é acaso que ela tenha de ser tão alta. Em vez de reclamar dos juros ou de tentar repetir em seu governo o que já deu errado nas gestões anteriores do PT, Lula deveria fazer avançar a agenda voltada para o crescimento prometida na campanha eleitoral.
Deputados e senadores já foram empossados, e as lideranças do Congresso estão eleitas. 
As investigações sobre o 8 de Janeiro seguem seu curso. 
O Estado Democrático de Direito foi salvo, e as instituições permanecem atentas para evitar novos ataques. Para fortalecer a democracia, o melhor que o governo pode fazer agora é começar a governar.  
O projeto de reforma tributária e a proposta de um novo arcabouço fiscal, metas anunciadas tantas vezes, precisam se tornar realidade. 
Mas não só. O Brasil também tem demandas urgentes na infraestrutura e 
 
A reforma do caótico sistema de tributos brasileiro é prioritária. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem uma equipe competente [?; há dúvidas.] que deverá aproveitar em seu projeto as propostas já avançadas na Câmara e no Senado para unificar impostos e simplificar a legislação. Acertadamente, Haddad prometeu uma reforma neutra, que não aumentará a carga tributária. Mas haverá redistribuição de impostos entre setores
É essencial que o governo adote uma estratégia de comunicação capaz de explicar à opinião pública e ao Congresso que as eventuais perdas de regalias de determinados setores serão compensadas pelo avanço do país. Todos ganham quando aumenta o potencial de crescimento do PIB.

Concomitantemente, o governo precisa agir noutras frentes. O gargalo na infraestrutura limitará vendas externas de açúcar já neste ano. É urgente privatizar portos, garantir independência às agências reguladoras e melhorar o ambiente de negócios para atrair investidores em infraestrutura.

Por fim é crítica, como deixou clara a última ata do Copom, a recuperação da credibilidade das contas públicas, abalada pelas sucessivas rupturas do teto de gastos e pela falta de regras fiscais confiáveis. Não adianta repetir que será apresentado um novo “arcabouço fiscal”
Enquanto ninguém souber o que essas palavras significam na prática, a incerteza persistirá
Declarações desastradas de Lula tentando atribuir ao BC uma responsabilidade que é dele em nada contribuem para dissipá-la
Ao contrário. Está na hora de o PT mostrar que aprendeu com os erros do passado. E precisa começar a agir logo.

Editorial - O Globo


sábado, 11 de janeiro de 2020

Inflação baixa que pesa no bolso - Míriam Leitão

O Brasil viu em dezembro o que não vê há muito tempo, uma inflação de 1,15% em um mês, e a taxa do ano ficar acima do centro da meta. Não é um grande perigo, mas é bom ficar atento ao fato de que há menos de três meses, no dia 15 de outubro, a pesquisa Focus, que reflete o que pensa o mercado financeiro, previa que a inflação terminaria o ano em 3,26%. Além disso, o IGP-M ficou em 7,3% e reajusta aluguéis. O índice para a população de baixa renda terminou o ano em 4,48%. A primeira conclusão é que neste momento acabou o espaço para a queda da Selic.

O Copom pode até cortar de novo os juros de 4,5% para 4% ou 4,25%, mas se o fizer estará apenas seguindo o que a maioria do mercado prevê, ou o que é bom para estimular crescimento, que não é o principal mandato do Banco Central. Pelos limites do regime de metas, claramente, não há mais espaço. É hora de esperar para ver e não de praticar juros negativos.   Os economistas dizem que os juros reais devem ser calculados olhando para a frente, o “ex-ante”, e não olhando a inflação passada, que seria o “ex-post”. Mas a expectativa de mercado vale até o dia em que muda. Se há três meses os bancos não tinham colocado nas projeções a pressão dos preços da carne é porque suas lunetas andam avariadas. A crise no abastecimento chinês ficou clara durante todo o ano passado com o surto de febre suína que atingiu o rebanho daquele país. A demanda cresceu fortemente por toda a cadeia de proteína e era claro que quando chegasse a entressafra a conta bateria. Foi o que aconteceu. [não somos economistas, mas, maximizar o 'espirro' inflacionário de dezembro é torcer contra o Brasil;
nenhum mês do período Bolsonaro reunião tantos ingredientes favoráveis ao crescimento da inflação quanto dezembro/2019.
Citando alguns:
- inflação da carne que atingiu 18,06% em dezembro e em 2019 32,4%; ainda que as condições desfavoráveis que causaram essa ascensão permaneçam, impedindo uma queda compensatória, não causará novo impacto em janeiro/2020;
- milho aumentou 100%; e outros menores que somados, já viu.
Uma série de aumentos sazonais costumam ocorrer em janeiro e fevereiro que podem elevar o índice.
Mas, outros baixam, podendo produzir uma queda em janeiro e fevereiro, ainda que pequena,  o que  estabelecerá uma tendência de queda com perspectiva de se manter.
Não será desta vez que a turma do 'quanto pior, melhor',  vai ter o que aplaudir.
O que não deve ser feito é baixar mais os juros, o que será, aos olhos destes possuidores de notório saber econômico um duplo golpe. 
Qualquer queda nos juros aumentará a demanda - infelizmente, grande parte dos brasileiros não se preocupa com o valor total da dívida que contraem e sim se dão conta de pagar a prestação (nem tanto por serem bons pagadores e sim para contrair mais dívidas - o que não é motivo para condená-los, já que muitas vezes o endividamento é o único caminho para ter o mínimo do necessário = o que exige um aumento de renda, não por decreto, e sim pela volta do  crescimento da economia;
somos o país em que no governo do condenado petista - temporariamente em liberdade, no aguardo de confirmação de novas condenações -  comprava um carro em 100 meses, pagando triplo do valor à vista e 'esqueciam' que carro para durar oito anos, precisa de uma  boa manutenção, que custa dinheiro, assim como pneus, combustível, etc.

OUTRO MAL dos JUROS NEGATIVOS: induz a retirada pelos poupadores de pequeno cacife, mas que somados representam um grande impacto, dos recursos aplicados, especialmente na poupança e direcionados para o consumo, gerando maior demanda = sem produção = mais inflação.]

A inflação da carne foi de 18,06% em dezembro, mas no ano chegou a 32,4%. E, ainda que em janeiro tenha parado de subir, não deve cair muito ao longo do ano a ponto de reverter essa alta. A pressão da demanda chinesa continua. O milho teve aumento forte. A saca quase dobrou o preço, apesar da alta da produção no ano passado. Já para este ano a previsão do IBGE é de pequena queda da safra. É o alimento de aves e suínos, pressionando a cadeia da proteína.
A inflação de 4,3% num país que teve um biênio de forte recessão e que não cresce direito há três anos é preocupante. E ela tem núcleos muito pesados. Além da alimentação impactada pelas carnes, a inflação dos remédios, planos e tratamentos hospitalares está pesando muito. Ficou em 15% segundo o “Valor”, citando a consultoria Aon. Os planos de saúde subiram 8,24% no ano. Os aluguéis familiares e comerciais podem pesar com a alta do IGP. Material escolar pode subir 8%.

As tensões internacionais deste ano enterraram a visão otimista de que o começo do acordo entre China e Estados Unidos teria afastado os riscos externos. Na verdade, a tensão entre as duas potências sempre pode recomeçar. Mas o que não estava no radar apareceu com força, a nova escalada de tensão no Oriente Médio. É bem verdade que, como já disse aqui, o petróleo oscila e não dispara por causa da nova estrutura de produção e consumo. No entanto, uma alta, ainda que pequena, já impacta os combustíveis e os índices de preços. A energia deu uma folga em dezembro, mas o item está sempre pesando. Teve alta de 7,51% até novembro e caiu para 5% em 12 meses até dezembro porque a Aneel estabeleceu bandeira amarela nas contas de luz, apesar do sinal vermelho que vem dos reservatórios. O nível de água do Sudeste está em 20%, uma queda de oito pontos percentuais em relação ao mesmo período do ano passado, apesar de 2019 não ter havido seca e a economia não ter crescido a ponto de pressionar a demanda.
A economia continua fraca, o desemprego permanece alto, a pressão inflacionária tem grande chance de se dissipar, mas existem incertezas para serem acompanhadas. A queda de juros que realmente importa para as empresas e a população é a dos juros bancários. Eles caíram em várias linhas, mas mesmo assim seguem sendo altas demais. [o mais trágico é que os tomadores dos empréstimos bancários estão obrigados, por decreto, a pagar juros acima de 150% ao ano, enquanto que os investidores aplicam seu dinheiro em investimentos para os quais a taxa SELIC tem validade total: apenas 4,5%.]  A redução da taxa do cheque especial foi decretada pelo Banco Central após passar um inaceitável custo para todos os correntistas que têm limites não usados nas suas contas correntes. A Caixa, quando estabelece como meta uma taxa de 2% ao mês, [anual, por baixo, em torno de 25% ao mês = no mínimo 5 x o valor da Selic.]como fez em entrevista a este jornal, está fazendo um movimento populista ou constatando que os juros, mesmo dessa linha emergencial, ainda são abusivos. Reduzir mais um pouco a Selic não resolve qualquer problema real e pode ser visto como leniência com a inflação que acaba de dar um salto.

Míriam Leitão, jornalista - Coluna em O Globo

 
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Sinais de melhora. Mas é cedo para comemorar - O Estado de S.Paulo

Celso Ming

Espraia-se a sensação de que o País passa por uma recuperação econômica, depois de longa temporada de baixo-astral na economia

Há boas indicações que justificam esse estado de espírito. Um dos medidores da pulsação, o Monitor do PIB, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas, mostrou que, até setembro, o ritmo dos negócios em 12 meses aumentou 0,9%, graças ao “bom desempenho na agropecuária, indústria (exceto transformação) e serviços (exceto transportes e intermediação financeira)”.

O consumo das famílias avançou 1,9% no terceiro trimestre em comparação com o terceiro trimestre de 2018. As projeções do mercado, medidas pela Pesquisa Focus, do Banco Central, indicam avanço da renda de 0,92% em 2019. Há uma apreciável melhora no crédito, cujo estoque na rede bancária cresceu 5,8% em 12 meses (dados de setembro). Até mesmo os caminhoneiros, há alguns meses tão insatisfeitos com o comportamento de sua renda, mostram coniança com o aumento da procura por transporte de carga, meses antes do início das safras de grãos.

O agronegócio é o setor produtivo mais dinâmico. Deve entregar aumento de cerca de 1,8% nas safras de grãos, como atestam os últimos levantamentos da Conab. E, apesar do fiasco dos dois últimos leilões de áreas do pré-sal, o setor do petróleo aponta para forte aumento da produção em 2020, dos atuais 2,9 milhões de barris diários para alguma coisa em torno dos 3,7 milhões. São sinais gratificantes que ganham bom reforço com a queda consistente da inflação e dos juros, mas que ainda não garantem firmeza porque sobre ele ainda pesam fatores contra.

A indústria de transformação, por exemplo, continua endividada e patina no negativo, tanto porque a Argentina, importante parceiro comercial do Brasil, está mergulhada na crise, como porque a economia mundial vem sendo esgarçada pela guerra comercial. Como mostram os dados do Ibre, o investimento interno aumentou 2,5% em bases anuais do terceiro trimestre, em todos os seus segmentos, principalmente em máquinas (+3,7%) e construção (+1,3%). Mas continua de breque puxado pelas incertezas.

O mercado do trabalho emite certos sinais de melhora. Mas ainda há 25 milhões de brasileiros atolados no desemprego, no subemprego e no desalento, um passivo econômico que emperra o crescimento. [deve ser dado especial atenção a composição desse total de 25 milhões - ou qualquer outro número substituto - dado o risco da contagem dupla ou mesmo tripla.
O desalentado é antes de tudo um desempregado, quem está empregado não vai para a categoria de desalentado - por não estar encontrando emprego, situação que só se aplica ao desempregado.
Assim, o número total não pode ser superior ao de desempregados (atualmente, abaixo dos 13 milhões)  - se o cidadão passa à condição de desalentado continua antes de tudo um desempregado.]  É um universo que tolhe o aumento de renda, o consumo e, na ponta da corda, a produção.

Os prognósticos de quem põe a mão na massa são de que em 2020 o avanço do PIB será superior a 2,0%, como também indica a Pesquisa Focus. Mas é preciso cuidado. Os quatro últimos anos, inclusive este, começaram com promessas alvissareiras logo desidratadas porque a economia não entregou o prometido. E isso pode acontecer de novo. É que investimentos e avanço nos negócios exigem um mínimo de previsibilidade, artigo hoje escasso. A economia mundial evolui muito devagar. As tensões entre as maiores potências do mundo podem refluir em alguma coisa graças ao início da temporada eleitoral nos Estados Unidos, mas apontam mais para acirramento do que para solução dos conflitos.

É verdade que por aqui algumas reformas andaram, como a da Previdência, o que não deixa de ser um alento para as contas públicas no longo prazo. Mas outras, como a tributária e administrativa, estão emperradas por falta de coordenação ou por excesso de protagonismo. E há o esparramo produzido pelas incertezas da política. Sobram dúvidas sobre a sustentabilidade do governo Bolsonaro, que tem uma agenda confusa e não consegue definir prioridades. Por isso, um brinde e mais outro aos fatores que têm ajudado na recuperação. Mas cuidado com comemorações antecipadas.
 
Celso Ming, colunista - O Estado de S. Paulo
 
 

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Tempo de aperto e cuidado

O retorno da confiança do consumidor depende da ação organizada do governo


Com dinheiro curto, endividado e sem perspectiva de melhora em pouco tempo, o consumidor continua retraído e pode até diminuir suas compras nos próximos meses. Se isso ocorrer, a economia continuará travada e o crescimento seguirá em marcha lenta como nos últimos dois anos. O risco é tangível e confirmado por novos levantamentos sobre as condições e a disposição das famílias. Entre os empresários do comércio, as expectativas permanecem baixas, enquanto os indicadores de negócios decepcionam e as incertezas políticas se prolongam. O Índice de Intenção de Consumo das Famílias (ICF) voltou a cair em abril, segundo pesquisa mensal da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Com a queda de 1,9%, o indicador chegou a 96,2 pontos. Em março já tinha havido um recuo de 0,4% em relação ao mês anterior. Depois de abril de 2015, o ICF nunca ficou acima de 100 pontos, linha divisória entre os estados de insatisfação e satisfação.

Aumentos de preços, juros altos e alto endividamento são os principais fatores apontados em nota da CNC para explicar a piora de ânimo das famílias. Desde o começo do ano a renda mensal tem sido consumida mais velozmente do que vinha sendo até o fim de 2018.  A alta da chamada prévia da inflação, o IPCA-15, trouxe o retrato mais atualizado da aceleração dos preços, um dos piores pesadelos das famílias. Chegou a 0,72% em abril o aumento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15. Em março, a variação havia atingido 0,54%, num ritmo já preocupante. Com o avanço de abril, a alta acumulada chegou a 1,91% no ano e a 4,71% em 12 meses, acima, portanto, da meta anual de 4,25%. O IPCA-15 é apurado entre o meio de um mês e o meio do mês seguinte e é usado como sinalizador de tendência da inflação mensal. A pesquisa é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

A alta de preços deverá perder vigor nos próximos meses, dizem especialistas do mercado e do setor público, e assim a inflação convergirá até o fim do ano para a meta. Essa avaliação pode estar certa, mas o consumidor, sem modelos matemáticos para avaliar tendências, pode apenas sentir o impacto imediato da inflação em seu orçamento e em suas condições de vida. Isso pesa na formação de suas expectativas, assim como o conjunto dos fatos políticos e econômicos. Neste momento, quase nada, nesse conjunto, é muito animador.

O quadro é feio dentro e fora de casa. Fora, há o desemprego, os preços em alta e as confusões de Brasília. Dentro, há os vários fatores de aperto, incluído o endividamento. Este é um dos principais fatores de preocupação. A piora do quadro foi mostrada em pesquisa da Boa Vista SPC, sucessora do Serviço Central de Proteção ao Crédito. No segundo semestre de 2018, segundo a pesquisa, 70% dos entrevistados disseram ter mais de metade da renda comprometida com o pagamento de dívidas. No primeiro semestre, 56% haviam dado essa resposta. Além disso, 82%, parcela igual à do semestre anterior, afirmaram ter muita dificuldade para manter as contas em dia.

Sem surpresa, o Índice de Confiança do Comércio, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), ficou em 96,8 pontos em abril, abaixo do nível 100, fronteira do otimismo. Houve estabilidade na avaliação mensal, mas sem melhora da expectativa. O valor anotado em abril foi o menor desde outubro, quando o índice bateu em 94,4 pontos. O sinal de otimismo observado no início do ano já se extinguiu.
A piora das expectativas tem sido mostrada na pesquisa Focus, atualizada a cada semana pelo Banco Central. Na pesquisa de 18 de abril, divulgada na segunda-feira seguinte, a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019 chegou a 1,71%. Quatro semanas antes estava em 2% e já em queda. A redução das projeções ocorreu seguidamente a cada semana. Também na última pesquisa o crescimento estimado para a produção industrial chegou a 1,70%, bem abaixo da estimativa de 2,57% coletada um mês antes. O retorno da confiança depende da ação organizada do governo.


Editorial - O Estado de S. Paulo

sábado, 12 de janeiro de 2019

Uma âncora para o governo



Com a inflação bem comportada, o presidente Jair Bolsonaro poderá governar nos próximos meses sem se preocupar com os preços no varejo ou com o risco de aperto no crédito

Com inflação muito bem comportada, o presidente Jair Bolsonaro poderá governar nos próximos meses sem se preocupar com os preços no varejo ou com o risco de um aperto no crédito. Complicações de preços ou juros, se surgirem, virão provavelmente do exterior ou de algum tropeço mais sério da nova administração federal. Referência principal para a ação do governo, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,15% em dezembro, bem menos que um ano antes, quando o aumento chegou a 0,44%. A variação apurada no fim do ano foi a menor para um mês de dezembro desde a implantação do Plano Real, em 1994.

Com isso, em 2018 o indicador subiu 3,75%. O resultado ficou sensivelmente abaixo da meta oficial, fixada em 4,5% com tolerância de 1,5 ponto para cima ou para baixo.
Se nada excepcional ocorrer nas próximas semanas, o Banco Central (BC) poderá manter em 6,50% ao ano a taxa básica de juros. A próxima deliberação está programada para o dia 6 de fevereiro. Em vigor desde março do ano passado, essa taxa poderá vigorar ainda por muitos meses, segundo avaliação corrente no mercado financeiro. Quanto mais prolongada a calmaria na política monetária, melhor para a expansão dos negócios e para a criação de empregos. 

Se isso ocorrer, a gestão das contas públicas será favorecida em dois aspectos. Em primeiro lugar, haverá aumento da arrecadação de impostos, contribuições e taxas, com um reforço muito bem-vindo para os cofres da União. Em segundo, o governo poderá continuar rolando os juros da dívida federal com o menor custo registrado em muitos anos.  A inflação acumulada em 2018 ficou pouco acima da mediana das projeções do mercado. Essa mediana ficou em 3,69% na pesquisa Focus divulgada pelo BC na última segunda-feira. A pesquisa, atualizada semanalmente, envolve consultas a cerca de cem instituições financeiras e consultorias.

Neste ano, o IPCA deve subir 4,01%, se a mediana das últimas estimativas for confirmada pelos fatos. Nesse caso, mais uma vez a inflação ficará abaixo da meta, agora fixada em 4,25% com 1,5 ponto de tolerância para mais ou para menos. As expectativas para os dois anos seguintes continuam favoráveis, com taxas estimadas - medianas, nos dois casos - em 4% e 3,75%, exatamente nas metas determinadas para 2020 e 2021.   Segundo a mesma sondagem, o Brasil deve chegar ao fim do ano com juros básicos de 7%. Quatro semanas antes as projeções indicavam 7,50%. A redução da taxa básica esperada aponta confiança no controle da inflação, preocupação muito moderada com pressões externas e, acima de tudo, uma aposta firme na condução da política de ajustes e reformas. O governo tem reafirmado o compromisso com a arrumação de suas contas e, como parte da tarefa, com a implantação da reforma da Previdência. 

As condições políticas para execução dessa pauta são claramente mais favoráveis, pelo menos até agora, do que no governo do presidente Michel Temer, prejudicado por denúncias e por tentativas de impeachment. Apesar dessas dificuldades, o governo recém-encerrado ainda conseguiu, depois da aprovação da reforma trabalhista e da aprovação do teto constitucional de gastos, conter o déficit primário, isto é, o resultado fiscal sem os juros. A inflação contida é atribuível em primeiro lugar à boa condução da política monetária pelos dirigentes do BC. Mas esses dirigentes conseguiram ao mesmo tempo conter a inflação e baixar os juros de 14,25% para 6,50% graças a algumas condições favoráveis. 

A mais importante foi o claro empenho do governo em consertar as contas públicas, mesmo depois do agravamento das condições políticas. O mercado reconheceu esse compromisso e isso contribuiu para a manutenção de expectativas favoráveis em relação aos preços. No jargão da autoridade monetária, as expectativas quanto à inflação têm permanecido bem ancoradas. Essa ancoragem tem sido confirmada pelas projeções coletadas na pesquisa Focus. O novo governo mostrará competência, em primeiro lugar, se conseguir manter essa âncora.

Opinião - O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Apostas a favor do novo governo

Um maior dinamismo dependerá de ganhos de produtividade, um desafio adicional à competência da futura equipe econômica

As apostas a favor do novo governo continuam aumentando. Se os apostadores estiverem certos, o futuro presidente começará seu mandato com inflação e juros mais baixos que aqueles previstos até há poucos dias. Será uma bênção poder enfrentar o primeiro grande obstáculo, o desarranjo das contas públicas, sem ter de se preocupar com maiores pressões inflacionárias e com maiores encargos financeiros. A gestão das finanças federais também será facilitada, em 2019, se os investidores estrangeiros continuarem confiantes como nos últimos dois meses. A melhora do humor nos mercados foi perceptível desde a campanha eleitoral, quando ficou mais clara a desvantagem do PT e de seus aliados. Na semana passada, as novas expectativas foram expressadas mais nitidamente em projeções captadas no mercado pela pesquisa Focus, do Banco Central.

A redução dos juros previstos para 2019 foi enfim expressada em números na pesquisa fechada em 23 de novembro e divulgada nesta segunda. A mediana das projeções para a taxa básica de juros, a Selic, passou de 8% para 7,75% ao ano. A estimativa de 8% havia sido sustentada pelos economistas por 44 semanas, isto é, por cerca de 11 meses.  Diante da inflação moderada, economistas vieram consolidando há algum tempo a expectativa de uma política monetária suave ainda por alguns meses. O BC manteve em outubro, pela quinta vez, a taxa básica de 6,50%, menos de metade daquela em vigor há pouco mais de dois anos, de 14,25%. Além disso, a autoridade monetária acaba de afrouxar as normas do depósito compulsório dos bancos, abrindo espaço para a liberação de R$ 2,7 bilhões neste fim de ano.

A expectativa de manutenção dos 6,5% em dezembro, na última reunião prevista em 2018 para o Copom, o Comitê de Política Monetária do BC, já se havia formado há várias semanas. A novidade, agora, é a redução explícita da taxa básica esperada para o fim do próximo ano. Para os dois anos seguintes a mediana das projeções continuou em 8%.
O corte na taxa Selic estimada para 2019 acompanhou a evolução da alta de preços prevista para o período. Em quatro semanas caiu de 4,22% para 4% a variação estimada para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Esses números, como os demais, correspondem às medianas das projeções. No caso das instituições com cálculos atualizados nos cinco dias úteis anteriores à pesquisa, a queda em quatro semanas foi de 4,20% para 4,12%. Para 2020 as projeções foram mantidas em 4%. Para 2021, as estimativas bateram em 3,90%.

Nos próximos três anos, durante três quartos do novo período presidencial, a inflação continuará, portanto, compatível com as metas fixadas pelas autoridades, se as projeções estiverem corretas.  Estimativas para um período tão longo são arriscadas, mas os números da pesquisa Focus mostram, pelo menos, um cenário de pressões toleráveis. Manter a inflação em ritmo suportável dependerá do sucesso nos ajustes e reformas indispensáveis à recuperação das contas públicas. As expectativas do mercado valem por um voto de confiança na execução dessa política.

Confiança semelhante vem sendo exibida por estrangeiros compradores de títulos do Tesouro. Em outubro, investidores de fora do Brasil aumentaram sua participação na dívida mobiliária federal. Embora as condições de crédito tenham piorado para grande parte dos emergentes, o fluxo de dinheiro para o Brasil ficou mais favorável. A saída de recursos de não residentes vinha diminuindo nos últimos meses e tornou-se positiva em outubro, com ingresso líquido de cerca de R$ 9,9 bilhões. Em novembro o cenário continuou favorável, segundo o coordenador-geral de operações da Dívida Pública, Luís Felipe Vital.
Apesar das boas apostas em relação a preços, juros e finanças públicas, o mercado continua projetando crescimento econômico de apenas 2,50% ao ano entre 2019 e 2021. Ajustes serão indispensáveis, mas um maior dinamismo dependerá de ganhos de produtividade, um desafio adicional à competência do novo governo.

Editorial - O Estado de S. Paulo
 

terça-feira, 24 de julho de 2018

Escapando do pior, até aqui



Num país com as finanças oficiais em mau estado, qualquer notícia positiva sobre as contas do governo é bem-vinda

Podia ser pior. Com o otimismo possível, isso qualifica a folga recém-descoberta de R$ 14 bilhões nas finanças públicas. Ou sobre o início da recuperação da economia depois do desastre de maio. A folga, se confirmada, permitirá fechar 2018 com um buraco pouco menor que o previsto no começo do ano para as contas do setor público. Nesse caso, o déficit primário diminuirá dos R$ 161,3 bilhões fixados como limite para R$ 147,3 bilhões. Isso ainda estará longe de um resultado razoável. E o quadro completo será muito mais feio. Ao déficit primário ainda será preciso juntar os juros vencidos e rolados, porque nem um centavo sobrará para cobrir o custo da enorme e crescente dívida pública. Quanto aos sinais de recuperação da atividade a partir de junho, depois de encerrado o bloqueio de estradas, falta ver o conjunto. Alguns números devem ter melhorado, mas as previsões de crescimento em 2018 permanecem abaixo de 2%.

Qualquer notícia positiva sobre as contas de governo é bem-vinda, num país com as finanças oficiais em muito mau estado, com gastos obrigatórios crescentes e uma dívida oficial muito mais pesada que a de todos, ou quase todos, os demais emergentes. É compreensível o tom otimista da secretária executiva do Ministério da Fazenda, Ana Paula Vescovi, ao mencionar “uma percepção de resultado fiscal sob controle e riscos fiscais bastante baixos”. Mas só se pode falar de riscos bastante baixos em relação a este ano.
Com apertos e algum aumento de receita será possível, talvez com alguma folga, respeitar a meta de déficit primário e o teto de gastos. Não se poderá sequer aproveitar toda a folga para maiores gastos, por causa do teto constitucional, e essa restrição é particularmente vantajosa, para o País, num ano de eleição presidencial.

A rigor, usar a palavra “folga” é quase uma licença de linguagem, porque as contas públicas – e isso vale principalmente para as do governo central – continuarão com déficit primário por muitos anos, provavelmente até 2022 ou 2023, de acordo com as projeções correntes. O primeiro ano do próximo governo será especialmente desafiador. Por isso, qualquer imprudência do novo presidente poderá levar o País a uma crise de longa duração.

Um crescimento econômico mais acelerado poderá tornar pouco menos difícil o trabalho do novo governo. Com receita maior será mais fácil conter o déficit primário e tornar menos demorado o ajuste das contas públicas, se o presidente resistir à tentação da gastança ou às pressões para abrir o cofre. Dificilmente um populista seguirá esse caminho. Se agir, como seria previsível, com irresponsabilidade, poderá promover uma festa de curta duração e de custo catastrófico.

De toda forma, as perspectivas de aumento do Produto Interno Bruto (PIB), neste e nos próximos anos, são muito modestas. Mencionando sinais de melhora depois do desastre de maio, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Fábio Kanczuk, falou de uma recuperação em “V”, isto é, muito rápidaPode ter ocorrido uma forte retomada em alguns setores, mas os efeitos da paralisação do transporte rodoviário em maio podem ser mais prolongados do que se tem previsto. O impasse na entrega de insumos para agricultura é um indício de problemas persistentes. Economistas do próprio governo mostraram-se pouco otimistas ao divulgar, juntamente com a revisão bimestral das contas públicas, uma projeção de aumento do PIB de apenas 1,5% em 2018. Essa é a mesma estimativa do mercado, incluída na última pesquisa Focus do Banco Central

As projeções para os próximos anos são melhores, mas ficam em 2,50% anuais entre 2019 e 2021. Os 2,50% equivalem aproximadamente ao potencial de expansão estimado se o investimento produtivo continuar baixo e pouco se fizer para tornar o País mais produtivo. Esse número ainda embute algum otimismo: mesmo um desempenho medíocre só será possível com algum controle das contas públicas e da dívida. Um governo populista poderá produzir algo pior que esse quadro de mediocridade.

Editorial - O Estado de S. Paulo
 

terça-feira, 17 de julho de 2018

Com impacto da paralisação dos caminhoneiros, economia encolhe 3,34% em maio, aponta Banco Central

Expectativa de analistas era de queda de 3,45% 

Após expansão em abril, a economia brasileira teve recuo no mês de maio de 2018, segundo dados do Banco Central.  O IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central), espécie de sinalizador do Produto Interno Bruto (PIB), caiu 3,34% em maio, na comparação com o mês anterior, divulgou o Banco Central nesta segunda-feira (16).
A expectativa em pesquisa da Reuters era de uma queda de 3,45% para o mês, marcado pela paralisação dos caminhoneiros, conforme projeções de especialistas consultados.

Na comparação com maio de 2017, o IBC-Br recuou 2,90%, e no acumulado em 12 meses registrou alta de 1,13%, de acordo com o BC, nos dois casos em dados observados.  Os impactos da paralisação dos caminhoneiros já foram sentidos em diversos setores da atividade e ajudaram a derrubar ainda mais as previsões de crescimento do PIB neste ano, inclusive dentro do governo.

Em maio, a produção industrial despencou 10,9%, ritmo mais forte de contração em quase uma década e desde a crise financeira mundial, enquanto que as vendas no varejo tiveram a primeira contração no ano e o volume de serviços a maior queda em sete anos.
Pesquisa Focus do BC divulgada nesta segunda (16) mostrou que a projeção de crescimento do PIB em 2018 agora é de 1,5%, metade dos 3% indicados há alguns meses.

O Ministério da Fazenda, que também chegou a falar em crescimento de 3% neste ano, agora calcula expansão de 1,6%, mesmo cenário do Banco Central.  O IBC-Br incorpora projeções para a produção nos setores de serviços, indústria e agropecuária, bem como o impacto dos impostos sobre os produtos.

Folha de S. Paulo



 

terça-feira, 26 de julho de 2016

A hora mais escura

Espalha-se pelo mundo a desesperança e mais do que respostas definitivas, falta atitude de busca de saídas


O empresário Donald Trump foi sagrado na terça-feira passada, 19,candidato à presidência dos Estados Unidos pelo Partido Republicano. A maneira mais equivocada de enfrentá-lo é tratá-lo apenas como mais um xenófobo e mais um ultraprotecionista, sem antes identificar os problemas de fundo e sem antes procurar soluções adequadas para as mazelas que tomam o mundo.

Os países de economia avançada e, até certo ponto, também os emergentes passam por um momento complexo, em que as pessoas sentem que estão sendo espoliadas e alijadas do seu futuro. A renda vai sendo dilapidada, os direitos básicos assegurados por lei estão ameaçados por Estados quebrados e pelo crescimento de mais mãos e bocas sobre um bolo cada vez mais minguado.  As relações de trabalho estão mudando, por muitas razões: o salário vem perdendo participação na renda, o emprego migra para regiões em que a mão de obra aceita remuneração mais baixa, aumentam as restrições ao acesso à previdência social e ao seguro-desemprego. A população está envelhecendo, há uma nova “invasão dos bárbaros” na Europa, na medida em que contingentes cada vez maiores da população vêm sendo escorraçados de seus países de origem, por guerras fratricidas ou pela pobreza endêmica.

Mais que tudo, espalha-se a desesperança, a sensação de falta de futuro, à medida que se fecham as oportunidades. A educação e o treinamento que até recentemente qualificavam os recém-chegados ao mercado de trabalho agora já não servem. Os diplomas e certificados de conclusão de curso vão perdendo utilidade. Nada disso é novidade, mas o acesso rápido e mais fácil aos meios de comunicação cria consciência e espalha frustração.  Os problemas vão nessa linha. As soluções apresentadas por líderes do tipo Donald Trump, nos Estados Unidos, por Marine Le Pen, na França, e os escapismos à Brexit são evidentemente equivocados e contêm enorme potencial solapador dos valores democráticos e do equilíbrio geopolítico.

É claro que o crescimento econômico mundial precisa ser retomado para que o bolo aumente e a fatia de cada dia, também. Infelizmente, não há receita fácil para isso. As soluções keynesianas clássicas já não respondem. Os Tesouros nacionais estão esgotados e os grandes bancos centrais já expandiram o nível de moeda que tinham de expandir. E, no entanto, os resultados chegam a conta-gotas, ou simplesmente não chegam.  Trump pode não se eleger, mas subsistem os problemas que alimentam sua retórica. E, no entanto, falta iniciativa dos atuais dirigentes globais. Mais do que respostas definitivas, falta atitude de busca de saídas.

Às vezes, como agora, não há clareza sobre o que fazer. Impor saídas forçadas é outro risco. Também nesse caso, é preciso respeitar a hora mais escura da noite, que é a que precede o amanhecer, como aquela a que se referiu em 1941 o então primeiro-ministro da Inglaterra, Winston Churchill. Foi o momento da prostração. A França estava de joelhos, Londres estava sob bombardeio e os aliados permaneciam na defensiva. O raiar do dia não tardou a chegar, mas foi preciso esperar.

CONFIRA:

Foto: Infográficos Estadão 

Nos gráficos, a expectativa do mercado para a inflação (evolução do IPCA) e para a evolução do PIB neste ano.

Alinhamento de mentes
Por enquanto, o Banco Central vem conseguindo que os formadores de preços trabalhem com inflação mais baixa tanto para 2016 como para 2017. Em outras palavras, há hoje mais credibilidade na ação do Banco Central do que havia ainda durante o governo Dilma Rousseff. Em grande parte, isso se deve à percepção de que hoje o Banco Central atua com plena autonomia operacional.
 


Fonte: Celso Ming - Estadão