A opinião do GLOBO
Diatribes contra os juros em nada contribuem para resgatar a confiança necessária para que eles caiam
Na posse do economista Aloizio Mercadante no comando do BNDES, o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a repetir suas diatribes
contra o Banco Central (BC) e a taxa de juros. “Não existe justificativa
nenhuma para que a taxa de juros esteja em 13,5% ao ano [na verdade,
está em 13,75%]”, afirmou. “É uma vergonha esse aumento de juro.”
Lula
pode não saber, mas declarações como essa só contribuem para o Comitê de
Política Monetária (Copom) do BC precisar manter o juro nas alturas. E o
desprezo que ele tem demonstrado por conceitos básicos da economia não
ajuda. Os próprios ministros da área econômica estão incomodados.
A incerteza diante da falta de regras fiscais confiáveis e os riscos de
volta de um modelo econômico fracassado elevaram as expectativas
inflacionárias pela oitava semana consecutiva (para 5,78%, segundo a
pesquisa Focus, do BC).
Como o BC não controla o juro real, apenas
estabelece a taxa nominal necessária para conter a inflação, não é acaso
que ela tenha de ser tão alta. Em vez de reclamar dos juros ou de
tentar repetir em seu governo o que já deu errado nas gestões anteriores
do PT, Lula deveria fazer avançar a agenda voltada para o crescimento
prometida na campanha eleitoral.
Deputados e senadores já foram empossados, e as lideranças do Congresso
estão eleitas.
As investigações sobre o 8 de Janeiro seguem seu curso.
O
Estado Democrático de Direito foi salvo, e as instituições permanecem
atentas para evitar novos ataques. Para fortalecer a democracia, o
melhor que o governo pode fazer agora é começar a governar.
O projeto de
reforma tributária e a proposta de um novo arcabouço fiscal, metas
anunciadas tantas vezes, precisam se tornar realidade.
Mas não só. O
Brasil também tem demandas urgentes na infraestrutura e
A reforma do caótico sistema de tributos brasileiro é prioritária. O
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem uma equipe competente [?; há dúvidas.] que
deverá aproveitar em seu projeto as propostas já avançadas na Câmara e
no Senado para unificar impostos e simplificar a legislação.
Acertadamente, Haddad prometeu uma reforma neutra, que não aumentará a
carga tributária. Mas haverá redistribuição de impostos entre setores.
É
essencial que o governo adote uma estratégia de comunicação capaz de
explicar à opinião pública e ao Congresso que as eventuais perdas de
regalias de determinados setores serão compensadas pelo avanço do país.
Todos ganham quando aumenta o potencial de crescimento do PIB.
Concomitantemente, o governo precisa agir noutras frentes. O gargalo na infraestrutura limitará vendas externas de açúcar já neste ano. É urgente privatizar portos, garantir independência às agências reguladoras e melhorar o ambiente de negócios para atrair investidores em infraestrutura.
Por fim é crítica, como deixou clara a última ata do Copom, a
recuperação da credibilidade das contas públicas, abalada pelas
sucessivas rupturas do teto de gastos e pela falta de regras fiscais
confiáveis. Não adianta repetir que será apresentado um novo “arcabouço
fiscal”.
Enquanto ninguém souber o que essas palavras significam na
prática, a incerteza persistirá.
Declarações desastradas de Lula
tentando atribuir ao BC uma responsabilidade que é dele em nada
contribuem para dissipá-la.
Ao contrário. Está na hora de o PT mostrar
que aprendeu com os erros do passado. E precisa começar a agir logo.
Editorial - O Globo