Celso Ming
Espraia-se a sensação de que o País passa por uma recuperação econômica, depois de longa temporada de baixo-astral na economia
Há boas indicações que justificam esse estado de espírito. Um dos
medidores da pulsação, o Monitor do PIB, elaborado pelo Instituto
Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas, mostrou que,
até setembro, o ritmo dos negócios em 12 meses aumentou 0,9%, graças ao
“bom desempenho na agropecuária, indústria (exceto transformação) e
serviços (exceto transportes e intermediação financeira)”.
O consumo das famílias avançou 1,9% no terceiro trimestre em comparação
com o terceiro trimestre de 2018. As projeções do mercado, medidas pela
Pesquisa Focus, do Banco Central, indicam avanço da renda de 0,92% em
2019. Há uma apreciável melhora no crédito, cujo estoque na rede
bancária cresceu 5,8% em 12 meses (dados de setembro). Até mesmo os
caminhoneiros, há alguns meses tão insatisfeitos com o comportamento de
sua renda, mostram coniança com o aumento da procura por transporte de
carga, meses antes do início das safras de grãos.
O agronegócio é o setor produtivo mais dinâmico. Deve entregar aumento
de cerca de 1,8% nas safras de grãos, como atestam os últimos
levantamentos da Conab. E, apesar do fiasco dos dois últimos leilões de
áreas do pré-sal, o setor do petróleo aponta para forte aumento da
produção em 2020, dos atuais 2,9 milhões de barris diários para alguma
coisa em torno dos 3,7 milhões. São sinais gratificantes que ganham bom reforço com a queda consistente
da inflação e dos juros, mas que ainda não garantem firmeza porque sobre
ele ainda pesam fatores contra.
A indústria de transformação, por exemplo, continua endividada e patina
no negativo, tanto porque a Argentina, importante parceiro comercial do
Brasil, está mergulhada na crise, como porque a economia mundial vem
sendo esgarçada pela guerra comercial. Como mostram os dados do Ibre, o
investimento interno aumentou 2,5% em bases anuais do terceiro
trimestre, em todos os seus segmentos, principalmente em máquinas
(+3,7%) e construção (+1,3%). Mas continua de breque puxado pelas
incertezas.
O mercado do trabalho emite certos sinais de melhora. Mas ainda há 25
milhões de brasileiros atolados no desemprego, no subemprego e no
desalento, um passivo econômico que emperra o crescimento. [deve ser dado especial atenção a composição desse total de 25 milhões - ou qualquer outro número substituto - dado o risco da contagem dupla ou mesmo tripla.
O desalentado é antes de tudo um desempregado, quem está empregado não vai para a categoria de desalentado - por não estar encontrando emprego, situação que só se aplica ao desempregado.
Assim, o número total não pode ser superior ao de desempregados (atualmente, abaixo dos 13 milhões) - se o cidadão passa à condição de desalentado continua antes de tudo um desempregado.] É um universo
que tolhe o aumento de renda, o consumo e, na ponta da corda, a
produção.
Os prognósticos de quem põe a mão na massa são de que em 2020 o avanço
do PIB será superior a 2,0%, como também indica a Pesquisa Focus. Mas é
preciso cuidado. Os quatro últimos anos, inclusive este, começaram com
promessas alvissareiras logo desidratadas porque a economia não entregou
o prometido. E isso pode acontecer de novo. É que investimentos e avanço nos negócios exigem um mínimo de
previsibilidade, artigo hoje escasso. A economia mundial evolui muito
devagar. As tensões entre as maiores potências do mundo podem refluir em
alguma coisa graças ao início da temporada eleitoral nos Estados
Unidos, mas apontam mais para acirramento do que para solução dos
conflitos.
É verdade que por aqui algumas reformas andaram, como a da Previdência, o
que não deixa de ser um alento para as contas públicas no longo prazo.
Mas outras, como a tributária e administrativa, estão emperradas por
falta de coordenação ou por excesso de protagonismo. E há o esparramo produzido pelas incertezas da política. Sobram dúvidas
sobre a sustentabilidade do governo Bolsonaro, que tem uma agenda
confusa e não consegue definir prioridades. Por isso, um brinde e mais outro aos fatores que têm ajudado na recuperação. Mas cuidado com comemorações antecipadas.
Celso Ming, colunista - O Estado de S. Paulo
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