Em mais um discurso cheio de som e fúria, a presidente Dilma Rousseff
prometeu manter dois erros muito custosos da política do petróleo - a
exigência de conteúdo nacional nos insumos e equipamentos e a
participação da Petrobrás em todas as concessões. Os fãs da presidente
podem, portanto, ficar sossegados, pois assim ela parece demonstrar
coerência com o que prometeu na campanha pela reeleição. Dilma só
descumpriu promessas eleitorais, aceitando um programa de ajuste das
contas públicas, por incontornável necessidade. Mas nunca reconheceu a
péssima gestão financeira de seu governo e continua atribuindo os males
do Brasil a fatores externos. Com a mesma coerência perversa, insiste no
equívoco de sobrecarregar a Petrobrás, dificultando o cumprimento de
suas missões essenciais como empresa petrolífera e como instrumento da
política energética.
Para começar, a estatal nem tem respeitado os índices de nacionalização
impostos por lei, como admitiu seu novo presidente, Aldemir Bendine, em
depoimento no Senado no fim de abril. Membros da antiga diretoria já
haviam reconhecido esse fato, mas o governo jamais cuidou da questão com
pragmatismo. Os limites da capacidade técnica e operacional dos
fornecedores são só uma parte do problema. Também seria preciso dar
atenção aos custos, sempre importantes e ainda mais no caso de uma
empresa envolvida na complexa e caríssima exploração do pré-sal. Todo
gasto além do necessário pode atrapalhar o plano de investimentos na
verdadeira função estratégica da Petrobrás. A estatal foi convertida em instrumento da política industrial por
iniciativa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso beneficiou
alguns grupos empresariais, mas tem atrapalhado, claramente, a atividade
essencial de uma petroleira.
Essa política incluiu a preferência a estaleiros nacionais na compra de
navios-tanque e de sondas. Nunca se deveria esquecer a história do navio
João Cândido, batizado por Lula e Dilma em maio de 2010 e recolhido
imediatamente ao estaleiro, por incapacidade para navegar. O barco só
foi para o mar dois anos mais tarde, depois de reparos demorados e
custosos. A presidente Dilma Rousseff talvez tivesse na memória esse
episódio, quando se referiu, no discurso de quinta-feira, aos problemas
encontrados quando um país se dispõe a ser "pioneiro em uma indústria".
Mas seria uma bobagem enorme e grotesca falar do Brasil como pioneiro na
indústria naval, em 2010 ou agora. Foi temerário comprometer dinheiro
público na Sete Brasil, criada para produzir sondas, hoje atolada em
dívidas e incapaz de atender às encomendas.
Mas a mãe de todos os equívocos, no caso do conteúdo nacional, foi a
confusão entre os objetivos da Petrobrás, com uma complicadíssima agenda
de exploração, e as metas de uma política industrial. Foi um caso
exemplar de incompetência administrativa. Além de atrapalhar a
Petrobrás, também prejudicada pelo controle de preços, o governo foi
incapaz de abrir uma nova etapa de desenvolvimento industrial, como
prova a estagnação do setor, sem condições de competir e atolado em
crise.
Da mesma forma, nada pode justificar a obrigação da Petrobrás de
participar de todas as concessões. Não há dinheiro para isso. Esse dado é
amplamente conhecido, mas a presidente Dilma Rousseff ainda parece
desconhecê-lo. Sem se comprometer muito, o presidente Aldemir Bendine admitiu a
incapacidade da empresa de participar de licitações pelo menos neste
ano. Ele seria mais informativo se admitisse a incompatibilidade entre
essa obrigação, os interesses da estatal e os objetivos nacionais na
área energética. Com mais clareza, o ministro de Minas e Energia,
Eduardo Braga, indicou em depoimento no Senado, em abril, possíveis
mudanças na política de conteúdo nacional e no papel da Petrobrás como
operadora no pré-sal.
A presidente, no entanto, mais uma vez se mostrou impermeável ao bom
senso. Mas, pensando bem, ninguém deveria admirar-se. No mesmo discurso,
ela explicou por que a Petrobrás foi premiada em recente evento
internacional nos Estados Unidos: por "ter sido capaz de extrair
petróleo de uma profundidade extremamente elevada". Profundidade
elevada? Talvez no Lago Titicaca.
Fonte: O Estado de São Paulo - Editorial
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