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domingo, 15 de janeiro de 2017

A incoerência de Temer ao reajustar servidores

O governo que aprova no Congresso o teto constitucional dos gastos é o mesmo que se compromete, por lei, a aumentar as despesas; terá de fazer opções em breve

Período de algum relaxamento, as viradas de ano podem ser usadas por governantes para tomar decisões que gostariam que não fossem notadas. Desta vez, a contagem regressiva para a chegada de 2017 coincidiu com a Medida Provisória 765, um presente de reajustes para oito categorias do funcionalismo público e, além de outros atos, a criação de um bônus de produtividade e eficiência para auditores fiscais e analistas tributários da Receita, extensivos a auditores do Ministério do Trabalho.

Nem parecia um país que encerrava 2016 ainda com preocupantes déficits fiscais: na faixa de 9% do PIB, considerando-se as despesas com juros — três vezes mais o admitido na União Europeia —, e 3% sem elas, números a serem confirmados mais à frente. Pelo segundo ano consecutivo. Um contrassenso.

Ao se detalhar a MP, constatam-se altas irresponsabilidades. Há reajustes de até 53%; o bônus é retroativo, para abranger o mês de dezembro e, o pior, estende-se a aposentados e pensionistas. Um bônus de produtividade para quem não mais produz (!). Como o Congresso não aprovou os percentuais de aumentos, o Planalto editou a MP no lusco fusco de fim de ano.

Tudo é possível no alegre reino da fantasia do funcionalismo federal. Mas não no duro universo dos servidores estaduais, onde o poder público não pode contrair dívida para colocar em dia salários e benefícios. A União pode, e tem feito isso. Procurada pelo jornal “Valor"para dar explicações, a Receita tentou sair pela tangente e piorou a situação: disse que o mesmo acontece na AGU e na Procuradoria Geral da Fazenda, entre outros braços da burocracia. Isso significa que o absurdo — inativo e pensionistas premiados por eficiência e produtividade — drena dinheiro do contribuinte há algum tempo, privilégio que deverá se espalhar nas pautas de reivindicações das categorias dos servidores. Desde que assumiu como presidente interino, Temer tem contrariado, desta forma — dando aumentos salariais —, a austeridade que prega e cobra, com acerto, dos governadores. [não podemos olvidar que a maior parte dos Estados concedeu nos últimos anos generosos reajustes aos seus servidores, sempre acima da inflação - os servidores do Rio foram um dos grupos beneficiados - enquanto servidores federais amargaram vários anos  sem reajustes.
Apenas um exemplo: os servidores do Poder Judiciários para receber a migalha de aumento concedida por Temer, tiveram um reajuste devido desde 2003 e que só a partir de OUT/2015 foi reconhecido e o salário foi atualizado (ficando os doze anos de atrasados para ser recebido depois) cassado.
O reajuste era de 13%, foi cassado e passou a ser pago a primeira parcela do reajuste Temer - parcela inferior a 5%, assim será necessário o pagamento de 3 parcelas -  cada parcela com intervalo de 6 meses = 18 meses = para compensar os 13% retirados quando começou a ser paga a primeira parcela do reajuste de 41% dividido em oito parcelas semestrais.
Ninguém destaca isto no noticiário. Que os servidores do Poder Judiciário para receber pouco menos de 5% perderam 13% que já recebiam.]


Já passaram pelo Congresso, enviados pelo governo Temer, mais de dez projetos de reajustes salariais. Apenas esta MP representa uma despesa adicional de R$ 3,8 bilhões, este ano. Até 2019, R$ 11,2 bilhões. Há duas justificativas oficiais: os reajustes haviam sido acertados anteriormente, no governo Dilma, e existe dinheiro no Orçamento. Mas, na verdade, não há esta certeza, porque o mesmo governo que gasta em salários como se não houvesse amanhã aprovou no mesmo Congresso um teto constitucional para os gastos.

Parecem dois presidentes em um só: um gasta, o outro corta. Quem vencerá? O Planalto deve se preparar para decidir onde cortar, para atender ao crescimento dessas despesas com salários, bônus e aposentadorias. Depois da PEC do teto, o total das despesas não pode crescer mais, este ano, que os 6,29% da inflação de 2016. Vai chegar a hora de definir prioridades.
Fonte: Editorial - O Globo

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