Após
sair incólume do escândalo do mensalão, a ponto de reeleger-se em 2006,
Lula sentia-se à vontade para bravatas de que hoje certamente se
arrepende
“Se, em algum momento, um dos 204 milhões de
brasileiros chegasse ao presidente da República e dissesse ‘tem um
esquema de propina na Petrobrás’, seria mandada embora a diretoria
inteira da Petrobrás.” Essa declaração de Lula em seu depoimento ao juiz
Sergio Moro dá bem a medida do nível da hipocrisia que lhe é própria.
Na verdade, em 2009 o então presidente foi oficialmente informado, não
por “um dos 204 milhões de brasileiros”, mas pelo Tribunal de Contas da
União (TCU) e pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso, sobre
graves irregularidades, principalmente superfaturamento, em quatro obras
da Petrobrás. A Comissão Mista votou pela exclusão daqueles quatro
projetos do Orçamento da União até que se apurassem as irregularidades.
Lula vetou a decisão do Congresso. Três das quatro obras – Refinaria
Abreu e Lima, em Pernambuco, Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro
(Comperj) e Refinaria Presidente Vargas (Repar), no Paraná – acabaram se
tornando objetos de investigação e denúncias na Operação Lava Jato.
Como
recorda o jornal O Globo, as obras da Refinaria Abreu e Lima estavam
começando naquele ano e o TCU analisou apenas quatro dos contratos,
relativos a R$ 347 milhões de um total de R$ 2,77 bilhões já então
contratados, nos quais constatou superfaturamento de R$ 121,6 milhões.
Entre os responsáveis pelas licitações figuravam diretores e gerentes da
Petrobrás que viriam a se tornar protagonistas de denúncias de
corrupção pela Lava Jato: Renato Duque, já condenado a quase 41 anos de
prisão; Pedro Barusco, também condenado; e Paulo Roberto Costa, pioneiro
da delação premiada, condenado a 12 anos de cadeia. Os dois primeiros
trabalhavam na “captação de recursos” para o PT.
Em 2010, na
solenidade de batismo da plataforma P-57 da Petrobrás, em Angra dos
Reis, Lula discursou, em tom de campanha eleitoral: “Houve um tempo em
que a diretoria da Petrobrás achava que o Brasil pertencia à Petrobrás e
não a Petrobrás ao Brasil. (...) No nosso governo é uma caixa branca e
transparente, nem tão assim, mas é transparente. A gente sabe o que
acontece lá dentro e a gente decide muitas das coisas que ela vai
fazer”. Após sair incólume do escândalo do mensalão, a ponto de
reeleger-se em 2006, Lula sentia-se à vontade para bravatas de que hoje
certamente se arrepende, pois para se defender das suspeitas levantadas
pela Lava Jato agora jura de pés juntos que nunca soube nada sobre o
bilionário escândalo do petrolão.
Além de pura e simplesmente
mentir, Lula passou a adotar o argumento de que todos os depoimentos que
levantam suspeitas a seu respeito são, eles sim, mentirosos, porque
prestados por delatores capazes de qualquer vilania para reduzir suas
penas, no mais das vezes vítimas de pressão de investigadores
interessados em condená-lo. Lula só não transforma suas acusações em
libelo contra o próprio instituto da delação premiada porque tem todo o
interesse em explorar politicamente a transformação em réus também de
seus adversários políticos. Nesse caso, delatar pode.
Este espaço
tem sido frequentemente aberto à defesa da tese de que a Operação Lava
Jato presta relevante serviço à moralização das práticas de gestão
pública no País e que uma condição indispensável para que esse objetivo
seja plenamente alcançado é que as investigações se desenvolvam
rigorosamente dentro da lei, a salvo dos assomos messiânicos de um
discurso moralista tão enganado e enganoso quanto a impostura
político-eleitoral de dividir o País entre “nós” e “eles”. As delações
não têm sido feitas por “eles”, mas por antigos cúmplices que não as
fazem, obviamente, por arrependimento ou escrúpulos que nunca tiveram,
mas para terem suas punições amenizadas. A validade dessas delações fica
a critério daqueles a quem cabe julgar o peso das evidências e provas
apresentadas. É responsabilidade não apenas de um juiz, mas de todo o
aparato judiciário.
Acusar acusadores de mentirosos é vezo de quem julga os outros por si.
Fonte: Editorial - O Estado de S. Paulo
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