O fenômeno da apatia com a política tem traços paradoxais. Nos últimos dois anos, o brasileiro experimentou uma melhora da situação econômica e social do País, que foi em boa medida resultado da mudança do governo federal. O impeachment de Dilma Rousseff serviu de ocasião para retificar os rumos da política econômica, com efeitos diretos sobre a inflação, o emprego, os juros, o consumo. Ainda há muito a fazer, mas a situação do País hoje é incomparavelmente melhor do que há dois anos.
Há evidências empíricas, portanto, de que o modo como o País é governado tem consequências práticas sobre a população. Em tese, tal constatação deveria ser mais que suficiente para que o eleitor reconhecesse a importância da política e, portanto, das próximas eleições, para o seu futuro imediato. Do resultado das urnas dependerá a continuidade da reconstrução do País. A percepção sobre a importância das eleições é, no entanto, ainda muito frágil. Na prática, a ideia de que as eleições periódicas são fundamentais para o País convive, sem maiores conflitos, com um profundo alheamento da política. Em geral, não se nega o valor do voto, mas ele é visto como incapaz de mudar o País. Segundo esse raciocínio, o melhor seria não criar expectativas com as eleições. Ou seja, o cidadão não parece disposto a utilizar o voto como um poderoso instrumento de mudança.
Entre as causas da apatia, que conduz a graves distorções na representação, ressaltam o populismo praticado pelo PT ao longo das últimas décadas e a demagogia que se tornou método de quase todos os partidos. De certa forma, o eleitor tem razão para estar frustrado. Foi-lhe dito que não era preciso cuidar do equilíbrio fiscal, foi-lhe prometida a diminuição dos juros por simples ato de vontade da presidente da República, foi-lhe afirmado que o déficit da Previdência não era motivo para preocupação, assim como tantas outras barbaridades.
O lulopetismo prometeu ao brasileiro um futuro espetacular sem necessidade de esforço. A única condição para que o paraíso fosse definitivamente instalado na terra era manter o PT no poder. Como bem se sabe, não foi isso o que ocorreu. As lideranças petistas trouxeram de volta a inflação, o desemprego, o aumento dos juros. Em suma, o PT deu motivo para que a população desconfiasse do governo ─ qualquer governo ─ e descresse do País.
Para piorar, a crise econômica veio acompanhada de grandes escândalos de corrupção. Sob o discurso da preocupação social, tão repetido pelos petistas, havia uma enorme podridão moral, capaz de gerar casos como o do mensalão e o do petrolão. Os recursos públicos desviados ganharam proporções inéditas. Diante desse quadro, houve quem tenha vislumbrado a oportunidade para difundir a ideia de que todo o sistema político estaria podre. Com adeptos no Judiciário e no Ministério Público, essa causa disseminou ainda mais desconfiança em relação à política. Se, como afirmam, tudo está irremediavelmente podre, qualquer medida que venha da política estaria viciada pela raiz.
Essa atitude é profundamente antidemocrática, pois o trabalho de reconstrução do País caberia apenas a alguns poucos iluminados, que não receberam nenhum voto para isso.
O eleitor precisa resgatar o seu protagonismo, ressaltando toda a importância do voto para o futuro do País. Isso não significa que a simples ocorrência de eleições seja garantia inexorável de um futuro promissor. Significa que o voto é o instrumento democrático e legítimo para a mudança dos hábitos administrativos e dos costumes políticos que têm levado o País ao fundo do poço. Somente a consciência dos nefastos efeitos de escolhas irresponsáveis nas eleições pode levar o eleitor a uma conduta mais madura diante das urnas. Não se constrói um País sem a ativa participação política e o trabalho de seu povo.
O Estado de S. Paulo
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