Decisões do ex-presidente vão dos locais a
serem visitados até a postura em debates do candidato petista
Além de
ser presença constante nos programas do horário eleitoral gratuito e nos
discursos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dá as cartas na estratégia
da campanha de Fernando Haddad à Presidência da República. É de sua cela
na Superintendência da Polícia Federal do Paraná que o líder petista
orienta desde as regiões que o candidato deve priorizar em sua agenda até a
postura em relação aos adversários. Nos 37 dias em que ocupou o posto de vice,
Haddad visitou Lula seis vezes. De acordo com aliados, a ideia é que as visitas
continuem constantes. Hoje, ele estará com o padrinho pela primeira vez na
condição de presidenciável.
A grande
influência de Lula também pode ser medida pelo número de homens da sua
confiança na coordenação da campanha. Fazem parte do grupo os ex-dirigentes do
Instituto Lula Luiz Dulci e Paulo Okamotto, além do ex-chefe de gabinete da
Presidência Gilberto Carvalho. Por indicação de Lula, a coordenação executiva
cabe a Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras. Ao
assumir a cabeça da chapa, Haddad não mexeu nos homens ligados ao padrinho.
Apenas incorporou à equipe Emídio de Souza e indicou Chico Macena para o posto
de tesoureiro. Macena, que ocupou a mesma função na campanha de Haddad a
prefeito de São Paulo em 2012, ficará no lugar do ex-presidente do PT Ricardo
Berzoini, que continua na coordenação, mas pediu para não cuidar mais das
contas porque vive em Brasília enquanto a estrutura da campanha está em São
Paulo.
De acordo
com um aliado, Lula continuará a ser consultado sobre todos os assuntos
relevantes. E sempre que Haddad tiver uma dúvida sobre a condução da campanha,
deve ir ao padrinho.
Foi por
recomendação do ex-presidente que Haddad fez campanha de madrugada nas portas
de metalúrgicas do ABC no dia 5. Entre as orientações do guru, está a de deixar
empresários, mercado financeiro e federações de indústrias fora da agenda. — O
negócio é o povo, ir para a rua e abraçar gente. É isso que dá voto — repetia
Lula nos encontros com Haddad, segundo integrantes do partido.
Na última
terça-feira, Haddad passou mais de quatro horas reunido com Lula. Com mais
quatro advogados, o grupo escolheu e refinou a carta que foi lida no fim
daquele dia em frente ao prédio da PF. De uma fresta na janela, Lula ouvia tudo
de pé e em silêncio. O documento oficializou o ex-prefeito de São Paulo como
candidato. O
encontro foi o último de uma série entre Lula e seu substituto na corrida
presidencial para definir o tom e as principais linhas da curta campanha. Como
o tempo é escasso, o ex-presidente deixou de lado pequenas observações e focou
no comportamento do sucessor.
Lula
também definiu o candidato do PSDB ao Planalto, Geraldo Alckmin, histórico
antagonista do PT, como principal opositor de Haddad; disse que ele “precisa
colar o presidente Temer na testa de Alckmin” e mostrar que o tucano é o
herdeiro do atual governo. Aconselhou o ex-prefeito a não rivalizar com os
demais candidatos — Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro
(PSL). Outra recomendação: nos debates, olhar para a câmera e responder o que
bem entender, a despeito da pergunta. A mensagem que Haddad deve levar aos
eleitores foi repetida várias vezes por Lula nas reuniões: incluir o povo no
orçamento do país.
Foi
nesses encontros que Lula determinou o tempo para a troca na cabeça da chapa. — O Lula
acha que a transferência de votos será tranquila. Sempre foi o que mais
acreditou nisso — conta um aliado. Nas
conversas entre o ex-presidente e Haddad, Lula relembrou as dificuldades que o
PT teve quando o atual candidato ao Planalto foi prefeito de São Paulo. A
teimosia e o jeito de comandar sem dar ouvido aos principais quadros do partido
renderam a ele o apelido de “Dilma de calças”, referência a ex-presidente Dilma
Rousseff.
EXEMPLO
ARGENTINO
A
lulodependência faz com que surjam questionamentos sobre como seria a
participação de Lula num eventual governo Haddad. Gilberto Carvalho e o líder
do PT no Senado, Lindbergh Farias, já defenderam publicamente que o candidato
deixe claro que o ex-presidente terá uma participação direta, inclusive
colaborando com a escolha de ministros.
Ambos
chegaram a fazer comparações entre a situação de Haddad com a de Héctor
Cámpora, eleito presidente da Argentina em 1973 ao se apresentar como
representante de Juan Domingo Perón, que estava exilado no exterior. Ao tomar
posse, Cámpora anistiou políticos e renunciou para que Perón pudesse ser eleito
e voltar ao poder. Nenhum deles, porém, chegou a sugerir a renúncia de Haddad. As
declarações desagradaram o grupo de Haddad, que as consideraram inoportunas.
Gilberto e Lindbergh são próximos à presidente do PT, Gleisi Hoffmann, tida
como adversária interna do ex-prefeito de São Paulo.
Pessoas
próximas a Haddad avaliam que Lula seria importante em um eventual governo para
conter o próprio PT. Se eleito, o presidenciável está disposto a, por exemplo,
nomear um ministro da Fazenda que tenha respeito do mercado financeiro. A
definição desse perfil está alinhada com Lula, a quem caberia segurar críticas
de alas do partido favoráveis a um economista de linha desenvolvimentista.
O Globo
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