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quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Falta combinar com os eleitores

É prioritário buscar o equilíbrio das contas públicas, começando pela principal fonte de desequilíbrio, a Previdência

Há dois grandes obstáculos à expansão da economia brasileira. No macro, é o desajuste das contas públicas, com os déficits anuais e a dívida crescente. No micro, é o ambiente de negócios desfavorável à atividade das empresas. Dentro do primeiro, o maior problema está na previdência, pública e privada, que gera déficits e desigualdades. No segundo, o principal entrave está no sistema tributário. As empresas pagam impostos elevados e gastam muito tempo, energia e dinheiro para pagá-los corretamente.

Há provas. Hoje, de cada 100 reais que o governo federal gasta, 50 vão para pagamento de aposentadorias e pensões. Há sete anos, eram 32 reais, ou 32% da despesa geral. E o sistema previdenciário não arrecada o dinheiro necessário para o pagamento dos benefícios. Resultado: o governo gasta cada vez mais com aposentadorias (e, portanto, cada vez menos com todos os demais serviços e investimentos) e usa a receita de outros impostos para financiar as aposentadorias.  No lado micro, a prova cabal está no extraordinário estudo do Banco Mundial, Fazendo Negócios, cuja versão 2018 foi divulgada ontem. Trata-se de avaliar a facilidade (ou dificuldade) para fazer negócios honestamente.

O Brasil até que melhorou. No ano passado, entre 190 países, estava na posição 125º, ou seja, na parte baixa da tabela. Na última versão, subiu para 109º, tendo melhorado na maior parte dos quesitos, como mais facilidade para abrir empresas. Mas no item “Pagando impostos”, não houve qualquer avanço. O Brasil continua na posição 184ª. Considerando que os seis últimos são países sem relevância, pode-se dizer com todas as letras: o Brasil tem o pior sistema tributário do mundo. Mas o pior de tudo é que nada disso é novidade. Qualquer pessoa que lida com negócios sabe o inferno que é pagar impostos corretamente. Mais ainda, os temas, macro e micro, estão colocados há bastante tempo, de modo que as diversas soluções estão disponíveis.

Por exemplo, tem uma reforma da previdência prontinha para ser votada na Congresso. Não é a ideal, mas quebra um bom galho – garante uma economia de uns R$ 500 bilhões em dez anos. Está lá também um projeto de reforma tributária que simplifica bastante o sistema, reunindo vários impostos numa única guia.  Por que não se resolve?  Porque nos tem faltado um governo com clara maioria eleitoral e que tenha assumido essa agenda de reformas.

O governo Temer tentou boa parte dessa agenda e, de fato, avançou em pontos como o teto de gastos públicos e a reforma trabalhista. Mas faltaram votos e moral para continuar o serviço.  O futuro governo Bolsonaro tem os votos e promete colocar os corruptos à parte. Além disso, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, tem colocado uma agenda que faz inteiro sentido.  Primeiro de tudo, buscar o equilíbrio das contas públicas, começando pela principal fonte de desequilíbrio, o gasto previdenciário.

Tudo depende disso. Por exemplo: não adianta nada cortar todos os gastos se a previdência continua gerando déficits. Não adianta nada privatizar estatais e resgatar parte da dívida pública, o que permitiria reduzir juros, se a estrutura básica de gastos continuar gerando déficits. Seria matar uma dívida e começar outra.  Tem que ser tudo combinado. Por exemplo, começar o ajuste fiscal, com a reforma da previdência que está aí, e apoiar esse esforço com privatizações.  Tudo considerado, a agenda econômica do futuro governo está correta.

Porém, ah!, porém, essa agenda não foi claramente apresentada aos eleitores. Os milhões que votaram em Bolsonaro votaram pela reforma da previdência, essa que está no Congresso e que Paulo Guedes quer aprovada?  Ainda dá tempo. O presidente eleito tem a força das urnas. Mas ele precisa ir a público e dizer que tais e tais reformas são necessárias para a retomada do crescimento. Dizer claramente e convencer seus eleitores, e a sociedade, que esse é o caminho. Sem isso, não formará maioria no Congresso para votar as reformas. 

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

Coluna publicada em O Globo - Economia 1 de novembro de 2018

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