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domingo, 27 de outubro de 2019

Madame Natasha pede compostura verbal - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

Está faltando compostura verbal no país

A boa senhora recomenda que os bolsonaristas evitem a cloaca do idioma

Natasha acredita que todos podem continuar defendendo suas posições, mas não devem usar a cloaca do idioma para se expressar

Madame Natasha tem opiniões políticas e não as revela, até porque quase sempre estão erradas. Ela zela pelo idioma e pela compostura no seu uso. Natasha acompanhou a campanha eleitoral do ano passado e convenceu-se de que Jair Bolsonaro e seus seguidores apresentavam-se como paladinos da lei, da ordem, da moralidade e dos bons costumes. Neste mês de outubro, ela colecionou falas de alguns poderosos e assombrou-se com o que viu. Coisas que não se dizem numa casa de família e que nunca se ouviram na política brasileira. 

Quem puxou o desfile da incontinência foi o presidente. Falando a um grupo de garimpeiros, Bolsonaro disse que “o interesse na Amazônia não é no índio nem na porra da árvore, é no minério”. Dias depois, quando um cidadão perguntou-lhe onde estava seu amigo Fabrício Queiroz, o doutor respondeu: “Tá com tua mãe”. (É o caso de relembrar a conduta do general João Figueiredo em Florianópolis, em 1979. Quando ele ouviu o que não gostou, vindo de uma manifestação, partiu para cima dos estudantes aos gritos: “Eu gostaria de perguntar por que a minha mãe está em pauta. Vocês ofenderam minha mãe.” É a velha história: Não se deve botar mãe no meio.)

O delegado Waldir, líder do PSL na Câmara, deu a Bolsonaro o veneno da sua própria incontinência. Reagindo à iniciativa que pretendia tirá-lo do cargo, ele disse, durante uma reunião do partido: “Vou implodir o presidente. (...) Não tem conversa, eu implodo o presidente, cabô cara. Eu sou o cara mais fiel a esse vagabundo, cara. Eu votei nessa porra. (...) Eu andei no sol 246 cidades, no sol gritando o nome desse vagabundo.” (Dias depois, repetiu: “Ele me traiu. Então, é vagabundo”.
O deputado Felipe Francischini (PSL-PR) acrescentou: “Ele começou a fazer a putaria toda falando que todo mundo é corrupto. Daí ele agora quer tomar a liderança do partido que ele só fala mal?” [parece que o implodidor colocou o explosivo no local errado e foi ele o implodido.]

Dias depois começou uma briga de textos. A deputada Joice Hasselmann desentendeu-se com Eduardo Bolsonaro (“moleque”) e foi rebatida pela colega Carla Zambelli, que a chamou de Peppa: “Só agradeço a Deus por estar tirando o véu da sacanagem ao povo brasileiro e mostrando quem é quem”. 

Finalmente, o deputado Daniel Silveira, que gravou a fala do Delegado Waldir, defendeu-se: “Alerto sobre a tentativa de pedir cassação de mandato. Garanto que não estão acostumados com alguém como eu. Tenho muita coisa para f*** o parlamento inteiro. Eu vou bagunçar o coreto de todo mundo, vou sacudir o Brasil.”
(...)
Natasha acredita que todos eles podem continuar defendendo suas posições, mas não devem usar a cloaca do idioma para se expressar. Ela torce para que Daniel Silveira conte o que sabe e gostou muito da ameaça de Joice Hasselmann: “Não se esqueçam que eu sei quem vocês são e o que fizeram no verão passado”. Tomara que conte.

A senhora faz esse apelo porque zela pelo idioma, mas lembra o que ensinou o escritor mexicano Octavio Paz: “Quando uma situação se corrompe, a gangrena começa pela linguagem.” 


(....) 

Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e gostou do projeto do senador Marcelo Castro (MDB-PI) propondo que os usuários de energia solar ou eólica paguem royalties aos governos estaduais, pois a luz e o vento seriam bens da União”.

O cretino refletiu e acha que alguém deve propor a cobrança de um imposto aos desempregados. Afinal eles usam bens e serviços públicos sem pagar nada.
Eremildo lembra que o rei da Itália punha fiscais nas praias para impedir que mulheres roubassem água do mar, cuja salinidade é adequada para cozinhar o macarrão. 

Publicado Folha de S.Paulo e O Globo - Elio Gaspari, jornalista

 

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