Vinicius Mota
Segunda instância, o julgamento que nunca termina
Desapreço pela estabilidade das regras do jogo no STF sugere novas reviravoltas
Rosa Weber tornou-se o modelo a que todo magistrado deveria aspirar. Só
fala nos autos, respeita e aplica a jurisprudência assentada, mesmo
contra a sua convicção, e não alimenta guerras de vaidades no supremo
tribunal dos narcisos. Foi divertido ver quem a criticou por negar o habeas corpus do
ex-presidente Lula, em abril de 2018, agora soltar fogos pelo seu voto
nas ações diretas de constitucionalidade que pleiteiam o cumprimento da
pena de prisão só após o fim dos recursos.
Rosa foi exemplo de coerência no supremo tribunal dos inconstantes.
Disse em 2018 que aquela ação de habeas corpus não era própria para
rever a orientação de fundo do STF. li só cabia aplicar a jurisprudência vigente, que validava a prisão
após condenaçãoem segundo grau, sob pena de colocar em risco a
estabilidade e a credibilidade das orientações proferidas pelo próprio
Supremo para as instâncias inferiores.
Já nesta quinta (24), quando se questionava a constitucionalidade
abstrata de um dispositivo do Código de Processo Penal, então estava
dada a ocasião para reavaliar a jurisprudência ela mesma. Rosa Weber,
votando de acordo com seu entendimento da Carta, rechaçou a
possibilidade de execução da pena antes do chamado trânsito em julgado. Mas no Supremo há apenas uma Rosa preocupada de fato com a estabilização
das regras do jogo, e por isso a questão da segunda instância não há de
ser encerrada tão cedo.
Como Dias Toffoli achou normal pautar o tema pela sexta vez (!) desde
2009, seu sucessor na presidência a partir de setembro de 2020, Luiz
Fux, dificilmente hesitará em organizar a sétima votação. Logo depois,
em novembro, aposenta-se o ministro Celso de Mello, da ala “garantista”,
e o provável posicionamento de seu substituto será o oposto. Os adeptos da execução da pena após a segunda condenação terão o
controle da pauta, com Fux, e retomarão a maioria na corte. A suprema
metamorfose ambulante vai atacar novamente. Rosa nos acuda. [Em suma: a Suprema Corte decide conforme a conveniência do seu presidente.
Vale lembrar que nada garante que as supremas excelências nada decidirão este ano, especialmente sob a presidência do ministro Dias Toffoli.]
Vinicius Mota, colunista - Folha de S. Paulo
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