DISCURSOS DE BOLSONARO
O Brasil já teve um presidente que se sentia perseguido por “forças terríveis”. Agora é comandado por um ex-militar que vê perigos em toda parte. A retórica de Bolsonaro expõe uma personalidade viciada em confronto. No último dia 2, no Planalto, ele falou em “dar a vida pela pátria”. “Não nos esqueçamos que o inimigo está aí do lado, o inimigo não dorme”, advertiu. [alguns podem até se espantar quando um militar, ou mesmo um ex-militar, considera algo absolutamente normal dar a vida pela Pátria;
os militares estão ligados por juramento ao solene compromisso, diante da Bandeira Nacional, de dar a vida pela Pátria = compromisso que não se extingue quando, por qualquer razão, passa à condição de ex-militar (exceto se a razão for traição à Pátria);
aliás, este compromisso se estende a todos os brasileiros, ainda que nunca tenham sido militares - por enquanto, apenas os do sexo masculino - visto que é regra o reservista prestar solene juramento à Bandeira Nacional, assumindo o compromisso em comento.]
Em agosto, no QG do Exército, jurou “lealdade ao povo” e conclamou o povo a “marchar para o sucesso”. “Não nos faltam é inimigos como os de sempre, que teimam em ganhar a guerra de informação contra a verdade”, afirmou. Na ausência de guerras reais, o presidente se dedica a fabricar inimigos imaginários. No início do governo, a ameaça viria dos comunistas, que estão em extinção desde a queda do Muro de Berlim. Em seguida, foi a vez de estudantes, professores, artistas e jornalistas.
Com a onda de queimadas na Amazônia, entraram na mira cientistas e ambientalistas que alertam para os riscos de destruir a floresta. [fenômeno sazonal que ocorre este ano, correu nos anteriores e ocorrerá nos vindouros.] Depois a fúria se voltou contra líderes da centro-direita europeia, como Angela Merkel e Emmanuel Macron. [qual presidente de uma nação soberana não se sente ofendido e reage com firmeza e veemência, quando um presidente de um país, especialmente no caso do Macron com viés colonialista, sugere internacionalizar parte do território nacional?]
A pregação contra “inimigos internos” é usada por todo regime autoritário. Na ditadura brasileira, o conceito fazia parte da doutrina de segurança nacional. Servia para simular um ataque iminente e justificar a repressão feroz aos opositores. No caso de Bolsonaro, a estratégia se mistura a uma tendência à paranoia. Nos últimos tempos, o capitão passou a enxergar inimigos até nas próprias bases. Personagens como o cantor Lobão e o deputado Alexandre Frota, que o apoiaram com fervor, viraram desafetos do governo. Agora o alvo é o PSL, o partido do clã presidencial. Aliados que resistem à nova cruzada, como o senador Major Olímpio, estão prestes a entrar na lista dos proscritos.
Bernardo Mello Franco, jornalista - Blog em O Globo
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