O Estado de S.Paulo
Enquanto frisava que jamais acusara Bolsonaro de crime, Moro deu, sem histrionismo e adjetivos, todos os passos para as investigações. E dissimulou a bala de prata: a reunião de 22 de abril
A principal conclusão sobre a reunião ministerial de 22 de abril é de
que o ex-ministro Sérgio Moro tem o controle da situação e da narrativa
que pode levar à denúncia e a um processo de impeachment contra o
presidente Jair Bolsonaro. [apresentar 'comentários' sobre as mesmas acusações - vez ou outra muda uma ou outra, mas a falta de provas é a tônica - é tedioso.
Com brevidade: falta a Moro e ao seu rebanho conseguir 342 balas de prata para que prospere qualquer tentativa de impeachment.] Moro lapidou seu temperamento frio e
calculista ao longo de 22 anos de magistratura e na Lava Jato e não
mergulharia numa aventura. Ele tinha bala na agulha. Ou melhor, uma
bomba atômica. Ao comunicar sua demissão do Ministério da Justiça, Moro
falou da investida política de Bolsonaro na PF e, na mesma noite, expôs a
troca de mensagens em que o presidente reclama das investigações contra
dez ou doze deputados do PSL e diz: “mais um motivo para a troca (na
PF)”.
O golpe mais certeiro, porém, Moro reservou para o depoimento à PGR e à
PF, tratado erroneamente como tiro n’água por bolsonaristas. Na
realidade, ele foi estratégico e avassalador. Enquanto frisava que
jamais acusara Bolsonaro de crime (medida preventiva contra denunciação
caluniosa), [medida preventiva adotada após a PGR pedir sua investigação por denunciação caluniosa - para pedir investigação é necessário, no mínimo, indício da prática de ato que pode ter aquela tipificação.] Moro deu, sem histrionismo e adjetivos, como quem não quer
nada, todos os passos para as investigações. E dissimulou a bala de
prata: a reunião de 22 de abril.
Além de “confissão” e “prova material” da ingerência política de
Bolsonaro na PF por interesses pessoais, a reunião é demolidora. Não
como uma bomba, mas como várias que vão explodindo aos poucos, dia a
dia, com ironias contra a China, sugestão de prisão de ministros do
Supremo, governadores e prefeitos e todos ouvindo o presidente
admitindo, despudoradamente, intervir na PF e demitir o ministro da
Justiça para proteger a própria família. Moro sabia exatamente a bomba
que tinha nas mãos. Não sobra pedra sobre pedra.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo
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