O Estado de S. Paulo
Se depois desse tempo todo a população elegeu Jair Bolsonaro para a presidência da República, depois de ter usado o seu voto para escolher personagens como Jânio, Collor ou Dilma, a pergunta é: será que compensa?
Eleição
direta, por mais que seja chato dizer isso, é um método muito ruim para
se eleger o presidente da República. Não é uma questão de ponto de
vista. É o que resulta quando se examina a lista de presidentes que o
eleitor brasileiro vem elegendo desde 1960 – atualmente por maioria
absoluta, e através do voto livre, universal, direto e obrigatório de
todos os cidadãos que têm mais de 16 anos de idade.
Nesses 60 anos foram eleitos seis presidentes: Jânio Quadros, Fernando Collor, Fernando Henrique, Lula, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Que tal?
Nesses 60 anos foram eleitos seis presidentes: Jânio Quadros, Fernando Collor, Fernando Henrique, Lula, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Que tal?
Não
adianta olhar para o lado, porque você não vai encontrar outros; são
esses mesmos, e só esses. É o que temos, em matéria de voto popular para
presidente. Parece que 60 anos – sim, 60 anos – seria tempo suficiente
para o eleitor aprender alguma coisa, como, aliás, vivem dizendo os
altos mestres da nossa ciência política. (Democracia só se aprende com
muita prática e com muito tempo, repetem eles sempre que alguém lhes
pergunta.) Mas não está funcionando assim.
O grande problema de eleição é que quem tem mais voto ganha – e não há a mais remota garantia, ou talvez nem mesmo a probabilidade, de que os que têm mais votos sejam os melhores. O Brasil tem no momento cerca de 150 milhões de eleitores. Já não é simples, em qualquer circunstância, que uma tal quantidade de gente esteja objetivamente qualificada para escolher quem deve ocupar o cargo mais importante do País; é por isso, aliás, que a maioria das democracias bem sucedidas do mundo se organiza de outras maneiras para eleger os seus governantes.
Mas tudo fica muito mais complicado quando se considera que pelo menos a metade do eleitorado brasileiro não consegue entender um texto em português, nem as operações básicas da matemática ou os princípios elementares das ciências – noções mínimas para o exercício da cidadania. Mais: os analfabetos podem votar. Não podem exercer a função de lixeiro municipal. Mas podem escolher o presidente da República. Como esperar que as eleições tenham resultados diferentes dos que têm tido?
Para garantir o desastre, o voto no Brasil é obrigatório – uma aberração que transforma um direito em dever, e entrega a decisão eleitoral para milhões de pessoas que não estão interessadas “em política” e não sairiam de casa para votar se não fossem obrigadas a isso. O voto opcional levaria às urnas apenas os cidadãos efetivamente conscientes do que estão fazendo, seja qual for o seu nível cultural ou econômico; tornaria as eleições mais legítimas.
A possibilidade de que isso venha a ocorrer no Brasil é igual a três vezes zero. Tudo bem: se democracia é isso, na opinião de nove entre dez doutores que mandam em alguma coisa neste País, deixa assim. Só não dá para ficar reclamando, a cada eleição, que o presidente eleito é um horror e que “o país não aguenta”. Dos cinco presidentes que vieram antes de Bolsonaro, um renunciou e outros dois foram depostos – ou seja, 60% dos eleitos não vingaram.
Tem cabimento um negócio desses numa democracia que venera as “eleições diretas”? Tenta-se, agora, mais um impeachment, sob a acusação de prática do “fascismo”. Mas se há fascismo há 58 milhões de fascistas que fizeram a maioria absoluta do eleitorado e puseram esse presidente lá. [presidente que além de ter a oposição cerrada do Poder Legislativo, cujas ações são sempre apoiadas pelo Poder Judiciário, ainda teve a má sorte da ocorrência de uma pandemia - cujo combate foi atribuído aos estados e municípios, limitando as ações do Poder Executivo e o mais grave, deixando com este o ÔNUS de bancar as despesas daqueles entes federativos, quase sempre de caráter urgente, por consequência, sem licitação formal, com a agravante de falhas ocorridas são jogadas nas costas do Poder Executivo da União.]E aí? Não dá para trocar de povo. Nesse caso, a saída seria trocar de sistema.
J.R. Guzzo, jornalista - O Estado de S. Paulo
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