Ao custo de R$ 25 milhões por dia, essa invenção nacional trata de demandas que poderiam ser resolvidas na Justiça comum e escancara a ineficiência do Estado
Assim como a jabuticaba, o brigadeiro, o pão de queijo, a tomada de três pinos e o frescobol, a Justiça Eleitoral também é uma brasileirice.
Decisão da 1ª Instância da Justiça Federal autorizava a que o dinheiro dos dois fundos fosse usado no combate ao covid-19 - só que o senador Alcolumbre, presidente do Senado, recorreu e a decisão foi revertida.]
Histórico
Assim como a jabuticaba, o brigadeiro, o pão de queijo, a tomada de três pinos e o frescobol, a Justiça Eleitoral também é uma brasileirice. Na maioria dos países, pendências eleitorais são decididas pela Justiça comum. “O modelo brasileiro surgiu por causa das fraudes eleitorais rotineiras durante a República Velha, quando os pleitos eram organizados pelo Executivo federal e lideranças locais”, explica o procurador regional da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, que foi procurador eleitoral até setembro deste ano e acredita na eficácia do sistema brasileiro. “Naquela época havia, por exemplo, o ‘voto de cabresto’, quando os coronéis levavam os eleitores para votar em quem eles mandavam.” Vem daí a expressão “curral eleitoral”, já que o povo era conduzido como se fosse um rebanho.
“As atribuições da Justiça Eleitoral certamente poderiam estar sob a alçada da Justiça comum”, afirma o cientista político Rubens Figueiredo, da Universidade de São Paulo. Ele salienta que o Brasil gasta hoje quase 1,8% do PIB com o Sistema Judiciário, valor muito superior ao despendido pela Argentina (0,13%), Alemanha (0,37%) ou França (0,2%), países providos de bons juízes nessa especialidade.
Para Figueiredo, o fato de a legislação eleitoral brasileira ser complexa e mudar a cada ano, o que a torna de difícil assimilação, colabora para o que ele chamou de “barafunda jurídica”. “O Brasil já é um país extremamente judicializado”, observa. “Essa falta de clareza e de transparência das leis acaba entupindo a Justiça Eleitoral de processos. É preciso simplificar as leis e, principalmente, não modificá-las a cada dois anos. Antes, por exemplo, os brindes e showmícios eram permitidos. Hoje, não são. Uma hora se pode colocar cavaletes nas calçadas. No ano seguinte, está proibido. Parece que as leis são feitas para gerar demandas judiciais.”
Figueiredo também qualifica de “ficção científica” a prestação de contas obrigatória. “O candidato finge que gastou aquilo e a Justiça finge que acredita”, resumiu. “Nas eleições deste ano há mais de 550 mil candidatos. Alguém acha que vão conferir tudo?”
Como tem acontecido no Brasil, a confirmação de uma eleição muitas vezes é feita na Justiça. “Você tem o primeiro turno e o segundo nas urnas. E o terceiro agora acontece no Judiciário”, lamenta Figueiredo. “O custo para quem move uma ação é muito pequeno e, mesmo quando ela não faz o menor sentido, não acontece nada com quem a propôs.”
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Os 27 TREsApesar das diferentes dimensões regionais existentes entre os Estados, todos os TREs têm sete juízes. No Tribunal de São Paulo, os casos pendentes são 23 mil. Cada juiz, portanto, lida com 3 mil processos. Em contrapartida, no Acre, o lote de cada juiz não chega a 200.
Como constata J. R. Guzzo, colunista da Revista Oeste, se ter uma Justiça Eleitoral — e pagar bem por ela — fosse sinônimo de qualidade, o Brasil teria os melhores políticos do mundo. Não é o que se vê.
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