Análise Política
As votações da pauta econômica expuseram com nitidez o ambiente de
acomodação das forças políticas, com a notável exceção do ex-presidente
Jair Bolsonaro e seus seguidores mais incondicionais. Faz algum sentido,
pois são o único grupo e o único líder desprovidos de poder formal. Os
demais precisam cuidar de seus espaços conectados a obrigações
administrativas. A eleição passou, vida que segue, exigindo cuidado
especial dos políticos cuja reprodução de poder em 2026 dependerá de
mostrar serviço na vida dos governados.
Mas, se a acomodação geral era tendência já detectada, há outro sintoma
no ecossistema: o congelamento radical da “nova política”. Na
indiferença geral que hoje cerca as pautas antes capazes de desencadear
ondas de choque “éticas”, é igualmente notável a naturalização dos
mecanismos clássicos de arregimentação de votos no Congresso Nacional. A
maciça execução orçamentária e a antevisão de uma reforma ministerial
receberam dos mecanismos ditos formadores de opinião pública uma atenção
quase técnica.
É outro tempo, em que a inércia cultural vai reabsorvendo e digerindo o
que resta de elementos de ruptura herdados do passado recente.
Dificilmente haveria um ambiente mais confortável para os parlamentares,
que pouco tempo atrás, sempre é bom recordar, preferiam quando em
público retirar da roupa o broche funcional, com receio do tratamento
que poderiam receber do eleitor. Até por alguns terem de fato sofrido
ataques em aviões, restaurantes etc.
Como já previa a literatura, tudo que um dia foi sólido desmanchou no ar.
O que poderia desestabilizar a tendência inercial de o sistema derivar
para um equilíbrio estável? A aproximação das eleições gerais em 2026,
naturalmente, é o primeiro fator. Mas elas ainda estão muito longe,
faltam três anos para as convenções, e antes disso, já no próximo ano,
haverá eleições municipais. Período em que os parlamentares ficam ainda
mais sensíveis aos poderes atrativos do governo, em função das demandas
das bases por recursos capazes de trazer votos e apoios indispensáveis a
quem deseja ser competitivo.
Pois são essas bases que darão a palavra final em 2026 sobre quem vai
voltar e quem não vai voltar para a Câmara dos Deputados e para o Senado
Federal. E, se a taxa de descarte de parlamentares ficar em torno da
média histórica - e até no auge do prestígio da “nova política” ela
mudou pouco -, um em dois deputados federais não voltarão em 2027. Se
brigar de verdade com o governo federal nunca é a primeira escolha de
suas excelências, menos ainda na véspera de disputa municipal.
Não se engane o eleitor: em Brasília, bem dizia Ulysses Guimarães, até a raiva é combinada.
O segundo fator é a economia. O teatro parlamentar será capaz de
monopolizar a atenção complacente por um tempo, mas os três números a
acompanhar estrategicamente são os de sempre: inflação, crescimento e
emprego. A primeira está mergulhando, e fica para a política o bate-boca
sobre o mérito. No segundo, as previsões vão sendo ajustadas algo para
cima. Mas, para blindar-se de eventos desagradáveis nas pesquisas e no
Legislativo, o governo precisará mostrar serviço no terceiro índice.
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político
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