Deputados governistas e conservadores querem pôr freios no
que chamam de ativismo judicial do STF
Mesmo após a derrota da bancada conservadora e governista, a
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara voltará a discutir o projeto
de lei n.º 4754/16, que tipifica como crime de responsabilidade a usurpação de
competência do Poder Legislativo ou do Poder Executivo por ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF). O projeto é visto por parlamentares governistas e
demais conservadores da Câmara como um antídoto contra o ativismo judicial do
STF.
No último dia 5, a CCJ rejeitou o relatório do PL 4754/16,
da deputada Chris Tonietto (PSL-RJ), por 33 votos contrários e 32 favoráveis. O
relatório era favorável ao projeto. Agora, a CCJ vai votar o relatório do
deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), que defende a inconstitucionalidade da
matéria. A matéria chegou a se agendada para a sessão da última terça-feira
(11) da CCJ, mas a votação acabou sendo adiada. A expectativa é que o relatório
de Mattos seja votado em breve.
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Governistas e conservadores se articulam para derrubar o
parecer de Pompeo de Mattos e poder novamente votar um relatório favorável ao
projeto inicial, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ). Na segunda-feira (10), em entrevista à Gazeta do Povo, a
presidente da CCJ, Bia Kicis (PSL-DF), confirmou a de articulação da base do
governo para a derrubada do relatório de Mattos.
Como está a articulação para derrubar o parecer A articulação para
reverter a tendência de rejeição na CCJ
do projeto contra o ativismo do STF envolve vários deputados, inclusive o autor
da proposta — Sóstenes Cavalcante diz estar empenhado em conseguir os votos
necessários. Os governistas precisam reverter dois votos – ou seja, precisam
ter 34 votos para derrubar o parecer de Pompeo de Mattos. "Empate é sempre
pró-relator", explica Sóstenes, daí a necessidade de mais dois votos. O autor do projeto tenta garantir o voto do PTB na CCJ. O
representante do partido esteve ausente na sessão do dia 5. Ele também tentará
reverter outros dois votos de deputados tidos como "traidores".
Sóstenes não informa os nomes deles para não atrapalhar o trabalho de
convencimento.
Parte da estratégia para sair vencedor na nova votação
envolve conquistar uma das cinco vagas do PSD. O deputado Delegado Éder Mauro
(PSD-PA) já expressou o desejo de votar contra o parecer de Mattos. Dos cinco
votos da legenda, apenas um votou favoravelmente no dia 5, Stephanes Junior
(PSD-PR).
Por quais motivos o parecer a favor de conter o ativismo do
STF foi
derrotado
A base governista e conservadora da CCJ tenta evitar brigas
internas. Mas culpa o PTB pela rejeição do parecer favorável ao projeto
elaborado pela deputada Chris Tonietto. O presidente nacional do partido,
Roberto Jefferson, prometeu entregar o voto da legenda à pauta. Mas, na
votação, o deputado Wilson Santiago (PB) faltou à sessão. Quem conversou com Jefferson após a derrota diz que ele
ficou "extremamente irritado". O presidente do PTB destituiu Santiago
do comando do diretório do partido na Paraíba. Como mostrou anteriormente a
Gazeta do Povo, o partido vive um racha após a aproximação de Jefferson com
Bolsonaro.
Além de perder a presidência do PTB na Paraíba, Santiago
também foi removido da CCJ pelo partido. Foi substituído pelo deputado Marcelo
Moraes (PTB-RS). O suplente da sigla na comissão, Maurício Dziedrick (PTB-RS),
que também esteve ausente na sessão do dia 5, permanece. Os "problemas de comunicação" no PTB, como alguns
preferem classificar para evitar brigas entre governistas, não é o único motivo
apontado pela derrota. Alguns deputados da base ouvidos pela reportagem
disseram suspeitar de que ministros do STF tenham atuado para derrubar o
projeto.
Por que o parecer de Pompeo de Mattos preocupa governistas e
conservadores
A preocupação dos defensores de um freio no ativismo
judicial do STF quanto ao parecer do deputado Pompeo de Mattos vai além da mera
defesa da inconstitucionalidade do projeto original. Caso o relatório dele saia
vitorioso, Sóstenes Cavalcante explica que o PL 4754/16 será arquivado e um
novo projeto, ainda que nos mesmos moldes, poderia ser apreciado somente após
seis meses.
A Associação Brasileira de Juristas Conservadores (Abrajuc)
alerta que uma vitória do parecer de Mattos traria um impacto pior do que o
mero arquivamento do texto original. "O que o deputado pretende é que o
Legislativo brasileiro, ao acolher o seu relatório, reconheça que qualquer
tentativa futura de impedir a total liberdade e autonomia da Suprema Corte,
acima de qualquer lei e da própria Constituição, será sempre
inconstitucional", argumenta a associação.
O presidente da Abrajuc, João Daniel Silva, afirma que o
parecer de Mattos é inconstitucional e defende a rejeição dele. "Nenhum
Poder pode ser ilimitado. Estaríamos beirando ao totalitarismo", avalia.
Para ele, o Brasil já vive o pós-ativismo judicial, onde se contempla o início
de uma "juristocracia" e o relatório original viria exatamente no
sentido de combater tal ativismo judicial ao propor freios a ministros do STF. Em parte, a defesa de inconstitucionalidade apresentada por
Mattos é embasada na própria subjetividade da "usurpação de poderes"
por ministros da Suprema Corte para justificar impeachment de integrantes do STF.
Silva afirma que o PL 4754/16 apenas complementa o artigo 39
da Lei 1.079/50, que define os crimes de responsabilidade aos magistrados.
"A própria lei de responsabilidade em si é uma lei muito abstrata",
diz Silva. Esse é um dos motivos pelo qual ele entende que a própria
subjetividade de tornar a usurpação de poderes um crime de responsabilidade não
é inconstitucional. "Mesmo a lei sendo subjetiva, é para ambos os lados,
assim como o ministro [Ricardo] Lewandowski conseguiu com essa mesma lei, de
forma flagrantemente inconstitucional, fatiar o impeachment da [ex-presidente]
Dilma Rousseff e manter seus direitos políticos", diz Silva.
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O que alega Pompeo de Mattos em seu parecer sobre o ativismo do STF O parecer
de Pompeo de Mattos defende que não existe
usurpação de poderes pelo STF e que cabe à Suprema Corte se posicionar quando o
Congresso não o faz. "Ora, se nós, nesta Casa, não legislamos sobre
determinado tema e a sociedade se vê perante uma situação de direito e recorre
ao STF, cabe a este se manifestar", diz em seu relatório.
Para Mattos, o relatório original seria uma forma de
"amordaçar" o STF. O pedetista também questiona a subjetividade da
proposta. "Destaco que usurpar competência significa tomar para si,
apropria-se de; assumir, avocar competência e o projeto analisado não
esclarece, objetivamente, critérios que definam se o ministro do STF está
'usurpando' competência", diz.
A medida, segundo Mattos, traz "forte potencial para
limitar e inibir a independência judicial". "Não podemos estabelecer
uma medida genérica para punição, por crime de responsabilidade de ministros do
STF", afirma. "Além disso, a medida desrespeita a separação de
poderes, contendo vícios insanáveis de inconstitucionalidade." A Constituição, destaca Mattos, estabelece em seu artigo 2.º
que os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são "independentes e
harmônicos entre si" e que a separação de poderes é cláusula pétrea,
prevista no artigo 60, parágrafo 4.º, inciso III". "Assim, percebemos que o parecer favorável à criação de
um novo crime de responsabilidade para os ministros do Supremo Tribunal Federal
estava baseado na tomada decisões proferidas na omissão do Poder Legislativo.
Ou seja, o STF estava, nesses casos, atuando com todas as suas prerrogativas
constitucionais", diz Pompeo.[Esse deputado precisa ser contido - tanto quanto o ativismo judicial do STF; ele, o Pompeu, fala em separação de poderes e finge esquecer que quando o STF passa a legislar - à pretexto de suposta omissão do Poder Legislativo - invade a competência do Poder Legislativo, violando a Constituição Federal que estabelece em seu artigo 2.º
que os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são "independentes e
harmônicos entre si" e a separação de poderes é cláusula pétrea,
prevista no artigo 60, parágrafo 4.º, inciso III".]
República - Gazeta do Povo