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domingo, 3 de setembro de 2023

Psicologia - A reeducação de Jordan Peterson - Flavio Gordon

Vozes - Gazeta do Povo


O psicólogo e ex-professor da Universidade de Toronto Jordan Peterson.| Foto: Reprodução/YouTube

No texto A Crise na Educação, a filósofa Hannah Arendt diz que a base do totalitarismo é uma concepção pedagógica da política. Em suas palavras:  “A educação não pode desempenhar nenhum papel na política porque na política se lida sempre com pessoas já educadas. Aqueles que se propõem a educar adultos, o que realmente pretendem é agir como seus guardiões e afastá-los da atividade política. Como não é possível educar adultos, a palavra ‘educação’ tem uma ressonância perversa em política – há uma pretensão de educação quando, afinal, o propósito real é a coerção sem uso da força.”

Se, como diz a filósofa, não é possível educar adultos nesse sentido (o que significa infantilizá-los e tutelá-los), imagine então tentar educar logo um adulto como o psicanalista Jordan Peterson, um dos mais importantes intelectuais públicos da atualidade, cujos livros são best-sellers e cuja audiência nas redes sociais atinge a casa dos milhões de seguidores? 
Pois é exatamente o que o movimento woke canadense pretende fazer, imitando, no seu estilo cultural passivo-agressivo, os projetos stalinistas e maoístas de reeducação política dos opositores.

    O Canadá tornou-se um pesadelo woke, uma espécie de trem fantasma reunindo todas as aberrações político-ideológicas da esquerda mundial contemporânea

Tudo começou em janeiro deste ano, quando, após receber denúncias sobre o mau comportamento de Peterson nas redes sociais – que consistia basicamente em expressar opiniões não alinhadas às do establishment progressista mundial –, o Conselho de Psicólogos da Província de Ontário (CPO) exigiu do profissional que passasse por um programa de reeducação e treinamento de mídia a fim de não perder a sua licença e, consequentemente, a sua prerrogativa de clinicar. 
O documento do CPO acusava-o de “falta de profissionalismo em manifestações públicas nas redes sociais e durante participação num podcast [de Joe Rogan]”. Em vista disso, Peterson deveria aceitar submeter-se a “trabalhar com profissionais para rever, refletir sobre e corrigir a minha postura professional em manifestações públicas”. E também “completar o Programa de Coaching”, cuja regra era a de que “o coach pode, a seu critério, requisitar do educando a permanência mais ou menos duradoura no programa”, com base na avaliação de seu progresso educacional.
 
Os parâmetros oficiais também determinavam que Peterson deveria concordar que “se o coach fornecer qualquer informação desfavorável sobre a minha prática”, o comitê de reeducação política poderia abrir novas investigações sobre a sua conduta. O psicanalista deveria subscrever ainda a seguinte declaração: “Entendo que, caso o coach não apresente um relatório final atestando que as preocupações acima descritas foram remediadas a contento em vista do interesse público, não serei reconhecido como tendo completado o programa”. Em outras palavras, Peterson deveria submeter-se a um processo de reeducação – ademais, pago do próprio bolso – cuja duração seria determinada única e exclusivamente pela vontade dos educadores. 
Além disso, em sua comunicação com o CPO, ele foi orientado a buscar um advogado e concordar com todas as condições estabelecidas, sob pena de perda da licença. 
Em lugar de garantir a competência técnica do profissional, o que estaria em sua alçada, o comitê de psicologia woke buscava forçar a adesão a uma certa ortodoxia política, agindo como polícia do pensamento e fiscal da linguagem.

Em 4 de janeiro de 2023, Peterson publicou a peça totalitária em sua rede social, com o seguinte comentário: “Eis as demandas para a minha reeducação. Já anunciei formalmente a minha recusa em aquiescer”. No mesmo dia, publicou um artigo no jornal canadense National Post, prometendo “arriscar a sua licença para escapar da reeducação na mídia social”.

Mas quais foram os delitos tão gravas cometidos por Peterson, capazes não apenas de ameaçar a reputação da psicologia canadense, como prejudicar os seus clientes e o público geral? Simples
Como ele vem fazendo publicamente desde 2016 – quando despontou para a fama ao se posicionar contra o uso compulsório dos pronomes de gênero –, Peterson havia se posicionado contra a esquerda. 
Além de retuitar as opiniões do líder conservador Pierre Polievre contra o lockdown, criticara o primeiro-ministro Justin Trudeau e parte de sua equipe, além de se posicionar frequentemente contra a ideologia de gênero e, em especial, à banalização das terapias de “redesignação de gênero” para crianças e adolescentes. Note-se que nada disso tinha a ver com sua atuação clínica, mas com o seu posicionamento político e o seu exercício de cidadania.
 
Além de se manifestar em jornais, revistas e nas suas redes sociais, Jordan Peterson também entrou com um processo contra o CPO junto ao Tribunal de Divisão de Ontário. 
A decisão do recurso saiu no último dia 23 de agosto, e, posto que infame, não chega a ser surpreendente. 
O tribunal decidiu contra Peterson, concluindo que o CPO tem o direito de chantagear o psicanalista antiwoke e corrigir a sua visão de mundo subversiva. “O dr. Peterson não pode ter tudo ao mesmo tempo: não pode falar como membro de uma profissão regulamentada sem assumir a responsabilidade pelo risco de causar dano, algo inerente à sua condição” – decretou o juiz Paul Schabas, falando em nome da corte.
 
Como dissemos acima: não surpreende. Como bem descreveu o repórter Steven Edginton para o britânico The Telegraph, o Canadá tornou-se um pesadelo woke, uma espécie de trem fantasma reunindo todas as aberrações político-ideológicas da esquerda mundial contemporânea. 
No fim das contas, é mesmo isso que se espera de um país comandado pelo filho espiritual de Fidel Castro, o qual já admitiu “admirar em alto grau a China, porque a sua ditadura básica tem permitido aos chineses dar uma guinada em sua economia e dizer ‘precisamos ser mais sustentáveis’... ‘precisamos começar a investir em energia solar’”. 
O Canadá é resultado do vazamento laboratorial do vírus totalitário chinês.  
E, na condição de um irredutível guerreiro da liberdade, Jordan Peterson decerto não escaparia da mira dos liberticidas.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Flávio Gordon,
colunista -Gazeta do Povo  - VOZES

 

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Vocação para o engano - Guilherme Fiuza

Revista Oeste

Nenhuma embalagem é confiável. Confiáveis são os fatos

Da esquerda para a direita, os presidentes Fernando Collor de Mello, Lula, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro | Foto: Montagem Revista Oeste/Wikimedia Commons/Shutterstock
Da esquerda para a direita, os presidentes Fernando Collor de Mello, Lula, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro | Foto: Montagem Revista Oeste/Wikimedia Commons/Shutterstock

Collor, por exemplo. Era o caçador de marajás, representando uma espécie de “direita” moderna contra os vícios fisiológicos da velha política. No que assumiu já submeteu a população a um plano econômico com um nível de autoritarismo estatal que nem a “esquerda” arcaica tinha coragem de cogitar. Colocou uma espécie de czarina no comando das ações, transformando a tecnocracia atrapalhada de Zélia Cardoso de Mello numa lição histórica sobre o que acontece quando se confunde arrogância com perícia.

O confisco, ou embargo do acesso dos brasileiros às suas contas bancárias fora dos limites baixados pela czarina de Collor, foi um ato de fazer stalinista aplaudir de pé emocionado — contrariando diametralmente a embalagem do candidato “capitalista moderno”. O desastre de demagogia e prepotência desse governo aventureiro foi o maior combustível que o petismo e o lulismo receberam em toda a sua vida de farsa “contra os poderosos”.

A chegada de Itamar Franco ao Palácio do Planalto também foi a contradição de si mesma — no terreno das expectativas que a política cria. Por conta do naufrágio da aventura “direitista” moderninha (esses conceitos sempre ajudam as pistas falsas), Itamar virou uma espécie de esperança moralizadora nacional-progressista após o trauma do trem fantasma collorido — com PC Farias, Zélia, Pedro Collor, Rosane e grande elenco da modernidade arcaica feita de gel, petulância e gula.

Ninguém esperava mais nada sério vindo dali — e veio o Plano Real, a coisa mais séria feita no Brasil em décadas

Nesse astral de tirar a política dos porões da Casa da Dinda, Itamar entregou o comando da economia a um sujeito gente boa, simpatizante do Galo da Madrugada e da ecologia. De fato, simpatia é quase amor — o que não é pouco depois da carranca da Zélia. Mas daí a resolver o problema da hiperinflação vai uma certa distância. Para complicar um pouco mais, Collor tinha finalmente acertado com a nomeação de Marcílio Marques Moreira para a Economia — cuja gestão discreta e competente foi interrompida pelas boas intenções de Itamar. As aparências enganando de novo, dramaticamente, no sentido oposto.

Fernando Henrique foi nada menos que o quarto ministro da Fazenda de Itamar em pouco mais de seis meses. Ninguém esperava mais nada sério vindo dali — e veio o Plano Real, a coisa mais séria feita no Brasil em décadas. De novo a traição das expectativas: FHC era um intelectual perdido na política (segundo os estereótipos), um sujeito educado para explicar o fracasso com boas maneiras. O PT salivava e só esperava a hora de pegar a chave do Palácio. Esperou dez anos.

Hoje FHC representa a desonestidade intelectual na política, fazendo vista grossa para os crimes de Lula e envenenando a ação meritória de Paulo Guedes para surfar na caricatura antibolsonarista. Mas boa parte dos fundamentos que permitem avanços na política fiscal de Bolsonaro e Guedes foi plantada por FHC, numa gestão que não pode ser classificada como menos do que magistral — regendo uma equipe de excelência e inaugurando a transparência e a previsibilidade na condução macroeconômica.

As aparências enganaram com Collor (até no momento em que ele acertou), com Itamar, com FHC (antes e depois), com Bolsonaro (um nacionalista estatizante que deu sua guinada liberal) e também com Temer, que de vice da Dilma conduziu um período de saneamento da lambança petista. Assim como FHC, Temer fez o favor de também contrariar depois as boas expectativas, aderindo a conversas fiadas sobre “semipresidencialismo” e outros zumbidos golpistas.

Até Lula chegou a driblar as projeções (para o bem) ao assumir a Presidência, jogando fora todo seu discurso populista e adotando uma política macroeconômica responsável, em prosseguimento às reformas do Plano Real. Infelizmente isso durou pouco e ele preferiu voltar ao normal, fazendo a festa dos picaretas do bando. Ainda assim, contrariou as expectativas “socialistas” e preferiu o bom e velho capitalismo como local do crime.

Como se vê, nenhuma embalagem é confiável. Nem mesmo credenciais são plenamente confiáveis, tampouco seus portadores. Confiáveis são os fatos — se você não se importar de olhar para eles.

Leia também “Jantando a democracia”

Guilherme Fiuza, colunista - Revista Oeste


domingo, 24 de outubro de 2021

A imprensa doente - Revista Oeste

A “CPI da Covid” não está chegando realmente ao seu fim está acabando, isto sim, com as marcas mais deprimentes de uma agonia. Essa aberração, uma das mais alucinantes que o Congresso Nacional produziu em toda a sua história, já estava destruída por uma metástase terminal antes mesmo de começar
Foi armada para falsificar fatos, condenar inimigos políticos e fraudar as próximas eleições presidenciais, com uma tentativa grosseira de derrubar o presidente da República e evitar a sua candidatura em 2022; nunca teve, assim, a mínima intenção de apurar honestamente nenhum erro no combate à covid. Ao longo dos seis meses em que esteve viva, foi um trem fantasma que levou o país a patamares de baixeza nunca atingidos antes numa disputa política. Jamais apurou coisa nenhuma. 
 
Ocultou crimes. Comportou-se nos interrogatórios como uma delegacia policial de ditadura; ofendeu, perseguiu e pisoteou os direitos das testemunhas como cidadãos e como seres humanos. Mentiu a partir do primeiro dia, e não parou até o último. Entregou-se de corpo e alma ao falso testemunho e a provas que não convencem um aluno de curso primário. Não investigou coisa nenhuma só acusou, como se os interrogados fossem criminosos e já estivessem condenados antes de abrir a boca. Inventou, e jogou em cima do governo, crimes que não existem na lei brasileira. Não teve um único momento de luz. 
Era natural, nessas condições, que acabasse como acabou: num funeral de terceira categoria, com seus donos se comendo entre si e uma lista de acusações oficiais integralmente miserável na sua qualidade e na sua consistência.

Da política brasileira, em geral, pode se esperar tudo, e do Senado, em particular, não se deve esperar nada

Qual a surpresa? O relator da CPI, Renan Calheiros, é possivelmente o cidadão mais enrolado com o Código Penal Brasileiro que habita neste momento o Congresso Nacional — nove processos no lombo por corrupção estilo-livre, ou todos-os-estilos, fora 20 anos de frequência à seção policial mais pesada do noticiário político. O presidente é outra piada sinistra: vem do Amazonas, o Estado onde mais se roubou dinheiro público destinado ao combate da covid. (Num certo momento faltou oxigênio em Manaus, uma responsabilidade direta e elementar das autoridades locais; meteu-se a mão em tudo, por ali.) 

Ele mesmo, Omar Aziz, aliado direto da politicalha local, esteve envolvido até o talo em investigações de corrupção na área da saúde; sua própria mulher e irmãos chegaram a puxar cadeia fechada sob acusações de ladroagem no mesmo setor. Nenhum dos seus principais subordinados, com problemas que foram da inépcia à histeria, teve comportamento melhor. Nada mais natural, assim, que a CPI tenha acabado como está acabando — com acusações mútuas de jogo baixo entre os grupinhos que mandavam na operação, xingatório de mãe e falta de acordo, sequer, sobre a data de publicação do relatório. 
Pior: não se sabia até a última hora do que, exatamente, estavam acusando o governo. Nem isso, depois de seis meses inteiros sem pensar em outra coisa? Nem isso.
 
Da política brasileira, em geral, pode se esperar tudo, e do Senado, em particular, não se deve esperar nada — tudo normal, portanto, com o nível de qualidade infame da CPI. 
O que sobrou de mais chocante no caso, na verdade, foi o comportamento que a mídia considerada de elite, a começar pelo julgamento que ela faz de si própria, teve diante de todo esse desastre. A imprensa brasileira, a partir do primeiro minuto, renunciou à sua função profissional de levar ao público informações objetivas sobre os fatos ligados à investigação — e de fazer suas análises com um mínimo de lógica e respeito às realidades. 
Em vez disso, atirou-se a uma militância política aberta, agressiva e sem freios em favor do relator e do presidente da comissão, mais os seus ajudantes de ordem — como se, no seu conjunto, fosse uma espécie de jornal oficial dos donos da CPI e do condomínio de partidos políticos interessados na sua exploração. Foi assim que se viu, nos últimos seis meses, um espetáculo realmente notável: jornalistas empenhados em servir a Renan, a Omar e a todos os que se dedicam a usar a CPI como ferramenta para virar a mesa; agiram o tempo todo como polícia, delatores e assistentes de acusação. Continuam a agir assim.

O fato é que as duas figuras centrais da CPI, Renan e Omar, foram transformadas de abril para cá, por decisão da mídia, em dois dos mais notáveis patriotas que a República já produziu em seus 132 anos de existência. Como entender um negócio desses? Com outros personagens, quem sabe — mas com esses dois aí? Tudo bem: a imprensa brasileira sofre, já há anos, de uma síndrome que não tem cura — o ódio a Jair Bolsonaro, que é tratado como se fosse o ser humano mais calamitoso que já apareceu neste mundo desde o nascimento de Caim. É irracional, envolve questões de descompensação psíquica e, mais do que tudo, produz um subjornalismo de teor cada vez mais baixo — mas o que se vai fazer? A vida das paixões leva mesmo a esses territórios escuros, e o público já se acostumou à mídia que tem. O extraordinário, no caso, é o apagão geral da imprensa quanto aos dois gestores da CPI — uma espécie de “queda no sistema” que responde pela estabilidade básica da atividade mental das pessoas. Como é possível alguém ser jornalista profissional e, ao mesmo tempo, ser capaz de passar seis meses inteiros de CPI sem dizer, uma única vez, quem são — do ponto de vista penal — o seu relator e o seu presidente? Aí já é mais do que militância política; é desvario.

Tão surrealista quanto os crimes de cloroquina e de genocídio é o crime de falta de planejamento, uma das joias da coroa entre as denúncias

Se a mídia brasileira não conseguiu ou não quis conseguir — dizer para os seus leitores, ouvintes e telespectadores quem são os homens a quem entregou as suas manchetes e o seu horário nobre durante os últimos 180 dias, é natural, também, que tenha fornecido uma certidão oficial de acusação séria, legal e técnica a cada um dos delírios produzidos pela CPI. Todo tipo de ilegalidade, ou de simples estupidez, cometido pelos acusadores foi aceito sem um mínimo de olhar crítico — ou a mera verificação dos fatos — por parte da mídia. Testemunhas foram humilhadas na frente dos jornalistas sem se ouvir um pio. Insultos grosseiros foram tratados como perguntas legítimas. Publicou-se com a maior seriedade do mundo que um dos crimes cometidos pelo presidente da República foi ter permitido ou incentivado a distribuição de kits” com cloroquina — um tratamento absolutamente legal e publicamente reconhecido como válido pelo Conselho Federal de Medicina. 

Como assim, “crime”, se milhares de médicos em todo o Brasil receitaram cloroquina para os seus pacientes, e se o CFM atestou que cabe aos profissionais aplicarem as terapias que julgarem mais acertadas, como em toda e qualquer doença? E o “crime de genocídio”, então, expressamente descrito na lei brasileira como o conjunto de ações praticado com a intenção deliberada de destruir “grupo nacional, étnico, racial ou religioso?” 

Há seis meses a imprensa aceita as acusações formais feitas na CPI de que Bolsonaro cometeu genocídiouma denúncia tão patética que acabou sendo retirada pelos próprios acusadores. (Retirada contra a vontade de Renan, o herói número 1 da mídia.) Tão surrealista quanto os crimes de cloroquina e de genocídio é o crime de falta de planejamento, uma das joias da coroa entre as denúncias. Como adotar um “plano nacional” se, por decisão formal do STF, nenhum ato ou projeto do governo federal poderia interferir nas decisões das “autoridades locais”? Esse o nível das acusações oficiais da CPI. Esse é o nível em que a imprensa se colocou.

O coroamento da história toda foram as expressões de pesar explícito que ocuparam o noticiário quando os acionistas majoritários da CPI, divididos por mesquinharias pessoais, interesses contrariados e ambições mal definidas, chegaram aos dias finais brigados uns com os outros. A imprensa derramou lágrimas, então, lamentando a “desunião” entre os inquisidores — no “momento decisivo”, comentou-se, eles deveriam fazer uma frente única contra Bolsonaro, em nome de “todos nós”. Nós quem? Não o público em geral, com certeza — mídia e público caminham há muito tempo em direções opostas.

Renan é Renan, Omar é Omar. Mas a imprensa brasileira deveria ser outra coisa.

Leia também “Só no Brasil”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste


sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Coquetel de formicida

Publicado na versão impressa de VEJA
J.R. GUZZO


Este país, a cada dia que passa, vai se tornando um competidor favorito na disputa do Campeonato Mundial das Discussões sem Pé nem Cabeça. A contribuição mais recente das nossas altas autoridades para esse novo título nacional é o palavrório enfezado, tolo e pretensioso que se armou em torno da seguinte questão: a campanha pela reeleição da presidente Dilma Rousseff foi feita dentro ou fora da lei? A resposta, pelo jeito que tomaram as coisas até agora, é que não pode haver resposta, pois não vale fazer a pergunta.



Segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o homem que deveria procurar saber se aconteceu ou não aconteceu algo de errado na história, “não interessa à sociedade” discutir essas “controvérsias”; é inconveniente, a seu ver, que a Justiça se meta nisso, pois a eleição já foi, os vencedores devem “usufruir as prerrogativas de seus cargos” e os derrotados devem se preparar para a próxima. Não será possível, assim, saber se houve ou não houve algum crime ─ pela vontade da Procuradoria, não deve haver investigação, sem investigação não há prova e, sem prova, ninguém pode dizer que houve crime.

O passado passou. Ficam arquivadas as dúvidas. É melhor não fazer perguntas, pois há o risco de se encontrar respostas. A campanha para a reeleição de Dilma Rousseff e do seu entorno é uma viagem completa no trem fantasma da política brasileira

Apareceram a empregada doméstica que, pela contabilidade oficial, recebeu 1,6 milhão, mas não sabe que recebeu, o motorista que é sócio de empresa prestadora de serviços à candidatura oficial, o pobre-­diabo que é promovido a empresário para passar notas fiscais com temperatura de 10 graus abaixo de zero. Há uma indústria gráfica que recebe mais de 20 milhões de reais da campanha, mas não tem máquinas gráficas, nem funcionários, nem sede social.

Há de tudo ─ e ao mesmo tempo não há nada, pois, sem uma decisão judicial, os fatos que ocorreram não produzem efeito algum. Por via de consequência, como diria o doutor Aureliano Chaves, não se pode dizer que a presidente é culpada e não se pode dizer que é inocente; ficamos apenas com uma discussão de hospício. Já seria bem ruim se a questão ficasse só nesse porre mental, mas é pior. Antes e além da rixa entre a PGR e a Justiça Eleitoral, o que existe aqui é um caso para a vara de falências do mundo moral.

É bem simples. Todos falam, falam e falam, e ninguém toca no ponto de onde realmente vem o curto-circuito: como pode haver limpeza numa campanha presidencial que recebe contribuições oficiais, contabilizadas e pagas em moeda corrente, de empreiteiras de obras públicas, fornecedores do governo e toda a tropa de empresas que dependem de licenças, autorizações ou favores governamentais para sobreviver? Dá para levar a sério, sinceramente, o argumento mais sagrado de todos os candidatos a algum cargo eleitoral quando lhes perguntam quem financiou sua campanha? “Ah, bom, a doação que recebemos foi perfeitamente legal”, dizem eles. “Está tudo declarado, direitinho. A lei permite. 

Qual é o problema?”

O problema é que a contribuição legal é feita basicamente com dinheiro ilegal. Em português claro: dinheiro que vem da corrupção. Esqueçam-se a empregada, o motorista, a gráfica etc. A flor do mal está na origem contaminada das doações ─ se elas são fruto do crime, a coisa toda vai para o diabo. Eis aí o verdadeiro coquetel de formicida que envenena as eleições brasileiras. No caso da eleição presidencial de 2014, a campanha de Dilma Rousseff recebeu dinheiro de empresas dirigidas por criminosos processados e condenados por corrupção ativa na 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba. Não há mais nada a provar quanto a isso: o processo tem 28 réus confessos, a maioria deles ligada a empreiteiras de obras públicas que declararam ter feito doações à candidata oficial.

Só uma delas, a Camargo Corrêa, vai devolver 700 milhões de reais ao Erário, após reconhecer que ganhou ilicitamente essa importância, pelo menos, em seus contratos com o governo. Será que Dilma não sabia nada sobre a origem dos 350 milhões de reais que gastou para se reeleger? Levou um susto quando soube? Nunca ouviu falar em empresas que roubam do governo e fazem contribuições de campanha? Naturalmente, não é só o PT que age assim ─ todos os seus adversários se servem dessa mesma rapadura. Mas os adversários não foram eleitos para a Presidência da República em 2014 ─ o problema concreto é de quem está sentado, hoje, num cargo ganho com a ajuda de dinheiro que veio do crime.