Para
um governo que promete severo controle de seus gastos e tenta impor às
administrações estaduais medidas de austeridade tão ou mais rigorosas do que as
que diz ter adotado para si, não poderia ter sido pior o sinal que transmitiu
aos brasileiros nos últimos instantes de 2016 com a edição da medida provisória
que aumenta os vencimentos de oito categorias de servidores. Nem o anúncio da
extinção de 4.689 funções e cargos comissionados feito pouco antes, em linha
com as promessas de austeridade, foi suficiente para reduzir o impacto negativo
da divulgação dos reajustes. Afinal, a economia esperada com o corte dos cargos
comissionados é de R$ 240 milhões por ano, enquanto o reajuste para as oito
categorias implicará gastos adicionais de R$ 3,8 bilhões só em 2017.
Medidas
contraditórias como essas retiram consistência e credibilidade do discurso do
governo sobre o ajuste no setor público. O ajuste, como defende o ministro da
Fazenda, Henrique Meirelles, e outros integrantes de sua equipe, é medida indispensável
para a restauração da confiança dos brasileiros na recuperação econômica. Sem
essa confiança, não haverá investimentos nem disposição de consumo para
sustentar o crescimento.
A
crise fiscal é generalizada e, por isso, sua superação não depende apenas das
autoridades federais. Ela é mais grave em várias unidades da Federação, daí o
governo Michel Temer ter tomado a decisão correta de condicionar a ajuda
federal aos Estados à adoção, por estes, de medidas rigorosas de controle de
despesas, entre as quais especialmente as com folha de pagamento. Suspensão de
aumentos e mesmo redução do quadro de funcionários estão entre as exigências
feitas pelo corpo técnico do Ministério da Fazenda para a renegociação da
dívida dos Estados com a União. O ministro Henrique Meirelles disse que
“eventual ajuda será o mais rápido possível desde que se obedeça a lei e não
prejudique o ajuste federal”.
No
momento, o ajuste federal está sendo prejudicado pelo próprio governo federal,
com decisões como a de aumentar os vencimentos de auditores da Receita Federal,
médicos peritos do INSS e auditores fiscais do trabalho, entre outras carreiras
do funcionalismo. Além de inteiramente em desacordo com a política de controle
de gastos do governo Temer, o aumento foi formalizado por meio de medida
provisória, que, como determina a Constituição, só deve ser utilizada em casos
de urgência e relevância, que não é o dos vencimentos de algumas categorias do
funcionalismo.
Além
disso, o aumento agora concedido por medida provisória já tinha sido proposto
pelo governo por meio de projeto de lei, que, numa rara demonstração de
responsabilidade diante da gravidade da crise das finanças públicas, os
parlamentares não haviam votado até o fim do exercício fiscal. Causa
estranheza a alegação do governo de que, com o aumento agora concedido, cumpre
o que foi acertado pelo governo anterior no início de 2016. Nos últimos dez ou
11 meses, a crise fiscal se agravou por causa da persistência da recessão.
Também pioraram, e muito, as condições de vida da população, sobretudo daquela
parcela, largamente majoritária, que depende de rendas obtidas no setor
privado. Situações estáveis em 2016 hoje são insustentáveis.
A
existência de 12,1 milhões de brasileiros sem emprego é um dos indicadores mais
dramáticos da crise que o País enfrenta. A queda da renda real média de quem
vem conseguindo manter uma fonte regular de remuneração é outro aspecto cruel
da crise. Em condições normais, o servidor público tem inúmeras vantagens em
relação aos empregados do setor privado. [sabiamente o articulista citou EM CONDIÇÕES NORMAIS e o Brasil não atravessa uma situação que possa ser considerada CONDIÇÕES NORMAIS.] Além de maiores garantias no emprego,
tem remuneração média muito superior à dos trabalhadores do setor privado. Além
de contrariar a política de rigor fiscal proclamada pelo governo, a concessão
de aumentos para servidores que já gozam de estabilidade e para carreiras cujo
salário mensal inicial supera muitas vezes R$ 15 mil parece escarnecer dos
trabalhadores do setor privado.
Fonte: Editorial - O Estado de S. Paulo
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