As empresas privadas, em grande número, mas grande mesmo, só funcionam com benesses do governo
Além das reformas em andamento, ou ao lado delas, é preciso aplicar
duas políticas de âmbito nacional: uma é reestatizar o Estado, outra,
seu reverso, privatizar a empresa privada.
O jornalista Rolf Kuntz, do “Estadão”, chamou a atenção para a
primeira delas em coluna no último dia 26. Está na rede, mas eis dois
exemplos contrários ali citados. A Petrobras, com Pedro Parente, foi
reestatizada depois do assalto privado e partidário das gestões
petistas. Já os órgãos de controle sanitário do Ministério da
Agricultura, apanhados na Carne Fraca, estavam obviamente privatizados.
Por aí o leitor tem uma boa ideia do que se está falando.
O reverso da história é a privatização da empresa privada brasileira ou, se quiserem, a privatização do capitalismo. Considerem a Vale, privatizada em maio de 1997. Nesta semana, foi
indicado o seu novo presidente, Fabio Schvartsman, um executivo do
primeiro time no setor privado. Sinal claro de aprovação geral: as ações
da Vale subiram. Mas houve envolvimento político, outra vez. Ocorre que o governo
federal está no bloco de controle da Vale, por meio do Banco do Brasil e
de fundos de pensão de estatais, junto com o Bradesco. Claro que, do
ponto de vista formal, nada ocorre sem o entendimento dos parceiros, o
público e o privado. Mas o peso do governo vai além do número de ações
que possui.
Vai daí que, na escolha do novo diretor-executivo da Vale, o
presidente Temer conversou com o senador Aécio Neves. Outro detalhe: a
empresa de mineração, embora tenha negócios no Brasil e no mundo, é
mineira de coração, digamos assim. Daí, neste governo, a participação de
Aécio. Ao mesmo tempo, bancadas de partidos políticos e candidatos ao
posto buscavam apoios e lobbies em Brasília. Mas nessa turma, ninguém
emplacou ninguém.
De sua parte, Aécio foi conversar com Armínio Fraga, uma
unanimidade positiva nos meios econômicos, que topou participar do
processo desde que fosse para, de fato, privatizar a Vale. Não falou com
essas palavras, mas o sentido era esse: entraria na história se fosse
para indicar um nome de mercado, para impor na Vale uma gestão
independente.
Tendo essa garantia, indicou o nome de Fabio Schvartsman, que havia
feito ótimo trabalho na Klabin. E Aécio o levou até o presidente Temer.
De outro lado, a Vale havia contratado a empresa Spencer Stuart
para selecionar seu novo presidente. E Schvartsman foi indicado pelo
head hunter. Se foi colocado na lista por Aécio e Temer ou se a empresa chegou a
seu nome paralelamente, e por coincidência, não importa mais. O fato é
que resultou uma indicação técnica, com respaldo político. Diz o senador Aécio Neves: “Ter aval político não desmerece Schvartsman”. De fato. Mas é fato também que os dois últimos presidentes da Vale, Roger
Agnelli e Murilo Ferreira, caíram quando perderam o apoio do governo
federal. Agnelli, por exemplo, foi atacado por Lula por dirigir a
companhia como se ela fosse... privada e independente.
Digamos que Lula volte em 2018. [xô satanás... cai fora e retire Lula do meios dos humanos e o leve para o teu séquito.] Ou alguém de seu lado. Schvartsman e
Pedro Parente seriam derrubados? Poderia acontecer, não é mesmo? Mais,
seria provável.
O que demonstra o ponto inicial: nem o Estado está estatizado, nem o
privado, privatizado. Hoje, a boa ou má gestão das estatais depende da
qualidade da escolha do governo de plantão. E as empresas privadas, em
grande número, mas grande mesmo, só funcionam com benesses do governo.
Nesta semana, por exemplo, empresários de peso foram a Temer
reclamar da presidente do BNDES, Maria Silvia Marques, que, como
Parente, é executiva de reconhecida competência. Ela estaria segurando
crédito — crédito que o governo anterior distribuiu tão ampla quanto
irresponsavelmente. Pois é, em vez de apresentar balanços e projetos saudáveis, foram reclamar com o presidente da República. Os controladores da Vale, incluído o governo, colocaram em marcha
um processo para torná-la uma companhia pública, com ações pulverizadas
e, portanto, sem dono definido. É boa medida.
Assim como seriam boas medidas que garantissem escolhas técnicas e
profissionais para cargos que exigem isso no governo e nas estatais.
Fiscal sanitário não pode ser indicação política, nem diretor de escola
ou presidente da Petrobras. Argumenta-se: o partido que ganha a eleição tem que dispor dos
instrumentos para aplicar a sua proposta política. E existe boa
política.
Tudo verdade. Mas o vencedor não precisa nomear mais de cem mil
correligionários pelo país afora. Nem pode colocar o governo a serviço
do partido e de determinadas empresas.
São urgentes mecanismos institucionais que garantam um Estado público e um capitalismo privado.
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