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domingo, 29 de abril de 2018

Recuo da 2ª Turma é útil também para Temer

Ao reverter uma decisão unânime tomada há seis meses para aprovar, por 3 votos a 2, o envio de trechos da delação da Odebrecht das mãos de Sergio Moro para a mesa de um juiz federal a ser sorteado em São Paulo, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal não cedeu apenas aos interesses de Lula. Há por trás da providência um beneficiário oculto. Chama-se Michel Temer o segundo maior interessado na novidade. No caso de Lula, os advogados tentam livrá-lo dos rigores de Sergio Moro, sob o argumento de que os processos que envolvem o ex-presidente petista não possuem conexão com o assalto à Petrobras. Por decisão do Supremo, o juiz da Lava Jato tem competência para julgar apenas os desvios relacionados à estatal petrolífera.


No escândalo da JBS, a defesa de Temer escora-se no mesmo argumento para sustentar que o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, não seria o juiz natural das denúncias feitas contra o presidente da República. O precedente aberto pela Segunda Turma abre brecha para a ressurreição desse debate. Temer questiona a atuação de Fachin desde maio do ano passado, quando o grampo do Jaburu ganhou as manchetes. Queixa-se de que o ministro não teria legitimidade para atuar no caso, pois a empresa JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, era investigada não no escândalo da Petrobras, mas em outras cinco operações: Sépsis, Greenfield, Cui Bono, Carne Fraca e Bullish.

O criminalista Antonio Cláudio Mariz, advogado de Temer, ao ser procurado no ano passado por uma escrivã da PF interessada em agendar o depoimento do seu cliente, atravessou uma petição na mesa de Fachin. Nela, fez três pedidos.  Primeiro, pediu que o depoimento de Temer fosse suspenso até a conclusão da perícia na gravação da conversa do presidente com o delator Joesley Batista. Fachin indeferiu. No segundo pedido, a defesa encareceu a Fachin que abdicasse da relatoria, devolvendo o processo à presidência do Supremo, para sorteio de um novo relator.  Alegou-se que a colaboração judicial da JBS não tinha nada a ver com a Lava Jato. Ao ignorar também esse pedido, Fachin deu crédito à versão da Procuradoria segundo a qual Temer endossou “Tem que manter isso, viu?”— uma suposta mesada que o delator Joesley insinuou que pagava ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha para comprar o silêncio dele na cadeia. Um indício de tentativa de obstruir a Lava Jato.

No terceiro pedido, a defesa de Temer pleiteou o desmembramento do processo, para que o presidente passasse a ser investigado sozinho, sem vinculações com o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, o homem da mala, e com o doleiro Lúcio Funaro, um operador de Eduardo Cunha. De novo, Fachin indeferiu.  Alvejado por duas “flechadas” do então procurador-geral da República Rodrigo Janot, Temer sacrificou a reforma da Previdência para arrancar da Câmara o congelamento das denúncias. Ambas serão retiradas do freezer em janeiro de 2019, quando o denunciado deixar a Presidência.

Nessa hora, sem as prerrogativas do cargo, Temer será enviado para o mármore quente da primeira instância. E não será uma surpresa se seus advogados protocolarem um recurso reivindicando a reabertura da discussão sobre a competência de Fachin e requerendo a anulação dos atos praticados pelo relator.  No caso de Lula, a despeito da comemoração dos seus advogados, o tumulto processual provocado pela decisão da Segunda Turma não deve produzir prejuízos incontornáveis. Os processos permanecem nas mãos de Sergio Moro. E não dependem das delações da Odebrecht para ficar em pé.

Colecionaram-se outras provas, esclareceram os procuradores da força-tarefa de Curitiba e o próprio Moro. A ação penal sobre a reforma do sítio de Atibaia está na fase de oitiva de testemunhas. A outra, sobre a compra de uma sede para o Instituto Lula, já entrou na etapa das alegações finais. Ambas pendem para a condenação. O caso de Temer é diferente. Como a Câmara proibiu o Supremo de se debruçar sobre as denúncias, não houve a abertura de ações penais. Os processos encontram-se, por assim dizer, em estágio embrionário. Uma fase ideal para que os advogados apontem incidentes processuais para melar o jogo.

Além de Temer, o governador do Mato Grosso do Sul Reinaldo Azambuja, outro encrencado na delação da JBS, questionou a atuação de Fachin. Seu advogado, Gustavo Passarelli da Silva, sustentou a mesma tese: os fatos atribuídos ao governador não estavam relacionados à Lava Jato e, por isso, deveria ser sorteado um novo relator. O recurso chegou ao plenário. Ali, em decisão unânime, Fachin e seus dez colegas indeferiram a reclamação.

Na decisão que tomara há seis meses, os cinco ministros que integram a Segunda Turma do Supremo também haviam indeferido por unanimidade o recurso de Lula para arrancar a delação da Odebrecht das mãos de Sergio Moro. Os advogados ajuizaram um embargo de declaração. Em condições normais, um embargo de declaração não costuma modificar decisões dos magistrados. Serve apenas para esclarecer eventuais obscuridades ou incongruências dos veredictos. Contudo, três dos cinco membros da turma —Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes— reverteram integralmente os seus votos, deferindo o que antes haviam indeferido.

Toffoli e Lewandowski possuem vínculos com o petismo. Gilmar é conselheiro de Temer, com quem esteve, no Palácio do Jaburu, horas depois da sessão da Segunda Turma.

Blog do Josias de Souza

 

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