Com o encaminhamento do projeto de mudanças nas aposentadorias dos militares, nada mais falta para que a reforma da Previdência comece a ser discutida para valer no Congresso [comentário 1: se o Maia deixar e o presidente da CCJ da Câmara não atrapalhar.]
Com o
encaminhamento do projeto de mudanças nas aposentadorias dos militares (leia o editorial A reforma dos
militares), nada mais falta para que a reforma da Previdência
comece a ser discutida para valer no Congresso. Não há mais desculpas para a
inação do governo, que no entanto parece sem saber o que fazer para
arregimentar o necessário apoio à reforma. Abundam sinais de que os
responsáveis pela articulação política, a começar pelo próprio presidente da
República, Jair Bolsonaro, não estão conscientes do grau de descontentamento
dos parlamentares com o governo, mesmo entre os que supostamente integram a
base. Não é um bom começo de conversa.
Levantamento
feito pelo Estado mostrou o tamanho do desafio: dos 308 votos
necessários para aprovar a reforma da Previdência na Câmara, o governo conta
por ora com o apoio de apenas 180 deputados, numa consulta feita a 501 dos 513
parlamentares. Entre os entrevistados, 228 preferiram não declarar o voto. Dos 180
que se disseram favoráveis, 119 condicionaram seu apoio a mudanças no texto
encaminhado pelo governo, e apenas 61 disseram aceitar a reforma tal como foi
proposta. Ou seja, mesmo entre os que se dispõem a aprovar a reforma existe uma
forte demanda por negociação.
O
problema se afigura ainda mais complexo quando se observa que, dos 54 deputados
do PSL, partido do presidente Bolsonaro, apenas 28 declararam apoio à reforma
exatamente como o governo encaminhou. Já no DEM, partido que tem o maior número
de ministros, inclusive aquele que é oficialmente o principal articulador
político do governo, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, somente 4 dos 27
deputados declararam aceitar a proposta do governo sem mudanças. O
presidente Bolsonaro insiste que a “nova política”, que ele diz representar,
não admite mais a realização de negociações nas bases fisiológicas que marcaram
as relações do governo com o Congresso praticamente desde a redemocratização do
País. O problema é que o presidente não parece saber o que vem a ser exatamente
essa “nova política” e tem antagonizado desnecessariamente os parlamentares,
como se qualquer forma de negociação estivesse interditada a priori por ser
considerada prática da “velha política”.
Enquanto
isso, a militância bolsonarista nas redes sociais é incitada a atacar os
políticos, como se o País ainda estivesse em campanha eleitoral, criando clima
francamente desfavorável ao diálogo. O próprio presidente da Câmara, Rodrigo
Maia (DEM-RJ), que vem articulando a aprovação da reforma, [comentário 2: articulando ou desarticulando? Rodrigo Maia, que só pensa em 2022, pretende travar tudo e jogar a culpa em Bolsonaro e no Moro.] queixou-se de
agressões virtuais que vem sofrendo de bolsonaristas, que o acusam de querer
“achacar” o governo. O presidente Bolsonaro, até agora, nada fez para
desautorizar esses ataques. Tampouco fez algo de realmente significativo para
convencer os parlamentares de que acredita na reforma que encaminhou - e essa
hesitação do governo, dada a impopularidade do tema, obviamente desencoraja o
apoio no Congresso.
Desde o
princípio, Bolsonaro sustentou que a proposta de reforma que seu governo
apresentou deveria ser “aperfeiçoada” pelos parlamentares, indicativo de que
nem ele mesmo estava disposto a bancar alguns pontos da emenda, a começar pela
idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres. Paradoxalmente, esse é
um dos pontos que tiveram o maior apoio entre os parlamentares consultados pelo
Estado na enquete - chegariam a 100 os votos favoráveis a essa medida. Isso
pode indicar que ainda há um clima minimamente simpático à reforma no
Congresso, inclusive em seus aspectos mais espinhosos, mas a manutenção dessa
disposição e a ampliação do apoio dependem agora exclusivamente do esforço do
governo e, em especial, do presidente Bolsonaro.
Para começar, seria bom que o governo evitasse misturar a reforma da
Previdência com temas fora de lugar neste momento, como a reestruturação da
carreira dos militares. Não é prudente dar a impressão de que o presidente
privilegia certos setores ao mesmo tempo que pede sacrifícios aos brasileiros
em geral. Os parlamentares, seja os remanescentes da “velha política”, seja os
eleitos na onda da “nova política”, não costumam responder bem a esse comportamento
ambíguo por parte do governo.
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