Retirar a Previdência da Constituição faz todo sentido. A Carta Magna deve ser preservada para o que é essencial à organização do Estado e aos direitos fundamentais
Com a proposta de reforma
da Previdência apresentada ao Congresso, o governo federal não deseja
apenas alterar as regras para concessão de aposentadorias e pensões. A
proposta inclui mudar o próprio local onde essas regras estão previstas.
Atualmente, boa parte dessas regras está na Constituição e, portanto,
só uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) pode alterá-las. O
Executivo propõe que a Previdência seja regulada por lei complementar. [aceitável, desde que outras regras absurdas sejam retiradas da Constituição, inclusive sendo retirado do famigerado artigo 5º da CF - aquele que concede mais de 50 direitos e nenhuma obrigação - a maior parte de suas determinações que devem ser alojadas na legislação ordinária e algumas eliminadas.]
O secretário de Previdência Social do Ministério da Economia, Leonardo Rolim, lembrou que o Brasil é o único país do mundo em que a Constituição fixa parâmetros para a concessão de aposentadorias e pensões. “A Constituição tem que ser uma coisa estável, não pode ficar alterando toda hora”, disse Rolim em entrevista ao Broadcast.
Uma alteração na Constituição [PEC] exige votação em dois turnos em cada Casa, com quórum de três quintos. São necessários 308 votos na Câmara e 49 no Senado. Para aprovar um projeto de lei complementar, basta maioria absoluta em único turno: 257 votos na Câmara e 41 no Senado. [Além de dificuldade de modificar a Constituição por PEC, alguns artigos são classificados como CLÁUSULAS PÉTREAS e estes não podem ser alterados, abolidos, nem pelo Congresso Nacional, modificações só por Assembleia Nacional Constituinte - entre eles, está o já citado artigo 5º;
sem esquecer que alguns pontos da Previdência Social, podem ser considerados 'direitos individuais' que não podem ser alterados por PEC.]
A proposta do governo de retirar a Previdência da Constituição faz todo sentido. Não há razão, por exemplo, para que a idade mínima para se aposentar esteja determinada na Carta Magna. Trata-se de um parâmetro que exige constante atualização diante da realidade econômica e demográfica do País. A idade mínima não é uma questão de natureza constitucional, que esteja vinculada às garantias e liberdades fundamentais ou aos fundamentos do Estado.
Tal disfuncionalidade do texto constitucional não está restrita a temas previdenciários. Ao longo de seus 250 artigos, além dos 114 artigos das Disposições Constitucionais Transitórias, verifica-se no texto constitucional a indevida presença de assuntos sem natureza constitucional. Esse inchaço causa desequilíbrios no ordenamento jurídico e afeta o funcionamento dos Três Poderes.
Não é à toa, por exemplo, que o Supremo Tribunal Federal (STF), cuja principal missão é guardar a Constituição, seja demandado em uma infinidade de processos, pelo próprio Estado, empresas e pessoas que tentam reverter decisões de instâncias inferiores. A incrível abrangência do texto constitucional torna possível vislumbrar em quase todas as ações judiciais alguma questão referente à Carta de 1988. O Legislativo também sofre com o inchaço da Constituição. A tramitação de uma PEC é muito mais complexa do que a de um projeto de lei ordinária ou complementar. O processo legislativo, que habitualmente já tem uma imensa pauta, se vê sobrecarregado por muitas demandas de modificação do texto constitucional. A esse respeito, não se pode acusar o Congresso de lentidão, pois já aprovou 99 Emendas Constitucionais (EC), além de 6 Emendas Constitucionais de Revisão (ECR).
São também evidentes os problemas que o inchaço constitucional causa ao Poder Executivo. É o caso da reforma da Previdência. Não bastasse ser um tema impopular, o governo tem de se organizar para conseguir, em dois turnos, o voto de 308 deputados e de 49 senadores. Se as regras relativas a aposentadorias e pensões não tivessem status constitucional, sua atualização demandaria muito menos esforço e levaria muito menos tempo. Uma Constituição mais enxuta possibilita um Estado mais ágil e mais eficiente – mais capaz de dar a tempo respostas adequadas aos problemas que surgem.
A Constituição deve ser preservada para aquilo que é essencial à organização do Estado e aos direitos e garantias fundamentais. [os tais direitos e garantias fundamentais é que sustentam o citado artigo 5º, que emperra até o combate à criminalidade.] Um sistema jurídico engessado sempre estará defasado ante a realidade econômica e social, muito especialmente no mundo atual, com seu ritmo acelerado de mudança. Uma Constituição mais enxuta possibilita também vislumbrar com mais nitidez as garantias realmente fundamentais. Ou seja, desconstitucionalizar o que não deve estar na Constituição é valorizar o núcleo de direitos e garantias que devem ter status constitucional. Enxugar a Constituição é, portanto, um modo de respeitá-la.
Opinião - O Estado de S. Paulo
O secretário de Previdência Social do Ministério da Economia, Leonardo Rolim, lembrou que o Brasil é o único país do mundo em que a Constituição fixa parâmetros para a concessão de aposentadorias e pensões. “A Constituição tem que ser uma coisa estável, não pode ficar alterando toda hora”, disse Rolim em entrevista ao Broadcast.
Uma alteração na Constituição [PEC] exige votação em dois turnos em cada Casa, com quórum de três quintos. São necessários 308 votos na Câmara e 49 no Senado. Para aprovar um projeto de lei complementar, basta maioria absoluta em único turno: 257 votos na Câmara e 41 no Senado. [Além de dificuldade de modificar a Constituição por PEC, alguns artigos são classificados como CLÁUSULAS PÉTREAS e estes não podem ser alterados, abolidos, nem pelo Congresso Nacional, modificações só por Assembleia Nacional Constituinte - entre eles, está o já citado artigo 5º;
sem esquecer que alguns pontos da Previdência Social, podem ser considerados 'direitos individuais' que não podem ser alterados por PEC.]
A proposta do governo de retirar a Previdência da Constituição faz todo sentido. Não há razão, por exemplo, para que a idade mínima para se aposentar esteja determinada na Carta Magna. Trata-se de um parâmetro que exige constante atualização diante da realidade econômica e demográfica do País. A idade mínima não é uma questão de natureza constitucional, que esteja vinculada às garantias e liberdades fundamentais ou aos fundamentos do Estado.
Tal disfuncionalidade do texto constitucional não está restrita a temas previdenciários. Ao longo de seus 250 artigos, além dos 114 artigos das Disposições Constitucionais Transitórias, verifica-se no texto constitucional a indevida presença de assuntos sem natureza constitucional. Esse inchaço causa desequilíbrios no ordenamento jurídico e afeta o funcionamento dos Três Poderes.
Não é à toa, por exemplo, que o Supremo Tribunal Federal (STF), cuja principal missão é guardar a Constituição, seja demandado em uma infinidade de processos, pelo próprio Estado, empresas e pessoas que tentam reverter decisões de instâncias inferiores. A incrível abrangência do texto constitucional torna possível vislumbrar em quase todas as ações judiciais alguma questão referente à Carta de 1988. O Legislativo também sofre com o inchaço da Constituição. A tramitação de uma PEC é muito mais complexa do que a de um projeto de lei ordinária ou complementar. O processo legislativo, que habitualmente já tem uma imensa pauta, se vê sobrecarregado por muitas demandas de modificação do texto constitucional. A esse respeito, não se pode acusar o Congresso de lentidão, pois já aprovou 99 Emendas Constitucionais (EC), além de 6 Emendas Constitucionais de Revisão (ECR).
São também evidentes os problemas que o inchaço constitucional causa ao Poder Executivo. É o caso da reforma da Previdência. Não bastasse ser um tema impopular, o governo tem de se organizar para conseguir, em dois turnos, o voto de 308 deputados e de 49 senadores. Se as regras relativas a aposentadorias e pensões não tivessem status constitucional, sua atualização demandaria muito menos esforço e levaria muito menos tempo. Uma Constituição mais enxuta possibilita um Estado mais ágil e mais eficiente – mais capaz de dar a tempo respostas adequadas aos problemas que surgem.
A Constituição deve ser preservada para aquilo que é essencial à organização do Estado e aos direitos e garantias fundamentais. [os tais direitos e garantias fundamentais é que sustentam o citado artigo 5º, que emperra até o combate à criminalidade.] Um sistema jurídico engessado sempre estará defasado ante a realidade econômica e social, muito especialmente no mundo atual, com seu ritmo acelerado de mudança. Uma Constituição mais enxuta possibilita também vislumbrar com mais nitidez as garantias realmente fundamentais. Ou seja, desconstitucionalizar o que não deve estar na Constituição é valorizar o núcleo de direitos e garantias que devem ter status constitucional. Enxugar a Constituição é, portanto, um modo de respeitá-la.
Opinião - O Estado de S. Paulo
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