Dois dos monstros que mataram 359 pessoas eram irmãos, outra era casada com um deles e explodiu os filhos, mais um tinha doutorado
É quase impossível resumir o horror que aconteceu no domingo de Páscoa no Sri Lanka num dos maiores atentados da história. As explosões em locais fechados como
igrejas e hotéis, com cargas de C4 e bolinhas de aço levadas em mochilas
pelos suicidas, deixaram tantos corpos despedaçados que foi preciso
abrir novos cemitérios.
Em áreas mais fechadas, como as ruas
próximas à igreja de São Sebastião, muita gente morreu dentro de casa.
Foram mais de cem vítimas nessa igreja, onde a cabeça do terrorista
arrancada pela força da explosão acabou em cima de um dos bancos, com os
olhos abertos.
Aos poucos, vão sendo descobertos os autores. Num clássico do jihadismo,
eles deixaram um vídeo tenebroso onde fazem a encenação típica do
Estado Islâmico, declarando–se mártires, numa inversão total da
realidade. Estão todos com roupas iguais e o rosto
coberto, e usam nomes de guerra tradicionais (Abu, ou pai, alguma
coisa). Menos o cabeça, Moulvi Zahran Hashim, já conhecido como pregador
do ódio.
Filiado ao ISIS,
o grupo se chama Tawid Jamaat Nacional. Tawid equivale a monoteísmo ou à
unicidade de Deus, um dos princípios mais fundamentais do Islã e
invocado frequentemente por jihadistas da linha sunita que acusam
qualquer outra corrente de heresia. Jamaat é a comunidade ou assembleia
dos fieis, englobando todos os muçulmanos. Outros dois de cara coberta já foram
identificados. Eram irmãos, nascidos numa família rica que transformaram
em célula terrorista. Ilham Ibrahim e Inshaf registraram-se nos hotéis
Shangri-La e Cinnamon, em Colombo. Explodiram-se na hora mais
movimentada do café da manhã.
Um deles usou dados verdadeiros na ficha.
A polícia procurou o endereço e, ao chegar, a mulher do terrorista
também se suicidou. Levou os dois filhos junto na explosão, além de três
policiais. Mais de vinte membros da família, que sabiam dos atentados,
foram presos. O tipo de ideologia doentia que produz
uma abominação assim já é bem conhecido, especialmente depois do Onze de
Setembro nos Estados Unidos.
O perfil de alguns dos terroristas
fanáticos também coincide: homens entre 20 e 30 anos, com um bom nível
de vida e de instrução. Alguns eram formados em direito, segundo
autoridades do Sri Lanka. Um dos terroristas fez faculdade no Reino
Unido e pós-graduação na Austrália. O grupo terrorista planejava uma segunda
onda de ataques. O clima de medo persiste. Os parentes que vão enterrar
seus mortos são revistados para entrar nos cemitérios. Os padres avisam
para não demorar muito, por receio de novas explosões.
Os católicos são cerca de 7% da
população. Como as outras minorias, hinduístas e muçulmanos, são da
etnia tamil. Muitos têm nomes ou sobrenomes portugueses, como na Índia,
remontando à colonização original.
As reformas recentes na Igreja não fazem
muito sucesso no Sri Lanka, como é comum em países onde a religião
minoritária se apega a tradições como forma de identidade e
sobrevivência.
Os padres usam batina branca e faixa
preta, as missas solenes, como a de Páscoa, duram duas horas, os fieis
fazem o sinal da cruz com as três persignações e o arcebispo de Colombo,
cardeal Malcolm Ranjith, pediu punição sem piedade para os terroristas,
“porque só animais fazem uma coisa dessas”. Depois, se retratou: “Não quero denegrir
os animais, essa gente é pior do que eles”. Disse que os cúmplices
mereceriam prisão perpétua e que os terroristas não deviam ser
considerados muçulmanos.
Esse é um argumento frequente,
enfraquecido pelo silêncio estrondoso de autoridades muçulmanas sobre o
atentado, ao contrário da condenação unânime ao bárbaro ataque contra
duas mesquitas na Nova Zelândia.
O papa Francisco pediu ajuda para as vítimas, mas ainda não havia telefonado ao arcebispo de Colombo.
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