Ministro tem razão para falar em abismo fiscal
Paulo Guedes foi ao Congresso dizer que o país está à beira do colapso fiscal, e o secretário de Fazenda falou em “arrocho” e “garrote”
O ministro Paulo Guedes foi com sua equipe ao Congresso dar uma coleção
de más notícias. As palavras foram fortes. O ministro afirmou que o
Brasil está à beira do abismo fiscal, e o secretário de Fazenda, Waldery
Rodrigues, falou em “arrocho” e “garrote” nunca vistos na sociedade
brasileira para o que vai acontecer em função do teto de gastos. Em Nova
York, o deputado Rodrigo Maia avisou que o teto de gastos pode causar
um “colapso social” no país.
Afinal, eles são contra ou a favor da Emenda 95 que estabeleceu o teto
no governo Temer? Eles defendem, mas avisam que vai doer muito. E que a
solução será aprovar as reformas que o governo Bolsonaro apresentou e
ainda apresentará. Guedes e todos os seus homens — a equipe é quase
integralmente masculina — estavam na Comissão Mista do Orçamento para
pedir liberdade para emissão de dívida. Mais precisamente, foram pedir
licença para os créditos suplementares. Essa seria a única forma de
descumprir com autorização a regra de ouro, disseram.
— A regra de ouro impede que se endivide para pagar despesa primária.
Ela está certa. O endividamento tem que ser para investir. Mas estamos
aqui para pedir R$ 248 bilhões de créditos suplementares para pagar
aposentadorias do Regime Geral, Bolsa Família, Plano Safra, BPC. Isso
mostra o drama social brasileiro. Estamos pedindo crédito para não
quebrar a regra de ouro — afirmou o ministro.
Para entender toda a cena é preciso lembrar fatos da vida recente do
país. Uma das acusações contra a presidente Dilma foi emitir crédito
suplementar sem autorização prévia do Congresso. Ela alegou que foi para
pagar esse mesmo tipo de despesa. Mas não teve perdão. O ministro Paulo
Guedes, durante a campanha e na transição, dizia que iria zerar o
déficit tão logo chegasse. No primeiro ano. Os velhos jornalistas de
economia duvidaram — como esta aqui que vos escreve — mas ele dizia que
dinheiro havia e ele venderia imóveis públicos e privatizaria tudo para
reduzir a dívida.
A realidade ele mostrou ontem. O país ao fim do governo Bolsonaro estará
no nono ano de déficit primário, em um cenário sem reformas. É verdade
que a projeção é de que esse déficit será decrescente por causa de leis
aprovadas nos governos dos últimos 30 anos — que ele tanto critica por
serem “social-democratas”. A regra de ouro e a Lei de Responsabilidade
Fiscal no governo Fernando Henrique, e o teto de gastos no governo
Temer.
O ministro Guedes tem razão quando fala em abismo fiscal. O Brasil caiu
no buraco fiscal em 2014 e desde então não conseguiu sair dele. Mesmo
assim, o déficit cairá por essa imposição que o secretário de Fazenda
chama de garrote e arrocho nunca vistos na sociedade brasileira, e que
Rodrigo Maia diz que poderá levar a um colapso social. O resultado
negativo cairá de R$ 139 bilhões este ano para R$ 31 bi em 2022. O teto,
esse remédio extremo, ao ser acionado, impedirá que as despesas cresçam
além da inflação. No último slide, no entanto, o secretário avisou que
não vão contratar pessoal, mas vão aumentar os salários dos militares.
Quanto às privatizações e vendas de ativos, não temos notícia. Ou temos.
Notícia de que empresas não serão privatizadas. O governo
social-democrata de Fernando Henrique privatizou Vale, Telebras, grande
parte do sistema Eletrobras, o resto da siderurgia e da petroquímica. O
que será que o governo que se diz liberal venderá, além de algumas
refinarias da Petrobras?
O crescimento esperado não veio neste começo do novo governo. O ministro
diz agora que via com ceticismo essa possibilidade. O Banco Central na
Ata do Copom de ontem avisou que o primeiro trimestre deve ter tido um
PIB negativo, e que os indicadores estão aquém do esperado. O secretário
de Fazenda disse que a previsão para este ano, que estava em 2,2%, vai
ser reduzida no dia 22, quando as contas forem refeitas. Mas Guedes já
contou qual é o novo número: 1,5%. E há estimativas piores, como a do
Itaú, que cortou para 1%. Menos crescimento é igual a menos receitas e
mais cortes.
Como solução para esse drama brasileiro, o ministro Paulo Guedes aponta
para as reformas que ele ainda não apresentou. No mercado futuro de
reformas tem o que ela chama de PEC do Pacto Federativo, que é a
desvinculação geral do Orçamento, a reforma tributária, a abertura da
economia. Tudo isso, segundo ele, vai “desentupir” os canais de
investimento. Com os canais entupidos, o país discute a primeira
reforma, a da Previdência.
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