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domingo, 21 de fevereiro de 2021

Daniel Silveira errou o tiro - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo
 
Deputado, que se dizia “cagando e andando” para as opiniões do STF, pensou em criar uma crise institucional; deu errado, fosse qual fosse a intenção 

Fosse qual fosse a intenção do deputado no vídeo, deu errado

Deputado, que se dizia “cagando e andando” para as opiniões do STF, pensou em criar uma crise institucional; deu errado, fosse qual fosse a intenção. [em nossa opinião quem buscou criar uma crise institucional foi o ministro Fachin ao comentar uma ocorrência de 2018 - na ocasião optou pelo silêncio coletivo. Daniel Silveira apenas pegou o embalo. Faltou ao parlamentar a tranquilidade e a competência na arte da ironia do general Villas Bôas:“Três anos depois”.  ]   Daniel Silveira é um ex-PM do Rio. Em seis anos na corporação, pagou 26 dias de prisão, com 14 repreensões. Antes de entrar para a polícia, ele se valia de falsos atestados médicos fraudados por um faxineiro para faltar ao serviço. Preso na semana passada, manteve dois celulares na sala da Polícia Federal onde ficou, por decisão do ministro Alexandre de Moraes. 
 
[Citado por Silvio Navarro - Revista  Oeste

 O Parlamento terá de agir ao arbítrio e apontar à Suprema Corte o caminho do devido processo e do respeito à Constituição. Hoje é com um deputado de que talvez você não goste, mas amanhã pode ser contra um de que você gosta”, disse Marcel van Hatten (Novo-RS).

Os deputados são escolhidos pelo voto para o Parlamento justamente para parlar (falar, do latim parolare) o que pensam seus eleitores — goste-se do que digam ou não. É fato que das oratórias da tribuna pouco se aproveita hoje em dia, algo piorado com a extensão dela nas redes sociais. Mas isso não significa que eventuais excessos ou bobagens ditas sejam piores do que guardar dinheiro surrupiado na cueca (como fez o senador Chico Rodrigues) ou mandar matar o marido (como é o caso da deputada Flordelis). Ambos estão soltos e com o mandato à disposição. Daniel Silveira foi preso “em flagrante”.]

Esse personagem, que dias antes se dizia “cagando e andando” para as opiniões de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), pensou em criar uma crise institucional no Brasil. Ele foi o estuário de uma visão nascida em 2018, quando o deputado Eduardo Bolsonaro disse que “basta um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal”. Não bastam.
 
[O nosso entendimento nos motiva a discordância com  o regozijo de grande parte da mídia com o insucesso do deputado Daniel Silveira. 
Entendemos que deveriam se assustar, jamais comemorar.
Esquecem que de omissão em omissão, de aplausos em aplausos é a nossa liberdade de expressão que está em risco. 
Concordamos  que o deputado foi extremamente agressivo, desrespeitoso,  ao expressar sua resposta ao comentário do ministro Fachin. 
Usou palavras inadequadas, talvez por supor que o 'quaisquer' do 'caput' do artigo 53 da Constituição Federal tinha o significado amplo que 'quaisquer' costuma ter. Ainda assim, entendemos que a análise do possível delito, ou delitos, é de competência do Conselho de Ética da Câmara.
 
O que fundamenta o nosso modesto entendimento que  os acontecimentos recentes deveriam assustar? Nunca ser motivo de regozijo.
Aos poucos, de forma sutil, até interceptível aos mais distraídos, a nossa liberdade vai acabando - grande parte das vezes por decisões do Supremo Tribunal Federal, especialmente monocráticas de alguns dos seus ministros.
 
 Adiante, citaremos exemplos que motivam cabíveis receios...] 
 
Ao seu estilo, Daniel Silveira usou a repercussão do depoimento do general da reserva Eduardo Villas Bôas para atacar, em nome de sua agenda pessoal, os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Os inquéritos sobre mobilizações antidemocráticas propagando mentiras estão na mesa de Moraes. Fosse qual fosse a intenção de Silveira, deu errado.

Na última terça-feira, quando os ataques do deputado chegaram ao conhecimento de ministros do Supremo, vários deles discutiram o caso com Moraes. À noite, ele mandou prendê-lo. Silveira sustenta que o flagrante citado por Moraes não se sustenta. [“flagrante perenemente possível”] O que não se sustenta é sua jurisprudência. Enquanto uma mensagem está postada pelo autor, o delito está em curso. (Depois que Silveira foi em cana, o vídeo foi apagado.) [por determinação do ministro Moraes.]

Pelo andar da carruagem, ainda nesta semana o doutor poderá passar para um regime de tornozeleira, com limitações cautelares. A partir daí, tudo dependerá do seu comportamento. A julgar pela sua conduta respeitosa durante a audiência de custódia de quinta-feira, o que foi combinado ficará de pé. Caso Silveira tenha uma recaída, saindo por aí “cagando e andando” por onde bem entende, cairá de novo na jurisdição de Alexandre de Moraes.

[Alguns exemplos, últimos doze meses e que assustam por ser um processo crescente:
a - final de 2020 um ministro do STF determinou que oficiais-  generais, quatro estrelas, intimados a depor como testemunhas, fossem  conduzidos, se necessário, 'debaixo de vara';  
Felizmente, os generais compareceram ou não ocorreu a audiência, a PF teve o bom senso de não entender necessário à condução na forma autorizada e tudo deu certo.
 
c - de  outra feita, o depoimento do presidente Bolsonaro, na condição de INVESTIGADO, foi exigido em um processo e, nos parece que   o mesmo ministro do STF,  determinou seu  comparecimento à Polícia Federal para depor - cassou as prerrogativas do Presidente da República escolher dia, hora e local, perguntas por escrito,etc . Tudo por entender que o Presidente da República era INVESTIGADO.
Felizmente tudo se ajustou da melhor maneira, achamos que o depoimento ainda não ocorrer.
Dando asas à imaginação, vamos supor que o delegado da PF, expedisse uma intimação ao presidente da República na forma autorizada pelo ministro e no dia, hora e local aprazado, Bolsonaro não comparecesse em função de compromissos inerentes a sua condição de exercer o cargo mais importante do Brasil e o delegado determinasse a condição coercitiva do faltoso.
Óbvio que a PF teria seu acesso ao local de trabalho do 'revel' - Palácio do Planalto, área de segurança e sob a guarda do Exército Brasileiro - e reportasse ao ministro o incidente e este determinasse, no limite,  a prisão da autoridade responsável por 'obstrução de justiça'.  
Situação constrangedora a Polícia Federal adentrando a QRG  - Quadra Residencial de Generais, em pleno SMU - Setor Militar Urbano, para prender o comandante do Exército Brasileiro.
 
Não estamos exagerando.  As situações "a"e "b", expostas,  felizmente não ocorreram.
 
Mas, a prisão do deputado, com base em situação jurídica, “flagrante perenemente possível”, até então inexistente, fundamenta cogitar possível agravamento.
E o Supremo sempre  cultuando, impondo o absolutismo. 
Os exemplos 'a' e 'b' decisões monocráticas e que se esvaíram, tornando desnecessária manifestação do plenário do STF.
O caso do deputado Daniel Silveira, também decisão monocrática, se concretizou e o plenário ratificou em 40 minutos. 
 
A quem recorrer?
 
A propósito: o Brasil tem dois notórios criminosos - um deles multicondenado, sentença ratificada em todas as instâncias, ex-presidente da República e o outro,  Zé Dirceu, condenado a mais de 20 anos - em liberdade, por decisão do Supremo.
 
A quem recorrer?]
 
Villas Bôas também esperou três anos
O general da reserva Eduardo Villas Bôas ironizou o arroubo do ministro Edson Fachin, que considerou “gravíssima” sua revelação dos bastidores da preparação do famoso tuíte de 2018. Nele, o então comandante do Exército prensou o Supremo Tribunal Federal na véspera do julgamento de um habeas corpus impetrado em favor de Lula.
Villas Bôas foi breve: “Três anos depois”.
 
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Folha de S. Paulo - Jornal O Globo - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista


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