O novo embaixador do Reino Unido no Brasil, Peter Wilson, não poderia ter sido mais claro: há dois entraves principais à entrada no Brasil na OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico: desmatamento e respeito aos instrumentos de combate à corrupção da entidade.
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o embaixador apressou-se a dizer que não estava fazendo juízo de valor sobre as políticas brasileiras, nem as condenando, mas apenas apresentando fatos. Ou seja, há uma desconfiança efetiva entre os membros sobre a capacidade e a disposição do governo brasileiro de cumprir aquelas duas exigências básicas.
Mas o que é exatamente a OCDE e quais as vantagens de integrá-la, no mundo de hoje?
A entidade, que tem 60 anos, já foi conhecida como o “clube dos ricos”.
E era mais ou menos isso. Reunia o grupo de países mais desenvolvidos e
destacava-se especialmente como um centro de estudos e pesquisas (think
tank). Mas foram exatamente esses estudos que, pouco a pouco, mudaram a
natureza da instituição. Ela passou a desenhar e fixar políticas para
boa governança, às quais os países membros aderiam.
Boa governança vai de democracia e direitos humanos até a definição de normas para uma eficiente economia de mercado (com livre concorrência) e políticas públicas que promovam o desenvolvimento e o bem estar individual e social. Se quiserem um termo que está na moda, um tipo de liberalismo social ou progressista. Palavras à parte, é fato que a OCDE foi das primeiras a identificar a questão climática e, mais recentemente, foi a primeira a mostrar os danos que a corrupção impõe ao desenvolvimento e à distribuição de renda.
Neste caso, a coisa começou com a definição de instrumentos para que os países membros combatessem juntos a evasão fiscal. Ora, quem esconde dinheiro da Receita é quase sempre porque não tem como explicar a origem. Ou seja, é roubado. Vai daí que não bastava combater a evasão, mas todo o processo de lavagem de dinheiro, um crime internacional. Assim definiram-se regras e formaram-se acordos de cooperação entre Receitas, bancos centrais, ministérios públicos, judiciários, polícias.
Sabem a Lava Jato? Pois é a expressão exata da montagem desse sistema de
combate à corrupção local e internacional. Não esquecer que a Lava Jato
de Curitiba apanhou falcatruas de empreiteiras brasileiras praticadas
mundo afora. Recebeu e prestou informações de parceiros de outros
países.
Em resumo, a OCDE tem normas de combate à corrupção às quais seus membros aderem. É um selo de qualidade.
O mesmo vale para a questão climática. Partiu da OCDE boa parte das
recomendações para que os países adotassem legislações para garantir que
as empresas comprem de cadeias produtivas sustentáveis. O Reino Unido,
por exemplo, já as implantou.
Lula não queria saber da OCDE. Tentou clube, o dos pobres do Sul, um
total fracasso, exceto num ponto: exportou a corrupção para a América
Latina.
No governo Bolsonaro, Paulo Guedes fez profissão de fé liberal e apressou-se a pedir entrada na OCDE. Foi bem recebido no começo. Mas ninguém é bobo nesse mundo. Ao contrário, todo o mundo percebeu a volta do desmatamento com a complacência ou o estímulo do governo. E o desmonte do sistema de combate à corrupção, aplicado pela cúpula do Executivo, do Legislativo e parte do Judiciário.
Um fato, como disse o embaixador britânico, num recado diplomático mas
incisivo. Notou que o Brasil até tem boas metas para a questão ambiental
e bons instrumentos de combate à corrupção. O problema é a prática, que
tem ido no sentido contrário.
Isso afeta a imagem do país e, sobretudo, os negócios. Como notou o
embaixador, investidores são cada vez mais orientados para países com
políticas verdes e sustentáveis.
É o contrário do nosso selo atual, de pária.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
Nenhum comentário:
Postar um comentário