Nesse nobre intuito, deparam-se com obstáculos imprevistos. Um presidente meio tosco, por exemplo, um tipo um tanto falastrão que, não fosse um acidente do destino, poderia estar fazendo piadas sem graça num churrasco qualquer.
Mas está lá, no comando do Executivo, das Forças Armadas, da nação. E resolveu oferecer resistência ao projeto ambicioso e "iluminado" desses deuses togados.
É a areia na engrenagem do sistema, que precisa ser expelida para que tudo volte ao normal, ou seja, aquela roubalheira inevitável para se construir um Novo Mundo.
Não se faz uma omelete sem quebrar uns ovos, não é mesmo? E claro que os nobres fins justificam quaisquer meios, como sabia titio Lenin. Logo, todo esforço da patota iluminada precisa se concentrar em retirar esse obstáculo do caminho paradisíaco.
A mídia, sofrendo de abstinência, entra em peso no projeto, massacrando o presidente diariamente, confundindo-o com o próprio vírus chinês, espalhando Fake News, deturpando cada fato.
Institutos de pesquisa seguem no rastro e projetam o corrupto que não pode sair às ruas como o grande favorito, quiçá levando no primeiro turno. Tudo pronto para o golpe!
Só um detalhe: o povo. Ah, esse ingrato! Não é capaz sequer de entender que tudo que fazem esses iluminados é para seu próprio bem?! São ignaros demais, cegos, alienados, bitolados, fascistas!
Agora o povo resolveu participar de uma enorme manifestação para demonstrar sua força, para lembrar que na própria Constituição resta claro que todo o poder emana dele, do povo. Assim não é possível...
Os deuses precisam agir, impedir esse tipo de absurdo. Prendem um sujeito mais fanfarrão, aprovam ações de busca e apreensão na casa de alguns organizadores, vetam as transferências de recursos, baixam regras que impedem sua aproximação da Praça dos Três Poderes. Se alguns povos enfrentam terroristas como Talibã, Hamas ou Al Qaeda, nós temos o cantor sertanejo octogenário e sua viola em cima de uma colheitadeira...
O projeto é bonito demais para ser estragado por gente assim, simples, pueril. Uma dona de casa mineira, que grava vídeos com deboche (e muitos fatos), não pode ser um entrave entre o sonho e a realidade. Retirem já sua monetização, para ela entender uma coisa! As tias do Zap saem em coro em sua defesa, formando uma multidão, mas quem liga? O projeto é belo demais para se preocupar com picuinhas...
Nessa democracia iluminada, tem de tudo! Tem muita ciência, do tipo que trava perguntas incômodas para repetir verdades reveladas. Tem muita tolerância, desde que o sujeito não venha com manias direitistas. Tem enorme diversidade, com cada um podendo escolher entre os cinquenta tons de vermelho. Tem liberdade a rodo, com cada um livre para escolher como obedecer seus senhores.
A única coisa que esse incrível projeto democrático não reservou qualquer espaço foi para o povo mesmo.
Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
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