O Globo
A reunião do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) com os representantes de plataformas digitais como Facebook,
YouTube, Instagram, Twitter e outras, para definir regras de pagamento a
sites e plataformas durante o período eleitoral com o objetivo de
evitar a propagação de fake news, deveria estabelecer critérios mais
rígidos de monetização das notícias também em tempos além do eleitoral.
Me
incomodou a decisão do corregedor-geral do TSE, ministro Luiz Felipe
Salomão, de proibir o pagamento de qualquer notícia divulgada por canais
bolsonaristas, com a intenção de cessar o financiamento dos blogs que
espalham notícias falsas com objetivos políticos.
A “imprensa
marrom” existe muito antes das redes digitais e deve ser combatida com a
legislação existente quando calunia, difama e constrange cidadãos ou
instituições, ou quando espalha boatos com a intenção de obter lucros
econômicos ou políticos.
A expressão surgiu no fim do século XIX e
vem do inglês “yellow press” (“jornalismo amarelo”). Os jornais New
York World e The New York Journal disputavam as aventuras de Yellow Kid,
a primeira história em quadrinhos. Uma disputa tão pesada que o amarelo
passou a designar publicações sensacionalistas e sem ética.
A
cor para identificar uma imprensa inescrupulosa passou a ser “marrom” no
Brasil em 1959, na redação do jornal carioca Diário da Noite. Para
noticiar um escândalo internacional da época, a manchete se referia à
“imprensa amarela”, como nos jornais dos EUA, mas o editor achou que
amarelo é uma cor muito alegre para classificar notícias escandalosas.
Mudou para “marrom”, cor de excrementos.
Não é diferente com os
meios digitais, com exceção do fato de terem alcance muito maior. O
pagamento por visualizações, pelo número de seguidores, adotado por
todas as plataformas, faz com que o noticiário digital perca
credibilidade a cada dia, embora alcance um número altíssimo de pessoas e
tenha efeito deletério nas relações sociais e políticas.
Mas
punir os que espalham fake news com intervenção nas mídias sociais ou o
bloqueio de financiamento não me parece o melhor caminho. A não ser que o
governo subvencione canais ilegítimos. Críticas, por mais abusivas que
sejam, devem ser aceitas como parte da vida democrática. Somente as
ameaças físicas a cidadãos, não apenas a autoridades, como os ministros
do STF, ou antidemocráticas a instituições deveriam ser interrompidas
por uma intervenção fora dos processos cíveis ou criminais.
Outra
coisa que é preciso rever é a análise por órgãos não especializados de
questões complexas. A Polícia Federal descobriu a pólvora ao explicar
que o noticiário desses blogueiros tornou-se uma máquina de ganhar
dinheiro e que as notícias são replicadas inúmeras vezes para ter maior
alcance e ser recompensadas devido à audiência pelas plataformas
digitais. Ora, esse é o sistema adotado por esses novos meios, que
realmente estimula notícias escandalosas e propagação de fake news, não
apenas políticas ou econômicas.
O que seria preciso mudar é o
conceito das plataformas digitais, que só buscam audiência, sem cuidar
do que é divulgado. Os influenciadores que têm milhões de seguidores e
recebem por isso podem ser inofensivos se tratam de assuntos de
interesse geral. Mas esse sistema de pagamento para notícias políticas e
econômicas precisa ser alterado.
Merval Pereira, colunista - O Globo - MATÉRIA COMPLETA
Nenhum comentário:
Postar um comentário