Alexandre Garcia
"As palavras de qualquer dos três detidos não produziram dano algum à democracia; as prisões deles, sim"
Único voto contrário ao inquérito das fake news, o ministro Marco
Aurélio o denominou de inquérito do fim do mundo e profetizou que seria
sem limites. Foi em 18 de junho do ano passado, quando o Supremo, por 10
a 1, confirmou uma ação baseada em seu próprio regimento interno, em
que o ofendido investiga, denuncia, julga e manda prender.
Esse ônus, o
recém-aposentado Marco Aurélio não carrega em sua biografia.
O inquérito
já tinha 15 meses quando foi assumido pela maciça maioria do Supremo. E
já jogou na cadeia um jornalista, um deputado e, agora, um presidente
de partido.
Magistrados, mestres e estudantes de direto devem estar se
perguntando onde ficaram o devido processo legal e a Constituição.
O pior é a indiferença diante de prisões por opinião —
embora disfarçadas de defesa da democracia.
Na Câmara, mais do que
indiferença, houve aprovação de uma delas. Um parlamentar foi preso, e
fingiram não saber que a Constituição torna deputados e senadores
invioláveis por suas palavras.
Os que fazem cara de paisagem também têm
boca: se tiverem opinião, passam a depender do escrutínio de um juiz, e
não da garantia de uma carta de direitos.
Não aplaudo o estilo de nenhum dos três presos, mas
está escrito na Constituição que é garantida a liberdade de expressão,
sem censura. Para injúria, calúnia e difamação, há o Código Penal;
para
indenização por danos morais, há o Código Civil.
O que não há, em código
algum, é a possibilidade de o próprio ofendido fazer justiça.
Além
disso, as palavras de qualquer dos três não produziram dano algum à
democracia; as prisões deles, sim. Deixam o ranço totalitário da
liberdade condicionada.
Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense
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