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sábado, 11 de setembro de 2021

O Brasil, caminha aos poucos para ter, na área política, um Guantánamo - VEJA

 Por que 39 prisioneiros ainda estão em Guantánamo 20 anos após o 11/09

Muitos desses detentos são chamados de 'prisioneiros eternos', que foram presos sem nenhuma acusação e, portanto, não podem ser julgados  

 Lado externo da prisão americana na Baía de Guantánamo, em Cuba Reuters/VEJA 

Em agosto, o governo de Joe Biden libertou um marroquino que estava detido na Baía de Guantánamo por quase 20 anos, mesmo nunca tendo sido acusado de nenhum crime. Abdul Latif Nasser chegou à prisão de segurança máxima, em Cuba, em 2002, acusado pelos Estados Unidos de ter ligações com o Talibã, mesmo sem nenhuma prova. Em 2016, os americanos permitiram sua libertação, que viria a ocorrer somente cinco anos depois. 

De acordo com o The New York Times, dos 39 presos que são mantidos na prisão, 27 são como Nasser, ou seja, foram detidos pela lei de guerra sem acusação ou julgamento. Chamados de prisioneiros eternos, esses indivíduos não foram acusados e nunca devem ser julgados, porém o governo os considera perigosos demais para serem soltos. 

Segundo Kevin Powers, advogado que trabalhou como consultor jurídico em alguns casos na Baía de Guantánamo entre 2011 e 2013, esses prisioneiros não seguiram as regras de combate sob o regime de guerra internacional, portanto eles não têm os direitos que um prisioneiro de guerra deveria ter.  Desse modo, os Estados Unidos podem mantê-los detidos sem apresentar qualquer acusação  até o fim das hostilidades, uma vez que o país ainda se considera em guerra com a Al-Qaeda. 

Desde 2013, um grupo de seis agências governamentais americanas revisam ocasionalmente os casos desses detidos. Semelhante a um conselho de liberdade condicional, o comitê já permitiu a liberação de 10 detentos dos 27 que não foram acusados desde que Biden chegou ao poder. No entanto, as suas liberações seguem atrasadas. Após a libertação, o detido é enviado para algum país que concorde em mantê-lo sob algumas normas de segurança exigidas pelos Estados Unidos. Esse processo envolve, na maioria das vezes, um acordo diplomático entre os governos, o que alonga ainda mais a tramitação. 

No entanto, o Secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse ao Congresso em junho que o governo Biden planeja designar alguém para trabalhar em tempo integral na organização das transferências e do fechamento de Guantánamo. Além dos 27 prisioneiros eternos, os outros 12 restantes na prisão foram, de fato, acusados de crimes de guerra e aguardam julgamento há anos. Especialistas afirmam que essa situação é mais complexa do que aqueles que não foram processados por crime algum. 

O principal motivo para a demora é o fato desses prisioneiros não estarem sendo julgados em um tribunal federal americano. Ao invés disso, são julgados por uma comissão militar sob um sistema legal estabelecido e administrado pelos militares, de acordo com a Lei e Comissões Militares de 2009. Isolada em uma costa rochosa a vários quilômetros da principal base naval de Guantánamo, a instalação ganhou notoriedade como resultado da operação da CIA para capturar membros suspeitos da Al-Qaeda e transferi-los secretamente para seus centros de detenção clandestinos espalhados ao redor do mundo.

Ao longo dos anos, a prisão se tornou um enorme problema para o governo dos Estados Unidos, que foi acusado de abusar dos direitos humanos. O ex-presidente Barack Obama chegou a ordenar o fechamento de Guantánamo dentro de um ano em 2009, porém a medida foi bloqueada por parlamentares republicanos. Mesmo sem obter sucesso no fechamento, Obama conseguiu a liberação da maioria dos detentos durante seus anos de governo, diminuindo o número de prisioneiros de 240 para 41. Durante o governo de Donald Trump, as libertações foram congeladas e o ex-presidente ameaçou encher mais celas com membros do Estado Islâmico.

Joe Biden já se mostrou a favor de fechar definitivamente o complexo prisional, porém analistas acham pouco provável que o atual chefe de estado siga o mesmo caminho de Obama, uma vez que o fracasso pode ser o mesmo. No entanto, Biden tem pressionado pela libertação silenciosa daqueles que não serão julgados. 

Mundo - Revista VEJA


segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Cabe às Forças Armadas moderar os conflitos entre os Poderes - Ives Gandra da Silva Martins

Um pouco da sabedoria de Ives Gandra sobre o artigo 142 da Constituição Federal

Tendo participado de audiências públicas, durante o processo constituinte, a convite de parlamentares eleitos em 1986, assim como, repetidas vezes, apresentado sugestões ao então presidente da Câmara dos Deputados, Ulysses Guimarães, relator Bernardo Cabral e presidentes de Comissões e Subcomissões, sempre que solicitado, decidi com Celso Bastos comentar o texto supremo, em 15 volumes, por 10 anos (1988-1998), em edições e reedições veiculadas pela Editora Saraiva.
 
(.........) 
 

O Título V da Carta da República corresponde ao volume 5, que ficou a meu cargo. Cuida de dois instrumentos legais para a defesa do Estado e das instituições democráticas (Estado de Defesa e de Sítio) e das instituições encarregadas de proteger a democracia e os poderes (Forças Armadas, Polícias Militares, Polícia Civil e Guardas Municipais).

Na 5ª parte da Lei Maior, por sua abrangência nacional e missão de proteção da soberania nacional, as Forças Armadas passaram a ter um tratamento diferenciado (artigos 142 e 143), tratamento este alargado quanto às demais corporações, pelas próprias atribuições outorgadas pelo constituinte às três Armas.

As funções determinadas pelo Constituinte estão no artigo 142, assim redigido:

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

Percebe-se que três são as atribuições das Forças Armadas, alicerçadas na hierarquia e disciplina, a saber:

  1. Defesa da pátria;
  2. Garantia dos poderes constitucionais;
  3. Garantia da lei e da ordem, por iniciativa de qualquer dos três Poderes.

A palavra "Pátria" aparece pela primeira e única vez neste artigo da Lex Magna.

Sobre a defesa da Pátria até mesmo os alunos do pré-primário sabem que o país será defendido contra eventuais invasões de outras nações pelas Forças Armadas. Não oferece qualquer dúvida.Sobre a garantia dos poderes contra manifestações de qualquer natureza, compreende-se, lembrando-se que, nos estados de defesa e de sítio as polícias militares, civil e guarda municipal são coordenadas pelas Forças Armadas.

A terceira função, todavia, é que tem merecido, nos últimos tempos, discussão entre juristas e políticos se corresponderia ou não a uma atribuição outorgada às Forças Armadas para repor pontualmente lei e a ordem, a pedido de qualquer Poder.

Minha interpretação, há 31 anos, manifestada para alunos da universidade, em livros, conferências, artigos jornalísticos, rádio e televisão é que NO CAPÍTULO PARA A DEFESA DA DEMOCRACIA, DO ESTADO E DE SUAS INSTITUIÇÕES, se um Poder sentir-se atropelado por outro, poderá solicitar às Forças Armadas que ajam como Poder Moderador para repor, NAQUELE PONTO, A LEI E A ORDEM, se esta, realmente, tiver sido ferida pelo Poder em conflito com o postulante.

Alguns juristas defendem a tese que a terceira atribuição e a segunda se confundem, pois para garantir as instituições, necessariamente, estarão as Forças Armadas garantindo a lei e a ordem, já que o único Poder Moderador seria o Judiciário.  Parece-me incorreta tal exegese, muito embora eu sempre respeite as opiniões contrárias em matéria de Direito. Tinha até mesmo o hábito de provocar meus alunos de pós graduação da Universidade Mackenzie a divergirem de meus escritos, dando boas notas àqueles que bem fundamentassem suas posições. É que não haveria sentido de o constituinte usar um "pleonasmo enfático" no artigo 142 da Carta Magna, visto que a Lei Suprema não pode conter palavras inúteis.

A própria menção à solicitação de Poder para garantir a lei e a ordem sinaliza uma garantia distinta daquela que estaria já na função de assegurar os poderes constitucionais, como atribuição das Forças Armadas.

Exemplifico: vamos admitir que, declarando a inconstitucionalidade por omissão do Parlamento, que é atribuição do STF, o STF decidisse fazer a lei que o Congresso deveria fazer e não fez, violando o disposto no artigo 103, parágrafo 2º, assim redigido:

Art. 103. (...) § 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.”

Ora, se o Congresso contestasse tal invasão de competência não poderia recorrer ao próprio STF invasor, apesar de ter pelo artigo 49, inciso XI, a obrigação de zelar por sua competência normativa perante os outros Poderes. Tem o dispositivo a seguinte redação:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

(...) XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;

Pelo artigo 142 da CF/88 caberia ao Congresso recorrer às Forças Armadas para reposição da lei (CF) e da ordem, não dando eficácia àquela norma que caberia apenas e tão somente ao Congresso redigir. Sua atuação seria, pois, pontual. Jamais para romper, mas para repor a lei e a ordem tisnada pela Suprema Corte, nada obstante — tenho dito e repetido — constituída, no Brasil, de brilhantes e ilustrados juristas.

O dispositivo jamais albergaria qualquer possibilidade de intervenção política, golpe de Estado, assunção do Poder pelas Forças Armadas. Como o Título V, no seu cabeçalho, determina, a função das Forças Armadas é de defesa do Estado E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS. Não poderiam nunca, fora a intervenção moderadora pontual, exercer qualquer outra função técnica ou política. Tal intervenção apenas diria qual a interpretação correta da lei aplicada no conflito entre Poderes, EM HAVENDO INVASÃO DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA OU DE ATRIBUIÇÕES.

No que sempre escrevi, nestes 31 anos, ao lidar diariamente com a Constituição — é minha titulação na Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie —, é que também se o conflito se colocasse entre o Poder Executivo Federal e qualquer dos dois outros Poderes, não ao Presidente, parte do conflito, mas aos Comandantes das Forças Armadas caberia o exercício do Poder Moderador.

Nada obstante reconhecer a existência de opiniões contrárias, principalmente dos eminentes juristas que compõem o Pretório Excelso, não tenho porque mudar minha inteligência do artigo 142
Como não sou político, mas apenas um velho advogado e professor universitário, que sempre buscou exercer a cidadania, continuarei a interpretar, academicamente, o artigo 142, como agora o fiz, com o respeito que sempre tive às opiniões divergentes, não me importando com as críticas menos elegantes dos que não concordam comigo. John Rawls dizia que as teorias abrangentes são próprias das vocações totalitárias, que não admitem contestação. Só são democráticas as teorias não abrangentes, pois estas admitem contestação e diálogo.

Aos 85 anos, felizmente não perdi o meu amor ao diálogo e à democracia.

MATÉRIA COMPLETA e comentários -  Revista Consultor Jurídico.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifeo, Unimeo, do CIEE-SP, das escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), superior de Guerra (ESG) e da magistratura do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, professor honorário das Universidades Austral (ARG), San Martin de Porres (PER) e Vasili Goldis (ROM), doutor honoris causa das Universidades de Craiova (ROM) e da PUC-PR e RS, e catedrático da Universidade do Minho (POR); presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio (SP); ex-presidente da Academia Paulista de Letras e do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo).

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Transparência Internacional diz que processará Conjur e a mim. Veja por quê - Reinaldo Azevedo

Transparência Internacional diz que processará Conjur e a mim. Veja por quê ... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2020/12/08/transparencia-internacional-diz-que-processara-conjur-e-a-mim-veja-por-que.htm?cmpid=copiaecola

 Coluna no UOL

A Transparência Internacional afirmou em nota que vai processar o site Consultor Jurídico e este blog porque chama de "ataques caluniosos" um texto publicado no primeiro e aqui reproduzido com comentário. Se acontecer, enfrente-se o debate. Agora que estou com todos os documentos em mãos, sustento que o bicho é ainda mais feio do que imaginei. A ONG atua no Brasil há mais de vinte anos. Só em 2017, quando celebrou um estranho acordo com uma facção do MPF, decidiu ter um CNPJ, o que a identifica como aquilo que é: uma entidade privada. Já vimos em outros eventos que a Transparência Internacional atua em parceria com a Lava Jato de Curitiba. E por que a zanga da direção da TI?

O site consultor jurídico tornou pública a informação de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, encaminhou à coordenadora da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão de combate à corrupção do MPF, subprocuradora Maria Iraneide Olinda Santoro Facchini, um memorando em que lembra o conteúdo da Cláusula 16, Inciso VII, do Acordo de Leniência da J&F, holding a que pertence a JBS, que prevê o pagamento de uma multa de R$ 10,3 bilhões ao longo de 25 anos. O acordo reserva a fabulosa quantia de R$ 2,3 bilhões para "projetos sociais em áreas temáticas relacionadas num apêndice", que, atenção!, serão geridos por uma "entidade a ser constituída".

Aras informa em seu memorando, que, no tal apêndice, "as partes concordam com a viabilidade e a coerência de se contar com o apoio da TI no desenho e estruturação do sistema de governança do desempenho dos recursos dedicados a projetos sociais que são parte das obrigações impostas à J&F. Além disso, os signatários registram ainda ciência e concordância com o auxílio da TI na apresentação de um projeto de investimento na prevenção e no controle social da corrupção (...), com uma estratégia (...) que priorize o fortalecimento e capacitação da sociedade civil (...)"

Aras conclui, então, o óbvio, prestem atenção: "Evidente que uma organização privada irá administrar a aplicação de recursos de R$ 2,3 bilhões nos investimentos sociais previstos nos acordos de leniência, sem que se submeta aos órgãos de fiscalização e controle do Estado. A Transparência Internacional é uma organização não governamental sediada em Berlim. Cuida-se de instituição de natureza privada, cuja fiscalização escapa da atuação do Ministério Público Federal".

É claro que, em tudo, esse acordo lembra a tal fundação que Deltan Dallagnol queria criar com recursos de multa paga pela Petrobras e que foi suspenso pelo Supremo. No memorando, Aras observa que já foram liberados, no começo do mês, R$ 270 milhões desses R$ 2,3 bilhões cuja destinação será decidida, dado o entendimento feito, pela TI. Ou aquilo não vale? E foi isso o que Conjur e este blog informaram, com base em documentos oficiais. Ninguém está acusando a ONG de roubar o dinheiro. Questiono é a autoridade de uma entidade privada, escolhida a dedo, para decidir a destinação de recursos bilionários que não pertencem aos procuradores, mas ao Tesouro, como já deixou claro o STF.

Aras afirma em seu memorando que a 5ª Câmara simplesmente ignorava os termos do pacto entre essa facção do MPF e a TI. Daí que, com acerto, o procurador-geral peça em seu memorando que o dinheiro liberado seja revertido para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos e que se promova uma apuração da destinação de outras garantias milionárias já pagas por força do acordo de leniência. Onde está o dinheiro?  
Que responsabilidade tem a J&F num troço como esse? Nenhuma! Vocês acham mesmo que uma empresa que está fazendo um acordo de leniência, com diretores cuidando de acordos de delação, tem poder de escolha? Se nem a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão de combate à corrupção do MPF sabia dos termos deletérios do entendimento, é claro que à empresa cumpria aceitar. Afinal, para todos os efeitos, os senhores procuradores falavam pelo Estado brasileiro.
 
Reinaldo Azevedo, jornalista - Coluna no UOL
 

 Um pequeno trecho: .........TI destaca que não será remunerada pelo trabalho. Sim, isso consta do apêndice. E daí? Quem lhe deu competência, direito ou exclusividade para, na prática, gerir recursos do povo brasileiro? A TI é uma ONG ocupada em combater a corrupção, uma desenvolvedora de startups sociais ou ente paraestatal ligada a frações do MPF?.................
TI destaca que não será remunerada pelo trabalho. Sim, isso consta do apêndice. E daí? Quem lhe deu competência, direito ou exclusividade para, na prática, gerir recursos do povo brasileiro? A TI é uma ONG ocupada em combater a corrupção, uma desenvolvedora de startups sociais ou ente paraestatal ligada a frações do MPF?... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2020/12/08/acordo-mpf-transparencia-cria-pais-independente-com-dinheiro-publico-pode.htm?cmpid=copiaecola
 
 
 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Juiz das garantias: avanço necessário! - Consultor Jurídico

Ney Bello

[o direito dos leitores concede aos que estão equivocados o direito de apresentar seus argumentos.]

Nas vésperas cristãs, o país viu publicarem diversas modificações nos seus diplomas penal e processual penal. As alterações legislativas, após vetos e sanções presidenciais, mergulharam todos -—na viragem da década — na discussão acerca da correção ou inviabilidade do juiz das garantias. Mas do que se trata? 
Qual o erro ou onde reside o acerto da partição da competência funcional do magistrado criminal entre juízo de atuação no processo cautelar e juízo de instrução e julgamento? 
Quais as motivações da criação e da crítica ao seu surgimento?

Duas observações preliminares: em primeiro lugar, é preciso verificar que a criação do juiz das garantias não é uma jabuticaba ou invenção tupiniquim! Nesse tema, nós não estamos sós no mundo do direito! Com algumas modificações referentes às peculiaridades locais, o modelo se repete em Portugal, na Itália e na Alemanha. [o diabo mora nos detalhes e as adaptações às peculiaridaddes regionais são os detalhes no caso brasileiro.
No Brasil quanto mais se detalha, mais se abre espaço para recursos absurdos e que buscam 'esclarecimentos']

Em segundo lugar, é preciso esclarecer exatamente o que a medida significa. A criação basicamente estabelece que o juiz que atua no processo emergencial cautelar, que defere quebras de sigilo, busca e apreensão, prisão preventiva ou temporária, homologa delação premiada e atua na revoada original de coleta de provas antes da formalização da acusação não será o juiz que instruirá o processo, que analisará os argumentos maduros da acusação e da defesa, e nem será o magistrado que julgará a causa, para absolver ou condenar.

As novas redações dos artigos 3°A e 3°B do Código de Processo Penal estabelecem a proibição de que o juiz produza provas, não podendo determiná-las de ofício, e também criam uma diferenciação funcional. O juiz atuante na fase do inquérito terá de ser distinto do magistrado que processa o caso. Que equívoco dogmático há nisso? A modificação legal — em consonância com o que se faz no mundo ocidental — tem o condão de proteger a imparcialidade do magistrado que instrui e decide o processo, separando definitivamente quem acusa de quem julga, restabelecendo o equilíbrio entre defesa e acusação no processo criminal.


Isso é salutar na medida em que o envolvimento do magistrado com a parte proponente e com as justificativas para medidas invasivas e cautelares, deferindo produção antecipada de provas, decretando prisão e homologando acordos de colaboração premiada, ineludivelmente compromete a isenção, porque o próprio deferimento de medidas dessa natureza implica o comprometimento, ainda que parcial, com a tese de acusação, aluindo a raiz do exercício da magistratura, que é a imparcialidade! Um juiz defere medidas cautelares e produz provas antes da formalização da acusação. Outro juiz analisa tudo sob o enfoque da argumentação jurídica sobre normas e fatos produzidos pelo Ministério Público e pelo réu... e sentencia!
Este o modelo moderno!
E por qual razão tamanha reação?


Noves fora a conta das compreensões e satisfações pessoais, que não produzem boa dogmática, a razão da grita está na paixão da magistratura por um modelo de concentração de poder. Também está no temor que parte dela possui da perda de importância da função do magistrado criminal punitivista.

Explico.

Quando um só magistrado recebe o tombo do inquérito e controla a investigação, é ele quem observa viabilidade no que a polícia propõe, concorda com o Ministério Público e vê necessidade da prisão preventiva e das quebras de sigilo. Assim, ele controla a investigação. Quando esse mesmo magistrado recebe a denúncia e defere ou indefere provas, analisa argumentos que já conhece desde o começo e ao final condena, ele tem total controle sobre o processo penal, e exerce sobre o mesmo uma tutela de poder que se confunde com a acusação!

O juiz combatente, uma falácia da pós modernidade, nada mais é do que o general do exército inimigo julgando as fileiras dos adversários! Terá ele isenção e imparcialidade? O moto condutor da crítica vincula-se mais à perda desse poder de fato — de cariz punitivista — do que a qualquer déficit de coerência dogmática do sistema. Mas há outras justificativas aparentes para a negação da medida. Há quem sustente que isso oneraria o orçamento do Poder Judiciário.


Não parece ser um bom argumento.O eventual gasto com reaparelhamento do Judiciário para implementação da medida é bem mais justificável do que gastos com Auxílio Moradia, Gratificação de Acúmulo de Jurisdição e outros equívocos.
 De igual lanço, não parece ser procedente argumentar no sentido da inviabilidade material da implementação da medida quando há um só juiz na comarca ou subseção judiciária. O PJE existe, e já foram investidas cifras imensas com seu desenvolvimento. Um processo judicial eletrônico permitirá facilmente que o juízo de outra comarca ou subseção atue na diferenciação funcional — e vice-versa — em lugares de um só magistrado. A modernidade da Justiça Criminal passa por um processo eletrônico capaz de contribuir para a afirmação de direitos fundamentais. Demais disso, não parece razoável impor ao cidadão um déficit de suas garantias pela só razão de os Tribunais optarem por orçamentos com outras prioridades. Não são ponderáveis direitos individuais e gastos instrumentais. Dessa maneira, esse problema específico resolve-se com tecnologia e com melhores escolhas orçamentárias.


Há também um argumento contrário que vê no juiz de garantias uma quebra do princípio do juiz natural. Equívoco dogmático, com permissão dos que assim veem.
Juiz natural no processo penal é o juiz com competência prévia e jurisdição definida. Ora, se a própria lei assim o estabelece, de onde a quebra do princípio? Se a norma produzida, sancionada e publicada afirma que o juiz das medidas cautelares é diferente do juiz da instrução e da sentença, o juiz natural é exatamente aquele a quem a lei atribui a competência para tanto! Não há direito adquirido do juiz a julgar todos os incidentes de eventuais processos futuros! A jurisdição e a competência só existem em razão da lei, o que implica a constitucionalidade óbvia de qualquer modificação de competência funcional!

Mas há algo no ethos de boa parte dos magistrados — e ex-magistrados — que explica a compreensão equivocada de que o juiz de garantias é um mal. Parece que uma afirmação pode descalvar a essência dessa crítica: triste a sociedade que necessita de heróis! Esse o ponto! É a perda de impacto do juiz Marvel — do nosso Capitão América de toga — que permite reações exageradas contra a medida dogmaticamente acertada e procedimentalmente correta.

Com a repartição funcional, o juiz que brilha nos noticiários junto às megaoperações e lê a si mesmo como herói perde importância e capilaridade. Isso ocorre na medida em que deixa de se confundir com a própria acusação e com o combate ao crime. É o juiz combatente que passa a ser — se a distorção permanecer — somente um combatente, deixando de ser juiz, e é o juiz do processo que se mantém sem lado no combate, preservando a imparcialidade da sua função. O exercício da magistratura criminal não se confunde com Santa Inquisição e nem com a parceria entre juiz e acusação nos processos criminais! Com acerto, o Congresso Nacional, quando criou a medida do juiz de garantias, alinhou o Brasil com o que há de mais avançado nos países modernos.

Com acerto, o Presidente da República que sancionou tão importante medida processual penal!

Ney Bello, desembargador TRF 1ª Região -Consultor Jurídico


quarta-feira, 4 de abril de 2018

Um artigo fundamental de Lenio Streck e a mentira burra e terrorista de que cumprir a Constituição soltará facínoras e pedófilos

Nunca estive com o jurista Lenio Luiz Streck, que é professor de Direito Constitucional e pós-doutor na área. Também atua como advogado. 

 

Vamos nos encontrar pela primeira vez num seminário internacional de Direito, para o qual tiveram a ousadia de me convidar. Que coisa, justo eu… O que tem de advogado mixuruca que tenta me ofender, acusando-me de não entender nada da área…  Felizmente, dos que importam, até agora, nenhum. E, para não variar, mais vomitam os irrelevantes.

Lenio tem algumas qualidades que aprecio, além de ter lido a Constituição e algumas outras coisinhas. É inteligente. Escreve bem. Tem um refinado senso de ironia. E, bem, não foge à polêmica. Pesquisem a origem da palavra: vem de “guerra”, de “combate”. Por extensão, a pessoa “polêmica” é aquela que não foge dos embates. Ainda que, muitas vezes, surpreenda amigos e inimigos. Fazer o quê? Como é mesmo o Carlos Drummond de “O lutador”? “Lutar com palavras/ é a luta mais vã./ Entanto lutamos/ mal rompe a manha./ São muitas, eu pouco (…) Tamanha paixão/ e nenhum pecúlio./ Cerradas as portas,/ a luta prossegue/ nas ruas do sono.”


Pois bem. Lenio escreveu um excelente artigo no site “Consultor Jurídico”, intitulado “A presunção da inocência e meu telescópio: 10 pontos para (não) jejuar”, numa alusão, claro, a Deltan Dallagnol, aquele que tem certeza de que Deus segue as suas orientações…  Lenio traz argumentos essenciais ao debate — o que os defensores do esbulho constitucional não fazem porque, afinal, como sabemos, já que eles têm as boas intenções, que povoam o inferno, argumentar pra quê? É de leitura obrigatória.

O especialista evidencia, por exemplo, que o que se quer de verdade, na prática, é mandar para a cadeia os escolhidos para ir para a cadeia mesmo que  “haja nulidade de provas, inversão do ônus probatório, escutas clandestinas ‘de boa-fé’ (afinal, prova é crença, diz-se já por aí) etc.” Sim, é o que eu também acho. 

[Em que pese a ótima qualidade das matérias postadas de autoria do Reinaldo de Azevedo e a recomendação que ele faz do artigo do jurista Lenio Streck, temos algumas considerações a fazer, especialmente sobre o que nos parece expressar o entendimento que a prisão preventiva possa substituir a prisão para  execução de pena.
A prisão preventiva no Brasil tem sido usada de acordo com a conveniência do momento e a importância do réu, o que relega a existência dos requisitos exigidos no CPP a um segundo plano.

Temos casos em que a prisão preventiva que está sendo usada como 'prisão perpétua à brasileira' = sabemos quando começou a pena,  mas não se sabe quando termina;

Salvo engano, o Sérgio Cabral, condenado a penas que já alcançam os 100 anos, não teve nenhuma condenação confirmada em segunda instância - se ele fosse o Lula estaria livre, leve e solto, fazendo caravanas, xingando a Corte Suprema, fazendo ameaças, tentando insuflar sua militância, estimulando ação de paramilitares (quando Lula chama o amontoado de marginais do MST de exército do Stédile incentiva o paramilitarismo, que é vedado pela Constituição); 
mas por não ser o Lula está preso, ao que consta não pelos cem anos de penas a cumprir e sim por força de uma mandado de prisão preventiva.

Isso faz com que a prisão preventiva se apresente mais como um instrumento a ser usado em determinadas circunstâncias e dependendo do candidato a ser preso (aliás no Brasil se consegue coisas que até Deus duvida: submetem um cidadão a prisão temporária para evitar o constrangimento de ser conduzido coercitivamente - ser preso por cinco dias, podendo a prisão ser prorrogada por mais cindo dias, constrange menos que ser conduzido pela polícia para depor!!!).
No momento em que o Supremo cometer a ignomínia  a favor da impunidade de impedir a prisão após a segunda instância, centenas de bandidos estarão livres, leves e soltos.

Qualquer criminoso - corrupto, corruptor, latrocida, pedófilo, estuprador, traficante de pessoas para fins sexuais e outros crimes classificados como hediondos - condenado em segunda instância, mas sem trânsito em julgado, tendo um bom advogado será libertado e poderá continuar cometendo crimes, sendo apenas mais cuidadoso para não ser flagrado. A lei vale para todos e não haverá interesse em mandar prender preventivamente tantos marginais.
Finalizamos com uma pergunta:
- se o Sérgio Cabral, Eduardo Cunha e muitos outros estão presos, sem que suas sentenças tenham transitado em julgado, qual a razão do Lula não estar preso? qual o motivo de só para ele ser válido o direito a só ser preso após o trânsito em julgado?
Lula foi condenado por NOVE JUÍZES - um singular, três desembargadores do TRF-4, e cinco ministro do STJ - e ainda é réu em sete processos penais.].


Na prática, esses valentes e aqueles que aderem às suas teses estão criando as condições básicas para um Estado autoritário. Se será de direita, de esquerda ou de coisa nenhuma, bem, que diferença faz? Autoritários se estreitam no abraço insano do ódio à democracia. Até cheguei a supor que se conseguiria criar no Brasil uma direita realmente liberal, que tivesse a democracia como imperativo categórico e que não cedesse à tentação mais óbvia e corriqueira na política: a instrumentalização das regras para criar o “direito penal do inimigo”, “para o inimigo” e, por consequência, para os amigos.  Mas eu estava errado. Não temos isso. Quem sabe um dia… Mas isso não é uma esperança; trata-se apenas de exercitar uma possibilidade. Adiante.

Destaco, ente os 10 pontos fulcrais de que trata Lênio, o item 7, que transcrevo: “Olhando com mais cuidado e sem fanatismo, os adeptos da prisão em segundo grau veriam que nós, defensores da constitucionalidade do artigo 283 do CPP, jamais falamos que prisões estão proibidas. Tendo os requisitos da preventiva, deve a pessoa responder ao processo presa. Isso não mudou nem mesmo em 2009.


Esse ponto é fundamental. É uma falácia, uma mentira, uma vigarice essa história de que o cumprimento da Constituição levaria para a rua pedófilos, traficantes e toda sorte de monstros.[???] Os Artigos 312 e 319 do Código de Processo Penal continuam em plena vigência, como estavam antes. Havendo os motivos para a prisão preventiva e para as medidas cautelares, nada impede que condenados em segunda instância, antes do trânsito em julgado, ou fiquem presas ou tenham seus movimentos tolhidos por medidas inferiores à prisão, mas, ainda assim, restritivas da liberdade.

Esse é um argumento terrorista. É só mais uma maneira de tentar ganhar o debate no berro.

Blog do Reinaldo Azevedo

[LEMBRETE: gostem ou não, a ministra Cármen Lúcia  tem o DIREITO de manter na íntegra a pauta para o mês de abril.
Quanto a pauta de MAIO continua sendo a definição dos assuntos de exclsuvia competência da presidente do STF.]