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quarta-feira, 27 de março de 2019

Sem autocrítica, texto que será lido nos quartéis em 31 de março cita 'lições aprendidas'



Documento assinado pelo ministro da Defesa e pelos comandantes das Forças Armadas justifica tomada do poder pelos militares na década de 60 e não fala em comemorações

No texto que será lido em quartéis do País no próximo domingo, 31, em comemoração aos 55 anos do golpe militar, as Forças Armadas afirmam "reconhecer" o papel desempenhado por aqueles que, ao se depararem com os desafios próprios da época, 'agiram conforme os anseios da Nação Brasileira". 

Como antecipado pelo Estado, o texto único ressalta as “lições aprendidas” no período, mas sem qualquer autocrítica aos militares. O período ficou marcado pela morte e tortura de dezenas de militantes políticos que se opuseram ao regime. 
O documento é assinado pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo, e pelos comandantes da Marinha, Ilques Barbosa Junior, do Exército, Edson Leal Pujol, e da Aeronáutica, Antonio Bermudez. 

 Ao final da matéria, texto completo da Ordem do Dia

"O 31 de março de 1964 estava inserido no ambiente da Guerra Fria, que se refletia pelo mundo e penetrava no País. As famílias no Brasil estavam alarmadas e colocaram-se em marcha. Diante de um cenário de graves convulsões, foi interrompida a escalada em direção ao totalitarismo. As Forças Armadas, atendendo ao clamor da ampla maioria da população e da imprensa brasileira, assumiram o papel de estabilização daquele processo", diz trecho do texto. 
 O Ministério da Defesa e os comandantes das Forças também dizem que as Forças Armadas "reafirmam o compromisso com a liberdade e a democracia, pelas quais têm lutado ao longo da História". 

Em outro trecho, afirmam que em 1979 "um pacto de pacificação foi configurado na Lei da Anistia e viabilizou a transição para uma democracia que se estabeleceu definitiva e enriquecida com os aprendizados daqueles tempos difíceis". "As lições aprendidas com a História foram transformadas em ensinamentos para as novas gerações. Como todo processo histórico, o período que se seguiu experimentou avanços." 

"As Forças Armadas, como instituições brasileiras, acompanharam essas mudanças. Em estrita observância ao regramento democrático, vêm mantendo o foco na sua missão constitucional e subordinadas ao poder constitucional, com o propósito de manter a paz e a estabilidade, para que as pessoas possam construir suas vidas", afirmam o ministro da Defesa e os comandantes das Forças.
Como revelado pelo Estado, o presidente Jair Bolsonaro orientou os quartéis a comemorarem a “data histórica” do aniversário do dia 31 de março de 1964, quando um golpe militar derrubou o governo João Goulart e iniciou um regime ditatorial que durou 21 anos.
Generais da reserva que integram o primeiro escalão do Executivo, porém, pedem cautela no tom para evitar ruídos desnecessários diante do cl ditadura militar nima político acirrado e dos riscos de polêmicas em meio aos debates da reforma da Previdência.  

Nesta quarta, Bolsonaro voltou a dizer que não houve ditadura militar no Brasil. Em entrevista ao programa do Datena, na TV Band, Bolsonaro afirmou que as comemorações do 31 de março ficarão restritas aos quartéis militares e serão feitas apenas a leitura de datas relativas ao que ele chama de revolução democrática de 1964.
"Vamos citar as datas, os números. Só isso", disse. O presidente afirmou que, na época, os jornais e organizações civis defenderam a saída do ex-presidente João Goulart do poder. Ele também minimizou o fechamento do Congresso Nacional ao comparar a edição de decretos-lei e a edição de medidas provisórias pelos governos pós-ditadura e disse que o regime militar não acabou com as liberdades individuais no país.

Confira o texto completo da ordem do dia: 

As Forças Armadas participam da história da nossa gente, sempre alinhadas com as suas legítimas aspirações. O 31 de Março de 1964 foi um episódio simbólico dessa identificação, dando ensejo ao cumprimento da Constituição Federal de 1946, quando o Congresso Nacional, em 2 de abril, declarou a vacância do cargo de Presidente da República e realizou, no dia 11, a eleição indireta do Presidente Castello Branco, que tomou posse no dia 15.
 
Enxergar o Brasil daquela época em perspectiva histórica nos oferece a oportunidade de constatar a verdade e, principalmente, de exercitar o maior ativo humano - a capacidade de aprender.
 
Desde o início da formação da nacionalidade, ainda no período colonial, passando pelos processos de independência, de afirmação da soberania e de consolidação territorial, até a adoção do modelo republicano, o País vivenciou, com maior ou menor nível de conflitos, evolução civilizatória que o trouxe até o alvorecer do Século XX.
O início do século passado representou para a sociedade brasileira o despertar para os fenômenos da industrialização, da urbanização e da modernização, que haviam produzido desequilíbrios de poder, notadamente no continente europeu.
 
Como resultado do impacto político, econômico e social, a humanidade se viu envolvida na Primeira Guerra Mundial e assistiu ao avanço de ideologias totalitárias, em ambos os extremos do espectro ideológico. Como faces de uma mesma moeda, tanto o comunismo quanto o nazifascismo passaram a constituir as principais ameaças à liberdade e à democracia.
 
Contra esses radicalismos, o povo brasileiro teve que defender a democracia com seus cidadãos fardados. Em 1935, foram desarticulados os amotinados da Intentona Comunista. Na Segunda Guerra Mundial, foram derrotadas as forças do Eixo, com a participação da Marinha do Brasil, no patrulhamento do Atlântico Sul e Caribe; do Exército Brasileiro, com a Força Expedicionária Brasileira, nos campos de batalha da Itália; e da Força Aérea Brasileira, nos céus europeus.
 
A geração que empreendeu essa defesa dos ideais de liberdade, com o sacrifício de muitos brasileiros, voltaria a ser testada no pós-guerra. A polarização provocada pela Guerra Fria, entre as democracias e o bloco comunista, afetou todas as regiões do globo, provocando conflitos de natureza revolucionária no continente americano, a partir da década de 1950.
 
O 31 de março de 1964 estava inserido no ambiente da Guerra Fria, que se refletia pelo mundo e penetrava no País. As famílias no Brasil estavam alarmadas e colocaram-se em marcha. Diante de um cenário de graves convulsões, foi interrompida a escalada em direção ao totalitarismo. As Forças Armadas, atendendo ao clamor da ampla maioria da população e da imprensa brasileira, assumiram o papel de estabilização daquele processo.
 
Em 1979, um pacto de pacificação foi configurado na Lei da Anistia e viabilizou a transição para uma democracia que se estabeleceu definitiva e enriquecida com os aprendizados daqueles tempos difíceis. As lições aprendidas com a História foram transformadas em ensinamentos para as novas gerações. Como todo processo histórico, o período que se seguiu experimentou avanços.
 
As Forças Armadas, como instituições brasileiras, acompanharam essas mudanças. Em estrita observância ao regramento democrático, vêm mantendo o foco na sua missão constitucional e subordinadas ao poder constitucional, com o propósito de manter a paz e a estabilidade, para que as pessoas possam construir suas vidas.
Cinquenta e cinco anos passados, a Marinha, o Exército e a Aeronáutica reconhecem o papel desempenhado por aqueles que, ao se depararem com os desafios próprios da época, agiram conforme os anseios da Nação Brasileira. Mais que isso, reafirmam o compromisso com a liberdade e a democracia, pelas quais têm lutado ao longo da História.

O Estado de S. Paulo

 

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Cassando carta branca 1: Bolsonaro evidencia em entrevista que ele decide a Previdência, não Guedes, de cujo modelo afirma ainda desconfiar

A entrevista concedida por Jair Bolsonaro (PSL), presidente eleito, a Jose Luiz Datena, no programa “Band Urgente”, na tarde desta segunda, teve mais importância do que pareceu à primeira vista. Bolsonaro cassou ali duas cartas brancas que teria dado: a Paulo Guedes, superministro da Economia, e a Sérgio Moro, superministro da Justiça. Comecemos por Guedes. [sendo Jair Bolsonaro, presidente da República, um democrat, um 'escravo' da Constituição, não é surpresa que ele cumpra rigorosamente todos os preceitos constitucionais - tanto os que favorecem o estilo que ele pretende imprimir ao seu Governo quanto os que atrapalhem o cumprimento de sua missão de presidir o Braslo - que recebeu através de ELEIÇÕES LIVRES e com vantagem superior a 20% sogbre oc andidato derrotado.
E um dos principios inseridos no texto constitucional é o da subordinação dos ministros ao presidente da República.

Assim, tem Bolsonaro competência legal, constitucional, de por limites e também flexibilizar os poderes que outorgou, dentos dos principios legais, aos seus auxiliares.

A reforçar o engano de qualquer ministro que acredite ter carta branca,  há o aspecto bem lembrado pelo dono do Blog: "presidentes da República não dão carta branca a ninguém. A razão é simples. São eles os donos dos votos."]
Na primeira semana depois da vitória, o economista parecia ter engolido uma vitrola. Falava pelos cotovelos e se comportava como o chefe da coisa toda. Deixou claro que sempre foi defensor da reforma da Previdência e que o correto seria que a turma de Bolsonaro se empenhasse em aprovar ainda neste ano o texto enviado pelo presidente Michel Temer. Não houve muito entusiasmo. Também defendeu a chamado sistema de capitalização em lugar do atual modelo, de repartição. Em linhas gerais, o trabalhador poupa e faz ele mesmo a sua aposentadoria.
De toda sorte, o que se dizia por aí, COISA NA QUAL NUNCA ACREDITEI, é que o Posto Ipiranga da economia iria decidir.

Bem, não foi o que Bolsonaro disse na entrevista desta segunda. Reproduzo suas palavras: “Não está batido o martelo, tenho desconfiança. Sou obrigado a desconfiar para buscar uma maneira de apresentar o projeto. Tenho responsabilidade no tocante a isso aí. Não briguei para chegar (à Presidência) e agora mudar tudo. Quem vai garantir que essa nova Previdência dará certo? Quem vai pagar? Hoje em dia, mal ou bem, tem o Tesouro, que tem responsabilidade. Você fazendo acertos de forma gradual, atinge o mesmo objetivo sem levar pânico à sociedade (…). Nós temos um contrato com o aposentado, você vai mudar uma regra no meio do caminho. Não pode mudar sem levar em conta que tem um ser humano que vai ter a vida que será modificada. Às vezes um colega pensa apenas em número. Não existe recriação da CPMF. Não queremos salvar o Estado quebrando o cidadão brasileiro”.

Não há como não concluir que o “colega” que pensa apenas em número é mesmo… Paulo Guedes.
Reitero: presidentes da República não dão carta branca a ninguém. A razão é simples. São eles os donos dos votos. Por que dariam?  Bolsonaro está pensando com a cabeça daquilo que ele é: um político. E está a falar com outros políticos.

Venham cá: por acaso, ele disse, durante a campanha, em algum momento, que iria fazer a reforma da Previdência dessa ou daquela maneira, nesse ou daquele ritmo? Resposta: NÃO! Isso nunca saiu de sua boca. Isso sempre foi algo presumido, que cercava o seu entorno. Havia e há a presunção no mercado de que faria.  Se o fizer, está claro, será um processo lento e gradual. Ao menos é o que foi esboçado na entrevista de ontem.

Eu defendo a reforma da Previdência? Caro que sim! Mas estou tratando aqui do mundo real da política. O presidente eleito sabe que a realidade não muda do dia para a noite. Sim, um governo tem muita força, como se costuma dizer, nos primeiros seis meses. Mas também pode se desmoralizar nesse tempo, como aconteceu com a segunda gestão de Dilma. Observem que os petistas poderiam adotar boa parte da fala de Bolsonaro sobre Previdência, inclusive a crença/constatação/norte de que, no limite, o Tesouro paga a conta. O eleito não está disposto a estrear com o carimbo de presidente antipobre. Os mercados podem não gostar. Mas é que, na política, existe um outro mercado bastante importante: o de votos.

Então, carta branca uma ova! Bolsonaro admitiu, em outra entrevista, à TV Aparecida, que pode querer votar neste ano a elevação em um ano a idade mínima para a aposentadoria dos servidores públicos. Um aninho só: 61 para homens e 56 para mulheres. Não mais do que isso.

Ameaça de demissão O presidente eleito ainda mandou outro recado, mostrando que é o Posto Ipiranga do Posto Ipiranga. O economista Paulo Cintra havia criticado a ideia do IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que Bolsonaro já defendeu mais ou menos, e defendido a criação de uma pequena alíquota sobre transações bancáriasleia-se: nova CPMF.

Bolsonaro mandou bala, a seu estilo: “Esse cara já foi deputado e está lá na equipe de transição. Já conversei com ele para não falar aquilo que não tiver acertado com o Guedes e comigo. Parece que tem certas pessoas que, se é a verdade a informação, não pode ver uma lâmpada que se comporta como mariposa.”
E ameaçou demitir quem eventualmente criticar suas orientações.
Convenham, né? Depois dessa, o “cara” ou a “mariposa” teria de pegar o rumo. Mas isso é com ele.
Fato: carta branca ninguém tem. E a reforma da Previdência andará a passos mais lentos, tudo indica, do que muitos imaginavam.

Bolsonaro intui, e com razão, que a reforma da Previdência vai minar parte da sua popularidade. Por adesismo, medo que ele e Sérgio Moro despertam ou sei lá o quê, talvez consiga aprovar no Congresso o que lhe der na telha nos primeiros meses. Qualquer que seja mudança, no entanto, os efeitos, bons ou ruins, cairão sobre o seu colo.  Uma reforma da Previdência certamente terá um efeito positivo, mas será naquele longo prazo, como disse certo economista, em que estaremos todos mortos. Bolsonaro está pensando nos eleitores que ainda estão vivos, não naqueles que ainda não nasceram.

Aqui o link para a cassação da carta branca a Sérgio Moro.

Blog do Reinaldo Azevedo  

 

domingo, 17 de junho de 2018

“Saúde, o direito de dever” e outras notas de Carlos Brickmann

Para que serve a ANS? Será a hora de descobrir para que servem as agências reguladoras

A Agência Nacional de Saúde Suplementar, ANS, quer que convênios e seguros-saúde aumentem no máximo em 10% seus preços. A Justiça achou muito: fixou 5,72% (contra uma inflação de 2,9%). A ANS, mas podem chamá-la de Governo, vai recorrer! Quer 10%. O cidadão é só um detalhe.

Para que serve a ANS, “a agência reguladora” dos planos de saúde? Dá para responder com números: nos últimos 14 anos, o aumento sempre foi superior à inflação. De 2000 a 2017, o plano de saúde subiu 374,1%. Deu de 7×1 na inflação, que chegou a 220%. Antes de 2000, as operadoras eram quem decidia o valor do aumento. E o cliente apanhava tanto quanto hoje: não teve vantagem nenhuma com a intervenção da agência oficial.

Resultados? Dois milhões de clientes suspenderam seus convênios ou seguros agora, sobrecarregam o SUS. A operação dos planos de saúde é tão lucrativa que gigantes multinacionais compraram empresas nacionais do ramo. E a benevolência da ANS chegou a despertar de seu profundo sono até o Senado, que planeja uma CPI sobre as relações ANS-operadoras. Um terço dos senadores, 27, já concordou com a CPI. Será interessante descobrir por que, todos os anos, o custo tem de subir mais que a inflação.
Será a hora de descobrir para que servem as agências reguladoras. A do transporte aéreo, Anac, foi a inventora da cobrança da bagagem, “para baratear as passagens”. Alguém já usou as passagens mais baratas?

Jornalista Lula
Lula deve comentar a Copa para a TVT, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Escreverá o comentário na prisão e o enviará ao jornalista José Trajano. “Não estou brincando, não”, diz Trajano. “Lula será comentarista da TVT. Vai escrever suas impressões, e as pomos na tela entre aspas”. [circo: o condenado e presidiário vai escrever uma porção de bobagens e o pior é que vai ter babaca para ler (por isso insistimos em escrever apenas para dois leitores; 'ninguém' e 'todo mundo').]

O Basta! De Neguinho
O sambista Neguinho da Beija-Flor, 68 anos, 41 de escola de samba, vai embora do Brasil: cansado da violência no Rio, cansado dos altos impostos (dos quais não vê retorno), vai no fim do ano para Braga, Portugal, cidade de origem da família da esposa. Quer que a filha mais nova, de nove anos, viva em lugar mais seguro. Neguinho é atração da escola cujo patrono é o poderoso Aniz Abrahão, homem-forte de Nilópolis. Se Neguinho sente a insegurança a ponto de ir embora, prometendo só voltar nos carnavais, imaginemos a situação a que a violência levou a Cidade Maravilhosa.

Cadê o centro?
Comecemos pela parte positiva: apesar de tudo, Geraldo Alckmin tem boas chances de chegar ao segundo turno, apesar da penúria de seus índices nas pesquisas. Com a multiplicação do número de candidatos, basta que Alckmin cresça em São Paulo, sua base eleitoral, onde foi governador por quatro vezes, para que chegue lá. No segundo turno, seu adversário deve ser um radical de esquerda ou direita, e ele deve receber o voto da maioria que é contra radicalismos. Agora, a parte ruim: Alckmin está indo mal até em São Paulo, o que o deixa em risco. Álvaro Dias come seus votos do Paraná para o Sul. Candidatos como Flávio Rocha e Josué Alencar atingem sua base. Com as intenções de voto se arrastando pelo chão, como atrair outros partidos de centro para formar a maioria? Alckmin tenta duas saídas.

A primeira: um problema
Alckmin nomeou Marconi Perillo, ex-governador de Goiás, articulador de sua candidatura. Problema: o candidato de Perillo ao Governo goiano, o vice José Elinton, tem no máximo 1/3 das intenções de voto de Ronaldo Caiado, DEM, o favorito. Perillo deixa de ser o chefe político de Goiás e se contenta em eleger-se senador. Tem processo na primeira instância da Justiça Federal, movido pela Procuradoria Geral da República, referente a delações de ex-executivos da Odebrecht, segundo as quais teria solicitado à empresa R$ 50 milhões para a campanha de 2014 (e obtido R$ 8 milhões). Alckmin não tem até agora qualquer vínculo conhecido com a Odebrecht.

A segunda: uma aposta
Alckmin quer também que o apresentador José Luiz Datena (DEM) seja candidato ao Senado, na chapa de João Dória. Datena é conhecido e tem facilidade de comunicação. Mas talvez prefira outra opção, como disse a O Estado de S. Paulo: “Se pintar a possibilidade de ser candidato à Presidência, talvez eu tente ajudar o meu País. Quero ser candidato para ajudar o povo. É mais uma decisão do partido do que minha. Depende das articulações, do resultado das pesquisas”. Alckmin quer, atraindo Datena, conseguir o apoio do DEM para ser presidente. Corre o risco de repetir o episódio de Doria: ganhar mais um adversário em disputa de seu espaço.

Sabe ou não?
Todos os países americanos decidiram votar em bloco em EUA, Canadá e México para a Copa de 2026. A CBF votou no Marrocos. O coronel Nunes, da CBF, votou errado ou esqueceu em quem votar? Você decide.

Publicado na Coluna de Carlos Brickmann

 

sábado, 2 de junho de 2018

Personagem da semana: a batata



Um desabafo franco do tubérculo que sumiu das prateleiras 

Empoderadas pela greve dos caminhoneiros, nós, batatas, atingimos uma valorização de 150%. Nossa autoestima está quente. Conquistamos nosso lugar de fala e também queremos fazer nossas reivindicações. Disputaremos narrativas com coxinhas, mortadelas e pamonhas que pedem intervenção militar.  Primeiro, é importante deixar claro que o sistema nos oprime. Uma penca de expressões e piadas reforça preconceitos contra nós ao longo dos séculos.  Vamos aos fatos: nossa reprodução é uma atividade malvista pela sociedade desde que “vai plantar batata” virou xingamento. Um sujeito descadeirado pode ser descrito como um saco de batatas sem que ninguém seja repreendido por isso. E ninguém contesta o tétrico estereótipo construído pelo Sr. Cabeça de Batata.

Machado de Assis, talvez o maior escritor brasileiro, contribuiu para o nosso mau agouro ao cunhar a irônica expressão “ao vencedor, as batatas”. Sem falar no tom pejorativo que ganhou a poesia “batatinha quando nasce/ se esparrama pelo chão”.  Não estamos representadas na novela das 9 da TV Globo. Não há conto de fadas em que a Rainha Má ofereça uma batata envenenada para a princesa. A carruagem vira abóbora. Popeye come espinafre. Magali, melancia. A cenoura se envolveu num boato maldoso na carreira de Mario Gomes. “Morango do Nordeste” virou sucesso nacional. Enquanto isso, nem Romero Britto se digna a pintar uma batata. té mesmo para noticiar as variações da inflação, a imprensa se esparrama no clichê das variações de preço do pãozinho. Pagamos nossos impostos em dia, e o Datena nos ignora. Luciano Huck nunca ajudou um morador de periferia a abrir uma batataria gourmet.

Basta!
A greve dos caminhoneiros parou o Brasil: faltou comida, gasolina, remédios. Centenas de voos cancelados. Sabemos que os prejuízos estimados pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) podem ultrapassar os R$ 6,6 bilhões. A situação expôs a fragilidade do governo Michel Temer, que já é mais impopular que uma porção de inhame no prato de uma criança.  Também colocou em xeque a política da Petrobras que — mesmo sendo um monopólio — flutua o preço dos combustíveis de acordo com o mercado internacional.
Tudo isso fez com que o caos se instaurasse por todas as classes sociais. Desde as famílias mais pobres, que não encontram itens de primeira necessidade, aos acionistas da Petrobras, que não encontram seus dividendos. Os áudios de WhatsApp, como de costume, deram conta de disseminar o medo generalizado.

É o que diz o poeta: não se faz uma revolução sem quebrar alguns ovos. Ou descascar algumas batatas.  É por isso que vamos lutar daqui para a frente. O povo brasileiro precisa conhecer nossa trajetória de luta!  Somos tubérculos de origem latino-americana sem dinheiro no banco e vindos do interior da Cordilheira dos Andes há cerca de 8 mil anos. Hoje, pela meritocracia, estamos em todos os continentes e somos o 4º alimento mais consumido no mundo. Muito provavelmente por causa da doutrinação comunista em nossas escolas, os jovens são privados do conhecimento de que batatas, quando plantadas, dão flores. Podem ser brancas, púrpuras ou rosadas — jamais vermelhas.  E mais: cada 100 gramas de batata possuem, em média, 65 calorias. Além de todas as vitaminas essenciais — exceto A e D. Disso a imprensa golpista não fala.
Por isso, apresentamos aqui uma lista de reivindicações. Michel Temer, sua batata está assando.

“Exigimos a criação do Dia do Orgulho Tubérculo e do
 Programa de Fritas Mínimas, em parceria com o senador Suplicy”
 
Os caminhoneiros pararam, as batatas minguaram, e os preços desembestaram. Em alguns mercados, o aumento superou 150% (Foto: CELSO PUPO/FOTOARENA)
 
 
1. Criação do dia do Orgulho Tubérculo
Batata é agro. Batata é tech. Batata é pop. Nesse dia, uma campanha em rede nacional vai elencar nossas qualidades.

2. Fritas Mínimas
Em parceria com Eduardo Suplicy, vamos estabelecer um programa em que toda criança poderá comer uma pequena porção de batata frita em todas as refeições.

3. Presença na cultura
Todos os imitadores de Carmen Miranda terão de respeitar uma cota de 10% para o empilhamento de batatas no chapéu. Caetano Veloso, que já fez até “Jenipapo absoluto”, ganhará incentivos fiscais toda vez que emitir opiniões sobre os mais variados tubérculos. Paulo Coelho será distribuído em todas as escolas públicas se escrever “Às margens da plantação de batatas, eu sentei e chorei”.

4. Nova política de preços
Também exigimos ser um monopólio, como a Petrobras. Queremos controlar a flutuação de preços, sem concorrência, para manter nossa valorização tão suada.

5. Aumento de impostos
Além de ajustar para cima toda a taxação de nossa cadeia produtiva, queremos a criação do ISM, Imposto Sobre Mordida.

6. Autossuficiência em batata
Temos todas as credenciais para entrar na política de Campeões Nacionais do BNDES. Wesley e Joesley não tinham nem metade de nosso potencial. Exigimos um financiamento gordo do BNDES para que — junto com o monopólio — a gente transforme o Brasil numa nação autossuficiente em batata.

7. Garantia de maioria no restaurante do Senado
Para compor uma base unida — seja ela frita, cozida ou rosti —, queremos pratos comissionados no restaurante do Senado.

8. Combate às fake news
 
Com frequência somos covardemente acusados de aumentar o colesterol, os triglicerídeos e de engordar. Não toleraremos mais ataques descabidos. Medidas legais serão tomadas.

9. Imunidade alimentar
Para não podermos mais ser acusados de crimes de indigestão.

10. Uma concessão nossa
Para deixar claro que não somos só exigências, também estamos dispostos a ceder. Isso se chama cidadania. Caso todos os nossos pontos sejam atendidos em 24 horas, vamos batalhar para alterar o slogan que pede a saída do presidente. Nossa nova proposta será “Frita, Temer”.
Caso contrário, vamos tomar medidas realmente drásticas. O povo brasileiro precisa ser avisado, pois o pior está por vir: bloquearemos roteadores para — pasmem — cortar o fornecimento de memes. Aí o bicho vai pegar.

 Revista Época