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domingo, 27 de junho de 2021

IMUNIZAÇÃO - Pfizer Brasil: 'Quando chegar sua vez, tome a que estiver disponível'

O fenômeno dos "sommeliers de vacinas" está gerando reações nos próprios postos de imunização brasileiros

Quando uma empresa desenvolve um produto que ganha a preferência do público, isso geralmente é encarado como sinal de sucesso. Porém, ao falarmos de vacinas, essa "escolha" seletiva do consumidor pode trazer mais prejuízos do que benefícios.

E isso é ainda mais perigoso quando estamos no meio de uma pandemia: muitos brasileiros estão deixando de ir ao posto de saúde quando as doses disponíveis naquele local são de determinado fabricante ou de outro.

Segundo relatos publicados nas redes sociais, a vacina Comirnaty, desenvolvida por Pfizer/BioNTech, virou a "queridinha" de muita gente, que se recusa a tomar a CoronaVac (Sinovac/Instituto Butantan) ou a AZD1222 (AstraZeneca/Universidade de Oxford), as outras opções disponíveis na campanha de imunização brasileira até o meio de junho.

O fenômeno dos "sommeliers de vacinas" está gerando reações nos próprios postos de imunização. Na Unidade Básica de Saúde do Cambuci, em São Paulo, por exemplo, um cartaz fixado na entrada apela: "Enquanto você escolhe a marca da vacina, o vírus pode escolher você. Vacine-se já!"

A mensagem foi flagrada pela repórter Beatriz Manfredini, da Jovem Pan News:

Vale reforçar que esse tipo de escolha num momento tão complicado como o que vivemos não faz sentido algum e pode até ser perigoso. Quem diz isso é a própria líder médica de vacinas da Pfizer Brasil: a pediatra infectologista Júlia Spinardi entende que não é hora de pensar somente em si e nas próprias preferências, mas, sim, na proteção de toda a comunidade. "Precisamos entender que as vacinas disponíveis se mostraram seguras e eficazes e o uso de todas elas, em conjunto, é o que vai nos permitir controlar a covid-19", diz. "Quando chegar a sua vez, vacine-se com o imunizante que estiver disponível", resume a especialista.

Spinardi, que trabalha há cinco anos na farmacêutica e tem mestrado em Ciências da Saúde pela Santa Casa de São Paulo, concedeu uma entrevista exclusiva para a BBC News Brasil, na qual avaliou o desenvolvimento das vacinas, o andamento das campanhas de imunização e as perspectivas futuras de enfrentamento da pandemia.

Uma façanha global
Em meio a tantas perdas e sofrimentos, a humanidade conseguiu um feito notável: desenvolver, testar e aprovar várias vacinas contra uma doença nova num intervalo de menos de 12 meses.Repare nas datas: a observação de que um novo vírus estava provocando uma "doença misteriosa" na China começou a ser feita entre o final de dezembro de 2019 e as primeiras semanas de janeiro de 2020.

E os primeiros imunizantes para a covid-19, como a própria Comirnaty e a AZD1222, já estavam aprovados para uso em larga escala em dezembro de 2020. Para Spinardi, a façanha só foi possível graças ao investimento em biotecnologia e ao foco total dos laboratórios públicos e privados em completar essa corrida contra o relógio. "Aqui na Pfizer, tivemos um redirecionamento total de nossas equipes e investimentos para que isso acontecesse e nós criássemos vacinas no menor tempo possível", diz.

A pediatra destaca que a inovação se deu também na forma como os estudos clínicos foram conduzidos: "Etapas que antes eram feitas em sequência e demoravam meses para serem concluídas foram realizadas em paralelo, para ganhar rapidez. E isso aconteceu, claro, sem que os critérios de segurança fossem deixados de lado." Ainda na seara das novidades, a atual pandemia marcou a chegada de uma nova geração de vacinas (ao menos quando pensamos no uso em larga escala): os imunizantes de mRNA, como os produtos desenvolvidos por Pfizer/BioNTech e Moderna.

Eles são baseados num pedaço de código genético sintetizado em laboratório que, ao ser injetado no corpo, instrui nossas células a produzirem proteínas características do coronavírus. Essas moléculas, por sua vez, são reconhecidas pelo sistema imune, que cria anticorpos capazes de combater uma infecção de verdade, caso o coronavírus tente invadir nosso organismo. Essa nova plataforma tem vários pontos positivos, como a fabricação rápida e uma flexibilidade maior na adaptação da fórmula para fazer frente às novas variantes, por exemplo. "Nós não precisamos fazer o cultivo de vírus ou bactérias em laboratório, que é algo mais complicado e que exige uma série de medidas. O fato de ser uma vacina 100% sintetizada facilita muito a produção como um todo", avalia Spinardi.

Entre as desvantagens, vale citar a pouca experiência na plataforma de mRNA em larga escala e as dificuldades tecnológicas em montar fábricas capazes de fabricar esse produto: hoje em dia, o mundo depende da expertise de poucas farmacêuticas (como Pfizer e Moderna) para obter milhões e milhões de doses dessas vacinas. Outro ponto que gerou muita preocupação nos primeiros meses após a aprovação da Comirnaty foi a necessidade de armazenamento em temperaturas muito frias (abaixo de -75 °C), o que demandava equipamentos rebuscados e pouco acessíveis.

Essa seria uma dificuldade enorme num país tão grande e diverso como o Brasil: lugares com menos acesso a congeladores superpotentes poderiam ficar sem esse imunizante. Mas essa barreira caiu por terra mais recentemente: já existem caixas especiais que facilitam o transporte dos lotes e novos estudos mostraram que essa vacina permanece viável se mantida a -20 °C por algumas semanas. Outra boa notícia foi a descoberta de que as doses que serão utilizadas logo, nos próximos dias, podem ficar na temperatura de 2 a 8 °C, que já se enquadra dentro da realidade dos mais de 30 mil postos de vacinação espalhados pelo Brasil."Isso foi fundamental para que a gente conseguisse fazer a vacina chegar às diferentes regiões do nosso país", comemora Spinardi.

Desafios em tempo real
A pediatra também chama a atenção para a diferença entre eficácia e efetividade de um novo imunizante.Enquanto a eficácia é medida a partir dos estudos clínicos de fase 3, que conta com algumas dezenas de milhares de voluntários, a efetividade mede os impactos de vida real da campanha de vacinação, que envolve milhões de pessoas. A Comirnaty, que já havia demonstrado uma eficácia de 91% nas pesquisas, até superou os resultados quando aplicada em larga escala em países como Israel e Estados Unidos."Os dados de efetividade que vemos hoje das nações com a imunização mais adiantada confirmam essa taxa superior a 90% e corroboram a necessidade do esquema de duas doses para garantir o maior potencial de proteção", informa.

A despeito das negociações com o Governo Federal do Brasil e todos os e-mails e propostas não respondidos, que estão sendo apurados pela CPI da Covid, Spinardi classifica como "gratificante" poder acompanhar todas as etapas de estudos e ver a vacina finalmente chegar ao Brasil.  "O desembarque das primeiras doses no país foi um momento de muita esperança. A gente passou efetivamente a entender que podíamos fazer parte da solução para o problema que estamos vivendo", admite.

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Como já mencionado no início da reportagem, a representante da Pfizer atesta que a imunização é uma estratégia coletiva e não estamos na posição de escolher a vacina A, B ou C — seja por medo de eventos adversos ou pela busca de uma eficácia maior.  "Precisamos entender que as vacinas disponíveis se mostraram seguras e eficazes e o uso de todas elas, em conjunto, é o que vai nos permitir controlar a covid-19", diz. "Quando chegar a sua vez, vacine-se com o imunizante que estiver disponível. E incentive as demais pessoas da sua família, da sua rua e da sua comunidade a fazerem o mesmo", completa.

Ainda no universo dos fenômenos recentes, não dá pra ignorar como as vacinas contra o coronavírus viraram assunto popular e hoje aparecem em abundância nos memes. O mais famoso deles foi produzido pelo humorista e roteirista Esse Menino: num vídeo que já conta com mais de 18 milhões de visualizações e 93 mil comentários no Instagram, ele aborda a falta de respostas do Governo Federal aos e-mails da Pfizer. Termos como "beijinhos científicos" e "Pifáizer" caíram no gosto popular e geraram milhões de figurinhas de WhatsApp, fotos e outros vídeos.

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O que o futuro nos reserva
Passados os seis primeiros meses de vacinação contra a covid-19 em várias partes do mundo, a discussão sobre o fim da pandemia começa a tomar forma — ainda que esteja bastante longe de nossa realidade.Mas, para que isso venha a acontecer de fato no futuro, alguns pontos-chave precisam ser resolvidos com urgência.

O primeiro deles é a desigualdade na distribuição das doses: os imunizantes de Pfizer, AstraZeneca, Janssen e outras farmacêuticas chegaram muito mais rápido e em maior quantidade aos países mais ricos, enquanto alguns dos lugares menos desenvolvidos do planeta sequer iniciaram suas campanhas.  Até abril, os países ricos já haviam vacinado uma a cada quatro pessoas. Nas nações mais pobres, apenas um a cada 500 indivíduos havia recebido as doses contra a covid-19.

Uma alternativa para facilitar a chegada das vacinas e descomplicar as campanhas é a intercambialidade dos produtos de diferentes laboratórios. Em outras palavras, alguns especialistas propõem misturar as vacinas: a pessoa poderia tomar eventualmente a primeira dose da vacina da Pfizer e a segunda da AstraZeneca, por exemplo. Isso, inclusive, está sendo avaliado por estudos científicos em alguns países, como o Reino Unido. Por ora, as farmacêuticas parecem não levar em conta essa possibilidade. "Neste momento, não temos nenhum programa oficial para analisar a intercambialidade e nossa recomendação é seguir com o esquema que temos hoje, de usar a mesma vacina nas duas doses", esclarece a pediatra.

"É claro que isso pode acontecer no futuro, mas os dados que temos por enquanto ainda são muito limitados", avalia.  Um terceiro e último front que começou a ser atacado nas últimas semanas é a ampliação dos públicos que poderão receber as vacinas — a Comirnaty, por exemplo, recebeu aprovação para ser usada em indivíduos de 12 a 18 anos no Brasil recentemente.  "A gente entende que a prioridade agora são os adultos, especialmente aqueles com risco de desenvolver as formas severas da doença. Mas, com o passar do tempo, só iremos conseguir controlar a circulação do vírus quando incluirmos todos os grupos etários", explica.  "Os mais jovens representam 25% da população mundial e em algum momento precisaremos pensar neles também", finaliza.

Brazil - Correio  Braziliense


 

quarta-feira, 3 de março de 2021

"O Estado não consegue tudo sozinho"

Alexandre Garcia

"Na segurança, somos agentes e pacientes; na saúde, apenas tutelados pelo Estado"

O artigo 144 da Constituição estabelece que segurança pública, sendo dever do Estado, é direito e responsabilidade de todos. Por sua vez, o artigo 196 diz que “saúde é direito de todos e dever do Estado”. Ou seja, a Constituição nos dá responsabilidade pela segurança, mas não pela saúde. Na segurança, somos agentes e pacientes; na saúde, apenas tutelados pelo Estado. Delfim Netto, no curso da Constituinte, me disse, ironizando, que, quando tivesse diarreia, ia responsabilizar o Estado. É o que se está vendo nesta pandemia.
 
Para garantir nossa segurança, de nossa família e de nossa propriedade, usamos tranca, cadeado, alarme, câmera, armas de defesa — o Estado não está sozinho no seu dever. Mas, para garantir nossa saúde, a Lei Maior deixa o Estado como único responsável. 
Não será essa a explicação para as aglomerações em festas, bares, praias, eventos? 
Fica o Estado responsável único pela prevenção e tratamento da covid, pois assim diz a Constituição.
Boa saúde significa resistir a doenças com alimentação saudável, preparo físico, exposição ao Sol e ar puro, higiene corporal, cabeça boa — é a nossa parte. O Estado não consegue tudo sozinho. Agora mesmo, tive um caso que deve explicar por que tanta gente é hospitalizada e vai para a UTI. 
Uma auxiliar minha, trabalhando a distância, levou cinco dias para procurar o posto de saúde, com todos os sintomas da covid. 
O médico fez o teste e a mandou para casa para esperar o resultado.  
Nesse quinto dia, ao sabermos, providenciamos a medicação conhecida.  
Ao terceiro dia de tratamento, ela já estava quase sem sintomas e recuperando o olfato e o gosto. 
E só sete dias depois do teste é que saiu o resultado. Positivo.
 
Dependendo só do Estado, ela esperaria 12 dias, talvez com o pulmão já inflamado e em risco de vida. 
Fico imaginando quantos milhares de casos que se agravaram têm esse histórico. 
Quantos milhares são mandados para casa, já na fase 2, por falta de leito, sem a necessária medicação oral de corticoide e antibiótico, para cuidar dos pulmões. 
O triste é que boa parte da população não tem meios de libertar sua saúde quando a tutela falha.
 
Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense

sábado, 24 de fevereiro de 2018

A vida sob intervenção

Um delegado de polícia, uma moradora de Ipanema e um ativista da Rocinha­­. Acompanhamos a rotina de três cariocas ao longo da última semana para mostrar o que mudou e o que ainda precisa melhorar para que a cidade se torne de fato mais segura

ABORDAGEM Militar revista morador da favela do Kelson’s, na zona norte do Rio, onde uma mulher foi torturada por traficantes na segunda-feira 19: desafio é agir sem abusar da força (Crédito: Leo Correa)

O carioca mistura os sentimentos de esperança e suspeita quando o assunto é a intervenção federal em vigor desde a sexta-feira 16 na segurança pública em todo o estado do Rio de Janeiro. “Torço, como todos, para que essa intervenção seja bem sucedida e que tenhamos um pouco de paz. Um pouco, não. Queremos paz completa. Não é pedir muito, é?”, indaga a gerente comercial Kika Gama Lobo, 53 anos, moradora de Ipanema. Criadora da hashtag “Riode Merda”, ela diz ter sido hostilizada por sua postura crítica em relação à segurança. “Criei isso depois que minhas duas filhas foram assaltadas. Foi meu meio de desabafo e de colaboração. Ali, falo de roubalheira, de falta de ética – e elogio também”. 


Assim como ela, moradores das zonas nobres da cidade dizem não ter percebido uma diferença significativa nas ruas durante a primeira semana de intervenção. Isso porque os tanques, blindados e soldados das Forças Armadas não ocupam os pontos turísticos e bairros da zona sul – como já ocorreu em eventos de grande porte, como os Jogos Olímpicos de 2016. As ações começaram em locais estratégicos, com a ocupação de rodovias federais e estaduais, varredura em presídios e patrulhamento de favelas violentas. Em uma delas, a do Kelson’s, no Complexo do Alemão, uma moradora foi torturada por traficantes na segunda-feira 19. O motivo: suspeita de ter passado informações do tráfico para agentes das Forças Armadas. 

Nascido e criado na favela da Rocinha, na zona sul, Leandro Lima, 35 anos, viveu uma dramática experiência tempos atrás, quando foi parado, numa viela por policiais do Bope. “Eu estava indo para o trabalho e um policial começou a me fazer perguntas com uma arma apontada para minha cabeça e o dedo no gatilho. Eu só pensava que se algum mal entendido acontecesse e o dedo dele apertasse, minha vida acabaria ali.” Lima é cameraman da TV Globo, mora na parte alta da favela e dirige a mídia comunitária FaveladaRocinha.com, que distribui um jornal impresso na comunidade e está presente em mídias sociais. Ele faz parte do grupo que gravou o vídeo “Dicas para Sobreviver a Uma Abordagem Indevida”, que aconselha ao jovem negro de favela, por exemplo, a não usar guarda-chuva de cabo longo pois isso pode ser confundido com uma arma e a carregar o cupom fiscal de qualquer objeto que ele esteja portando, seja um iPhone ou um cordão para comprovar a compra e descartar o roubo. “Os moradores de favelas estão apreensivos porque têm sofrido incursões truculentas ao longo dos anos, sem solução para eles. Não são tratados como cidadãos, as portas de suas casas podem ser arrebentadas por chutes”, diz Lima. “Para nós, é mais do mesmo. A pior violência que sofremos nas favelas não é a da falta de segurança e, sim, da falta de saneamento básico, transporte, posto de saúde, educação, cultura”, afirma.
Orlando Zaconne 54 anos, morador da Barra da Tijuca Profissão Delegado do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE) (Crédito:Stefano Martini)

“O delegado é uma autoridade jurídica. A partir do momento em que a segurança pública passa a ser comandada por militares, gera desconforto” 
Orlando Zaconne, delegado do Departamento Geral de Polícia Especializada
 [esse delegado perdeu a oportunidade de ficar calado; falou e falou bobagem. Os civis tiveram sua oportunidade, não foram competentes.]

O Delegado do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE), Orlando Zaconne, 54 anos, disse à ISTOÉ que o clima entre os policiais também é de inquietação: ”O delegado é uma autoridade jurídica. A partir do momento em que a segurança pública passa a ser comandada por militares, gera desconforto.” O delegado lembra que a intervenção está sendo discutida e espera-se que haja “garantia democrática do exercício da função policial.”

Julita Lemgruber, ex-diretora do sistema penitenciário do Rio e coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), diz que a intervenção pode momentaneamente transmitir sensação de segurança. “Mas se não resolvemos algumas questões básicas, não vamos a lugar nenhum.” Questões básicas são a corrupção dentro da polícia e a estratégia de enfrentar o varejo do tráfico à bala. No início da semana, uma operação policial em Caxias, na Baixada Fluminense, deixou um homem morto e outras duas pessoas feridas, entre elas uma criança. Revoltados, moradores atearam fogo em um ônibus ­­— cenas que a intervenção ainda não foi capaz de suprimir da rotina do Rio.

 IstoÉ - Eliane Lobato

 

domingo, 14 de maio de 2017

Rollemberg vai fechar 14 postos de saúde no DF - governador acha que o 'excelente atendimento' na Saúde Pública do DF, torna os postos subutilizados

Com investimento de R$ 21 mi, reformas fecharão 14 postos de saúde no DF

O GDF investirá R$ 21 milhões para recuperar estruturas obsoletas e renovar aluguéis. Apesar de os serviços básicos mudarem de endereços durante as intervenções, a população está preocupada com o deslocamento e os possíveis atrasos nas obras

A situação precária e a estrutura obsoleta de 14 postos de saúde da capital federal obrigou a Secretaria de Saúde a traçar um plano de reformas para essas unidades. Atendimentos básicos, como consultas e exames, deverão mudar de endereço em pelo menos nove cidades. [os postos vão ser apenas oficialmente fechados; já que em termos de funcionamento já estão fechados há muito tempo, tendo em vista que muitos não marcam mais consultas, outros não tem material, outros não tem funcionários.FECHAR PARA OBRAS é apenas um pretexto para oficializar o que já acontece.] Durante as obras, os serviços serão suspensos, e os profissionais, alocados em outros locais. O temor dos pacientes é que as intervenções demorem a sair do papel. O Executivo local prevê gastar R$ 21 milhões com os reparos. Até o fim do mês, o projeto deve ser enviado à Novacap para o órgão iniciar a licitação.
O Correio acompanha a situação de centros de saúde de Ceilândia, do Gama e do Lago Sul, que fecharam para reformas e não voltaram a funcionar. Essa é justamente a preocupação da pensionista Maria de Fátima de Moraes Santos, 62 anos. A casa dela fica a menos de cinco minutos do Centro de Saúde nº 5 de Ceilândia. Lá, ela faz consultas e retira receitas médicas para o medicamento que controla a hipertensão. “Se for uma obra com começo, meio e fim, será ótimo. O prédio é antigo e nunca passou por grandes reparos. Agora, se isso significar que a unidade ficará fechada por um sem fim de tempo, é maldade com a população”, reclama a moradora da QNM 24.
Maria conhece a estrutura deficiente das unidades. A reportagem percorreu 110km entre Ceilândia, Samambaia e Recanto das Emas visitando os postos que passarão por obras. São prédios velhos, sem manutenção e com espaço inferior ao da necessidade da população. “Com o passar do tempo, é natural que as instalações percam sua capacidade de funcionamento. O problema é que o governo espera chegar a uma situação extrema de obsolescência”, critica o vigilante José Alves Ramos, 64, morador de Samambaia.

Quando José conversou com o Correio, o Centro de Saúde nº 1 de Samambaia, na QS 408, estava movimentado pela campanha de vacinação contra a gripe. Cerca de 50 pessoas esperavam pelas doses. O calor era insuportável. “A obra deve ser feita com seriedade. Imagina toda essa gente sem local de atendimento”, diz. A menos de 10km dali, a dona de casa Érica Rodrigues dos Santos, 31, fez a mesma queixa. “Há 11 anos, eu me consulto aqui. O serviço tem dificuldades, mas recebe a gente”, conta a moradora do Recanto das Emas.

Lá, o Posto de Saúde Urbano, na Quadra 307, destoa da vizinhança. Nas proximidades, há um prédio novo do 27º Batalhão de Polícia Militar. Ao lado, o quartel do Corpo de Bombeiros também é moderno. Logo em frente à unidade, a Clínica da Família nº 2 — espaço também administrado pela Secretaria de Saúde — foi inaugurada em dezembro de 2012. “Lembro quando o posto começou a funcionar neste prédio. Antes, era um barracão de madeira. Desde a construção da alvenaria, houve pouquíssimos reparos. Isso faz mais de 20 anos”, detalha a atendente Jaqueline dos Santos Nascimento, 30.

"Assistência garantida"
Apesar das dificuldades financeiras, o diretor Organizacional da Atenção Primária, Lucas Bahia, descarta que o pacote de obras se torne um problema a mais no funcionamento da rede. As mudanças, garante Lucas, não afetarão o serviço. "As equipes serão redimensionadas para locais próximos às unidades em obras. A assistência não será paralisada", esclarece. Para se ter dimensão da investida do governo, as unidades a serem reformadas e as que serão substituídas por novos contratos de aluguel representam 22% dos 172 locais de atendimento no DF.

Outra medida é a substituição de 24 unidades alugadas. Alguns desses imóveis estão há mais de 10 anos sem nenhum tipo de investimento. A situação degringolou de tal forma que os espaços não obedecem a regras básicas da Vigilância Sanitária. A reestruturação afeta uma das áreas mais críticas da saúde pública: a atenção primária. As melhorias serão capazes, acredita o governo, de atenuar o colapso do setor.

Até mesmo a concepção de postos de saúde ou unidades básicas é delicada. É que casas comuns são locadas e transformadas em locais de atendimento. Os aluguéis atuais não têm contratos. O pagamento é feito por meio de despesas indenizatórias. Anualmente, a Secretaria de Saúde desembolsa R$ 2 milhões no aluguel dessas unidades. Com a criação dos postos, o montante gasto passará para R$ 2,5 milhões.

Até junho, o Executivo local deve publicar o chamamento público para novos locatários. “Essa é uma ação inédita e passou pela Procuradoria para dar transparência ao que estamos fazendo”, explica o diretor Organizacional da Atenção Primária, Lucas Bahia. A meta é que, até o fim do ano, os postos estejam em funcionamento. São Sebastião, Planaltina e Riacho Fundo 2 serão as principais cidades beneficiadas. “Fizemos um levantamento e verificamos que necessitamos de novos pontos de atendimento. Haverá a criação de 12 unidades alugadas. Estamos num processo de chamamento público para locação de imóveis com pré-requisitos bastante severos”, detalha Lucas. No caso dos novos aluguéis, os postos antigos só serão desativados quando as estruturas estiverem prontas.
Reforço
A intenção do Executivo local é que a cobertura dos serviços básicos de saúde passe de 30,8% para 75% da população do DF até o próximo ano. O investimento em equipes do Saúde da Família ancoram as alterações na área. Na última semana, o governo convocou 50 médicos para atuarem exclusivamente no programa.

[tem muitos postos que não estão na relação abaixo e não funcionam; caso Rollemberg deseje é só solicitar e publicamos a relação de vários postos de saúde que NÃO ESTÃO EM OBRAS, MAS não funcionam; 
tem posto que não tem médico ginecologista nem de outras especialidades, a estrutura física está precária, não marca consulta (dizer que a marcação de consultas é feita por telefone é outro enganação, tendo em conta que a maior parte dos telefones do GDF estão cortados por falta de pagamento)  - consta como funcionando mas é só ir lá para ver que não funciona.] 
Em obras
Veja os 14 postos de saúde que passarão por reformas

Guará 2
Centro de Saúde nº 3, na QE 38

Riacho Fundo 1
Centro de Saúde nº 3, na QN 7

Recanto das Emas 
Posto de Saúde Urbano, na Quadra 307, Avenida Monjolo

Brazlândia
Posto de Saúde Urbano Veredas 1, no Setor Veredas
Centro de Saúde nº 1, no Setor Norte

Samambaia
Centro de Saúde nº 1, na QS 408

Ceilândia
Centro de Saúde nº 12, na EQNQ 3/4
Centro de Saúde nº 5, na QNM 16
Posto de Saúde Rural Boa  Esperança, no Núcleo Rural  Boa Esperança

Paranoá 
Centro de Saúde nº 1, na Quadra 21

Sobradinho
Centro de Saúde nº 2, na Quadra 3
Posto de Saúde Rural Catingueiro, na DF-205, Km 13

Santa Maria
Centro de Saúde nº 1, na QR 207/307
Posto de Saúde Urbano nº 2, na QR 202/303

 

segunda-feira, 14 de março de 2016

Lula, o boyzinho das empreiteiras

A soma de todos os medos

A cada avanço da Lava-Jato florescem iniciativas para aumento da confusão política

No mundo real, as multidões voltaram às ruas, em desfile marcado pelo apoio às ações anticorrupção e condimentado pelo protesto contra o governo Dilma Rousseff, imóvel diante do aumento do desemprego, do número de falências e do declínio da renda dos trabalhadores.

Num mundo paralelo, os chefes dos maiores partidos políticos também se mobilizaram.

No PMDB, o vice Michel Temer e os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros anteciparam no sábado a sua mensagem: por quatro semanas, estará proibida a aceitação de cargos governamentais, período em que será composta a comissão de análise do impeachment de Dilma. O vice Temer seria herdeiro, por direito constitucional.

No PT, o ex-presidente Lula saiu de casa no domingo para encontrar um grupo de porta-bandeiras do PT e da CUT, enquanto sua caricatura em roupa de presidiário passeava pelas ruas das maiores cidades. Lula é o pilar de um partido em ruína.

No PSDB, o senador Aécio Neves viajou à Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Saiu da praia carioca para dizer que vale “qualquer saída” para derrubar Dilma — nos limites impostos pela Constituição, ressalvou.  O medo move os mundos das ruas e dos caciques políticos. A coincidência, porém, acaba aí. Os receios resultantes da consciência de perigo têm motivações muito distintas.

Desde julho de 2013, as multidões rugem cada vez mais alto nas ruas por mudanças no governo, na economia, na saúde, na educação e na forma de se organizar a política. Temem o futuro no bolso, na escola e no posto de saúde.

Há 32 meses seguidos, os líderes partidários retrucam com propostas para mudar, mantendo-se tudo como está. Reivindicam proteção na turbulência de inquéritos sobre corrupção no setor público, onde Lula, Temer, Cunha, Renan e Aécio, entre outros, têm sido mais citados do que os versos de Cecília Meireles.

A cada avanço das investigações florescem iniciativas para aumento da confusão política. O PMDB de Temer, Cunha e Renan, por exemplo, teme a cassação da chapa presidencial pelo TSE, o que levaria a novas eleições. Há um ano acaricia o impeachment como escudo protetor.  Entre as ruas, a corporação petista e a “coalizão” que corrói sua autoridade, Dilma assiste impassível à liquefação do próprio governo. Nessa imobilidade, sua melhor perspectiva talvez esteja no processo de impeachment: ela precisa apenas de 171 votos pelo “não”, enquanto adversários precisam garantir “sim” 342 vezes no plenário da Câmara. Seria o momento da soma de todos os medos.

Fonte: José Casado -  O Globo