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sábado, 21 de fevereiro de 2015

Pátria Educadora - Práticas do governo Dilma desmente o discurso e prejudica milhões de estudantes

Cadê a "Pátria Educadora"?

Primeiros atos do governo Dilma mostram que o discurso da posse, que elegeu a educação como prioridade, está muito longe da realidade. Do ensino básico ao superior, o setor está em crise e as medidas tomadas pelo governo prejudicam ainda mais o estudante

"Só a educação liberta um povo e lhe abre as portas de um futuro próspero”, cravou Dilma Rousseff em seu discurso de posse, em 1º de janeiro. A presidente justificou a alcunha de “pátria educadora” dada ao País nesse dia ao afirmar que “democratizar o conhecimento significa universalizar o acesso a um ensino de qualidade em todos os níveis, da creche à pós-graduação”. Palavras de impacto e com o aval de todos os brasileiros. Afinal, quem ousaria dizer que essa não é uma das áreas mais importantes para o desenvolvimento econômico e social de um povo? Mas medidas tomadas pelo governo mostram que ele está seguindo na direção oposta das palavras que abriram o segundo mandato da presidente eleita. Da educação básica ao ensino superior, sem distinção, todos os níveis apresentam graves problemas. Recentes mudanças no Programa de Financiamento Estudantil (Fies), por exemplo, podem deixar alunos fora do ensino superior.

O corte orçamentário fará com que sejam subtraídos cerca de R$ 7 bilhões dos gastos do Ministério da Educação neste ano, o maior bloqueio entre todas as pastas. Além disso, estudos mostram que a educação básica, que deveria dar sinais de avanço, apresenta desaceleração nos níveis de aprendizado. Levando-se em conta que não se passaram nem dois meses do início de 2015, é impossível não fazer a pergunta: onde está a pátria educadora?

O caso mais emblemático é o do Fies, programa pelo qual o governo banca a mensalidade dos estudantes. A dívida é paga após a formatura com juros camaradas. No final de 2014, o governo estabeleceu algumas mudanças, entre elas a de que só seriam mantidas no programa as instituições de ensino superior que tivessem teto de reajuste da mensalidade até 4,5%. Depois de negociações com entidades do setor e reclamações de alunos, a taxa subiu para 6,4%, o índice da inflação. Ainda assim, muitos estudantes correm o risco de deixar seus cursos porque suas universidades tiveram aumento maior do que esse percentual.  Segundo a Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES), apenas 280 mil do 1,9 milhão de contratos haviam sido renovados até a sexta-feira 13.  

Procurado, o Ministério da Educação não explicou por que o percentual foi estabelecido, mesmo com a reclamação das universidades sobre a liberdade de mercado para que cada uma possa estipular o reajuste necessário. Para o professor de políticas públicas Fernando Schuler, do Insper, o fato de o programa ser do governo lhe dá o direito de colocar essa regra, mas não de uma hora para outra, como foi feito. “O planejamento financeiro das instituições é fechado com muita antecedência. Educação não é resolvida a curto prazo”, diz. “Além disso, o argumento para chegar a esse número é de que ele corresponde à inflação. Mas na precificação do ensino superior há inúmeras variáveis, como reajuste de salário dos professores, que não segue a mesma lógica.” 

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Somente de 2012 para 2013, o número total de matriculados pelo Fies em instituições particulares aumentou 100% de 11% para 21%, segundo dados de 2013 da consultoria Hoper Educação. Até 2010, quando as regras do programa mudaram e os financiamentos dispararam, o índice de inadimplência nas escolas particulares era de 9,58%, tendo caído para 8,46% um ano depois. Há um grande envolvimento das instituições de ensino com o Fies. Muitas podem perder alunos e ter prejuízos econômicos com as mudanças. 

“Há muitas universidades com um número alto de usuários do financiamento, mais de 80%”, afirma Romário Davel, consultor da Hoper. A perspectiva do diretor-executivo da ABMES, Sólon Caldas, é de que as faculdades vão se adequar a essa taxa. “A concepção do programa é muito focada na inclusão social e as escolas estão comprometidas com isso”, diz. Quem atrapalha é o governo. Também aluna de psicologia, Ohara de Souza Coca, 25 anos, cursa o quinto e último ano na Faculdade São Judas, em São Paulo, e passa pela aflição de não saber se vai conseguir concluir a faculdade, já que sua mensalidade passou por um reajuste de 8%. “A falta de informações tem causado grande preocupação. Enquanto isso não for resolvido, há o medo de que tenha de deixar os estudos a qualquer momento”, diz. “Não escolhi o Fies por ser cômodo, mas por ser a grande possibilidade de conseguir estudar.” 

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Universidades públicas também devem sofrer com a diminuição de repasses, segundo especialistas. “Não há a menor dúvida de que a crise vá impactar negativamente o ensino superior, que é uma área dispendiosa para o governo”, afirma o professor Renato Hyuda de Luna Pedrosa, coordenador do laboratório de estudos em educação superior da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Para algumas, o corte nos repasses já é uma realidade. 

Na Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, dos R$ 11 milhões que deveria receber este ano, foram transferidos R$ 7 milhões, cerca de 30% a menos. A instituição, no entanto, afirma que ainda assim conseguiu manter as contas em dia. Devem ser adiadas melhorias em infraestrutura, contratação de novos professores, propostas de qualificação, aberturas de novos cursos e linhas de pesquisas. “O maior prejuízo é a perda da expectativa em relação ao acesso à educação, principalmente a superior. Uma das boas coisas que aconteceram no Brasil foi esse sonho concretizado de se conseguir um diploma”, afirma o senador Cristovam Buarque. “A cada ano ficava mais fácil entrar na universidade. Em 2015, parece que vai acontecer o contrário.” Que o diga a caloura do curso de enfermagem da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (SP) Bruna Santoni Silva, 21 anos. Dependente do Fies para começar o curso, ela pode não conseguir validar o contrato com o programa, que abre para novos alunos no dia 23, porque sua faculdade teve reajuste de 9%. “Falei com a universidade, mas eles não têm nenhuma posição sobre o assunto. Só me resta esperar, sabendo que meus estudos e meu futuro profissional estão em jogo. Aliás, não só o meu, mas de milhões de estudantes de nosso país.”  

Cadê a pátria educadora?  

Fonte: Revista IstoÉ 

Fotos: Montagem sobre foto, Rafael Hupsel; WASHINGTON ALVES/ESTADãO CONTEÚDO,Pedro Ladeira/Folhapress; Elza Fiúza/Agência Brasil; Wellington Cerqueira/Ag. Istoé 

 

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