A Nação que se salvou a si mesma - PARTE IV
Por ser um
artigo contemporâneo à Revolução de 1964, é uma narrativa bastante preciosa
sobre o período que o País vivia.
[Percebe-se
facilmente que mesmo sendo um texto escrito há 50 anos, narrando fatos
daquela época, se adapta perfeitamente aos dias de hoje.
Quando aborda a corrupção desenfreada que havia no Brasil naquela época, se esquecermos a data da matéria, podemos pensar que estamos lendo um jornal dos dias atuais em que a "petralhada" a "cumpanherada" tem um único objetivo:
ROUBAR
O MÁXIMO QUE FOR POSSÍVEL, NO MENOR TEMPO - como aves da rapina que
são percebem que a oportunidade do "ENRIQUEÇA DEPRESSA" está chegando ao
fim.]
Um Aviso de KennedyEM NENHUM momento, a não ser bem no fim, qualquer das forças anticomunistas — grupos masculino, feminino ou militar — pensou em obter a deposição de Jango antes do fim de seu mandato, em janeiro de 1966. Diz Haroldo Cecil Poland, membro da Junta Diretora do IPES: “Afinal de contas, Goulart tinha sido legalmente eleito, de acôrdo com a Constituição, e nós brasileiros temos uma longa tradição de legalidade. Só estávamos procurando fazê-lo livrar o Govêrno de métodos e pessoas que estavam levando - o país ladeira abaixo rumo ao caos e à guerra civil. Nossas comissões procuraram-no enquanto êle se mostrou disposto a nos receber. Mas êle não nos dava atenção, voltando-se cada vez mais para os extremistas, e afinal recusou-se a receber-nos.”
Um dos primeiros indícios do desdém de Goulart por conselhos amistosos ocorreu em dezembro de 1962, quando o Procurador-Geral dos Estados Unidos, Robert Kennedy, visitou o Brasil. O objetivo dêle era aconselhar, em nome de seu irmão, o Presidente, que os Estados Unidos não poderiam continuar eternamente despejando fundos da AID dentro do Brasil, a menos que se fizesse alguma coisa para deter a espiral inflacionária que anulava o valor desses fundos. Goulart agiu da seguinte maneira: apenas algumas horas depois da partida de Kennedy, êle formou uma comissão para coordenar a expansão do comércio com a União Soviética!
A Sorte Está Lançada
NO COMÊÇO de março dêste ano, o país inteiro era um rastilho pronto a irromper em chamas de revolta. Em 13 de março, o próprio Goulart, com os vermelhos a incitá-lo, temeràriamente riscou o fósforo. Perante uma audiência de uns 100.000 trabalhadores — arrebanhados por líderes vermelhos e trazidos para o Rio de Janeiro em ônibus e trens ao custo de mais de 400 milhões de cruzeiros para o Govêrno — Goulart e Brizola irrevogàvelmente comprometeram o Govêrno a fazer mudanças radicais.
Realizado na praça em frente à estação da Central do Brasil, no Rio, na hora da volta para casa das grandes massas residentes nos subúrbios, o comício apresentou uma floresta de cartazes enfeitados com a foice e o martelo e exigências como “Legalidade Para o Partido Comunista!” e “Armas Para o Povo!”. Agentes democratas, procurando misturar- se com a multidão, constataram estar esta dividida em blocos, cada um com sua própria senha para deixar de fora quaisquer intrusos inamistosos.
A estupefata classe média brasileira, assistindo pela TV, ouviu Goulart denunciar como “superadas” a estrutura do Govêrno e a ordem social existentes, exigindo mudanças básicas na Constituição. Entre as mudanças sugeridas: legalização do Partido Comunista. A seguir, Goulart anunciou dois decretos. Um confiscava e entregava à Petrobrás as seis refinarias ainda em mãos de particulares. O outro, mais assustador, autorizava o Govêrno a confiscar, sem indenização em dinheiro, quaisquer áreas agrárias por êle julgadas inadequadamente utilizadas e entregá-las a camponeses sem terras — uma clara repetição do programa inicial de Fidel Castro de “reforma agrária”.
Os decretos constituíram um movimento audacioso para contornar o Congresso. Combinado com os ataques à Constituição, isso era um audaz lanço para estabelecer o govêrno por decreto, essência da ditadura. O cunhado do Presidente, assomando à tribuna, foi mais longe ainda. Em voz estridente, Brizola exigiu a extinção do Congresso e a instituição, em seu lugar, de “assembléias” de operários, camponeses e sargentos do Exército — um evidente eco dos sovietes de operários, camponeses e soldados de Lenine, em 1917. As implicações eram bastante claras.
O comício de 13 de março bem pode ser considerado como o detonador da revolução preventiva. A classe média brasileira percebeu então que a sorte estava lançada: Goulart tinha ido além do ponto em que poderia arrepender-se. O Govêmo tinha entrado num caminho que só podia levar a uma sangrenta guerra civil, seguida da tomada do poder pelos comunistas.
A Marcha das Mulheres
OS PRIMEIROS a agir foram as mulheres de São Paulo. Ouvindo pelo rádio e TV o comício de 13 de março, centenas de donas de casa correram para os telefones para convocar um comício capaz de fazer a demonstração engendrada por Goulart parecer insignificante. Seis dias depois, a 19 de março, as largas avenidas do centro da cidade de São Paulo ficaram entupidas pelo que as mulheres denominaram “Marcha da Família com Deus Pela Liberdade”. Apertando livros de oração e rosários contra o peito, mais de 600.000 pessoas marcharam solene e ritmicamente sob pendões anticomunistas. E enquanto elas marchavam, os jornaleiros nas calçadas venderam centenas de milhares de exemplares de jornais contendo na íntegra uma proclamação de mais de 1.000 palavras, prèviamente preparada pelas mulheres. É dessa proclamação o seguinte trecho:
"Esta nação que Deus nos deu, imensa e maravilhosa como é, está em extremo perigo. Permitimos que homens de ambição ilimitada, sem fé cristã nem escrúpulos, trouxessem para nosso povo a miséria, destruindo nossa economia, perturbando a nossa paz social, criando ódio e desespêro.
Eles infiltraram o nosso país, o nosso Govêmo, as nossas Fôrças Armadas e até as nossas igrejas com servidores do totalitarismo exótico para nós e que tudo destrói... Mãe de Deus, defendei-nos contra a sorte e o sofrimento das mulheres martirizadas de Cuba, da Polônia, da Hungria e de outras nações escravizadas!"
Um espectador classificou a marcha das mulheres em São Paulo “como a demonstração mais comovente da história brasileira”. Dias depois, foram organizadas marchas semelhantes para várias das principais cidades do país. Nem todos os esforços do Govêrno para desencorajá-las nem as ameaças da polícia de dissolvê-las conseguiram deter as entusiásticas cruzadas.
Guardiães da Legalidade
MAS, PARA impedir o golpe vermelho, tinha de ser empregada ação mais forte do que demonstrações públicas. Líderes da classe média começaram a conferenciar secretamente com generais anticomunistas do Exército Brasileiro, de longa data desconfiados de Goulart e silenciosamente empenhados em sua própria resistência aos métodos dêle. Para compreender o papel desempenhado pelos militares na revolução é mister entender o caráter e as tradições do Exército Brasileiro — uma estirpe ímpar na América Latina. O Brasil, ao contrário de outros países, nunca estêve sob uma ditadura exclusivamente militar.
Tradicionalmente, o Exército tem-se considerado o defensor da Constituição, o guardião da legalidade. Seus generais, ainda ao contrário dos de alguns países latinoamericanos, não são oriundos da aristocracia rica, mas das classes média e média inferior. Vários começaram sua carreira- como soldados. Assim, não formam uma casta militar, representando antes, talvez melhor do que qualquer outro segmento da população, uma seção transversal da opinião e dos ideais democráticos brasileiros.
Historicamente submetido à autoridade civil, o Exército só interferiu em situações políticas cinco vêzes desde a queda da Monarquia, em 1889 — e tão-sòmente em crises em que o poder civil se desmoronou ou decaiu. Nessas ocasiões o Exército só assumiu a direção o tempo suficiente para restabelecer os processos constitucionais, afastando-se em seguida. Nunca revelou nenhuma tendência para pegar o poder para si próprio — mesmo quando teria sido mais fácil, e quiçá aconselhável, fazê-lo. Da implantação da República até hoje, só cinco dos 25 presidentes do Brasil foram militares, e êsses devidamente eleitos ou nomeados.
Em sua maioria anticomunistas, a desconfiança que os generais tinham de Goulart e seus enredamentos com os extremistas era igualada pela desconfiança que Goulart tinha dêles. Confiando em que o respeito à Constituição os impediria de agir, não obstante, Goulart, por medida de cautela, transferia os comandos militares e manobrava as promoções de modo a reduzir o poder dos oficiais mais conservadores.
Um dêsses oficiais, o General Humberto de Alencar Castelo Branco, comandava o Exército sediado em Pernambuco, há muito um perigoso foco de agitação social. Quando alguns fazendeiros foram assassinados, e muitas famílias fugiram do terrorismo vermelho para as cidades, Castelo Branco entrou em ação. Aí, o Governador de Pernambuco, Miguel Arraes, notoriamente radical, queixou-se de que o General Castelo Branco estava “neutralizando” as influências esquerdistas em seu Estado. Goulart imediatamente tirou de lá o criador de casos — “promovendo- o” a Chefe do Estado-Maior do Exército. Outros oficiais que se manifestaram contra o comunismo foram analogamente transferidos, para cargos burocráticos, enquanto esquerdistas eram levados a posições de comando estratégicas.
Motim nas Fileiras
PARA ANULAR ainda mais qualquer possibilidade de uma revolta de generais anticomunistas, os vermelhos — aparentemente com a conivência de Goulart — trataram de destruir a disciplina nas Forças Armadas, quando não estimular o motim declarado. Foi desencadeado entre sargentos e praças um programa de vigorosa agitação, incitando-os a formarem seus sindicatos para reclamar uma alteração na lei que permitisse candidatarem-se a cargos eletivos — direito franqueado a oficiais, mas não a praças. Para minar mais ainda a ação dos chefes e enfraquecer a disciplina, formou-se uma Associação de Marinheiros e Fuzileiros-Navais — levando a “guerra de classes” marxista às classes armadas.
Em 23 de março, com os acontecimentos se avolumando vertiginosamente, Goulart demonstrou abertamente sua simpatia pelo movimento destinado a pôr a pique a disciplina das Fôrças Armadas. Nesse dia, uns 1.400 sócios da Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil amotinaram-se no Rio de Janeiro, abrigando-se na sede do Sindicato dos Metalúrgicos, controlado por comunistas. Desafiando as ordens de regressarem aos quartéis, os amotinados gritavam alegremente das janelas “Viva Goulart” e apregoavam sua fidelidade a seu comandante, Cândido da Costa Aragão, nomeado por Goulart e conhecido nos meios esquerdistas como “Almirante do Povo”.
Tropas do Exército cercaram e prenderam os rebeldes — que no entanto foram postos em liberdade algumas horas depois por ordem do próprio Presidente. Para grande desapontamento dos militares, Goulart “pediu” aos amotinados que fôssem para os seus quartéis, com a garantia de que não seriam punidos e receberiam dispensa no fim-de-semana. O Ministro da Marinha, Almirante Sílvio Borges de Souza Mota, abruptamente exonerou o “Almirante do Povo”, depois demitiu-se em protesto contra o encorajamento do motim pelo Govêrno. Goulart imediatamente reconduziu o “Almirante do Povo” ao seu pôsto e a seguir anunciou que o nôvo Ministro da Marinha seria Paulo Mário da Cunha Rodrigues, um esquerdista conhecido como “Almirante Vermelho”, convocado da reserva nessa emergência. Os amotinados comemoraram ruidosamente a vitória nessa tarde no centro da cidade do Rio, conduzindo aos ombros seu bem-amado “Almirante do Povo”.
Comêço de Uma Avalancha
ENTREMENTES, observando sombriamente os acontecimentos de seu gabinete de trabalho no Rio, Castelo Branco, o general que fôra “promovido” , havia sondado sua consciência legalista e resolvido agir. Entre seus colegas oficiais, o Chefe do Estado-Maior do Exército gozava do tipo de respeito profundo desfrutado nos Estados Unidos pelos Generais George Marshall e Douglas MacArthur. Êle se formou brilhantemente na Escola Militar do Brasil, tendo mais tarde feito um curso no Colégio de Comando e Estado-Maior dos Estados Unidos, em Fort Leavenworth, no Kansas. Durante a Segunda Guerra Mundial foi Chefe de Operações da Fôrça Expedicionária Brasileira, na Itália, como parte do Quinto Exército comandado pelo General Mark Clark.
Após o comício de 13 de março, Castelo Branco redigiu uma veemente nota. Quando um Presidente se propunha a anular o Congresso e a derrubar a Constituição, argumentava êle, a ação militar em defesa da legalidade não só se justificava, mas era obrigatória. Êsse memorando sigiloso foi distribuído a generais de confiança. Como toda correspondência dos oficiais sabidamente anticomunistas era controlada e seus telefones censurados, a circulação do manifesto de Castelo Branco foi um problema. Foi resolvido por homens de negócio anticomunistas: êstes transportaram exemplares no bôlso do paletó, entregando-os pessoalmente aos oficiais certos, e também forneceram homens de confiança para transmitir mensagens entre generais na sua acelerada troca de opiniões.
Ao manifesto de Castelo Branco, que circulava secretamente, mais de 1 500 oficiais de Marinha acrescentaram então um dêles. Endereçado a todo o povo brasileiro, êle declarava que chegara a hora de o Brasil “se defender” . O Exército prontamente proclamou “solidariedade à Marinha”, o grosso da imprensa aderiu, e na distante Brasília alguns membros do Congresso abraçaram a causa. Estaria a nação inteira se sublevando? O próprio Goulart pareceu atônito pela extensão da reação pública. Conferenciando às pressas com seu nôvo Ministro da Marinha, o “Almirante Vermelho”, Jango procurou recuar. Haveria um inquérito sôbre aquêle motim, anunciou, e, entrementes, o “Almirante do Povo”, Aragão, foi dispensado de seu comando.
O recuo veio tarde demais — a avalancha havia começado. Fazendo um último e desesperado esfôrço para obter algum apoio nas Fôrças Armadas, Goulart, na noite de 30 de março, foi à sede do Automóvel Clube do Brasil, no Rio, onde uma grande multidão de sargentos do Exército se reunira para homenageá-lo. Mas era demasiado tarde. No momento mesmo em que Goulart sorvia os aplausos dos sargentos e verberava os “gorilas”, a revolução preventiva já estava em marcha.
Marcham as Colunas Rebeldes
A PRIMEIRA conclamação para depor Goulart viera do Governador dos mineiros, Magalhães Pinto. Demonstrações em apoio dêsse apelo prontamente ocorreram nas ruas, e em 31 de março uma divisão do Exército sediada em Minas e comandada pelo General Olympio Mourão Filho pôs-se a caminho do Rio. Poucas horas depois chegou a notícia de que o General Amaury Kruel, comandante do Segundo Exército, sediado em São Paulo, estava lançando suas forças na luta pela liberdade e enviando um forte contingente para o norte, rumo ao Rio. Nessa altura, soube-se que o Quarto Exército, sediado em Pernambuco e comandado pelo General Justino Alves Bastos, também aderira à rebelião.
A beira do pânico, o Presidente Goulart tomou um avião para Brasília, onde disse aos repórteres: “Vim para aqui a fim de governar o país, e confio em que o povo esteja comigo.” Rapidamente descobriu que o Congresso não estava, e que tropas da guarnição de Brasília estavam-se movimentando para atacar o palácio presidencial. Após três horas apenas em Brasília, estava outra vez de volta em seu avião, rumo ao seu Estado natal, o Rio Grande do Sul. O Terceiro Exército, sediado em Pôrto Alegre, ainda não se definira; seu general-comandante, Ladário Pereira Telles, embora não esquerdista, era leal a Jango. A sua chegada, entretanto, Goulart soube que o Governador Ildo Meneghetti aderira ao levante.
Uma incógnita era o Primeiro Exército, sediado no Rio de Janeiro. Virtualmente preso em seu palácio no Rio, do qual fêz sua última barricada, o Governador da Guanabara, Carlos Lacerda, de longa data acirrado inimigo de Goulart, queria proclamar sua fidelidade à revolução e não podia fazê-lo. O Govêrno Federal ainda controlava as estações de rádio do Rio e uma greve geral em apoio de Goulart fechara tudo na cidade. As únicas fôrças de Lacerda eram a Polícia Militar, suas únicas armas blindadas os caminhões de limpeza pública estacionados de modo a obstruírem as ruas que conduziam ao palácio. Ao que êle sabia, o Primeiro Exército ainda estava recebendo ordens de Goulart.
Desanimado, o Governador soube que Goulart mandara uma coluna em direção a São Paulo, a fim de interceptar a coluna rebelde que avançava. (O que êle e a população carioca só puderam saber mais tarde foi que, quando as duas fôrças se encontraram, a coluna presumivelmente pró-Goulart logo aderiu aos rebeldes.) Afinal, em sua única linha telefônica ainda funcionando, o Governador Lacerda conseguiu falar com uma emissora rebelde na distante Belo Horizonte, cujo som podia ser ouvido no Rio.
Foi então que sua própria cidade finalmente o ouviu proclamar sua solidariedade à revolução. Mas quando ainda falava, chegou-lhe um comunicado de que carros de combate do Primeiro Exército rodavam pelas belas e sombreadas avenidas do Rio, a caminho do palácio do Govêrno. Só quando os carros chegaram ao palácio, foi que Lacerda soube que êles tinham vindo para salvá-lo e não para massacrá-lo.
Conclusão ...
SALVE a REDENTORA - SALVE o 31 de MARÇO de 1964 - A NAÇÃO que se salvou a si mesma - CONCLUSÃO
“A Nação que se salvou a si mesma”, de Clarence
W. Hall, publicada na edição de novembro de 1964 da revista Seleções do
Reader’s Digest.
Por ser um
artigo contemporâneo à Revolução de 1964, é uma narrativa bastante preciosa
sobre o período que o País vivia.
[Percebe-se
facilmente que mesmo sendo um texto escrito há 50 anos, narrando fatos
daquela época, se adapta perfeitamente aos dias de hoje.
Quando aborda a corrupção desenfreada que havia no Brasil naquela época, se esquecermos a data da matéria, podemos pensar que estamos lendo um jornal dos dias atuais em que a "petralhada" a "cumpanherada" tem um único objetivo:
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O MÁXIMO QUE FOR POSSÍVEL, NO MENOR TEMPO - como aves da rapina que
são percebem que a oportunidade do "ENRIQUEÇA DEPRESSA" está chegando ao
fim.]
Vitória
PELO MEIO da tarde de quarta-feira, 1º de abril, tudo estava terminado, e
os líderes da classe média do Brasil estavam nos microfones saudando o
colapso do comunismo. Em tôdas as janelas do Rio esvoaçavam lençóis e
toalhas saudando a vitória, e as ruas de tôdas as grandes cidades do
Brasil se encheram de gente alegre e dançando num espírito carnavalesco.
Do Rio Grande do Sul chegou a notícia de que Jango Goulart fugira para o
Uruguai. Também escaparam às pressas Brizola, o Embaixador de Cuba e
chefes graduados dos vermelhos, que dispararam para as fronteiras dos
países vizinhos, pularam depressa dentro de aviões rumo a Cuba ou se
esconderam em embaixadas amigas de países da Cortina de Ferro.
Navios procedentes da Tchecoslováquia, cheios de mais armas para os
revolucionários vermelhos, foram assinalados virando rumo a Havana. E,
no Rio, densas nuvens de fumaça subiam dos incineradores da Embaixada
Russa, onde grandes quantidades de documentos e papéis foram queimados
às pressas. Como pôde uma nação dividida, de 80 milhões de pessoas, mudar
politicamente tão depressa e pràticamente sem perda de vidas, em
contraste com as carnificinas de circo romano de Cuba, ou da Espanha,
onde ambos os lados lutaram tão encarniçadamente durante anos?
O mérito cabe em grande parte ao quadro dos oficiais do Exército Brasileiro, altamente civilizado, que agiu com tanta lealdade e precisão para pôr côbro à ameaça vermelha de apoderar-se do Govêrno, pouco antes de chegar ao ponto de derramamento de sangue. Mas como os generais se apressam em admitir, maior mérito ainda cabe aos civis, que, tendo diante dos olhos a lição de Cuba, por mais de dois anos haviam alertado o povo — e no momento culminante deram o sinal aos militares para agirem.
Dois dias depois da revolução, o Brasil teve um lembrete do que realmente a tornara possível. Dois de abril tinha sido marcado pelas mulheres da CAMDE como a data para a “Marcha da Família com Deus Pela Liberdade”, no Rio de Janeiro. Mas então, com a liberdade conquistada, para que incomodar-se? As mulheres do Rio, todavia, correram aos seus telefones, como suas irmãs de outras cidades haviam feito antes. A marcha teria lugar segundo os planos, mas agora como “marcha de ação de graças a Deus”. Quando até o General Castelo Branco, por meio do telefonema de um amigo, aconselhou o cancelamento, temendo violências, Dona Amélia Bastos insistiu, afirmando: “A marcha demonstrará ao mundo que esta é uma revolução do povo — um plebiscito em marcha pela verdadeira democracia!”
E assim foi: um oceano de humanidade, totalizando mais de um milhão de pessoas, deslocando-se sob uma tempestade de papéis picados caindo dos arranha-céus ao longo das avenidas do Rio; um exército de paz com bandeiras, dizendo com firmeza e reverência a tôda a América do Sul que os brasileiros estavam decididos a permanecer livres.
Qual Era o Grau de Perigo?
DIAS DEPOIS da revolução, os brasileiros começaram a tomar conhecimento de quanto tinham estado perto de perder essa liberdade. Varejando antros de subversão, apressadamente abandonados, unidades do serviço militar de informação descobriram toneladas de publicações comunistas, manuais de guerrilhas, arsenais de armas, planos meticulosos para a dominação vermelha, projetos estranhos para o massacre dos principais elementos anticomunistas. No Palácio das Laranjeiras, no Rio, havia arquivos comprometedores de correspondência de gente do Govêrno com chefes vermelhos, chequei compensados no valor de milhões de cruzeiros doados a organizações comunistas camufladas.
Na residência do cunhado de Goulart vieram à tona inúmeras provas dos atos da “Frente de Libertação Nacional” de Brizola — composta por seus “Grupos dos Onze” (conhecidos como G-11) — que êle presidia como “comandante supremo”. Os grupos G-11, cuja fôrça não era para desprezar, organizados por Brizola para “salvar o Brasil das garras dos capitalistas internacionais e de seus aliados internos”, apurou-se terem um efetivo superior a 30.000 homens.
Um manual secreto apreendido, distribuído aos comandantes regionais dos G-11, determinava que estes fôssem organizados segundo modelo da “gloriosa Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917”. Os seus membros, chamados “companheiros”, juravam “lutar até à morte”, aprendiam a organizar greves, a promover agitações e armar confusão; a “destruir, saquear e queimar edifícios públicos assim como empresas privadas” ; a capturar estações telefônicas, de rádio e TV e depósitos de armamento; a raptar e conservar como reféns autoridades que, em caso de insucesso, “deveriam ser imediata e sumariamente mortas” .
Outro manual tratava das técnicas de “violência planejada, pondo de lado qualquer espécie de sentimentalismo”, para eliminar qualquer pessoa que se opusesse- Dava-se atenção especial à execução de oficiais de postos elevados: “Cada oficial suspeito terá um homem responsável por sua eliminação no momento certo”; se o encarregado falhasse em seu dever, êle próprio deveria “sofrer imediatamente a pena de morte”.
Dinheiro Disponível e Dinheiro Falso
NA LUXUOSA residência de Brizola em Porto Alegre, com 20 cômodos — êle que nos seus discursos gostava de considerar-se “um homem pobre” e “defensor dos oprimidos” — foram encontradas várias centenas de milhões de cruzeiros e também documentos cuidadosamente preparados pondo outros bens dêle, em nome de terceiros, mas especificando que deveriam ser “devolvidos quando pedidos por LB”. Em Pernambuco, quartel-general dos preparativos comunistas no Nordeste, foram descobertos mais de 10.000 uniformes e o mesmo número de pares de sapatos, além de encomendas para mais 50.000, destinados ao Exército Camponês, que estava sendo recrutado e adestrado por Miguel Arraes, o Governador vermelho de Pernambuco. Havia vários uniformes para os chefes revolucionários, com um de desenho especial destinado ao próprio Arraes.
Em São Paulo, foi encontrado um vasto depósito de imitações de dinheiro em papel-moeda e moeda metálica, tendo gravadas as imagens de Lenine, Stalin, e Prestes, bem
como selos postais com a foice e o martelo. Isso era utilizado principalmente para propaganda. Mas também apareceram enormes quantidades de dinheiro falso, tão bem feito que quase não podia ser descoberto; os arquivos de sua utilização indicavam que outros bilhões tinham sido remetidos para organizações vermelhas, não só para financiar a subversão, mas também para acelerar a inflação, um objetivo prioritário dos engenheiros do caos.
Nas sedes das organizações trabalhistas e na União Nacional de Estudantes havia montes de filmes e impressos da Rússia, China Vermelha e Cuba; ampliações de fotografias de Castro, Khrushchev e Mao Tse-tung para colocar nas paredes e pilhas de fotografias menores para distribuição; além disso, havia grandes estoques de bombas Molotov e material para confeccioná-las. Foram apanhados em flagrantes nove agentes, vermelhos chineses, sete dêlès apresentando-se como membros de uma “missão comercial” e dois como correspondentes da Agência de Notícias Nova China. Em poder deles havia planos pormenorizados para o assassinato de preeminentes anticomunistas, bem como maçarocas de dinheiro e registro de gratificações pagas a congressistas e a membros do séquito de Goulart. O dinheiro encontrado com os nove, aparentemente destinado a subornar, elevava-se a mais de um bilhão de cruzeiros, 53.000 dólares americanos, 5.000 libras esterlinas e diversas quantias menores de outras procedências.
Nova Fechadura na Porta
CONTRA TODOS êsses elementos subversivos e corruptores os militares agiram depressa, prendendo todos os suspeitos — por um “Ato Institucional” ràpidamente promulgado para orientar o Brasil durante o govêrno provisório — excluindo do cenário político pessoas reputadas como ameaças imediatas para o sucesso da revolução. Muitos foram soltos após investigações; só continuaram detidos aquêles cujos atos provados, e não meras palavras, contribuíram para o quase soçôbro do Brasil.
Tiveram seus direitos políticos cassados por 10 anos 68 membros expulsos do Congresso e 349 outros brasileiros destacados — entre êles os ex-Presidentes Goulart, Quadros e Kubitschek. Sòmente depois que o Presidente Castelo Branco examinou pessoalmente as provas que havia contra Kubitschek, teve o ex-Presidente também cassados os seus direitos políticos. Aos críticos estrangeiros para quem tais medidas foram excessivamente severas, o nôvo Govêrno limitou-se a dizer: “Quando a casa da gente foi saqueada, não se convidam os ladrões a voltarem para jantar. No mínimo coloca-se uma nova fechadura na porta.” Visitando Paris após a revolução, e submetido a perguntas mordazes de repórteres franceses acerca do expurgo pós-revolucionário, o Governador Lacerda aludiu à Revolução Francesa de 1789. “O Brasil”, observou com vivacidade, “ainda não mandou uma única pessoa para a guilhotina.”
“Um Honesto Meio-Têrmo”
PERFEITAMENTE dentro do período de 30 dias previsto pela Constituição, o Congresso do Brasil elegeu Presidente o General Castelo Branco até ao término dos dois anos que restavam do Govêrno Goulart. (O Congresso mais tarde aprovaria uma prorrogação do mandato até 1966.) Em vívido contraste com os demagogos baratos que o precederam, Castelo Branco é universalmente reconhecido como honesto, isento da temeridade tão marcante de muitos governantes latino-americanos, e profundamente dedicado aos processos democráticos. É um homem sereno, mas obstinadamente corajoso.
Sendo êle próprio a antítese do caudilho, Castelo Branco chefia um govêrno que está longe de ser uma ditadura militar. Os partidos políticos como o Congresso existem sem restrições. A imprensa é livre, sem limitações aos desacordos ou à crítica; até o jornal Última Hora, principal defensor de Jango, continua sendo publicado. A “família oficial” do Presidente é composta dos mais notáveis peritos do país em seus respectivos campos: economistas, diplomatas de carreira, engenheiros, etc. A exceção dos ministros das três Forças Armadas e do Marechal Reformado Juarez Távora, Ministro da Viação e Obras Públicas, todos os membros do Gabinete são civis. Todos êles são homens da “classe média”, devotados às anunciadas reformas de Castelo. Rigoroso homem de centro, Castelo Branco repele a qualificação de “revolução direitista”. Êle assevera positivamente: “A extrema direita é reacionária, a extrema esquerda é subversiva. O Brasil precisa seguir um honesto meio-têrmo.” Quando, pouco depois da revolução, alguns ricos industriais e latifundiários procuraram impor o que ele considerou reivindicações em benefício próprio, Castelo Branco falou àsperamente: “A solução para os males da extrema esquerda não reside no nascimento de uma direita reacionária.” Os latifundiários deviam estar mais, bem informados. Enquanto servira no Nordeste, ele não escondera o fato de que “o aspecto mais desagradável da vida militar para mim é ter de defender proprietários ricos que tratam trabalhadores rurais como escravos” . No início de abril um porta-voz do Govêrno deixou claro: “A revolução não foi feita para manter a injustiça social e privilégios especiais.”
O Presidente não alimenta ilusões quanto à enormidade da sua missão, nem sôbre o pouco tempo de que dispõe para cumpri-la. Os problemas do Brasil estão profundamente enraizados; há regiões de tremenda pobreza e exploração das massas — não por gente de fora, como acusavam os vermelhos, mas por sua própria gente. São necessárias reformas extremas — políticas, econômicas e sociais. A tarefa é desconcertante. Mas, não estando vinculado a nenhum partido ou grupo de pressão — e com podêres dados pelo Ato Institucional, que o tornam responsável apenas perante o Congresso e o povo — o denodado Marechal está empenhado numa tentativa decisiva.
Reformas em Marcha
MAL ASSUMIU o cargo, Castelo Branco começou a desmontar a gigantesca e corrupta máquina burocrática; reduziu de 30% o recheado orçamento para o primeiro ano, começou a despejar no funil do Congresso reformas que vão direto ao cerne das dificuldades brasileiras. Cada projeto de lei tem de ser estudado peio Congresso dentro de um prazo de 30 dias ou automàticamente se converterá em lei. As reformas políticas já aprovadas abrangem uma emenda constitucional exigindo maioria absoluta nas eleições presidenciais — para desestimular a proliferação de partidos políticos, atualmente em número de 13, e para neutralizar a possibilidade de algum demagogo chegar ao poder com a conivência dos partidos, contrariando a vontade popular.
As reformas econômicas compreendem medidas destinadas a deter a inflação, como uma redução sensível nas despesas oficiais, a vinculação das futuras escalas salariais à produtividade e ao custo de vida e o fechamento dos meios de evasão das leis sôbre sociedades anônimas e impôsto de renda; uma emenda da Lei de Remessa de Lucros, há muito tempo discriminatória contra os investimentos estrangeiros; proibição de nacionalização e confisco de empresas privadas; eliminação de subsídios para a importação de trigo, petróleo e papel de imprensa; cancelamento da isenção de impostos para jornalistas, juízes, escritores e professôres. As reformas sociais, visando a elevar 'o padrão de vida das massas empobrecidas, incluem um programa nacional de construção de casas de baixo preço, destinado a acabar com as horrorosas favelas que são uma vergonha das grandes cidades brasileiras, e um programa de reforma agrária para corrigir a pobreza e as injustiças sofridas pelas massas nordestinas, virtuais servas dos grandes senhores feudais. O cerne do projeto de reforma agrária de Castelo Branco é a imposição de um imposto progressivo, de acôrdo com o tamanho e as frações ociosas da propriedade, que estimulará a utilização da terra e sua redistribuição pelos que não possuem terra própria. Êsse programa compreende assistência técnica e subvenções para auxiliar os pequenos fazendeiros no comêço, além de estradas federais que liguem a fazenda aos mercados.
Não menos difícil que as reformas políticas, econômicas e sociais é a limpeza moral em que se acha empenhado o regime. Nisto o Presidente deu exemplo. Antes de tomar posse, êle voluntariamente fêz a declaração de seus bens particulares: um apartamento no Rio de Janeiro, cêrca de três milhões de cruzeiros em ações, um automóvel Aero Willys modêlo 1961, um jazigo perpétuo no Cemitério São João Batista, no Rio. Seus discursos à Nação e mensagens ao Congresso ressoam como apelos à moralidade política. “A grande coisa que Castelo Branco já fêz”, disse um eminente brasileiro em julho último, “foi a criação de uma imagem de decôro e honestidade no Govêrno.”
Longa Viagem de Volta
MAS APESAR de seus magnânimos objetivos, poderá o Govêrno Revolucionário — no período que lhe resta — convencer todos os brasileiros da necessidade dos sacrifícios que têm de ser feitos para remediar os males que afligem a Nação? Os obstáculos são formidáveis. A maioria da classe de ricos proprietários rurais reage firmemente contra impostos mais elevados e reforma agrária. Das massas camponesas, por outro lado, surgirão novos líderes que acharão excessivamente lentos os projetos de melhoramento social. Comunistas e outros radicais, malgrado seu banimento presente, certamente se reagruparão em segredo, decididos a evitar seus enganos do passado. E o homem da rua, de há muito céptico quanto às promessas oficiais de qualquer procedência, tem de ver suficiente progresso rumo às reformas para dar seu apoio nas eleições livres ora marcadas para 1966.
A resposta não depende apenas do Marechal e de seus adeptos da classe média. “Ela também depende”, dizem os revolucionários brasileiros, “da vontade de todo brasileiro de subordinar os interesses egoístas ao bem da Nação.” Diz Castelo Branco: “Por tempo demais fomós levados pelos demagogos a pôr a culpa de todos os nossos males no imperialismo ianque. Doravante vamos ser julgados, não por nossas intenções, não por nossas promessas, mas pelo que fizermos!”
Apoiando o Presidente há os que antes de tudo tornaram um sucesso a revolta da classe média. “Uma coisa é fazer uma revolução”, diz Dr. Glycon de Paiva, do Conselho Nacional de Economia, “e outra sustentá-la. O perigo agora é de que nós, que iniciamos esta revolta, nos descuidemos.” Para evitar tal perigo, grupos democráticos continuam a postos — patrocinando cursos para adestrar líderes democráticos, especialmente nas classes média e pobre, e criando maneiras de manter o publico atento e esclarecido. Expressando a nova atitude de muitos empresários brasileiros, o industrial Paulo Ayres Filho declara: “Sabemos agora que nós, homens de negócio, não podemos pensar apenas em lucros, mas também nos problemas sociais do país. Temos de provar que a livre-emprêsa pode prestar o melhor serviço a todos.”
Os grupos femininos também não se estão desmobilizando. Diz Dona Amélia Bastos, da CAMDE: “Nós, as mulheres do Brasil, descobrimos a nossa fôrça. Vamos trabalhar agora para conservar a democracia que ajudamos a salvar.” As mulheres da CAMDE estão voltando suas energias para a educação e a assistência social. Elas também sugeriram ao Govêrno um plano minucioso para combater o analfabetismo, oferecendo-se para montar uma campanha de âmbito nacional, destinada a angariar fundos para realizar êsse plano. Se essa atitude se difundir suficientemente, o Brasil poderá de fato sair do longo mergulho em direção ao caos e dar grandes passos para a realização de seu imenso potencial. E, assim fazendo, poderá contar com o apoio de todo o mundo livre.
Transcrito do Blog Juventude Conservadora da UnB
O mérito cabe em grande parte ao quadro dos oficiais do Exército Brasileiro, altamente civilizado, que agiu com tanta lealdade e precisão para pôr côbro à ameaça vermelha de apoderar-se do Govêrno, pouco antes de chegar ao ponto de derramamento de sangue. Mas como os generais se apressam em admitir, maior mérito ainda cabe aos civis, que, tendo diante dos olhos a lição de Cuba, por mais de dois anos haviam alertado o povo — e no momento culminante deram o sinal aos militares para agirem.
Dois dias depois da revolução, o Brasil teve um lembrete do que realmente a tornara possível. Dois de abril tinha sido marcado pelas mulheres da CAMDE como a data para a “Marcha da Família com Deus Pela Liberdade”, no Rio de Janeiro. Mas então, com a liberdade conquistada, para que incomodar-se? As mulheres do Rio, todavia, correram aos seus telefones, como suas irmãs de outras cidades haviam feito antes. A marcha teria lugar segundo os planos, mas agora como “marcha de ação de graças a Deus”. Quando até o General Castelo Branco, por meio do telefonema de um amigo, aconselhou o cancelamento, temendo violências, Dona Amélia Bastos insistiu, afirmando: “A marcha demonstrará ao mundo que esta é uma revolução do povo — um plebiscito em marcha pela verdadeira democracia!”
E assim foi: um oceano de humanidade, totalizando mais de um milhão de pessoas, deslocando-se sob uma tempestade de papéis picados caindo dos arranha-céus ao longo das avenidas do Rio; um exército de paz com bandeiras, dizendo com firmeza e reverência a tôda a América do Sul que os brasileiros estavam decididos a permanecer livres.
Qual Era o Grau de Perigo?
DIAS DEPOIS da revolução, os brasileiros começaram a tomar conhecimento de quanto tinham estado perto de perder essa liberdade. Varejando antros de subversão, apressadamente abandonados, unidades do serviço militar de informação descobriram toneladas de publicações comunistas, manuais de guerrilhas, arsenais de armas, planos meticulosos para a dominação vermelha, projetos estranhos para o massacre dos principais elementos anticomunistas. No Palácio das Laranjeiras, no Rio, havia arquivos comprometedores de correspondência de gente do Govêrno com chefes vermelhos, chequei compensados no valor de milhões de cruzeiros doados a organizações comunistas camufladas.
Na residência do cunhado de Goulart vieram à tona inúmeras provas dos atos da “Frente de Libertação Nacional” de Brizola — composta por seus “Grupos dos Onze” (conhecidos como G-11) — que êle presidia como “comandante supremo”. Os grupos G-11, cuja fôrça não era para desprezar, organizados por Brizola para “salvar o Brasil das garras dos capitalistas internacionais e de seus aliados internos”, apurou-se terem um efetivo superior a 30.000 homens.
Um manual secreto apreendido, distribuído aos comandantes regionais dos G-11, determinava que estes fôssem organizados segundo modelo da “gloriosa Guarda Vermelha da Revolução Socialista de 1917”. Os seus membros, chamados “companheiros”, juravam “lutar até à morte”, aprendiam a organizar greves, a promover agitações e armar confusão; a “destruir, saquear e queimar edifícios públicos assim como empresas privadas” ; a capturar estações telefônicas, de rádio e TV e depósitos de armamento; a raptar e conservar como reféns autoridades que, em caso de insucesso, “deveriam ser imediata e sumariamente mortas” .
Outro manual tratava das técnicas de “violência planejada, pondo de lado qualquer espécie de sentimentalismo”, para eliminar qualquer pessoa que se opusesse- Dava-se atenção especial à execução de oficiais de postos elevados: “Cada oficial suspeito terá um homem responsável por sua eliminação no momento certo”; se o encarregado falhasse em seu dever, êle próprio deveria “sofrer imediatamente a pena de morte”.
Dinheiro Disponível e Dinheiro Falso
NA LUXUOSA residência de Brizola em Porto Alegre, com 20 cômodos — êle que nos seus discursos gostava de considerar-se “um homem pobre” e “defensor dos oprimidos” — foram encontradas várias centenas de milhões de cruzeiros e também documentos cuidadosamente preparados pondo outros bens dêle, em nome de terceiros, mas especificando que deveriam ser “devolvidos quando pedidos por LB”. Em Pernambuco, quartel-general dos preparativos comunistas no Nordeste, foram descobertos mais de 10.000 uniformes e o mesmo número de pares de sapatos, além de encomendas para mais 50.000, destinados ao Exército Camponês, que estava sendo recrutado e adestrado por Miguel Arraes, o Governador vermelho de Pernambuco. Havia vários uniformes para os chefes revolucionários, com um de desenho especial destinado ao próprio Arraes.
Em São Paulo, foi encontrado um vasto depósito de imitações de dinheiro em papel-moeda e moeda metálica, tendo gravadas as imagens de Lenine, Stalin, e Prestes, bem
como selos postais com a foice e o martelo. Isso era utilizado principalmente para propaganda. Mas também apareceram enormes quantidades de dinheiro falso, tão bem feito que quase não podia ser descoberto; os arquivos de sua utilização indicavam que outros bilhões tinham sido remetidos para organizações vermelhas, não só para financiar a subversão, mas também para acelerar a inflação, um objetivo prioritário dos engenheiros do caos.
Nas sedes das organizações trabalhistas e na União Nacional de Estudantes havia montes de filmes e impressos da Rússia, China Vermelha e Cuba; ampliações de fotografias de Castro, Khrushchev e Mao Tse-tung para colocar nas paredes e pilhas de fotografias menores para distribuição; além disso, havia grandes estoques de bombas Molotov e material para confeccioná-las. Foram apanhados em flagrantes nove agentes, vermelhos chineses, sete dêlès apresentando-se como membros de uma “missão comercial” e dois como correspondentes da Agência de Notícias Nova China. Em poder deles havia planos pormenorizados para o assassinato de preeminentes anticomunistas, bem como maçarocas de dinheiro e registro de gratificações pagas a congressistas e a membros do séquito de Goulart. O dinheiro encontrado com os nove, aparentemente destinado a subornar, elevava-se a mais de um bilhão de cruzeiros, 53.000 dólares americanos, 5.000 libras esterlinas e diversas quantias menores de outras procedências.
Nova Fechadura na Porta
CONTRA TODOS êsses elementos subversivos e corruptores os militares agiram depressa, prendendo todos os suspeitos — por um “Ato Institucional” ràpidamente promulgado para orientar o Brasil durante o govêrno provisório — excluindo do cenário político pessoas reputadas como ameaças imediatas para o sucesso da revolução. Muitos foram soltos após investigações; só continuaram detidos aquêles cujos atos provados, e não meras palavras, contribuíram para o quase soçôbro do Brasil.
Tiveram seus direitos políticos cassados por 10 anos 68 membros expulsos do Congresso e 349 outros brasileiros destacados — entre êles os ex-Presidentes Goulart, Quadros e Kubitschek. Sòmente depois que o Presidente Castelo Branco examinou pessoalmente as provas que havia contra Kubitschek, teve o ex-Presidente também cassados os seus direitos políticos. Aos críticos estrangeiros para quem tais medidas foram excessivamente severas, o nôvo Govêrno limitou-se a dizer: “Quando a casa da gente foi saqueada, não se convidam os ladrões a voltarem para jantar. No mínimo coloca-se uma nova fechadura na porta.” Visitando Paris após a revolução, e submetido a perguntas mordazes de repórteres franceses acerca do expurgo pós-revolucionário, o Governador Lacerda aludiu à Revolução Francesa de 1789. “O Brasil”, observou com vivacidade, “ainda não mandou uma única pessoa para a guilhotina.”
“Um Honesto Meio-Têrmo”
PERFEITAMENTE dentro do período de 30 dias previsto pela Constituição, o Congresso do Brasil elegeu Presidente o General Castelo Branco até ao término dos dois anos que restavam do Govêrno Goulart. (O Congresso mais tarde aprovaria uma prorrogação do mandato até 1966.) Em vívido contraste com os demagogos baratos que o precederam, Castelo Branco é universalmente reconhecido como honesto, isento da temeridade tão marcante de muitos governantes latino-americanos, e profundamente dedicado aos processos democráticos. É um homem sereno, mas obstinadamente corajoso.
Sendo êle próprio a antítese do caudilho, Castelo Branco chefia um govêrno que está longe de ser uma ditadura militar. Os partidos políticos como o Congresso existem sem restrições. A imprensa é livre, sem limitações aos desacordos ou à crítica; até o jornal Última Hora, principal defensor de Jango, continua sendo publicado. A “família oficial” do Presidente é composta dos mais notáveis peritos do país em seus respectivos campos: economistas, diplomatas de carreira, engenheiros, etc. A exceção dos ministros das três Forças Armadas e do Marechal Reformado Juarez Távora, Ministro da Viação e Obras Públicas, todos os membros do Gabinete são civis. Todos êles são homens da “classe média”, devotados às anunciadas reformas de Castelo. Rigoroso homem de centro, Castelo Branco repele a qualificação de “revolução direitista”. Êle assevera positivamente: “A extrema direita é reacionária, a extrema esquerda é subversiva. O Brasil precisa seguir um honesto meio-têrmo.” Quando, pouco depois da revolução, alguns ricos industriais e latifundiários procuraram impor o que ele considerou reivindicações em benefício próprio, Castelo Branco falou àsperamente: “A solução para os males da extrema esquerda não reside no nascimento de uma direita reacionária.” Os latifundiários deviam estar mais, bem informados. Enquanto servira no Nordeste, ele não escondera o fato de que “o aspecto mais desagradável da vida militar para mim é ter de defender proprietários ricos que tratam trabalhadores rurais como escravos” . No início de abril um porta-voz do Govêrno deixou claro: “A revolução não foi feita para manter a injustiça social e privilégios especiais.”
O Presidente não alimenta ilusões quanto à enormidade da sua missão, nem sôbre o pouco tempo de que dispõe para cumpri-la. Os problemas do Brasil estão profundamente enraizados; há regiões de tremenda pobreza e exploração das massas — não por gente de fora, como acusavam os vermelhos, mas por sua própria gente. São necessárias reformas extremas — políticas, econômicas e sociais. A tarefa é desconcertante. Mas, não estando vinculado a nenhum partido ou grupo de pressão — e com podêres dados pelo Ato Institucional, que o tornam responsável apenas perante o Congresso e o povo — o denodado Marechal está empenhado numa tentativa decisiva.
Reformas em Marcha
MAL ASSUMIU o cargo, Castelo Branco começou a desmontar a gigantesca e corrupta máquina burocrática; reduziu de 30% o recheado orçamento para o primeiro ano, começou a despejar no funil do Congresso reformas que vão direto ao cerne das dificuldades brasileiras. Cada projeto de lei tem de ser estudado peio Congresso dentro de um prazo de 30 dias ou automàticamente se converterá em lei. As reformas políticas já aprovadas abrangem uma emenda constitucional exigindo maioria absoluta nas eleições presidenciais — para desestimular a proliferação de partidos políticos, atualmente em número de 13, e para neutralizar a possibilidade de algum demagogo chegar ao poder com a conivência dos partidos, contrariando a vontade popular.
As reformas econômicas compreendem medidas destinadas a deter a inflação, como uma redução sensível nas despesas oficiais, a vinculação das futuras escalas salariais à produtividade e ao custo de vida e o fechamento dos meios de evasão das leis sôbre sociedades anônimas e impôsto de renda; uma emenda da Lei de Remessa de Lucros, há muito tempo discriminatória contra os investimentos estrangeiros; proibição de nacionalização e confisco de empresas privadas; eliminação de subsídios para a importação de trigo, petróleo e papel de imprensa; cancelamento da isenção de impostos para jornalistas, juízes, escritores e professôres. As reformas sociais, visando a elevar 'o padrão de vida das massas empobrecidas, incluem um programa nacional de construção de casas de baixo preço, destinado a acabar com as horrorosas favelas que são uma vergonha das grandes cidades brasileiras, e um programa de reforma agrária para corrigir a pobreza e as injustiças sofridas pelas massas nordestinas, virtuais servas dos grandes senhores feudais. O cerne do projeto de reforma agrária de Castelo Branco é a imposição de um imposto progressivo, de acôrdo com o tamanho e as frações ociosas da propriedade, que estimulará a utilização da terra e sua redistribuição pelos que não possuem terra própria. Êsse programa compreende assistência técnica e subvenções para auxiliar os pequenos fazendeiros no comêço, além de estradas federais que liguem a fazenda aos mercados.
Não menos difícil que as reformas políticas, econômicas e sociais é a limpeza moral em que se acha empenhado o regime. Nisto o Presidente deu exemplo. Antes de tomar posse, êle voluntariamente fêz a declaração de seus bens particulares: um apartamento no Rio de Janeiro, cêrca de três milhões de cruzeiros em ações, um automóvel Aero Willys modêlo 1961, um jazigo perpétuo no Cemitério São João Batista, no Rio. Seus discursos à Nação e mensagens ao Congresso ressoam como apelos à moralidade política. “A grande coisa que Castelo Branco já fêz”, disse um eminente brasileiro em julho último, “foi a criação de uma imagem de decôro e honestidade no Govêrno.”
Longa Viagem de Volta
MAS APESAR de seus magnânimos objetivos, poderá o Govêrno Revolucionário — no período que lhe resta — convencer todos os brasileiros da necessidade dos sacrifícios que têm de ser feitos para remediar os males que afligem a Nação? Os obstáculos são formidáveis. A maioria da classe de ricos proprietários rurais reage firmemente contra impostos mais elevados e reforma agrária. Das massas camponesas, por outro lado, surgirão novos líderes que acharão excessivamente lentos os projetos de melhoramento social. Comunistas e outros radicais, malgrado seu banimento presente, certamente se reagruparão em segredo, decididos a evitar seus enganos do passado. E o homem da rua, de há muito céptico quanto às promessas oficiais de qualquer procedência, tem de ver suficiente progresso rumo às reformas para dar seu apoio nas eleições livres ora marcadas para 1966.
A resposta não depende apenas do Marechal e de seus adeptos da classe média. “Ela também depende”, dizem os revolucionários brasileiros, “da vontade de todo brasileiro de subordinar os interesses egoístas ao bem da Nação.” Diz Castelo Branco: “Por tempo demais fomós levados pelos demagogos a pôr a culpa de todos os nossos males no imperialismo ianque. Doravante vamos ser julgados, não por nossas intenções, não por nossas promessas, mas pelo que fizermos!”
Apoiando o Presidente há os que antes de tudo tornaram um sucesso a revolta da classe média. “Uma coisa é fazer uma revolução”, diz Dr. Glycon de Paiva, do Conselho Nacional de Economia, “e outra sustentá-la. O perigo agora é de que nós, que iniciamos esta revolta, nos descuidemos.” Para evitar tal perigo, grupos democráticos continuam a postos — patrocinando cursos para adestrar líderes democráticos, especialmente nas classes média e pobre, e criando maneiras de manter o publico atento e esclarecido. Expressando a nova atitude de muitos empresários brasileiros, o industrial Paulo Ayres Filho declara: “Sabemos agora que nós, homens de negócio, não podemos pensar apenas em lucros, mas também nos problemas sociais do país. Temos de provar que a livre-emprêsa pode prestar o melhor serviço a todos.”
Os grupos femininos também não se estão desmobilizando. Diz Dona Amélia Bastos, da CAMDE: “Nós, as mulheres do Brasil, descobrimos a nossa fôrça. Vamos trabalhar agora para conservar a democracia que ajudamos a salvar.” As mulheres da CAMDE estão voltando suas energias para a educação e a assistência social. Elas também sugeriram ao Govêrno um plano minucioso para combater o analfabetismo, oferecendo-se para montar uma campanha de âmbito nacional, destinada a angariar fundos para realizar êsse plano. Se essa atitude se difundir suficientemente, o Brasil poderá de fato sair do longo mergulho em direção ao caos e dar grandes passos para a realização de seu imenso potencial. E, assim fazendo, poderá contar com o apoio de todo o mundo livre.
Transcrito do Blog Juventude Conservadora da UnB
Postado no Blog PRONTIDÃO - antecessor deste Blog PRONTIDÃO TOTAL - em 31 de março de 2014
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