O ministro Joaquim Levy poderia dizer que
foi mais uma brincadeira cara
A
aprovação da lei que dá a estados e municípios um belo desconto na dívida que
têm com a União. Só neste ano, disse o ministro, o governo federal deixaria de receber uns R$ 3 bilhões, dinheiro
precioso para um momento de ajuste das contas públicas.
A
presidente Dilma certamente diria que não
foi brincadeira nenhuma, pois ela mesma assinou a lei em novembro passado. Teria considerado uma demanda
justa? Agora, entretanto, a presidente
diz que não tem "espaço"
no orçamento para dar esse desconto às unidades federativas, especialmente as
prefeituras do Rio e São Paulo, principais beneficiárias.
A primeira hipótese, portanto, supondo que tem lógica
nessa história, é a seguinte: em novembro, Dilma achava
que teria o dinheiro; já no começo de seu novo governo, percebeu, com a
ajuda do ministro Levy, que não tinha dinheiro. Vai daí, deu um perdido: simplesmente se esqueceu de regulamentar a lei de novembro, sem
o que o desconto não pode ser concedido.
Quando começou a derrubar as
desonerações de impostos para empresas, Levy saiu-se com aquela: essa
brincadeira (as desonerações) nos
custa R$ 25 bilhões. A atual suposta brincadeira é mais barata - só 3
bilhões - mas como a primeira havia dado
confusão - a presidente Dilma
exigiu uma retratação - o ministro Levy não disse
nada desta vez. Mas agiu segurando a tal regulamentação. Ou seja,
tal como nas desonerações, o ministro
viu na renegociação das dívidas regionais mais uma....
não brincadeira, mas cabe uma bobagem? Também melhor não. Um equívoco, talvez.
Mas só pode ser
brincadeira! -
reclamaram
prefeitos, governadores e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
Então o Congresso aprova uma lei que
favorece as unidades da Federação e a
presidente simplesmente a ignora?
Reação: o
prefeito do Rio consegue na Justiça uma liminar obrigando Dilma a regulamentar
a lei e conceder logo a desconto na dívida. No mesmo dia, a Câmara aprova outra lei mandando a
presidente aplicar a lei de novembro.
Entende-se,
portanto, a bronca de prefeitos, governadores. Eduardo
Cunha não está de bronca, mas apenas quer tirar o poder da presidente. [não deixe a Dilma sangrar até morrer – não funcionou com Lula em 2005 e
talvez não funcione com ela – DELETE-A da forma mais simples: receba os pedidos
de impeachment contra a presidente e proceda o encaminhamento devido.] E assim convergiram nas manobras
para obrigar Dilma a dar o alívio nas dívidas estaduais e municipais.
Mas há ainda duas questões
jurídicas cruciais. A
negociação original das dívidas federativas foi feita no final dos anos 90, em
contratos individuais. Quer dizer, cada governo estadual, cada prefeitura tem
seu contrato assinado com a União. Ora, a Constituição
determina que um contrato firmado entre
duas partes legítimas, um ato jurídico perfeito, só pode ser alterado com a
concordância dos dois contratantes. Além disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal determina que a União não pode
renegociar uma dívida já contratada.
Reparando,
então: a lei de novembro do ano passado
não manda nada, apenas autoriza o governo federal a renegociar; mas, por outras normas, o governo federal não
pode renegociar contratos antigos. Ora, para que
serve uma lei que autoriza o governo a
fazer algo que ele não pode ou não quer? Imaginem o seguinte: o Congresso aprova uma lei invertida,
determinando que os governos estaduais e prefeituras passem a pagar prestações
maiores. Não passaria, não é mesmo?
A segunda lei, aprovada na última terça, com
apoio de todos os partidos, é mais inútil
ainda. Obriga a
presidente a cumprir uma lei que na prática não determina nem vale nada.
Ou: uma lei ilegal para fazer cumprir uma lei
vazia. Do lado lá deles, é uma sucessão de manobras e golpes. Visto do lado de cá, dos cidadãos e
contribuintes, só
pode ser brincadeira.
Escrito por: Carlos Alberto
Sardenberg - http://www.sardenberg.com.br/
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