Rodrigo
Maia só é presidente da Câmara, reeleito em fevereiro deste ano, como
produto de mais um golpe na Constituição (parágrafo 4º do artigo 57) e
de um bico no regimento interno (artigo 5º) da Casa que comanda. Os
textos são expressos: numa mesma legislatura, num período de quatro
anos, ninguém pode ocupar o mesmo cargo, na Mesa Diretora da Câmara,
duas vezes seguidas.
Devedor de Michel Temer para que lá
chegasse, Maia concluiu o mandato de Eduardo Cunha — e lhe herdou os
limites. Tinha conhecimento disso ao se projetar como candidato a
tampão. Só se reelegeu porque o Supremo — essa corte estranha, que toma
prerrogativas constitucionais do Legislativo quando não pode, mas que
faz corpo mole quando um Poder distorce a leitura da Carta Magna de que
deveria ser guardião — deixou passar.
E aí está: Maia, empoderado
por manobra ilegal, muito à vontade para confessar ter extrapolado a
função protocolar de presidente da Câmara (de modo a derrubar a primeira
denúncia contra Temer) somente para exibir sua força — e isso com a
intenção de ameaçar o presidente da República. Ou terá querido dar
recado diferente ao dizer — em resposta ao advogado Eduardo Carnelós —
que, depois de tudo o que fizera por Temer, aquilo de que se julgava
vítima não era aceitável e que, a partir de então, cumpriria
exclusivamente seu papel institucional? Oi? Que “tudo” é esse? O que fez
Maia — por Temer — para além do que estritamente lhe cabia? Sabe-se
agora que pretende ser apenas o presidente da Câmara acerca da segunda
denúncia contra Temer. Ok. Mas: será essa doravante uma condição
estável, ou algo pode fazer com que mude e possa novamente, aqui ou
acolá, dar uma força ao presidente ou a qualquer outro enrolado?
Noto,
à margem, que o motivo do conflito foi a publicação, no site da Câmara,
de vídeos com a delação de Lúcio Funaro. Material que a assessoria de
Edson Fachin, diante do imbróglio, formalmente comunicou estar sob
sigilo, mas que continuaria disponível, no mesmo lugar, como se não
consistisse numa afronta a uma determinação do Judiciário. Mesmo, porém,
que não houvesse sigilo: nada obrigava a Câmara a dar publicidade aos
vídeos. Se o fez, a responsabilidade é de seu presidente —e é natural
que se leia no fato, na semana em que a Casa trata da denúncia contra
Temer, um gesto autoritário para efeito político.
Sei que o homem
é querido por gente influente, fonte farta para o jornalismo de fofoca e
interlocutor privilegiado do mercado financeiro. Aécio Neves também o
era. E isso serve de alerta a Maia. Para que não se deslumbre; não se
tenha em conta desproporcional. Leio, por exemplo, que sua gestão à
frente da Câmara é considerada excelente, embora ninguém saiba explicar
por que nem tampouco declinar por quem. A valoração sobre um bom
comando da Casa — num juízo honesto intelectualmente — deveria decorrer
da percepção de que há uma agenda positiva para o país se desenvolvendo
ali. Mas isso há? Qual é a agenda atual da Câmara para o Brasil? Qual é a
diretriz de Maia para a Câmara? Que perfil tem a instituição hoje que a
difira daquela dirigida por Cunha?
O esforço para o
estabelecimento do teto de gastos públicos remonta ao final de 2016, na
vigência ainda do mandato-tampão, antes de algum arrivista difundir a
ideia de que Maia presidir o país seria a solução. E de lá pra cá? Ele
foi reeleito em fevereiro — e temos já oito meses em que esteve
diariamente nas manchetes não para o debate sobre as reformas (nesse
período, só a trabalhista prosperou), mas em futricas relativas à sua
relação com Temer, derivadas do surto de grandeza segundo o qual, “CEO
do Brasil”, pode polarizar com o presidente da República.
É tudo
muito cafona e pequeno. Há, contudo, método no projeto de se manter em
evidência seja como for, ascendendo artificialmente — Parlamento como
escada — enquanto a Câmara vai paralisada. O plano é óbvio. Maia pode
ser instrumento a interesses vários, daí porque inflados os seus dotes,
mas ainda é— e tem consciência de que é — deputado federal de apertados
53 mil votos, cuja eleição à presidência da Câmara se deu no vácuo
oportunista de uma das maiores crises da história da Casa e em cuja
gestão se aprovou, sob a anarquia do que se chamou de reforma política, o
sonho maior do petismo: o financiamento público de campanhas
eleitorais.
Ele pode até dar corda para que se especule a
respeito, mas sabe que não tem densidade — voto — para ser governador.
Nem senador. Sabe também que a superfície sobre a qual tenta encorpar o
DEM é frágil e que, se bem-sucedido, garantirá, no máximo, a vaga de
vice na chapa presidencial do PSDB. [anotem e cobrem: a carreira política de Rodrigo Maia acaba em 31 dez 2018, ou quiçá, antes;
as chances de Maia ser eleito são iguais as de Lula = ZERO; ele está pior que Lula e percebam que o sentenciado Lula sequer será candidato - presidiário não pode ser candidato.]
Com seu investimento em
aparecer, Maia quer apenas se reeleger, mas com votação expressiva,
entre as maiores do Estado do Rio de Janeiro, e depois ser reeleito
presidente da Câmara. Afinal, também ele tem motivos para não arriscar
eleitoralmente em 2018 — ou não está citado nas delações da Odebrecht
que podem lhe valer uma denúncia a qualquer momento? Como
qualquer outro, quer — precisa — manter o foro especial. Não está onde
está por suas qualidades distintivas, mas por ser representativo.
Fonte: Carlos Andreazza - O Globo
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