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domingo, 29 de outubro de 2017

Prepotência do MP e onipotência destemperado do juiz Marcelo Bretas transformaram Cabral numa vítima

Bretas transformou Cabral numa vítima

Dizer que Cabral teve acesso a informações privilegiadas ou que tenha pesquisado a vida de Bretas é atentar contra a inteligência alheia. Bastava ler jornal

O juiz Marcelo Bretas deu uma demonstração de destemperada onipotência ao transferir o ex-governador Sérgio Cabral para uma prisão federal. Ele e o Ministério Público poderiam ter cuidado disso em julho, quando se soube que o ilustre detento tinha como companheiro de cela e anjo da guarda um ex-PM condenado a 19 anos por negócios com o tráfico. É comum que os chefes de quadrilhas tenham guarda-costas na cadeia.

 Juiz Marcelo Bretas (Foto: Leo Martins / Agência O Globo)

Bretas determinou a transferência punitiva de Cabral porque, numa audiência, discutindo a mecânica do comércio de joias, coisa que o ex-governador e sua mulher conhecem e usufruem, disse o seguinte:  “Vossa Excelência tem um relativo conhecimento sobre o assunto, porque sua família mexe com bijuterias. Se eu não me engano, é a maior empresa de bijuterias do estado.”

Bretas tomou essa afirmação sibilina como uma ameaça, feita “subliminarmente”. Da cadeia, com “acesso privilegiado a informações que talvez não devesse ter”, Cabral “acompanharia a rotina” de sua família. Diante disso, o Ministério Público requereu a transferência do preso para uma cana federal, e Bretas concedeu-a. Dias depois, o desembargador federal Abel Gomes confirmou a decisão, porque, entre outras impropriedades, Cabral estaria “pesquisando a vida das autoridades que constitucionalmente estão encarregadas da persecução e julgamento das diversas ações penais a que responde”.

A partir de uma frase de Cabral, construiu-se um bonito romance policial. Preso, o Poderoso Chefão descobre que a família do corajoso juiz tem uma loja de bijuterias e mostra que sabe disso. [A cena está abaixo.]

Cabral se LASCOU, MEXEU COM O JUIZ ERRADO!! POLÊMICA: Senador quer "abrir" o Whatsapp; conheço o que é viver em um PAÍS SEGURO e que não tem o famigerado 'estatuto de desarmamento'.


Cabral foi para a audiência disposto a desestabilizar Bretas. Já fez isso em duas outras ocasiões, mas desta vez conseguiu. Colocou o juiz em tamanha defensiva que acabou pedindo ajuda aos advogados do criminoso. Com sua técnica parlamentar, Cabral foi da prepotência à humildade, armou o alçapão e Bretas caiu nele.  Faltou-lhe a frieza de Sérgio Moro. Cabral foi um bom ator e ninguém podia pedir a Bretas que o superasse na arte cênica, mas foi um mau juiz ao aceitar a argumentação do Ministério Público, encampando a tese da “informação privilegiada” para transferi-lo.

A informação de que a família de Bretas tem uma casa comercial nada tem de privilegiada. Foi publicada em fevereiro pelos repórteres Marco Aurélio Canônico e Italo Nogueira. Em setembro, Luiz Maklouf Carvalho repetiu-a, tendo entrevistado o próprio Bretas e seu pai.  Nos dois casos, identificou-se a região do Rio onde fica a loja, que não é a maior do estado, nem trabalha com bijuterias, pois seria mais adequado falar em miçangas. Como disse Márcio, o irmão mais moço do juiz, com uma das joias de Cabral, pode-se comprar todo o estoque de sua loja, onde o preço médio das mercadorias é de R$ 5.

Dizer que Cabral teve acesso a informações privilegiadas ou que tenha pesquisado a vida de Bretas é atentar contra a inteligência alheia. Bastava ler jornal. Cabral fez o diabo (inclusive na cadeia) e suas condenações haverão de somar mais de cem anos mas, com os fatos expostos, não se pode acusá-lo de ter pesquisado a vida de Bretas ou de ter recebido informações privilegiadas na cana.


Fonte: Elio Gaspari - O Globo


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