O telemarketing invasivo nos lembra que as deficiências do Brasil não se limitam ao setor público. Por
uma combinação de incompetência com terceirizações precárias, empresas
que desejam legitimamente se dirigir a clientes atuais ou potenciais se
tornam um estorvo na vida do consumidor, invadindo sua privacidade e
seus momentos de repouso –o que conspira contra a imagem e os interesses
da própria companhia.
Essa marcha insensata é favorecida por um
ambiente de regulação falha, além de protocolos que violam as mais
elementares regras de bom senso. Operadores mal remunerados e sem
treinamento acabam por adotar uma prática mais semelhante ao assédio do
que à conquista recomendada pelos manuais de vendas. Como
descreve o caderno especial publicado por esta Folha na terça-feira, os resultados desses desatinos, além da irritação de quem precisa
responder a múltiplas e inconvenientes ligações telefônicas, são
ineficiências empresariais na forma de custos com multas e até processos
judiciais.
Há uma forma razoavelmente simples e barata de
enfrentar o problema: trata-se da lista pública de telefones que não
devem ser contatados pelos departamentos de telemarketing, já adotada
nos EUA, em países da União Europeia, na Argentina e mesmo em alguns
Estados do Brasil, como São Paulo. Empresas que fazem chamadas
indesejadas a números registrados nesses cadastros ficam sujeitas a
multas e a outras sanções. Se isso não basta para eliminar as agruras
dos consumidores —especialmente porque a incompetência está entre suas
causas—, decerto serve para atenuá-las.
Outro aspecto preocupante
é que o desrespeito à privacidade dificilmente fica restrito ao campo
do telemarketing agressivo. Tudo indica que o padrão de desleixo de
empresas esteja se repetindo na guarda de dados dos clientes, com
transtornos menos visíveis, mas consequências que podem ser bem mais
graves. Tais informações têm valor estratégico e são frequentemente vendidas ou repassadas a outras firmas, nem sempre idôneas.
Embora
o Marco Civil da Internet proíba o fornecimento de dados pessoais sem a
anuência do titular, este costuma autorizá-lo inadvertidamente, ao
preencher formulários não lidos na íntegra, em meio digital. Seria
recomendável, portanto, a apresentação à parte de tais cláusulas. Faz-se hora de interromper essa e outras rotinas de ineficiências que tanto mal fazem ao país.
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Fonte: Editorial - Folha de S. Paulo
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