Joaquim não quis. Nem os dez pontos percentuais que lhe davam uma
dianteira tão confortável como surpreendente lhe convenceram a seguir em
frente com a candidatura. Preferiu se recolher. Ocupar o posto de mais
um observador. E já pontificou: “a eleição não muda nada no País”. Que
ao menos o prognóstico esteja errado. Precisa mudar. Joaquim, na
verdade, temeu. Não queria macular a biografia. Receava dossiês
fabricados à ocasião. Livrou-se até de um apartamento que mantinha em
Miami e que já havia lhe causado alguma dor de cabeça quando ministro do
Supremo. [pesadelos até certo ponto esperados; além da criação de uma empresa para adquirir o apartamento em condições mais favoráveis, pagando menos impostos, o ex-ministro ainda colocou como endereço da empresa no Brasil o seu apartamento funcional - na época era ministro do STF.] Tinha pesadelos com a ideia de perder renda e status, hoje
obtidos através de um escritório de advocacia e das palestras realizadas
para o universo privado — sedento por ouvir lições e experiências de um
ex-presidente do STF. Joaquim aquiesceu. Esse combate não é para ele,
lhe sussurrou a voz da consciência. Não é na verdade para os neófitos,
amadores, pregam os donos dos feudos eleitorais. No tabuleiro da
disputa, a desistência de Joaquim caiu como uma pedra. Quebrou o
equilíbrio de forças. Rearrumou as estratégias.
Embaralhou tudo de novo. De quem será o espólio? Os aventureiros de
ocasião já se apresentaram. Bolsonaro diz que irá tudo para ele. Em
parte tem razão, dada a empatia que figuras de fora da curriola
partidária desperta. O PT agora sonha de novo em liderar uma chapa de
esquerda. Marina, que de início era cotada a montar uma dupla imbatível
com o ex-ministro, ainda imagina arrancar um naco do prestígio de
Joaquim para reascender o ânimo em torno de seu nome. Ganhou Ciro Gomes,
ganhou Alckmin, ganhou Álvaro Dias e até Meirelles pode fisgar uma
parte desse estoque de votos antes carreados para Joaquim. Na prática,
na real mesmo, a retirada de seu nome a essa altura do campeonato e de
tal pedestal de popularidade praticamente sela as chances dos potenciais
outsiders. Primeiro foi o apresentador Luciano Huck, que hesitou
bastante antes de bater em retirada. Ambos reuniam atributos muito
procurados pelo eleitor. Joaquim Barbosa representava o novo, a
biografia ilibada de alguém que veio da pobreza absoluta — ex-faxineiro
antes de alcançar o olimpo — e, não fosse suficiente, ainda havia
brilhado em uma seara especialmente cara aos brasileiros neste momento: a
da ética e da justiça [o reeducando Lula quando se tornou conhecido do grande público também usou o argumento de sua origem pobre - chegou a dizer para destacar sua pobreza, melhor dizendo sua ignorância, que sua mãe nasceu analfabeta e sem dentes;
mesmo tendo vindo da pobreza, da ignorância Lula se tornou um corrupto - para dizer o mínimo.
Assim, fica a certeza que nascer pobre ou rico não é garantia de honestidade ou desonestidade.] . O eleitorado sem um alinhamento ideológico
definido, que é contra a depravação do Estado, da vida parlamentar e da
política tradicional, parecia caminhar para a alternativa viável e
concreta. Escolher Joaquim, no entender dessa corrente de pensamento,
seria optar pelo combate sem tréguas à corrupção. Demonstraria o apoio
incondicional da sociedade ao trabalho da Lava Jato e da depuração ética
já em curso.
Sem Joaquim, com o centro esfacelado, a esquerda
indefinida e a direita marcada pelo extremismo que lhe impõe um teto de
simpatizantes [teto que subirá quando a campanha começar e aumentar o número dos que passarão a ver a certeza: a DIREITA É A ÚNICA SOLUÇÃO - Bolsonaro fará o necessário para consertar o Brasil. E uma vantagem adicional para Bolsonaro (mesmo idade não sendo garantia de longevidade) É jovem e tem mais chances de se candidatar a reeleição.] as opções rarearam. Bastante! O público não quer mais (já
demonstrou isso) os velhos modelos e as caras marcadas pelos veios da
irregularidade. Acusações de caixa dois, de participação em esquemas
ilícitos, de desvios de qualquer natureza serão fatais em candidaturas
que almejam o Planalto.
Definitivamente não vai valer apenas a base de
apoio, a estrutura partidária e o tempo de TV. Para convencer, os
potenciais presidenciáveis terão, necessariamente, de entregar um
renovador plano de governo, algo alvissareiro que não soe falso. A
decantação das opções entra na fase final. A distância de interesses
entre o establishment político e os eleitores ainda é enorme. Forças
tendem a se aglutinar para angariar musculatura. O impacto do fim da
opção Joaquim ainda não está totalmente dimensionado. Vai além dos 10%
que ele devolve ao jogo. A lembrar que o ex-ministro chegou lá sem dar
uma única declaração sequer como presidenciável. Seu voluntarismo para
buscar discretamente a filiação e se apresentar como opção foi tão
rápido como o que mostrou ao se retirar. O cometa Joaquim reluziu por
tempo curto no céu turvado de nuvens da eleição.
Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três - IstoÉ
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